INTRODUÇÃO
As mamoplastias estão entre as principais cirurgias estéticas realizadas no Brasil.
Como principais indicações cirúrgicas estão o grande volume das mamas, caracterizado
pelo aumento do estroma mamário devido a fatores genéticos e hormonais, ptose e
assimetria mamária1,2. As mamoplastias têm como principais objetivos
a melhora estética e postural do paciente ou simetrização após mastectomias
contralaterais3. Os pacientes com
indicação de mamoplastia são submetidos a um rastreamento pré-operatório para
detecção de alterações com natureza neoplásica2. Mesmo os pacientes com rastreamento pré-operatório negativo estando
sob baixo risco de apresentar carcinoma mamário, não é raro encontrar lesões
suspeitas de malignidade durante a cirurgia ou após, no laudo anatomopatológico da
peça ressecada. Alguns autores chegaram à conclusão de que a incidência de câncer
de
mama acidental em mamoplastias redutoras varia de 0,05 a 1,8%, e pode ocorrer com
exames radiológicos ou ecográficos normais3-6. Não há um consenso
na literatura sobre a necessidade do exame anatomopatológico de rotina dos tecidos
ressecados. A pequena incidência de alterações histológicas tumorais nesses
espécimes e a faixa etária jovem das pacientes submetidas a esses procedimentos são
fatores que devem ser considerados quando se questiona a relação custo-benefício
dessa prática7. Além disso, aproximadamente
60% das pacientes com exames pré-operatórios sem alterações podem apresentar achados
benignos no anatomopatológico. A análise histopatológica dos tecidos poderia
diagnosticar lesões proliferativas pré-malignas e possibilitar a conduta adequada
para cada paciente8. Logo, um estudo regional
deve ser realizado para avaliar o perfil das principais alterações
anatomopatológicas encontradas na população local e avaliar a importância da análise
das peças ressecadas em termos de saúde pública.
OBJETIVO
Analisar os resultados dos exames anatomopatológicos das pacientes submetidas à
cirurgia de mamoplastia no Serviço de Cirurgia Plástica e Queimados do Hospital
Universitário de Florianópolis, vinculado à Universidade Federal de Santa Catarina,
no período de 2012 a 2015 e determinar a distribuição dos principais achados
anatomopatológicos.
MÉTODO
Trata-se de estudo descritivo e retrospectivo, realizado no Serviço de Cirurgia
Plástica e Queimados do Hospital Universitário Professor Polydoro Ernani de São
Thiago. Foram avaliadas as mamoplastias redutoras uni ou bilaterais, realizadas
durante o período de janeiro de 2012 a junho de 2015. Os dados são provenientes da
revisão de prontuários e análise da descrição cirúrgica e histopatológica das peças
cirúrgicas. As lesões foram divididas em lesões não proliferativas e proliferativas
benignas ou lesões malignas. As primeiras, subdivididas em: fibrose estromal,
ectasia ductal, microcistos, metaplasia apócrina, alteração/hiperplasia de células
colunares, hiperplasia fibroadenomatoide, adenose e mastopatia linfocítica. Já as
proliferativas benignas, em: fibroadenoma, hiperplasia ductal usual, papiloma
intraductal e hiperplasia pseudoangiomatosa. Os dados foram analisados pelo programa
Statistical Package for Social Science (SPSS), versão 16.0.
RESULTADOS
Foram estudadas 253 peças cirúrgicas provenientes de mamoplastias realizadas em 131
pacientes. A média etária das pacientes submetidas à cirurgia foi 37,7 anos,
variando de 18 a 72 anos de idade (DP = 12,3). Alterações histopatológicas foram
observadas em 200 (79,05%) espécimes analisados e em 53 (20,95%) não foi encontrada
nenhuma alteração histológica. A mediana do peso de ressecção foi 351 g, percentil
25 de 161,5 g e o percentil 75 de 496 g e variou de 44 a 1.554 g. As lesões não
proliferativas benignas foram os principais laudos histopatológicos encontrados,
sendo elas: fibrose estromal, 137 (54,1%), ectasia ductal, 129 (50,9%), e
microcistos, 42 (16,6%), as mais frequentes (Tabela 1). Foi encontrada mais de uma alteração histopatológica em alguns
espécimes. Alterações proliferativas benignas foram achados histopatológicos
incomuns, com apenas seis casos: fibroadenoma foi o mais comum (três casos), seguido
do papiloma intraductal (dois casos) e hiperplasia ductal usual (um), sendo que os
dois primeiros achados aconteceram em pacientes com idade inferior a 35 anos e o
último em paciente com 44 anos. O carcinoma ductal in situ não foi
encontrado nas amostras estudadas (Tabela 2).
Tabela 1 - Incidência de alterações histopatológicas não proliferativas nas peças
cirúrgicas.
Alteração histopatológica |
N |
% |
Fibrose estromal |
137 |
54,15 |
Ectasia ductal |
129 |
50,98 |
Microcistos |
42 |
16,6 |
Metaplasia apócrina |
25 |
9,88 |
Alteração/hiperplasia de células colunares |
12 |
4,74 |
Hiperplasia fibroadenomatoide |
5 |
1,97 |
Adenose |
13 |
5,13 |
Mastopatia linfocítica |
2 |
0,79 |
Tabela 1 - Incidência de alterações histopatológicas não proliferativas nas peças
cirúrgicas.
Tabela 2 - Incidência de alterações histopatológicas proliferativas nas peças
cirúrgicas.
Alteração histopatológica |
N |
% |
Fibroadenoma |
3 |
1,18 |
Hiperplasia ductal usual |
1 |
0,39 |
Papiloma intraductal |
2 |
0,79 |
Hiperplasia Pseudoangiomatosa |
1 |
0,39 |
Tabela 2 - Incidência de alterações histopatológicas proliferativas nas peças
cirúrgicas.
DISCUSSÃO
Diversos autores já demonstraram alterações histopatológicas em peças cirúrgicas
oriundas de mamoplastias2-4,6-12. Também tem sido
questionada a importância do detalhamento microscópico das peças cirúrgicas9. Em nosso estudo, as alterações
histopatológicas foram observadas em 200 (79,05%) espécimes analisados e em 53
(20,95%) não foi encontrada nenhuma alteração histológica, resultado semelhante ao
obtido por Ayhan e cols.8 As lesões benignas
foram as mais encontradas, sendo as não proliferativas as mais comuns. As alterações
proliferativas benignas foram achado incomum e não necessitaram de terapêutica
cirúrgica, sendo o seguimento clínico a conduta indicada. Assim, o resultado
beneficiou as pacientes em questão e as alertou para o rastreamento adequado nos
anos subsequentes. Tafuri e Gobi3, em um
estudo realizado no Brasil, revisaram 867 peças originadas de mamoplastia redutora
bilateral, em pacientes assintomáticas, e verificaram que as alterações benignas
como fibrose, cistos e ectasia ductal são as alterações mais frequentes, semelhante
aos achados em nosso estudo. A avaliação das lesões proliferativas nas peças
estudadas pode individualizar pacientes e definir estratégias de seguimento ou
medidas preventivas, como uso de antiestrogênicos e mastectomia profilática3. Em diferentes séries, o carcinoma oculto foi
encontrado em 0,05% a 1,8% dos espécimes de redução mamária e o risco variou de
acordo com a precisão dos métodos diagnósticos pré e pós-operatórios3-6. Snyderman e Lizardo10, em uma
série com 5.008 espécimes, reportaram detecção de câncer em 0,4% (0,24-0,62%); nesse
estudo foram incluídos pacientes com carcinoma detectado já no pré-operatório.
Jansen e cols.11, em um estudo similar,
encontraram incidência de 0,16% (0,04-0,4%) de neoplasia em 2.576 peças.
Recentemente, Tang e cols.12 documentaram
carcinoma invasivo em 0,06% (0,03-0,09%), em 27.500 reduções mamárias, mas não
incluíram carcinoma ductal in situ nos resultados. A amostra
estudada não apresentou nenhum caso de carcinoma oculto. Keshtgar e cols.7 descreveram com detalhes os achados
patológicos nas peças cirúrgicas, mas não detectaram câncer nesses estudos. Esses
estudos refletem a diminuição na detecção de câncer oculto nos espécimes de
mamaplastias em anos recentes, que tem sido explicada por avanços tecnológicos nos
métodos de detecção precoce, progressos na educação populacional, grupo mais jovem
de pacientes realizando cirurgia mamária e rastreamento pré-operatório mais
completo7. Atualmente não é recomendado o
rastreamento para câncer de mama por qualquer modalidade, exceto o exame clínico,
em
mulheres com idade inferior a 35 anos, mas pacientes jovens são submetidas a
rastreamento histopatológico após realização de cirurgia estética de mama sem
evidência científica clara7.
CONCLUSÃO
A maioria das peças analisadas em nosso estudo apresentaram alterações no exame
anatomopatológico, todas de caráter benigno. Mesmo não encontrando nenhuma lesão
maligna em nosso estudo e essas sendo de baixa incidência em pacientes com exames
pré-operatório normal, há possibilidade do achado. Desse modo, a avaliação
anatomopatológica das peças cirúrgicas ressecadas nas mamoplastias pode ser
importante para a detecção de alterações no tecido mamário sem manifestações
clínicas prévias, que podem orientar o tratamento ou seguimento após a cirurgia.
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1. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica,
Santa Catarina, SC, Brasil.
2. Hospital Universitário, Universidade Federal de
Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil.
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