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Original Article - Year2013 - Volume28 - Issue 2

RESUMO

INTRODUÇÃO: As reconstruções nasais complexas têm alcançado alto nível de sofisticação, enfatizando-se a necessidade de substituir os tecidos nasais por outros similares. O objetivo deste estudo é descrever uma série de casos de pacientes submetidos a reconstrução nasal complexa secundária a ressecções oncológicas ou trauma.
MÉTODO: Foi considerado defeito nasal complexo, e, consequentemente, sua reconstrução, aquele que acometia mucosa, suporte cartilaginoso e pele nasal, simultaneamente. O tipo de reconstrução foi definido de acordo com a localização e o tamanho do defeito, mas sempre incluiu reconstrução da mucosa, suporte cartilaginoso e pele nasal simultaneamente.
RESULTADOS: Dez pacientes foram submetidos a reconstrução complexa do nariz, sendo 8 do sexo masculino, com média de idade de 53 anos. A reconstrução da mucosa foi feita com retalho septal condromucoso contralateral, mucoso ipsilateral ou retalho cutâneo malar em cambalhota. O suporte cartilaginoso foi realizado com enxerto de cartilagem septal e conchal e a cobertura cutânea, com retalho paramediano frontal. Não foi observado nenhum caso de hematoma, necrose ou infecção. Os pacientes que tiveram a reconstrução da mucosa realizada com retalhos mucosos referiam que respiravam normalmente, ao contrário dos pacientes submetidos a reconstrução com retalho dermogorduroso em cambalhota, que referiam obstrução ao fluxo aéreo.
CONCLUSÕES: A reconstrução de defeitos nasais complexos se constitui num desafio para o cirurgião plástico. A substituição dos tecidos nasais por outros similares promove melhor resultado tanto estético como funcional possível e está associado a baixa incidência de complicações.

Palavras-chave: Neoplasias cutâneas. Nariz/cirurgia. Retalhos cirúrgicos.

ABSTRACT

BACKGROUND: Complex nasal reconstruction has reached a high level of sophistication, emphasizing the need to replace nasal tissues with other similar tissues. We aimed to describe a series of patients who underwent complex nasal reconstruction secondary to oncologic resection or trauma.
METHODS: Patients simultaneously presenting with mucosa, cartilaginous support, and nasal skin defects were considered to have complex nasal defects and were eligible for reconstruction. The type of reconstruction was established according to the location and size of the defect; however, the procedure always included simultaneous reconstruction of the mucosa, cartilaginous support, and nasal skin.
RESULTS: Ten patients underwent complex reconstruction of the nose, including 8 men with a mean age of 53 years. Mucosal reconstruction was performed using a contralateral chondromucosal septal flap, ipsilateral mucosa, or cutaneous malar somersault flap. Cartilaginous support was performed with septal and conchal cartilage grafts and cutaneous coverage with a frontal paramedian flap. There were no cases of hematoma, necrosis, or infection. Patients who underwent mucosa reconstruction with mucosal flaps reported normal breathing, unlike those who underwent reconstruction with a dermal-fat somersault flap and reported air flow obstruction.
CONCLUSIONS: Reconstruction of complex nasal defects is challenging for plastic surgeons. Replacing the nasal tissue with similar tissue promotes the best possible aesthetic and functional results and is associated with a low incidence of complications.

Keywords: Skin neoplasms. Nose/surgery. Surgical flaps.


INTRODUÇÃO

O nariz é uma estrutura central na face, com grande importância estética e funcional. É particularmente exposto a traumas e neoplasias cutâneas, tornando sua reconstrução um desafio para o cirurgião plástico1.

Nas últimas décadas, as reconstruções nasais complexas têm alcançado alto nível de sofisticação, enfatizando-se a necessidade de substituir os tecidos nasais por outros similares. Assim, sempre que possível, a pele deve ser substituída por uma de cor e textura semelhantes, como nos retalhos frontais, a mucosa, com retalhos septais, e o suporte cartilaginoso, com retalhos ou enxertos septais, conchais ou costais2.

O objetivo deste trabalho é descrever uma série de casos de pacientes submetidos a reconstrução nasal complexa secundária a ressecções oncológicas ou trauma.


MÉTODO

Foi considerado defeito nasal complexo, e, consequentemente, sua reconstrução, aquele que acometia mucosa, suporte cartilaginoso e pele nasal, simultaneamente.

Foram incluídos pacientes que possuíam defeitos complexos em uma ou mais subunidades estéticas do nariz, secundários a ressecções oncológicas simultâneas ou pregressas ou, ainda, a traumas.

Todos os pacientes foram submetidos a reconstrução nasal complexa no Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade de Pernambuco, entre maio de 2010 e abril de 2012.

Todos os pacientes foram operados sob anestesia geral e infiltração local com lidocaína a 0,5% e adrenalina 1:200.000. Em todos os casos, foi realizada antibioticoprofilaxia com 2 g de cefazolina endovenosa, na indução anestésica.

O tipo de reconstrução foi definido de acordo com a localização e o tamanho do defeito, mas sempre incluiu reconstrução da mucosa, suporte cartilaginoso e pele nasal simultaneamente, realizada em dois tempos distintos.

A liberação da base do retalho paramediano frontal foi planejada para ser confeccionada com 21 dias de pós-operatório.

Esse estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Pernambuco (CAAE 00744712. 0.0000.5207).


RESULTADOS

Dez pacientes foram submetidos a reconstrução complexa do nariz, sendo 8 do sexo masculino, com média de idade de 53 anos, variando de 27 anos a 82 anos. Nove pacientes foram submetidos a ressecção de tumores cutâneos malignos e um foi vítima de trauma por arma branca.

Todos os defeitos localizavam-se em uma das asas e na porção inferior das paredes laterais ou na ponta nasal, ou seja, no terço inferior do nariz, e envolviam mucosa, cartilagem lateral inferior e/ou superior e segmento de pele sobrejacente.

Em 2 pacientes submetidos a ressecção oncológica, a mucosa foi reconstruída com um retalho dermogorduroso em cambalhota de base medial da região malar, visto que esses pacientes foram submetidos a ressecção de todo septo cartilaginoso. O suporte cartilaginoso foi feito com enxerto de cartilagem conchal (Figura 1).


Figura 1 - Retalho dermogorduroso malar em cambalhota de base medial, para reconstrução da mucosa da parede lateral do nariz pós-ressecção de carcinoma basocelular.



No paciente vítima de trauma, a reconstrução da mucosa nasal foi feita com retalho contromucoso septal contralateral em dobradiça, de base ântero-superior. A mucosa ipsilateral foi rebatida e depois devolvida e suturada para evitar fístulas septais. O suporte cartilaginoso foi reconstituído com enxerto de cartilagem conchal, para sustentação da asa nasal, e com o segmento de cartilagem do retalho septal já citado, para reconstrução da válvula nasal interna (Figura 2).


Figura 2 - Retalho condromucoso septal contralateral em dobradiça de base ântero-superior com enxerto de cartilagem conchal na margem narinária, para reconstrução da mucosa e suporte cartilaginoso da asa e parede lateral direitas do nariz, após perda de substância pós-trauma com arma branca. Retalho já elevado e fixado.



Nos outros 7 pacientes, o forro mucoso foi reconstruído com retalho mucopericondral ipsilateral com base no septo caudal. A mucosa contralateral foi mantida intacta. O esqueleto cartilaginoso foi reconstruído com enxerto de cartilagem conchal e septal para sustentação da asa e confecção da válvula nasal interna, respectivamente (Figura 3).


Figura 3 - Retalho mucopericondral ipsilateral com base no septo caudal, para reconstrução da mucosa nasal da asa e parede lateral esquerdas do nariz pós-ressecção de carcinoma basocelular. Observa-se a cartilagem septal exposta, que foi utilizada como enxerto para confecção da válvula nasal interna.



Em todos os pacientes, a cobertura cutânea foi feita com retalho paramediano frontal, elevado em plano supraperiosteal, mantendo-se íntegro o pedículo da artéria supratroclear. Foi realizado adelgaçamento distal do retalho, na porção que corresponderia ao defeito cutâneo, por meio de miectomia do frontal remanescente (Figura 4).


Figura 4 - Retalho paramediano frontal, elevado em plano supraperiosteal, com adelgaçamento distal do mesmo, na porção que corresponderia ao defeito cutâneo, por meio de miectomia do frontal remanescente, para cobertura cutânea da ponta nasal.



Em 9 pacientes, foi realizado o fechamento primário da área doadora frontal, inclusive na porção que corresponde à extremidade distal do retalho. No jovem paciente vítima de trauma, em decorrência da pouca flacidez da pele frontal, a área correspondente à extremidade do retalho foi deixada para cicatrizar por segunda intenção.

A secção do pedículo do retalho paramediano frontal foi feita no 21º dia de pós-operatório, assim como a base do retalho mucopericondral ipsilateral, quando realizado.

Todos os pacientes apresentaram epistaxe ou sangramento da área cruenta do retalho cutâneo, mas nenhum necessitando de revisão cirúrgica. Nenhum caso de hematoma, necrose ou infecção foi observado. Os pacientes que tiveram a reconstrução da mucosa realizada com retalhos mucosos referiram que respiravam normalmente, ao contrário dos pacientes submetidos a reconstrução com o retalho dermogorduroso em cambalhota, que referiram obstrução ao fluxo aéreo.

As Figuras 5 e 6 retratam o resultado obtido 12 meses após reconstrução nasal complexa, em 2 pacientes.


Figura 5 - Paciente de 27 anos de idade, sexo masculino. Em A, aspecto pré-operatório, exibindo significativa perda de substância nasal pós-trauma com arma branca. Em B, aspecto intraoperatório. Em C, aspecto 12 meses após reconstrução nasal complexa, com retalho condromucoso septal contralateral em dobradiça, de base ântero-superior, enxerto de cartilagem conchal e septal para sustentação da asa e confecção da válvula nasal interna, respectivamente, e retalho paramediano frontal para cobertura cutânea.


Figura 6 - Paciente de 55 anos de idade, sexo masculino. Em A, aspecto pré-operatório. Em B, aspecto 12 meses após reconstrução nasal complexa, com retalho mucopericondral ipsilateral com base no septo caudal, enxerto de cartilagem conchal e septal para sustentação da asa e confecção da válvula nasal interna, respectivamente, e retalho paramediano frontal para cobertura cutânea.



DISCUSSÃO

A reconstrução de defeitos complexos do nariz requer a reconstituição da mucosa nasal, do suporte osteocartilaginoso e da cobertura cutânea com cor, textura e contorno semelhantes à pele original, além da restauração da função respiratória nasal normal2,3.

As reconstruções nasais devem ser baseadas nas subunidades nasais, as quais constituem a unidade estética nasal. Incisões devem ser programadas nos limites das subunidades, onde as cicatrizes serão menos visíveis. Desse modo, a remoção do tecido adicional com reconstrução de toda subunidade garante melhor resultado, se há perda superior a 50% da subunidade, simulando o contorno nasal normal4.

Para reconstrução da mucosa nasal, os retalhos cutâneos em dobradiças são espessos e mal vascularizados, provocando distorções e diminuição da permeabilidade da cavidade narinária5, ao contrário dos retalhos mucosos, que são delgados e bem vascularizados, que acabam fornecendo irrigação sanguínea ideal para o enxerto cartilaginoso e ausência de obstáculo ao fluxo de ar nasal6.

A restauração do suporte nasal é fundamental para excelência do resultado estético e funcional. Materiais autógenos, como cartilagem septal, auricular e costal, são os mais utilizados para essa finalidade, seja com enxerto livre ou composto, ou fazendo parte de retalho condromucoso septal, cada um com suas vantagens e desvantagens7,8.

O enxerto livre de cartilagem conchal, por possuir convexidade natural, geralmente é utilizado para suporte à asa nasal e promove a sustentação da margem narinária. Já para reconstrução da válvula nasal interna, enxerto ou retalhos condromucosos septais são os mais utilizados2,8.

A cobertura cutânea nas reconstruções nasais complexas é feita com o retalho paramediano frontal, na maioria dos casos, já que promove pele de textura e cor semelhantes às do nariz original9,10. Importantes táticas levaram à melhora estética na reconstrução nasal com esse retalho. O conceito das unidades estéticas nasais surgiu com a ênfase em substituir a pele de uma unidade inteira, caso falte mais de 50% dela8, além de fazer as incisões ao longo das extremidades das mesmas, tentando-se evitar ultrapassar seus limites2.

Além do exposto, em decorrência de sua rica vascularização11, o retalho paramediano frontal se torna bastante versátil, podendo ter seu arco de rotação ampliado e sua extremidade adelgaçada por meio de miectomia do frontal, permitindo que as reentrâncias e projeções normais do nariz sejam moldadas pela sua cobertura cutânea relativamente delgada8.

A maioria dos autores realiza a reconstrução nasal em dois ou três estágios, sendo realizado adelgaçamento do retalho, reposicionamento da cabeça do supercílio e outros retoques. Em geral, a liberação do retalho é realizada entre 15 dias e 21 dias, momento em que o retalho se encontra autonomizado2,8. Outros autores o fazem em um único estágio, utilizando retalhos livres12.

Apesar da não realização de um método objetivo para verificar a função respiratória nasal em nosso estudo, a maioria dos autores refere que a reconstrução do forro com mucosa nasal e emprego de enxertos cartilaginosos para suporte são as melhores opções para manter a permeabilidade ao fluxo de ar, fato constatado subjetivamente na presente pesquisa2,5,8.


CONCLUSÕES

A reconstrução de defeitos nasais complexos se constitui num desafio para o cirurgião plástico. A substituição dos tecidos nasais por outros similares promove o melhor resultado estético e funcional possível e está associado a poucas complicações. Em relação à parte funcional, avaliações objetivas devem ser realizadas para confirmar esse achado.


REFERÊNCIAS

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12. Cinpolat A, Bektas G, Coskunfirat OK. Complex partial nasal reconstruction using free prelaminated temporoparietal fascial flap. Microsurgery. 2013;33(2):156-9.










1. Mestre, membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), cirurgião plástico do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade de Pernambuco, Recife, PE, Brasil
2. Membro especialista da SBCP, cirurgião plástico do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade de Pernambuco, Recife, PE, Brasil
3. Médico residente em Clínica Médica, especialização em Dermatologia pelo CEDER na Santa Casa de Misericórdia do Recife - Hospital Santo Amaro, Recife, PE, Brasil
4. Membro especialista da SBCP, cirurgião plástico do Instituto Materno-Infantil de Pernambuco Professor Fernando Figueira (IMIP), Recife, PE, Brasil
5. Membro titular da SBCP, cirurgião plástico do IMIP, Recife, PE, Brasil
6. Graduanda em Medicina da Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil
7. Professor adjunto da Universidade de Pernambuco, chefe do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade de Pernambuco, Recife, PE, Brasil

Correspondência para:
Rodrigo Campos Soares Quintas
Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade de Pernambuco
Rua Arnóbio Marques, 310 - Santo Amaro - Campus Universitário
Recife, PE, Brasil - CEP 50100-130
E-mail: rodrigo-quintas@hotmail.com

Artigo submetido pelo SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBCP.
Artigo recebido: 17/2/2013
Artigo aceito: 11/4/2013

Trabalho realizado no Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade de Pernambuco, Recife, PE, Brasil.

 

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