INTRODUÇÃO
A cirurgia de contorno corporal está entre os procedimentos cirúrgico mais
solicitados em cirurgia estética. Desde o início da cirurgia do contorno corporal,
avanços significativos na técnica têm sido descritos por diversos autores em todo
o
mundo, cada geração trazendo suas alterações culturais e evoluções científicas1.
A abdominoplastia é um procedimento comumente solicitado por muitas razões, incluindo
as preocupações de uma população mais velha determinada a manter um físico jovem,
mulheres com a intenção de restaurar sua aparência pré-gestacional, o aumento de
pacientes com perda de peso massiva que procuram remover os estigmas do excesso de
pele residual da perda de peso (pós-bariátrica)2.
A ideia geral é melhorar o contorno da parede abdominal por meio da plicatura da
fáscia do reto abdominal e remoção do excesso de pele e gordura da região. Tudo isso
é conseguido usando uma incisão suprapúbica baixa que pode ser escondida sob a linha
do biquíni ou roupa íntima. Refinamentos desse conceito nos últimos anos são as
bases da inovação na abdominoplastia3.
A introdução da lipoplastia no arsenal cirúrgico por Illouz trouxe muitas mudanças
nos procedimentos de abdominoplastia. Grande progresso na abordagem cirúrgica da
região abdominal foi feito. Osvaldo Saldanha popularizou a lipoaspiração irrestrita
do abdome em abdominoplastia, com limitadas dissecações supraumbilicais e
preservação da fáscia de Scarpa. Nas técnicas de lipoaspiração, Henry Mentz e
Alfredo Hoyos descreveram a remoção seletiva de gordura para recriar a aparência de
um aspecto muscular e chamaram suas técnicas, condicionamento físico e lipoescultura
de alta definição1,4-6.
OBJETIVO
Apresentar nova abordagem para abdominoplastia apresentando marcação e técnica.
MÉTODO
Marcação
A marcação é realizada em posição ortostática, pois ao decúbito encontramos
alteração das estruturas anatômicas. Pedimos para o paciente contrair o abdome,
facilitando a marcação de estruturas abdominais e avaliação de possíveis hérnias
ou diástase do reto abdominal.
As estruturas anatômicas que devem ser ressaltadas na marcação para posterior
lipoaspiração são a linha alba (linha média) e as linhas semilunares. Nas linhas
semilunares devemos marcar o ponto de encontro com o gradil costal, onde iremos
lipoaspirar mais superficialmente na tentativa de criar depressão gordurosa
local.
A região de flancos é local de lipoaspiração. Os autores utilizam uma marcação
topográfica na tentativa de apresentar os locais de maior projeção e presença de
tecido subcutâneo. As linhas topográficas reforçam os locais de maior
necessidade de lipoaspiração no paciente em decúbito. Outras regiões corpóreas
que necessitam de lipoaspiração são marcadas da mesma maneira de acordo com o
planejamento cirúrgico (Figura 1).
Figura 1 - Marcação pré-operatória.
Figura 1 - Marcação pré-operatória.
Para a abdominoplastia colocamos a linha de incisão entre 5-7 cm do introito
vaginal. Nesse ponto, na linha média marcamos uma horizontal de 10-14 cm,
utilizando a dobra cutânea inguinal como parâmetro de simetria. O tamanho da
extensão da incisão deve ser, pelo menos, até o limite da dobra lateral do
avental dermolipeico. Realizar a marcação com a paciente sentada ajuda a mostrar
o local correto da dobra lateral. Não limitar a extensão da incisão lateral;
assimetrias de cicatrizes são encontradas pela necessidade de estender a incisão
no transoperatório. Cuidado deve existir para que a incisão passe abaixo da
crista ilíaca anterossuperior, na tentativa de esconder a cicatriz dentro da
roupa íntima/biquíni.
Devemos marcar a provável região do novo umbigo no retalho cutâneo abdominal,
mesmo alterando posteriormente sua posição no transoperatório. Lembrar que a
marcação da lipoaspiração em linha média deve ser somente acima da posição do
novo umbigo (Figura 2).
Figura 2 - Resultado pós-operatório.
Figura 2 - Resultado pós-operatório.
Técnica cirúrgica
Iniciamos o procedimento pela lipoaspiração. Utilizamos solução de soro
fisiológico com adrenalina (1:500.000), na proporção de 1 a 1,5 para 1 de
lipoaspirado. Importante iniciar a lipoaspiração em plano gorduroso profundo
para posteriormente avançar em plano superficial. Os autores utilizam tecnologia
associada a lipoaspiração, com aspirador (miniturbo Coelho) e por vezes com
auxílio de equipamento de vibração (Vibrofit Faga). As cânulas utilizadas são de
3.0 ou 3.5 com cinco furos de padrão Mercedes.
Utilizamos cinco pontos de incisão para introdução das cânulas: dois pontos no
retalho dermogorduroso abdominal que retiraremos em momento futuro cirúrgico, um
ponto em região umbilical e dois pontos em região de sulco mamário.
Realizamos lipoaspiração profunda em região lateral/flancos com maior
agressividade e em região abdominal superior com parcimônia, ato que facilita a
posterior confecção do túnel em região de abdome superior com cautério elétrico
por dissecção prévia pelas cânulas.
Realizamos lipoaspiração em região das linhas semilunares tanto em região
profunda como superficial, na tentativa de marcação da mesma por visão direta,
criando um resultado mais atlético para a paciente. O ponto predefinido do
encontro das semilunares com as costelas flutuantes é local de reforço da
lipoaspiração na tentativa de criar depressão local e consequente sombra na
presença de luz. A linha média deve ser lipoaspirada em plano superficial,
criando o desenho da linha alba. Somente devemos lipoaspirar e criar essa
depressão da linha média acima do local onde consideramos futuro local do
umbigo.
Iniciamos a abdominoplastia ao término da lipoaspiração. Realizamos uma
abdominoplastia clássica com ressecção do coto umbilical para posterior
neo-onfaloplastia. Confeccionamos túnel dermocutâneo em abdome superior estreito
(máximo de 7 cm diâmetro) na tentativa de preservar o angiossomo que vasculariza
o retalho cutâneo abdominal. Caso encontremos diástase dos retos abdominais,
plicatura dos mesmos é realizada com náilon 0 duplo laçado. Realizam-se pontos
de Baroudi com vicryl 3.0 em linha média e em região de linhas semilunares; além
de diminuir o espaço morto, conseguimos fazer um reforço nas marcações visuais
pegando profundo na fáscia de Scarpa do retalho.
A escolha dos autores é realizar neo-onfaloplastia como rotina. A técnica de
escolha é em X, com braços de 1 cm. A fixação dos retalhos é feita com náilon
2.0, o retalho superior e lateral direito é fixado na aponeurose do reto
abdominal em posição superior. O retalho inferior e lateral esquerdo é fixado na
aponeurose do reto abdominal e posição inferior.
A posição do neoumbigo é avaliada diante da anatomia de cada paciente. A região
de escolha é entre as linhas de divisão de ½ e 1/3 do abdome. Para
pacientes jovens, com porte atlético, consideramos um umbigo em posição mais
alta. Nunca colocamos o umbigo a menos de 7 cm da borda inferior do retalho
(Figura 3).
Figura 3 - Pós-operatório de neo-onfaloplastia.
Figura 3 - Pós-operatório de neo-onfaloplastia.
Utilizamos dreno portovac 3.2 com retirada quando a drenagem foi inferior a 50
mL/24 h.
RESULTADOS
Entre dezembro de 2018 e fevereiro de 2019 foram realizadas nove cirurgias de
lipoabdominoplastia HD pelos autores do estudo. Todas as pacientes eram femininas
com média de idade de 37 anos (21 a 51).
As pacientes realizaram acompanhamento pós-operatório semanal com a equipe médica,
sendo orientadas a iniciar a drenagem linfática no 2º dia de pós-operatório. O uso
da malha e meia compressiva foi de 1 mês no mínimo.
Entre as complicações encontradas tivemos: seroma em x paciente, perda da fixação
na
aponeurose do neo-onfalo em um paciente.
Apresentamos as fotos dos resultados nas Figuras 4 a 6.
Figura 4 - Paciente feminina 35 anos, 1 mês pós-operatório.
Figura 4 - Paciente feminina 35 anos, 1 mês pós-operatório.
Figura 5 - Paciente feminina 48 anos, 1 mês de pós-operatório. Mastopexia
associada.
Figura 5 - Paciente feminina 48 anos, 1 mês de pós-operatório. Mastopexia
associada.
Figura 6 - Paciente feminina 21 anos, 1 mês de pós-operatório.
Figura 6 - Paciente feminina 21 anos, 1 mês de pós-operatório.
DISCUSSÃO
O refinamento das técnicas cirúrgicas em busca de melhores e mais naturais resultados
é uma tendência da cirurgia plástica. Numerosos estudos publicados contribuíram para
uma compreensão mais completa da anatomia vascular de toda a unidade abdominal,
fornecendo diretrizes críticas para técnicas mais avançadas7,8.
Na lipoaspiração, técnica relativamente recente, a busca por procedimentos cada vez
mais seguros e esteticamente mais agradáveis não é diferente. As publicações mais
recentes e eventos científicos de cirurgia plástica vêm destacando a lipoaspiração
de alta definição, ou lipo HD9.
Mentz, em 1993, foi o primeiro a relatar o uso de técnicas convencionais de
lipoaspiração para melhor contorno abdominal em pacientes do sexo masculino, com
lipoaspiração superficial das linhas alba, semilunar e interseções tendíneas
transversais, conferindo aspecto mais natural pela valorização do contorno da
musculatura abdominal10.
As taxas de satisfação do paciente para o procedimento de lipoabdominoplastia
combinada mostraram-se melhores quando comparadas à abdominoplastia tradicional
sozinha. Em uma análise retrospectiva de 114 pacientes de pacientes submetidos a
procedimentos de contorno abdominal, foram encontradas menores taxas de complicações
em pacientes submetidos à lipoabdominoplastia em comparação com a abdominoplastia
tradicional. No entanto, modificações cuidadosas na técnica devem ser seguidas para
preservar com segurança o suprimento vascular dos retalhos cutâneos. Além disso, a
lipoaspiração geralmente é realizada profundamente na fáscia de Scarpa, exceto no
abdome inferior na área de pannus a ser extirpada. Os túneis
profundos de lipoaspiração criam um plano deslizante para a aba da parede abdominal,
interrompendo os ligamentos de retenção da pele, mas poupando grandes vasos
perfurantes essenciais, necessários para a circulação3.
Um estudo comparando lipoaspiração, lipoabdominoplastia e abdominoplastia encontrou
alta satisfação do paciente em todos os três procedimentos; os pacientes com
lipoabdominoplastia tinham um nível semelhante de desconforto em comparação com a
abdominoplastia sozinha, ao mesmo tempo que tinham o nível mais alto de satisfação.
Dois estudos usando imagens de fluorescência de laser não encontraram diferença na
perfusão do retalho abdominal entre a abdominoplastia padrão e a técnica de
dissecção limitada11.
Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas nas taxas de
complicações quando se comparou a abdominoplastia com lipoaspiração com equipamento
de sucção assistida à abdominoplastia isolada. Além disso, a quantidade e
localização da lipoplastia, idade, IMC e tempo de cirurgia não afetaram
significativamente a morbidade do paciente12.
Kim e Stevenson examinaram o efeito da lipoaspiração na incidência de seroma após
abdominoplastia e verificaram que não havia uma taxa mais alta de seroma quando a
lipossucção foi adicionada à abdominoplastia13.
A incidência de complicações do nosso estudo é coerente com a literatura vigente.
CONCLUSÃO
Apresentamos a descrição da marcação e técnica de lipoabdominoplastia HD. A tendência
atual é combinar abdominoplastia e lipoaspiração para melhorar a reprodutibilidade
e
produzir resultados esteticamente agradáveis. Além disso, há evidências aceitáveis
da segurança da combinação desses procedimentos.
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1. Hospital Universitário, Universidade Federal de
Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil.
2. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica,
Santa Catarina, SC, Brasil.
Endereço Autor: Caio Pundek Garcia Rua Professora
Maria Flora Pausewang, s/nº, Trindade, Florianópolis, SC, Brasil CEP 88036-800
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