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35ª Jornada Sul Brasileira de Cirurgia Plástica - Year2019 - Volume34 - (Suppl.1)

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2019RBCP0072

RESUMO

Introdução: A cirurgia estética periorbital adequadamente realizada é um dos procedimentos mais rejuvenescedores de todas as cirurgias faciais realizadas. No entanto, não existe padronização dos procedimentos necessários para diminuir a chance de má posição da margem palpebral no pós-operatório.
Método: O serviço de cirurgia plástica do HU/UFSC criou uma padronização de avaliação da margem palpebral pré-cirúrgica. Para avaliação do ligamento tarsal foi utilizado o snap test, projeção lateral e projeção anterior. Para avaliação da sustentação tarsal foi utilizado o canto lateral, vetor e distância canto-órbita.
Resultados: A partir de setembro de 2018 foi implementada a padronização de avaliação de margem palpebral para realização de blefaroplastia inferior.
Conclusão: A padronização de um procedimento evita intercorrências e complicações futuras de pacientes.

Palavras-chave: Doenças palpebrais; Blefaroplastia; Blefaroptose

ABSTRACT

Introduction: Properly performed periorbital aesthetic surgery is one of the most rejuvenating procedures of all facial surgeries. However, there is no standardization in procedures necessary to reduce the chance of poor postoperative palpebral margin position.

Method: The HU/UFSC plastic surgery service created a pre-surgical eyelid margin standardization. To evaluate the tarsal ligament, the snap test, lateral projection and anterior projection were used. To evaluate the tarsal support, we used the lateral corner, vector and corner-orbit distance.

Results: As of September 2018, the standardization of eyelid margin evaluation was performed for lower blepharoplasty.

Conclusions: The standardization of a procedure avoids future complications and complications of patients.

Keywords: Blepharoptosis; Eyelid diseases; Eyelids


INTRODUÇÃO

A cirurgia estética periorbital adequadamente realizada é um dos procedimentos mais rejuvenescedores de todas as cirurgias faciais realizadas. Devidamente concebida e executada, causa enorme satisfação tanto para o cirurgião como para o paciente1.

A região ocular é a unidade estética central de nossa face. O olhar pode transmitir, de forma particular, aspectos da personalidade e dos sentimentos de um indivíduo e pode se modificar com o envelhecimento. Partindo desse pressuposto, a região orbitopalpebral assume importante papel como complemento dessa forma de expressão2,3.

Usualmente, as alterações causadas pelo envelhecimento são percebidas primariamente ao redor dos olhos. Atualmente, existem diversas técnicas com diferentes princípios para corrigir as deformidades palpebrais que aparecem com o processo natural da idade, entre elas temos a cirurgia das pálpebras4.

No entanto, não existe padronização dos procedimentos necessários para diminuir a chance de má posição da margem palpebral no pós-operatório. Cada técnica é individualizada e indicada de uma forma cirurgião dependente, sem consenso científico.

Dentro dessas técnicas para evitar a má posição palpebral, temos as cantopexias e as cantoplastias (tarsal strip). Ainda dentro de cada técnica existe uma variedade de táticas cirúrgicas, muitas delas não padronizadas pelos cirurgiões.

Uma padronização para melhor entendimento das indicações das cantoplastias e cantopexias é necessária primeiramente para indicar corretamente um procedimento para o paciente. A mesma padronização facilita o trabalho do residente ou profissional com menor experiência, aumentando a chance de resultados satisfatórios. Por último, em um contexto de medicina baseada em evidência, a padronização gera possibilidade de avaliação e produção literária com melhora contínua.

OBJETIVO

Apresentar algoritmo de avaliação pré-operatória da margem palpebral, evitando sua má posição pós-operatória.

MÉTODO

O serviço de cirurgia plástica do HU/UFSC criou uma padronização de avaliação da margem palpebral pré cirúrgica para realização de procedimento que evite sua má posição pós-operatória.

Para avaliação do ligamento tarsal foi utilizado o snap test, projeção lateral e projeção anterior. Para avaliação da sustentação tarsal foi utilizado o canto lateral, vetor e distância canto-órbita (Tabela 1).

Tabela 1 - Avaliação do ligamento e sustentação tarsal.
AVALIAÇÃO MARGEM PALPEBRAL
1. LIGAMENTO TARSAL
  NORMAL  ALTERADO CONDUTA
SNAPTEST RETORNO  LENTIFICADO ALTERADO = NORMAL TARSAL STRIP
PROJEÇÃO LATERAL <0.8CM >OU=0.8CM  ALTERADO = TARSAL STRIP
PROJEÇÃO ANTERIOR <0.6CM >OU= 0.8CM ALTERADO = TARSAL STRIP
1. SUSTENTAÇÃO TARSAL
  NORMAL ALTERADO CONDUTA
CANTO LATERAL ACIMA/NEUTRO ABAIXO CANTOPEXIA + TARSORRAFIA TEMPORÁRIA
DISTÂNCIA (CANTO/ÓRBITA) <1CM >OU = 1CM ALTERADO = 1 PONTO
VETOR POSITIVO NEGATIVO ALTERADO = 1 PONTO
SOMATÓRIO DE PONTUAÇÃO
PONTOS CONDUTA 1
0-1 TARSORRAFIA TEMPORÁRIA
2 TARSORRAFIA TEMPORÁRIA + CANTOPEXIA
Tabela 1 - Avaliação do ligamento e sustentação tarsal.

O snap test é realizado com a paciente em posição ortostática e olhos abertos. Realiza-se tração da pálpebra inferior para baixo com dedo do examinador e com retirada do mesmo avalia-se tempo de retorno para posição natural. Pode ser classificado como normal ou lentificado (Figura 1).

Figura 1 - Avaliação do ligamento tarsal. Da esquerda para a direita: 1. Snap test; 2. Projeção lateral; 3. Projeção anterior.

A projeção lateral e projeção anterior são parâmetros mensuráveis com régua. Realiza-se tração máxima lateral da pálpebra, para projeção lateral. Distâncias maiores ou iguais a 0,8 cm do ligamento tarsal até a esclera são consideradas alteradas. Para projeção frontal, pinça-se de maneira delicada a pálpebra do paciente e realiza-se tração frontal; medidas maiores ou iguais a 0,6 cm entre o ligamento tarsal e o globo ocular são considerados alterados.

Para qualquer alteração do ligamento tarsal, nas três avaliações realizadas (snap test, projeção lateral e projeção anterior) é mandatória a realização de tarsal strip na paciente, pois a mesma apresenta frouxidão ligamentar. Caso a mesma não apresente alteração no ligamento tarsal, evoluímos à avaliação da sustentação tarsal.

A primeira avaliação da sustentação tarsal é realizada pelo canto lateral. Avalia-se a relação do canto lateral frente ao canto medial dos olhos, criando um vetor de avaliação. Caso o paciente apresente um canto lateral acima do medial ou na mesma altura (neutro) consideramos normal, levando pontuação zero. Caso o paciente apresente o canto lateral abaixo do canto medial, mimetizando um olhar triste, é mandatória a realização de cantopexia + tarsorrafia temporária.

O vetor é avaliado com o paciente em posição ortostática e perfil. Marcam-se as maiores regiões de projeção da eminência malar e do globo ocular. Para realizar o mesmo, régua rígida é de boa valia. Um vetor positivo é quando a iminência malar é a frente do globo, sendo compatível com uma sustentação/arcabouço ósseo mais proeminente para estruturas acima. O vetor negativo é quando não existe esse sustento. Caso o paciente apresente vetor negativo, pontuamos com um; caso positivo, zero (Figura 2).

Figura 2 - Avaliação da sustentação tarsal. Da esquerda para a direita: 1. Cantolateral; 2. Distância canto-órbita; 3. Vetor.

A distância canto-órbita é realizada com o paciente em posição ortostática. Mede-se a distância final da fenda palpebral até a eminência óssea orbital, mimetizando o tamanho do retináculo lateral. Consideramos uma distância normal até 1 cm. Caso a distância seja maior ou igual a 1 cm, pontumos o paciente com um ponto; caso normal, zero.

Pacientes que não apresentaram alteração do ligamento tarsal e do canto lateral evoluem para somatório de pontuação para conduta. Caso a pontuação total seja zero ou um, é realizada tarsorrafia temporária. Caso pontuação seja dois, é realizada contopexia.

TÉCNICA CIRÚRGICA

Tarsorrafia temporária

Após a blefaroplastia inferior finalizada e já realizado fechamento com náilon 6.0 da ferida, realiza-se passagem de ponto de náilon 6.0 em tarso de pálpebra superior (plano total) e tarso de pálpebra inferior (plano total) aproximadamente 1 a 1.5 do canto lateral dos olhos. Os pontos diminuem a tensão na região cantal lateral, servindo de sustendo da palpebral inferior e não deixando que a cicatrização da pálpebra inferior cause retração da mesma. Mesmo sem estudo prévio, a tarsorrafia temporária parece melhorar a quemose pós-operatória. Os pontos bem executados não alteram campo visual da paciente e não causam desconforto para a mesma.

Cantopexia

Realiza-se fixação com náilon 5.0 em periósteo da região orbital em ponto de encontro entre uma linha que passe entre a narina, canto lateral dos olhos e região orbital, região que normalmente corresponde ao tubérculo de Whitnall. Realiza-se a passagem do fio em região posterior aos retináculos laterais e retorno do fio passando à frente do retináculo na tentativa de ancorar a estrutura. Não é realizada passagem de ponto em tarso ou musculatura orbicular. No retorno, nova passagem do fio em periósteo é realizada e o mesmo é anodado com pelo menos cinco seminós.

Tarsal strip

Realiza-se cantotomia/cantólise; parcimônia deve existir na ressecção do ligamento tarsal, pois a função do retináculo lateral será realizada pelo tarso ao final do procedimento. Com náilon 5.0 realiza-se a passagem de fio em periósteo orbital, um pouco acima da linha horizontal ocular, na tentativa de criar um canto lateral acima do conto medial. O fio passa no ligamento tarsal e retorna para o periósteo para segunda fixação. O mesmo é anodado com pelo menos cinco seminós.

RESULTADOS

A partir de setembro de 2018 foi implementanda a padronização de avaliação de margem palpebral para realização de blefaroplastia inferior em busca de evitar má posição da margem palpebral.

Entre setembro a dezembro de 2018, 21 pacientes realizaram procedimento dentro da padronização estabelecida. Todos os casos foram operados com anestesia local sem sedação. A maioria dos pacientes eram do sexo feminino (19). A idade média dos participantes foi de 56 anos (44-72 anos).

Entre os procedimentos realizados em blefaroplastia inferior: seis pacientes realizaram retalho cutâneo (no touch), 12 pacientes realizaram retalho miocutâneo com transposição de gordura e um paciente realizou blefaroplastia transconjuntival. Duas pacientes evoluíram com suspensão do procedimento por sangramento abundante. Resultados de 3 meses são apresentados nas Figuras 3 a 5.

Figura 3 - Paciente feminina, 46 anos, realizada blefaroplastia miocutânea com reposição de bolsas, e realizada tarsorrafia temporária + cantopexia. Três meses de pós-operatório.
Figura 4 - Paciente feminina, 51 anos. Foi realizada blefaroplastia transconjuntival + no touch, e realizada tarsorrafia + cantopexia. Três meses de pós-operatório.
Figura 5 - Paciente feminina, 63 anos. Foi realizada blefaroplastia miocutânea com reposição de bolsas, e realizado tarsal strip. Pósoperatório de 3 meses.

Todas as pacientes tiveram seus pontos retirados em 5-7 dias com início de massagens contra a gravidade iniciados no mesmo momento. As massagens perduram por todo o pós-operatório.

Entre as complicações encontradas tivemos um caso de ectrópio em pós-operatório inicial, por erro de avaliação do ligamento tarsal, que evoluiu com reoperação dentro de 1 mês do quadro instalado.

As pacientes se encontram em acompanhamento com o serviço e serão reavaliadas com 6 meses de pós-operatório para verificar resultado de margem palpebral e futura publicação.

DISCUSSÃO

A cirurgia das pálpebras é um dos procedimentos mais realizados pelo cirurgião plástico. Sendo bem realizada e com qualidade técnica, acaba trazendo resultados estéticos agradáveis, com amplo rejuvenescimento dos pacientes.

Ao contrário da pálpebra superior, a pálpebra inferior apresenta maiores dificuldades de execução e maior cuidado técnico. Complicações ou intercorrências como lagoftalmo, esclero show e ectrópio não são raros de acontecer. Isso se deve pela ação cicatricial de retração que acontece nas lamelas palpebrais ajudada/empurrada pela gravidade. O resultado dessa equação é a má posição da margem palpebral. Fisiologicamente a margem palpebral deve contornar a íris, apresentando no máximo 1-2 mm de esclera evidente, principalmente em uma pálpebra senil.

Permanece a incerteza na escolha do procedimento de cantal lateral mais apropriado. Os fatores que contribuem para essa incerteza são a falta de compreensão da complexa anatomia funcional da pálpebra inferior e uma documentação inadequada dos achados anatômicos e morfológicos específicos do paciente necessários para a escolha lateral. Há uma escassez de literatura, na qual a importância dos achados pré-operatórios é destacada para evitar mau posicionamento da pálpebra inferior5,6.

Na tentativa de evitar as complicações palpebrais, inúmeros procedimentos de ancoragem, diminuição do ligamento tarsal e até massagem são realizadas. No entanto, não existe consenso a respeito do melhor procedimento a ser realizado de acordo com a anamnese e exame físico. Sem padronização, tanto o paciente como o cirurgião ficam à mercê de intercorrências. Isso fica mais evidente em residentes e cirurgiões jovens, que acabam por evoluir com erros por não encontrar padronização prévia7.

Muitos artigos comentam as causas do ectrópio ou abordam a necessidade da avalição do paciente, buscando parâmetros relacionados a maior chance de intercorrências. No entanto padronização de avalição pré-operatória com algoritmo de conduta ainda não é encontrado na literatura5-13.

A divisão da avaliação em (1) ligamento tarsal e (2) sustentação tarsal auxilia a conduta do cirurgião. Iniciando a avaliação pelo ligamento tarsal, podemos verificar os casos onde o tarsal strip se faz mandatório. Por receio, dificuldade técnica ou pós-operatório mais complexo, a não execução de um tarsal strip quando necessário nos parece a principal causa de má posição da margem palpebral no pós-operatório. A avaliação do item 2 (sustentação tarsal) acaba diferenciando casos de boa sustentação do complexo palpebral, no qual somente uma tarsorrafia temporária se faz necessária, ou casos com uma pontuação maior (dois pontos) em que se faz necessária uma cantopexia + tarsorrafia temporária.

O cuidado com a margem palpebral sempre deve existir; em nosso algoritmo o cirurgião deve no mínimo realizar tarsorrafia temporária. Procedimento rápido, facilmente reprodutível e sem complicações. Cuidado deve existir para retirar em 5-7 dias os pontos, evitando desconforto local.

Vale citar, frente a uma avaliação pré-operatória do paciente, que em nenhum momento é levado em conta o procedimento que o mesmo realizará. Nós sabemos que uma blefaroplastia miocutânea com transposição de bolsas palpebrais requer maiores cuidados que uma blefaroplastia cutânea (no touch) por chance de má posição da margem palpebral. No entanto, acreditamos que os parâmetros analíticos devem ser levados em consideração e as pacientes que realizaram blefaroplastia miocutânea com transposição de bolsa de gorduras e somente realizaram tarsorrafia transitória têm evoluído muito bem.

O tempo de evolução das pacientes, aproximadamente 3 meses de pós-operatório, não nos possibilita a avaliação precisa do resultado estético das pálpebras. As pacientes serão submetidas após 6 meses a nova avaliação para validação do algoritmo aqui presente.

CONCLUSÃO

A padronização de um procedimento evita intercorrências e complicações futuras de pacientes. A avaliação pré-cirúrgica da margem palpebral é de grande valia para um melhor resultado estético, sendo facilmente reproduzido.

REFERÊNCIAS

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1. Hospital Universitário, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil.
2. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Santa Catarina, SC, Brasil.

Endereço Autor: Caio Pundek Garcia Rua Professora Maria Flora Pausewang, s/nº, Trindade, Florianópolis, SC, Brasil CEP 88036-800. E-mail: caio_pgarcia@hotmail.com

 

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