INTRODUÇÃO
O carcinoma espinocelular (CEC) é um câncer de pele bastante comum caracterizado pela
proliferação maligna dos queratinócitos da epiderme ou seus apêndices. Usualmente
se
desenvolve de lesões precursoras como ceratose actínica e a doença de Bowen, mas o
mesmo pode se originar de novo, a partir de radiodermatite, feridas crônicas ou
transtornos inflamatórios crônicos da pele. Representa 20-50% dos cânceres de pele.
Apesar de, em sua maioria, serem erradicados satisfatoriamente por excisão
cirúrgica, alguns subtipos têm maior probabilidade de recorrência, metástase e
morte1,2.
A reconstrução do couro cabeludo, quando se trata de uma lesão grave ou extensa,
representa um grande desafio para o cirurgião devido à elasticidade limitada da pele
nessa região, aspecto tridimensional do crânio e a necessidade de cobertura da
calota craniana3.
Foram já descritos diferentes métodos de reconstrução como perfuração da tábua
externa, enxertos de pele, retalhos locais de couro cabeludo, retalhos pediculados,
retalhos microcirúrgicos e reimplante4,5.
A realização de retalho de rotação local associado a enxertia de pele é um
procedimento cirúrgico realizado em tempo único, provendo a cobertura das áreas
desvitalizadas com um tecido viável e bem vascularizado4,5.
OBJETIVO
O presente estudo tem como objetivo relatar o caso de ressecção de tumor extenso de
couro cabeludo e a reconstrução realizada em mesmo tempo cirúrgico no Serviço de
Cirurgia Plástica e Queimados do HU/UFSC em agosto de 2018.
MÉTODO
Revisão de prontuário e registro fotográfico com descrição do caso e revisão da
literatura.
RESULTADOS
Paciente masculino de 67 anos, natural e procedente de Florianópolis, aposentado,
exposto cronicamente a radiação solar, com histórico de lesão grande na região
frontoparietal esquerda de tempo incerto de evolução, crescimento lento, não
dolorosa, móvel, sangrativa, irregular, elevada (Figura 1).
Figura 1 - Lesão tumoral de couro cabeludo.
Figura 1 - Lesão tumoral de couro cabeludo.
Foi realizada biópsia da lesão, a qual confirmou tratar-se de CEC moderadamente
diferenciado invasivo. Exames de imagem não evidenciavam invasão da calota craniana,
tampouco metástases linfonodais cervicais.
Foi optado pela ressecção cirúrgica do tumor sob anestesia geral, com margens de
segurança laterais de 1 cm e profunda, incluindo o periósteo da calota craniana
(Figura 2). Foi retirada ainda lesão menor
à direita de cerca de 3 cm. Realizou-se rotação de retalho de couro cabeludo baseado
na artéria occipital para cobertura óssea e enxertia de pele total abdominal, na
área doadora do retalho (Figura 3) que
permanecia com periósteo íntegro. Mantido curativo de Brown em área de enxertia por
5 dias.
Figura 2 - Transoperatório após ressecção do tumor.
Figura 2 - Transoperatório após ressecção do tumor.
Figura 3 - Pós-operatório imediato com rotação do retalho e enxertia
cutânea.
Figura 3 - Pós-operatório imediato com rotação do retalho e enxertia
cutânea.
Foi realizado o seguimento ambulatorial de duas em duas semanas, evidenciando-se
viabilidade absoluta do retalho e do enxerto cutâneo após 41 dias de tratamento
cirúrgico (Figura 4). O exame anatomopatológico
confirmou o diagnóstico de carcinoma espinocelular moderadamente diferenciado, com
margens periféricas e profundas livres de neoplasia.
Figura 4 - Pós-operatório tardio.
Figura 4 - Pós-operatório tardio.
DISCUSSÃO
O CEC é uma condição clínica com múltiplos fatores de risco nos quais encontramos
exposição crônica ao sol, radiação, inflamação ou feridas crônicas, que se
desenvolve a partir das células escamosas da pele, sendo uma patologia oncológica
tratável preferencialmente por meio da cirurgia, mesmo em casos mais avançados1.
A excisão com margens de segurança adequadas é fundamental quando se tem em mente
a
reconstrução imediata do defeito e muitas vezes não se tem disponível o exame de
congelação. Por isso, alguns serviços optam pela reconstrução em um segundo tempo,
após confirmação de margens histopatológicas.
A técnica do retalho de rotação do couro cabeludo, associada a enxertia de pele da
área doadora do retalho, mostra-se uma técnica segura e com possibilidade da
extensão da margem profunda até além do nível periosteal, trazendo maior segurança
ao procedimento; fator que não é possível quando optado pelo enxerto direto, que
necessita integridade do periósteo para obter sucesso5. Possui ainda vantagens como uma alopecia limitada e previsível, além
da necessidade de intervenção cirúrgica única. Pelo contrário, técnicas como
cicatrização por segunda intenção requerem recuperação mais prolongada, fechamento
primário requer defeitos menores que 3 cm e, reimplante, citado em algumas
referências como tratamento de escolha, requer equipe treinada e especializada e
viabilidade do tecido a ser reimplantado4.
Cabe salientar que, sempre que disponível, o exame de congelação deve ser utilizado
para maior segurança das margens de ressecção.
CONCLUSÃO
O tratamento de lesões limitadas de couro cabeludo com retalho local + enxerto no
CEC, ou mesmo outras condições cirúrgicas, se necessário, é efetivo como terapia
definitiva para essa patologia.
REFERÊNCIAS
1. Stratigos A, Garbe C, Lebbe C, Malvehy J, del Marmol V, Pehamberger
H, et al. Diagnosis and treatment of invasive squamus cell carcinoma of the
skin: European concensus-based interdisciplinary guideline. Eur J Cancer;
2015.
2. Que SKT, Zwald FO, Schmults CD. Cutaneous Squamous Cell Carcinoma:
Incidence, risk factors, diagnosis and staging. J Am Acad Dermatol. 2018;
78(2):237-47. DOI: https://doi.org/10.1016/j.jaad.2017.08.059
3. Uliano EJM, Lucchese IC, Avila DFV, de Brito MB, de Vasconcellos
ZAA, Ely JB. Reconstrução total de couro cabeludo: relato e experiencia de dois
casos. Rev Bras Cir Plást. 2018; 33(supl 1):53-5.
4. Breasley NJ, Gilbert RW, Gullane PJ, Brown DH, Irish JC, Neligan PC.
Scalp and forehead reconstruction using free vascularized tissue transfer. Arch
Facial Plas Surg. 2004; 6(1):16-20.
5. Angelos PC, Downs BW. Options for the management of forehead and
scalp defects. Facial Plast Surg Clin North Am. 2009; 17(3):379-93. DOI:
https://doi.org/10.1016/j.fsc.2009.05.001
1. Hospital Universitário, Universidade Federal de
Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil.
2. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de
Janeiro, RJ, Brasil.
Endereço Autor: Celto Pedro Dalla Vecchia
Junior Av. Deputado Antonio Edu Vieira, nº 1422 - Pantanal,
Florianópolis, SC, Brasil CEP 88040-000 E-mail:
celtodv@yahoo.com.br