ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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33ª Jornada Norte-Nordeste de Cirurgia Plástica - Year2018 - Volume33 - (Suppl.2)

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2018RBCP0116

RESUMO

As deformidades do contorno abdominal são a principal queixa entre os pacientes com perda de peso expressiva que procuram um cirurgião plástico. A redundância de pele em parede anterior do abdome pode ter componente vertical e horizontal associados, principalmente em região epigástrica, e a correção dessa região pode ter resultado limitado com as técnicas convencionais de abdominoplastia. Este trabalho visa relatar à comunidade científica um caso de sucesso operado em nosso serviço, com a técnica de abdominoplastia em flor-de-lis, após grande emagrecimento, enfocando as complicações e a satisfação do paciente, de modo a desmitificar o conceito de risco e perda de resultado estético com a cicatriz vertical.

Palavras-chave: Abdominoplastia; Obesidade abdominal; Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos; Abdome.

ABSTRACT

Abdominal contour deformities are the main complaint among patients who seek a plastic surgeon after expressive weight loss. Skin redundancy on abdomen anterior wall may have associated vertical and horizontal components, mainly in epigastric region, and the correction oh that region may have limited results with conventional abdominoplasty techniques. This paper aims to report to the scientific community a successful case operated in our service, with Fleur-de-lis abdominoplasty technique, after massive weight loss, focusing on complications and patient satisfaction, in order to demystify risk concept and aesthetic result loss with the vertical scar.

Keywords: Abdominoplasty; Obesity, abdominal; Reconstructive surgical procedures; Abdomen.


INTRODUÇÃO

A obesidade mórbida caracteriza-se por acúmulo excessivo de tecido adiposo que se distribui de maneira heterogênea em todo o organismo, tendo alcançado índices epidêmicos em todo o mundo1. Além disso, pode estar associada a diversas comorbidades, como coronariopatias, hipercolesterolemia, hipertensão arterial, osteopatias, diabetes mellitus, doenças pulmonares, apneia do sono e distúrbios psicossociais que comprometem a qualidade de vida do paciente obeso.

As deformidades do contorno abdominal são a principal queixa entre os pacientes com perda de peso expressiva2 que procuram um cirurgião plástico. Após perda considerável de peso, o doente apresenta grande quantidade de sobras cutâneas que se distribuem pelo corpo e, sob essas sobras, tanto pelo volume quanto pela dificuldade de acesso à higiene, acumulam-se secreções que favorecem à instalação de infecções cutâneas.

A redundância anterior pode ter componente vertical e horizontal associados, principalmente em região epigástrica, e a correção dessa região pode ter resultado limitado com as técnicas convencionais de abdominoplastia3.

A abdominoplastia para o tratamento do excesso de pele em ex-obesos iniciou-se com Kelly, no começo do século XX. Na década de 1960, surgiram variações apresentadas por vários autores, como Castañares & Goethel, que propuseram a ressecção vertical e horizontal, conferindo o aspecto em âncora da cicatriz final. Em 1970, Regnault preconizou a retirada do excedente cutâneo com marcação em flor de lis4.

OBJETIVO

O propósito deste estudo é relatar à comunidade científica um caso de sucesso operado em nosso serviço, com a técnica de abdominoplastia em flor-de-lis, após grande emagrecimento, enfocando as complicações e a satisfação do paciente, de modo a desmitificar o conceito de risco e perda de resultado estético com a cicatriz vertical.

MÉTODO

Trata-se de paciente do sexo feminino, 62 anos, que procurou o serviço para tratamento do excedente dermogorduroso em região abdominal, após perda ponderal de 40kg, com estabilização do peso há mais de 1 ano. Queixava-se de dificuldade para deambular, se exercitar e até para se vestir devido ao grande avental cutâneo residual após perda de peso.

Mantinha Índice de Massa Corporal (IMC) = 33kg/m2, associado a hipertensão arterial sistêmica e artropatia dos joelhos, necessitando do uso de apoio para deambulação. História de colecistectomia convencional prévia, com presença de cicatriz em hipocôndrio direito (Figura 1 A, B, C e D).

Figura 1 - A: Documentação pré-operatória - vista frontal; B: Documentação pré-operatória - perfil direito; C: Documentação pré-operatória - perfil esquerdo; D: Documentação pré-operatória - tração do retalho.

Após avaliação clínica minuciosa e compensação de comorbidades, optamos pela abordagem com técnica de marcação em flor-de-lis.

A marcação foi feita no pré-operatório imediato, inicialmente com a paciente em pé. A abordagem inicial foi semelhante à da técnica convencional, com marcação da incisão inferior a 6 cm acima da comissura vulvar anterior, após tração cefálica dos tecidos excedentes, e marcação da linha média, estendendo-se do esterno até a incisão inferior.

As marcações dos limites laterais foram feitas no ápice da dobra cutânea, com a paciente sentada, e estimou-se a excisão em sentido horizontal unindo esses pontos com a linha média.

A excisão vertical foi estimada por pinch test com a paciente deitada.

Finalmente, a cerca de 16 cm abaixo do apêndice xifoide, foram demarcados, bilateralmente, 2 pequenos retângulos cutâneos de 2 cm no sentido horizontal e de 4 cm no vertical, posicionados medialmente nas bordas que delimitavam os limites verticais de ressecção, para confecção do neoumbigo5 (Figura 2).

Figura 2 - Esquema da marcação pré-operatória com detalhe dos retalhos para confecção do neoumbigo.

O procedimento foi realizado sob anestesia peridural alta, associada a sedação venosa. Foi realizada infiltração com soro fisiológico a 0,9% e adrenalina a 1:500.000. Em seguida, procedeu-se à incisão cutânea ao longo de toda a linha demarcada para ressecção, dissecção e exérese em monobloco de toda a capa cutânea com eletrocautério até o plano aponeurótico, incluindo o umbigo e seu pedículo. A peça correspondente ao excedente dermogorduroso pesou 11kg.

O coto umbilical foi invaginado e suturado, fechando-se defeito da parede abdominal. Os músculos reto abdominais foram plicados mediante sutura da aponeurose com fio inabsorvível e, com a paciente em posição de Fowler, foi realizada sutura das extremidades dos 2 hemirretalhos cutâneos na linha média pubiana.

Após confecção do neoumbigo, através de sutura dos dois pequenos retalhos retangulares, e respectiva fixação na aponeurose, procedeu-se à sutura por planos dos retalhos dermogordurosos vertical e horizontalmente, deixando dreno de sucção a vácuo em plano subcutâneo.

RESULTADOS

A paciente foi mantida internada por 3 dias, devido a questões sociais, para monitorar o dreno a vácuo, que foi retirado com o declínio do debito da secreção sero-hemática. Evoluiu com deiscência da ferida operatória em região do “T” suprapúbico no pós-operatório recente, que, após duas ressuturas em ambiente ambulatorial, apresentou fechamento completo.

Em acompanhamento por 6 meses, paciente refere melhora da postura, na deambulação, na qualidade de vida em geral. Não apresenta queixas com relação à cicatriz vertical (Figura 3).

Figura 3 - Aspecto pós-operatório (20o dia pós-operatório).

DISCUSSÃO

O paciente ideal é aquele com estabilidade ponderal, com menor IMC possível, equilíbrio emocional e quadro clínico estável, entretanto, a maioria dos pacientes ex-obesos foge desse perfil.

A avaliação do IMC como critério de decisão torna-se insuficiente no preparo pré-operatório de pacientes como esta, uma vez que apenas a retirada do retalho dermogorduroso excedente já determinou queda do IMC de 33kg/m2 para 29kg/m2. Ou seja, havia um viés de classificação da paciente em “obesa” devido à grande redundância abdominal, quando na verdade tratava-se de um quadro de sobrepeso.

As cicatrizes devem ser muito bem descritas, assim como as possíveis complicações e as limitações do procedimento em relação à falta de elasticidade e à provável flacidez cutânea residual. A ocorrência de pequenas deiscências é comum em procedimentos dessa monta, mas que não comprometem o resultado em médio prazo.

Obviamente, os resultados estéticos em procedimentos como este estão aquém daqueles conseguidos em pacientes não obesos. Contudo, o alívio pela retirada dos excessos dermogordurosos é maior que a presença das cicatrizes, levando à melhoria da qualidade de vida, permitindo melhor desenvoltura do aparelho locomotor, melhora da integração social, do comportamento sexual e das condições higiênicas.

CONCLUSÃO

Abdominoplastia em flor-de-lis é um recurso poderoso para correção de flacidez cutânea horizontal e vertical, muito comum em pacientes com perda ponderal expressiva, melhorando a qualidade de vida, facilitando a higienização, a deambulação, além de melhorar o desempenho sexual e reforçar sua autoestima.

Os resultados estéticos são satisfatórios, não sendo a cicatriz vertical um empecilho. As taxas de complicações são comparáveis às da abdominoplastia convencional, exceto pela incidência de infecções de ferida operatória, que se mostra aumentada pela adição do componente vertical.

Deve-se ter bastante cautela no uso do IMC como critério de indicação ou exclusão cirúrgica nesse grupo de pacientes, pois este parâmetro pode estar falseado pelos grandes excedentes cutâneos.

AGRADECIMENTOS

Registramos nosso agradecimento a todos os funcionários e colegas do Hospital Universitário Ciências Médicas, em especial ao Dr. José Cesário da Silva Almada Lima, chefe do Serviço de Cirurgia Plástica, e ao Dr. Lucio Flavio Manetta Martins Belem, regente do programa de Residência Médica/Especialização em Cirurgia Plástica do HUCM/FELUMA.

REFERÊNCIAS

1. Cortes JES, Oliveira DP, Sperli A. Abdominoplastias em âncora em pacientes ex-obesos. Rev Bras Cir Plást. 2009;24(1):57-63.

2. Friedman T, O'Brien Coon D, Michaels J, Purnell C, Hur S, Harris DN, et al. Fleur-de-Lis abdominoplasty: a safe alternative to traditional abdominoplasty for the massive weight loss patient. Plast Reconstr Surg. 2010;125(5):1525-35. PMID: 20145584 DOI: http://dx.doi.org/10.1097/PRS.0b013e3181d6e7e0

3. Mitchell RT, Rubin JP. The Fleur-De-Lis abdominoplasty. Clin Plast Surg. 2014;41(4):673-80. DOI: 10.1016/j.cps.2014.07.007. pii: S0094-1298(14)00098-4 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.cps.2014.07.007

4. Grando MC. Dermolipectomia em âncora após cirurgia bariátrica: complicações e índice de satisfação dos pacientes. Rev Bras Cir Plást. 2015;30(4):515-21.

5. Reno BA, Mizukami A, Calaes IL, Staut JG, Claro BM, Baroudi R, et al. Neo-onfaloplastia no decurso das abdominoplastias em âncora em pacientes pós-cirurgia bariátrica. Rev Bras Cir Plást. 2013;28(1):114-8. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1983-51752013000100019











1. Hospital Universitário Ciências Médicas, Belo Horizonte, MG, Brasil.

Endereço Autor: Juliana Metzker Oliveira Bergamo
Avenida Agulhas Negras, 680 - Mangabeiras
Belo Horizonte, MG, Brasil CEP 30210-340
E-mail: jumobergamo@gmail.com

 

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