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Ideas and Innovation - Year2014 - Volume29 - Issue 4

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2014RBCP0105

RESUMO

INTRODUÇÃO: A hidradenite é uma doença cutânea crônica, que acomete as regiões que abrigam as glândulas apócrinas. Tem uma prevalência estimada de 1% da população, com predileção pelo sexo feminino.
MÉTODO:LMN, 48 anos, sexo feminino. Ao exame, a paciente apresentava nodulações palpáveis, coalescentes, dolorosas e uma área de fibrose e retração cicatricial circunjacente em ambas as axilas, principalmente em axila esquerda. Submetida a exérese ampla das lesões em axila e região torácica esquerda, sendo necessária a realização de um retalho fasciocutâneo de rotação, habitualmente usado em pacientes submetidas à quadrantectomia lateral.
RESULTADOS: Obteve-se um resultado estético satisfatório associado à preservação dos movimentos.
CONCLUSÃO:Apesar de existirem poucos casos relatando o uso do retalho fasciocutâneo toracodorsal lateral, essa técnica mostrou ser excelente alternativa na reconstrução axilar, devido à facilidade de ressecção, boa cobertura da área receptora além de um resultado estético satisfatório.

Palavras-chave: Hidradenite; Glândulas sudoríparas; Mastectomia.

ABSTRACT

INTRODUCTION:Hidradenitis suppurativa is a chronic skin disease that affects the regions harboring the apocrine sweat glands. It has an estimated prevalence of 1% of the population and a preference for the female sex. 
METHOD: LMN, a 48-year-old female patient, presented, on examination, palpable, coalescent, painful nodules and a circumjacent area of fibrosis and scar retraction in both axillae, mainly in the left axilla. She was subjected to wide excision of the lesions at the axilla and left thoracic region, with a need for a rotational fasciocutaneous flap, usually used in patients who undergo lateral quadrantectomy.
RESULTS: A satisfactory aesthetic result was attained, together with the preservation of movements.
CONCLUSION: Although there are few reported cases of the use of the lateral thoracodorsal fasciocutaneous flap, this technique is an excellent alternative in axillary reconstruction, owing to the ease of resection, good coverage of the receiving area, and the satisfactory aesthetic result.

Keywords: Hidradenitis suppurativa; Sweat glands; Mastectomy.


INTRODUÇÃO

A hidradenite é uma doença cutânea crônica que acomete as regiões com glândulas apócrinas. Formam-se nódulos inflamatórios e abscessos, que evoluem com ulceração e fistulização. A axila é o local mais frequentemente acometido, seguida pela região anogenital. Tem uma prevalência estimada de 1% da população, com predileção pelo sexo feminino (3:1)1.

O tratamento da hidradenite é um desafio. As terapias conservadoras, drenagens de abscessos e uso de antibióticos tópicos, intralesionais e sistêmicos, são limitadas e de eficácia transitória¹. Além disso, o uso crônico desses medicamentos, devido ao alto grau de recorrência das lesões, leva ao desenvolvimento de resistência bacteriana2. A cirurgia está indicada para a hidradenite severa e recorrente. A lesão deve ser ressecada com margens e a cicatrização por segunda intenção não é recomendada devido a contraturas resultantes. O fechamento primário é associado à alta recorrência3. Dessa forma, é fundamental o conhecimento das inúmeras técnicas de retalhos para a região, assim como buscar novas formas de reconstrução para o local.

Avaliada em nosso serviço, uma paciente com hidradenite crônica importante em região axilar, na qual a excisão completa da lesão gerou área cruenta extensa, impossibilitando o fechamento primário. Foi então decidido, pela equipe, o emprego de retalho fasciocutâneo toracodorsal lateral, tradicionalmente, usado para reconstrução após mastectomia.


OBJETIVO

Buscar maior variedade de técnicas para a reconstrução complexa da região axilar, de modo a diminuir o prejuízo funcional e estético.


MÉTODO

LMN, 48 anos, sexo feminino, natural de Campo Belo, casada, tabagista passiva há 26 anos, sem outras comorbidades, nega uso de medicações. Aos 14 anos de idade, já apresentava lesões nodulares múltiplas, dolorosas, em ambas as axilas, que evoluíram com formação de abscessos, úlceras e fibrose de forma recorrente. História familiar positiva para hidradenite, pai, irmãos e seus 2 filhos possuem a doença. A paciente fez uso crônico de vários antibióticos durante acompanhamento dermatológico, principalmente cefalexina, porém sem remissão da doença.

Em 2011 foi submetida à drenagem de abcessos em ambas as axilas, também sem melhora no quadro, sendo então encaminhada ao serviço de cirurgia plástica do Hospital das Clínicas da UFMG. Ao exame, a paciente apresentava nodulações palpáveis, coalescentes, dolorosas e uma área de fibrose e retração cicatricial circunjacente em ambas as axilas, principalmente em axila esquerda. Em Novembro de 2011, após informação completa sobre o procedimento e assinatura do termo de consentimento livre e informado, foi feita a primeira abordagem cirúrgica, na qual foi realizada a exérese das lesões nodulares da axila direita com fechamento primário.

Em Maio de 2012 ocorreu o segundo tempo cirúrgico, no qual foi feito uma exérese ampla da fossa axilar esquerda, com retirada de pele e tecido subcutâneo subjacente, incluindo as glândulas apócrinas relacionadas à hidradenite, havendo drenagem de secreção purulenta compatível com processo infeccioso crônico da região. A ressecção ampla não permitiu o fechamento primário. Assim, foi decidido pela realização de um retalho fasciocutâneo toracodorsal lateral, de rotação, que tradicionalmente é usado para tratamento cirúrgico de pacientes submetidas à quadrantectomia lateral. A decisão pelo retalho foi discutida com a paciente, que aceitou o procedimento.


Figura 1. Pré-operatório.



Realizada incisão cutânea das linhas, previamente demarcadas (Figura 2). Tomou-se a precaução de demarcar os limites lateral e inferior da mama, de modo a preservar seu contorno após o procedimento (Figura 3) . O descolamento do retalho foi realizado no plano fascial, realizado meticulosamente com auxilio de lâmina de bisturi número 20 e eletrocautério. A viabilidade do retalho pôde ser comprovada pela presença de fluxo sanguíneo em sua extremidades (Figura 4). Após rotação do retalho e revisão rigorosa da hemostasia, finalmente, procede-se à sutura do retalho, por planos: subcutâneo, subdérmico e cutâneo. Foi posicionado dreno do tipo portovac 3.2 na ferida, retirado no segundo dia pós-operatório(Figura 5).


Figura 2. Planejamento do retalho.


Figura 3. Planejamento do retalho e sua relação com a mama.


Figura 4. Retalho descolado e com boa vascularização.


Figura 5. Resultado final.



O tipo de anestesia utilizado foi a anestesia geral. Instituiu-se antibioticoterapia com cefalexina via oral até o sétimo dia pós-operatório, e o uso de analgésicos comuns foi sintomático. A paciente manteve o membro imobilizado junto ao corpo nos primeiros dias pós-operatórios para evitar deiscência da ferida, e os pontos de pele foram retirados no décimo quinto dia pós-operatório.


RESULTADOS

O excedente de pele e tecido adiposo presente na região torácica lateral apresenta vascularização segura a partir dos vasos perfurantes do 5º, 6º, e 7º espaços intercostais. Este detalhe anatômico permitiu a rotação de pele e gordura para região mamária e axilar lateral com o fechamento seguro da área que foi ressecada.

Assim, foi realizado um retalho fasciocutâneo tóraco-lateral com eixo de rotação inferior para superior, em direção à axila, e fechamento com tensão mínima. Obteve-se um resultado estético satisfatório e não houve perdas funcionais. A técnica possibilitou a reconstrução da axila de forma harmoniosa. Até o momento, não foram evidenciadas retração cicatricial, prejuízo à movimentação ou recidivas na região operada, porém as lesões inguinais se agravaram. A paciente permanece em acompanhamento após um ano da operação, demonstrando extrema satisfação com os resultados da reconstrução axilar, porém ainda aguarda o tratamento das lesões inguinais.


DISCUSSÃO

O diagnóstico da hidradenite supurativa é na maioria dos casos tardio e o tratamento efetivo não é realizado, prolongando o sofrimento do paciente e aumentando a possibilidade de complicações. Dentre as complicações estão às consequências de supuração crônica (anemia, hipoalbunemia e amiloidose), depressão, atropatias axilares, obstruções linfáticas, fístulas, contraturas e até mesmo carcinoma de células escamosas2,3.

A excisão cirúrgica extensa do tecido envolvido possibilita a melhor remissão da doença, e o debridamento insuficiente da área acometida é a principal causa de sua recorrência4. Após uma ressecção ampla, devido à arquitetura anatômica tridimensional da fossa axilar, é necessária a reconstrução adequada com retalho que possibilite a movimentação dos tecidos da região axilar, sem ocasionar retração cicatricial durante os movimentos do braço5.

Existem diferentes tipos de retalhos descritos na literatura: lipocutâneos, fasciocutâneos, miocutâneos e retalhos livres6. A utilização frequente de retalhos miocutâneos e fasciocutâneos no campo da cirurgia plástica difundiu o uso desses retalhos também no tratamento da hidradenite, com resultados satisfatórios. Giovannini and Giannas5 defendem o uso dos fasciocutâneos paraescapulares devido a sua melhor capacidade de rotação, menor espessura e menor dano a área doadora. Além disso, a técnica utilizada para a realização do fasciocutâneo é menos complexa, demandando menor tempo cirúrgico7. Teo et al.8 descreveu, recentemente, relato de dois casos em que foi realizada abordagem radical de hidradenite axilar com uso do retalho torácico lateral. O autor destaca as grandes dimensões que o retalho pode alcançar (30x15cm) e a importância do delay para esta técnica.

O retalho toracodorsal lateral foi descrito por Holmström and Lossin7 ,em 1986, como uma técnica a ser adotada para reconstrução mamária. Constitui um exemplo de retalho fasciocutâneo que pode ser utilizado com segurança para a reconstrução axilar após exérese de hidradenites supurativas extensas, como pudemos comprovar. Esse retalho possui ricas anastomoses e boa vascularização, sendo importante a dissecção cuidadosa com manutenção da fáscia muscular em toda a extensão do retalho9.

De acordo com o estudo feito por Woerdeman6, no qual foram avaliados resultados cirúrgicos no uso do retalho toracodorsal lateral em pacientes pós-mastectomia, concluiu-se que a técnica resultou em poucas complicações. Isso permitiu ao autor considerar que o uso desse retalho é apropriado a outras deformidades, não apenas mamárias como também cicatrizes e defeitos axilares. Porém, existem escassos trabalhos sobre a utilização desse retalho na abordagem de hidradenites crônicas extensas.

Muitos tratamentos cirúrgicos para a hidradenite já foram descritos pela literatura10. A excisão simples com sutura primária, comumente preferida por cirurgiões não especializados em cirurgia plástica, apresenta altas taxas de recorrência da doença3. Mandal and Watson11 observaram que 69% dos pacientes que foram submetidos à sutura primária precisaram de pelo menos uma nova abordagem cirúrgica. Sabe-se, também, que excisões simples com sutura secundária necessitam de um longo período de tempo para que ocorra cicatrização completa. Além disso, tanto o fechamento primário quanto o secundário estão relacionados com maior aparecimento de contração cicatricial e de limitação de movimentos3.


CONCLUSÃO

A hidradenite crônica é uma doença que afeta a qualidade de vida do paciente, não apenas fisicamente como também emocional e socialmente9.

O do retalho fasciocutâneo toracodorsal mostrou-se excelente alternativa na reconstrução axilar, devido à facilidade de ressecção, boa cobertura da área receptora, além de um resultado estético satisfatório.


REFERÊNCIAS

1. Menderes A, Sunay O, Vayvada H, Yilmaz M. Surgical Management of Hidradenitis Suppurativa. International Journal of Medical Sciences 2010;7(4):240-247.

2. Buyukarik O, Hasdemir AO, Kahramansoy N, Cavit C, Erkol H. Surgical Approach to Extensive Hidradenitis Suppurativa. American Society of Dermatologic Surgery, Dermato Surg. 2011;37:835-842.

3. Eleutério JC, et al. Thoracodorsal fascicutaneous flap in the treatment of hidradenitis suppurativa: a case report and literature review. Rev Bras Cir Plást. 2012;27(1):170-3.

4. Soldin MG, Tulley K, Kaplan H, Hudson DA, Grobbelaar AO. Chronic axillary hidradenitis: the efficacy of wide excision and flap coverage. Br J Plast Surg. 2000;53(5):434-6.

5. Giovannini UM, Giannasi S. Fasciocutaneous flap to treat Verneuil disease (hidradenite supurativa) in the axillary region. Ann Plast Surg. 2003;50(1):108-9.

6. Woerdeman LA. Title Surgical risk factors of breast reconstruction and their clinical implications. Plast Reconstr Surg. 2004;113:196-203.

7. Holmström H, Lossing C. The lateral thoracodorsal flap in breast reconstruction. Plast Reconstr Surg. 1986;77:933-941

8. Teo WL, Ong YS, Tan BK. Radical Surgical Excision and Use of Lateral Thoracic Flap for Intractable Axillary Hidradenitis Suppurativa. Arch Plast Surg. 2012;39(6):663-666.

9. Bienek A, Matusiaki Y, Okulewicz-Gojlic D, Szepietowski JC, Surgical Treatment of Hidradenitis Suppurativa: Experiences and Recommendations. American Society for Dermatologic Surgery, Inc. Published by Wiley Periodicals, Inc. Dermatol Surg 2010;36:1998-2004.

10. Margesson LJ, Dellavalle RP, Ofori AO, Danby W. Pathogenesis, clinical features and diagnosis of hidradenitis suppurativa. Ann R Coll Surg Engl. 1997 Mar; 79(2):83-89.

11. Mandal A,Watson J. Experience with different treatment modules in hidradenitis suppurativa: a study of 106 cases. Surg. 2005;3:23-6










1. Residente de cirurgia plástica do HC-UFMG - residente de cirurgia plástica do HC-UFMG
2. Doutorado em Cirurgia, especialista em Cirurgia Plástica - Cirurgião Plástico preceptor do Hospital das Clínicas da UFMG
3. Residente de cirurgia plástica do HC-UFMG - residente de cirurgia plástica do HC-UFMG
4. Acadêmica de Medicina da UFMG - Coordenadora da Liga Acadêmica de Cirurgia Plástica da UFMG
5. Acadêmico de Medicina da UFMG - Coordenador da Liga Acadêmica de Cirurgia Plástica da UFMG
6. Residente de cirurgia plástica do HC-UFMG - Residente de Cirurgia Plástica do HC-UFMG
7. Residente de cirurgia plástica do HC-UFMG - Residente de Cirurgia Plástica do HC-UFMG
8. Residente de cirurgia plástica do HC-UFMG - Residente de Cirurgia Plástica do HC-UFMG

Instituição: Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital das Clinicas da UFMG - MG, Armando Chiari Junior.

Autor correspondente:
Thaís Gomes Casali
Rua Professor Alfredo Balena, 110 - Santa Efigênia
Belo Horizonte, Brasil CEP: 33120-050
E-mail: casalithais@hotmail.com

Artigo submetido: 24/3/2013.
Artigo aceito: 1/9/2013.

 

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