INTRODUÇÃO
A hérnia é definida como uma protrusão anormal de um órgão ou tecido através de
defeito na parede abdominal adjacente. As hérnias são encontradas na região
abdominal e nas áreas em que as aponeuroses e fáscias não são cobertas por fibras
musculares estriadas, caracterizando fragilidade anatômica da parede muscular9.
O tratamento dessas condições compreende a tentativa da reconstrução anatômica da
parede abdominal, fechando o defeito parietal e restaurando a pressão
intra-abdominal. Na maioria das hérnias incisionais, é realizado fechamento simples
do defeito8. Esse fechamento simples na
maioria dos casos precisa ser abordado por uma incisão mediana infra e
supraumbilical.
Esse tipo de cirurgia é pouco aceitado pelos pacientes, já que muitas vezes o
resultado são cicatrizes inestéticas e pacientes insatisfeitos. Pacientes com
lipodistrofia conjunta podem apresentar dermatites em região de dobras e dificuldade
de movimentação.
O procedimento combinado é uma opção para se obter o melhor resultado cirúrgico
funcional e estético2. As primeiras
abdominoplastias foram realizadas com o intuito de corrigir grandes hérnias
ventrais3.
Fazemos relato de caso de uma paciente com uma alteração abdominal grande, na qual
a
correção da hérnia unicamente traria resultados não estéticos, comprometendo o
psicológico, e preservaria as doenças de pele, assim como as queixas da
paciente.
OBJETIVO
Apresentar a experiência e os benefícios de uma cirurgia combinada de correção de
hérnia abdominal e abdominoplastia.
MÉTODO
Relato de caso
Paciente feminina, 53 anos e 10 meses de idade, caucasiana, apresenta-se no
ambulatório em 2018 com hérnia abdominal encarcerada e apresentando dor, porém
sem obstrução ou sinais de sofrimento vascular. Nega náuseas ou vômitos, e
refere alimentação sem alterações; evacuações e eliminação de flatos diários; e
também incômodo com a lipodistrofia, chegando a acometer a pele na região púbica
com lesões fúngicas de repetição.
Ao exame físico apresentava abdome flácido, sem sinais de irritação peritoneal,
com ruídos hidroaéreos presentes. Hérnia abdominal encarcerada, com conteúdo não
redutível, indolor à palpação. Ausência de sinais flogísticos locais.
Lipodistrofia abdominal com eritema em região púbica, porém sem sinais de lesões
fúngicas no momento (Figura 1).
Figura 1 - Foto do pré-operatório.
Figura 1 - Foto do pré-operatório.
No intraoperatório, encontramos uma hérnia umbilical, epigástrica e incisional.
Foi realizado reparo da mesma com suturas na aponeurose fragilizada e
aproximação do músculo reto do abdome com Vycril® 2-0 (Figura 2).
Figura 2 - Tela de polipropileno com correção da hérnia abdominal.
Figura 2 - Tela de polipropileno com correção da hérnia abdominal.
Realizou-se um reforço da sutura, utilizando o saco herniário restante,
colocando-o em cima da sutura e realizando novos pontos em cima dela. Após, foi
colocada uma tela de polipropileno Marlex de 30 × 30 cm e realizada a
fixação da mesma com pontos de nylon 0.3 nas bordas com a aponeurose (Figura 2). Foi feita aproximação do retalho e
exérese do tecido dermogorduroso excedente (2.210 kg), corrigindo a parte
estética e melhorando a qualidade de vida da paciente. Realizou-se uma
onfaloplastia com f2 retalhos retangulares paralelos, princípio apresentado por
Franco e cols.10, que foram suturados
entre si e fixados à aponeurose dos músculos retos abdominais. Foi colocado
dreno de portovac em região púbica com drenagem da região do descolamento e
realizado o fechamento por planos sem tensão devido à grande espessura do
retalho.
A paciente foi de Alta no 4º P.O. sem complicações, com cinta modeladora
pós-cirúrgica e com o dreno de portovac com 100 mL de conteúdo sero-hemático por
dia.
Retornou ao ambulatório de cirurgia plástica no 7º P.O., assintomática, com dreno
de portovac com menos de 50 mL de conteúdo seroso e sutura sem sinais
flogísticos e bom aspecto. Realizou-se a retirada do dreno nessa consulta. No
14º P.O. foram retirados os pontos. No 38º P.O. apresentava-se sem queixas e
satisfeita com o resultado, realizadas as fotos do pós-operatório (Figuras 3 e 4). Apresentou hipertrofia de cicatriz umbilical, sendo tratada com
corticoide tópico.
Figura 3 - Foto do pós-operatório.
Figura 3 - Foto do pós-operatório.
Figura 4 - Foto de pós-operatório.
Figura 4 - Foto de pós-operatório.
RESULTADO
Paciente submetida a dermolipectomia, com retirada de 2.210 g de pele e tecido
celular subcutâneo, com correção efetiva dos defeitos herniários por meio de reforço
da aponeurose com tela de polipropileno e sem sinais de aumento de pressão
intra-abdominal com excelente evolução pós-operatória. Apresenta melhora na
qualidade de vida e se diz satisfeita com o resultado.
DISCUSSÃO
Os objetivos do reparo da hérnia abdominal são reconstruir a integridade estrutural
da parede abdominal, minimizando a morbidade4.
As técnicas atuais incluem o fechamento primário, o reparo por estágios e o uso de
materiais protéticos. As técnicas para abdominoplastia incluem o uso da incisão
abdominal transversa inferior e a ressecção do excesso de pele, como descrito por
Pitanguy em 19673.
Hérnias são protrusões anormais de conteúdo intra-abdominal entre defeitos na fáscia
da parede abdominal. Acometem mais o sexo masculino em uma proporção de 2:11.
O procedimento cirúrgico pode ser realizado por meio de uma incisão baixa
transversal4, tendo assim uma melhor
abordagem das hérnias com correção das mesmas e a possibilidade de realizar uma
dermolipectomia conjunta.
A abdominoplastia combinada com o reparo de hérnia não acrescenta riscos comparada
com a cirurgia de hernioplastia apenas, segundo um estudo realizado com 111
pacientes5.
Uma análise de 4.925 pacientes submetidos à abdominoplastia com ou sem hernioplastia
concomitante evidenciou que os procedimentos combinados apresentavam maiores
complicações em relação ao procedimento único. Hipertensão, tabagismo e uso crônico
de esteroides foram identificados como preditores de complicações, e o grupo com a
cirurgia combinada (abdominoplastia associada à hernioplastia) teve maior taxa de
complicações (18,3% vs. 9,8%)6.
O uso de tela de polipropileno para a correção de hérnias abdominais está
consolidado, com menos complicações e recidiva7.
CONCLUSÃO
Com a incisão da dermolipectomia e o descolamento até o apêndice xifoide, é possível
ter uma visão melhor das hérnias abdominais e uma correção mais segura das mesmas.
Podemos realizar uma fixação melhor da tela de polipropileno devido ao espaço
oferecido pela técnica do descolamento do retalho. Assim, também, a correção das
hérnias em conjunto com uma dermolipectomia tem um melhor resultado estético e
funcional para pacientes com lipodistrofia, melhorando a autoestima e a qualidade
de
vida.
REFERÊNCIAS
1. Nyhus LM. Herniology 1948-1998: Evolution toward excellence. Hernia.
1998 mar 1; 2(1):1-5.
2. Possamai LM, Zancanaro M, de Freitas Neto FM, Zanin E, Ely PB.
Correção cirúrgica de múltiplas hérnias abdominais associada à abdominoplastia:
relato de caso. Rev Bras Cir Plást. 2018; 33(supl. 1). doi: http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2018RBCP0034.
3. http://dx.doi.org/10.1097/00006534-196710000-00012 https://doi.org/10.1097/00006534-196710000-00012
4. http://dx.doi.org/10.1016/j.ijscr.2014.10.033 https://doi.org/10.1016/j.ijscr.2014.10.033
5. http://dx.doi.org/10.1177/1553350616646480 https://doi.org/10.1177/1553350616646480
6. http://dx.doi.org/10.1097/PRS.0000000000000519 https://doi.org/10.1097/PRS.0000000000000519
7. http://dx.doi.org/10.1056/NEJM200008103430603 https://doi.org/10.1056/NEJM200008103430603
8. Ricciardi BF, Chequim LH, Gama RR, Hassegawa L. Correção de hérnia
abdominal com tela envolta por tecido fibroso - estudo em ratos Wistar. Rev Col
Bras Cir. [periódico na Internet] 2012; 39(3). Disponível em: http://www.scielo.br/rcbc.
9. Sabiston DC, Towsend Jr CM. Sabiston Tratado de Cirurgia: As bases
biológicas da prática cirúrgica moderna. 17 ed. Rio de Janeiro: Elsevier;
2005.
10. Franco D, Medeiros J, Farias C, Franco T. Umbilical reconstruction
for pacients with a midline scar. Aesthet Plast Surg. 2006; 30(5):595-8. DOI:
https://doi.org/10.1007/s00266-006-0114-8
1. Serviço de Cirurgia Plástica do Dr. Ewaldo
Bolivar de Souza Pinto, São Paulo, SP, Brasil.
2. Hospital Santo Amaro Guarujá, São Paulo, SP,
Brasil.
3. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, São
Paulo, SP, Brasil.
4. Universidade Federal de São Paulo, São Paulo,
SP, Brasil.
5. Escola Paulista de Medicina, São Paulo, SP,
Brasil.
Endereço Autor: Linda Mar Parada Roberts Muniz Rua
Quinto Bertoldi, nº 40 - Guarujá, SP, Brasil CEP 11410-908 E-mail:
lmparadaroberts@gmail.com