ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Original Article - Year2005 - Volume20 - Issue 2

ABSTRACT

Cutaneous flaps are largely used by plastic surgeon and have many indications, like in burn repairs, injuries, deformities and face reconstructions. However, they present several complications. Necrosis is the most warningfull complication, so many substances had been used to avoid it, but none of them has proved to be efficient in reduce putting out necrosis. We compared and verified, in this project, the efficiency of catalase, glutathione, retinoic and glycolic acid in the injury and cutaneous flaps, healing by macroscopic and microscopic analysis of rabbit's skins. Fibrosis, scar/crust, congestion, spongiosis, inflammatory process, neovascularization increase and epiderm atrophy were some of results of histopathologic analysis. Thus, the use of pool-antinecrosis was indicated to cutaneous grafts that are going to cover large devitalized areas with large continuity solution.

Keywords: Surgical flaps. Necrosis. Catalase. Glutatione. Tretinoin

RESUMO

Retalhos cutâneos são amplamente utilizados por cirurgiões plásticos e têm muitas indicações, como em reparações de queimaduras, injúrias, deformidades e reconstruções faciais. No entanto, eles apresentam muitas complicações. Necrose é a complicação mais alarmante, e muitas substâncias têm sido utilizadas para evitá-la, mas nenhuma delas teve sua eficiência comprovada na redução deste processo. Neste trabalho, foi comparado e verificado o desempenho da catalase, da glutationa, dos ácidos retinóico e glicólico em injúrias e na cicatrização dos retalhos cutâneos, por meio de análises macroscópicas e microscópicas de peles de coelhos. Fibrose, cicatrizes/crostas, congestão, espongiose, processo inflamatório, aumento da neovascularização e redução da atrofia epidérmica foram alguns dos resultados da análise histopatológica. Portanto, o uso dessas substâncias pode ser indicado para retalhos cutâneos que irão cobrir grandes áreas desvitalizadas com grande solução de continuidade.

Palavras-chave: Retalhos cirúrgicos. Necrose. Catalase. Glutationa. Tretinoína


INTRODUÇÃO

Retalhos cutâneos são muito úteis em intervenções cirúrgicas plásticas reconstrutivas ou estéticas1. Apesar de toda evolução técnica dos enxertos, nós ainda enfrentamos sérias complicações como deficiência de suprimento sangüíneo, tensão excessiva, angulação de pedículo, compressão curativa, hematoma ou infecção1,2. Necrose também é uma complicação freqüente1.

Com o objetivo de controlar a ação dos radicais livres muitas substâncias têm sido testadas para evitar a necrose1. O uso de agentes quelantes, como a deferoxamina ou EDTA, e de enzimas protetoras, como a SOD ou catalase, pode ser útil contra os radicais livres (reação de Fenton)3.

Alguns ácidos podem, também, desempenhar um importante papel na redução da necrose, como os ácidos glicólico e retinóico. Esses ácidos desempenham um importante papel no tratamento dermatológico de camadas da pele desde que induzem neovascularização e aumentam as células do tecido cutâneo4,5. Ácido ascórbico também tem uma importante ação contra necrose em enxertos6.

A eficácia de substâncias quelantes e neoangiogênicas em retalhos cutâneos experimentais em coelhos será avaliada nesse trabalho.


MÉTODO

Vinte coelhos domésticos (raça Nova Zelândia) foram igualmente divididos em dois grupos, A e B. O grupo B recebeu a solução-antinecrose, enquanto o grupo A foi o controle. A solução foi composta de duas partes, uma feita de glutationa 0,3%, catalase 5% e base cremosa 100g. A outra de ácido retinóico 0,5%, base de gel 30g e ácido glicólico 50%. Procedimentos pré-cirúrgicos incluíram medição, pesagem e tricotomia. Os animais foram anestesiados com cetamina, seguido de antissepsia com álcool iodado e, logo após, foi realizada a cirurgia.

Retalhos cutâneos ventrais foram feitos na proporção 1:6 com circulação axial e randômica. Esses enxertos foram intencionalmente feitos para produzir necrose no terço distal. Após a cirurgia, os enxertos foram fotografados para avaliação pré e pós-cirúrgica (Figuras 1 a 5).


Figura 1 - Marcação do retalho randomizado no dorso do coelho.


Figura 2 - Incisão da pele do retalho randomizado no dorso do coelho.


Figura 3 - Detalhe do retalho.


Figura 4 - Fixação do retalho randomizado no dorso do coelho.


Figura 5 - Aplicação das substâncias quelantes e neoangiogênicas.



Análise pós-cirúrgica foi realizada diariamente por meio da aplicação da solução e do registro de informações. Não houve mortes entre os coelhos. Depois de 30 dias, os coelhos foram sacrificados e os enxertos removidos. Uma película foi fixada no enxerto e a área de necrose registrada. A área de necrose foi avaliada em um papel milimetrado e comparada entre os animais. Os enxertos foram também fixados em formol a 10% para posterior análise microscópica. A área de transição entre os tecidos viáveis e necróticos também foi biopsiada. Cortes com três a cinco µm foram corados com hematoxilina e eosina.

Os parâmetros histopatológicos analisados foram: fibrose tecidual, exocitose, neoangiogênese, atrofia epidérmica, espongiose, edema, células gigantes multinucleadas, ulceração, linfócitos, plasmócitos e população macrofágica. Os resultados foram analisados estatisticamente utilizando-se Epinfo 6.04 (programa de análise estatística). Estatística descritiva e o teste T também foram usados (p< 0,01).


RESULTADOS

Todos os coelhos apresentaram necrose à análise macroscópica. Dez coelhos pertencentes ao grupo controle apresentaram um melhor resultado no pós-cirúrgico, pois tiveram menores cicatrizes/crostas, menor rubor, pequena congestão e maior aproximação das bordas cirúrgicas. Os demais apresentaram congestão, grandes cicatrizes/crostas e secreção inflamatória.

Quatro coelhos, no grupo teste, tiveram bons resultados com pequena congestão, pouca cicatriz/crosta e boa aproximação da lesão cirúrgica. Na análise histopatológica, o grupo teste apresentou fibrose, processo inflamatório, espongiose, aumento de neovascularização e redução da atrofia epidérmica quando comparado ao grupo controle (Figura 6, Quadros 1 e 2).


Figura 6 - Freqüência de úlceras nos retalhos entre os grupos estudados.






Na área do vértice, onde a irrigação sangüínea é melhor, o aumento da neovascularização no grupo controle elevou a reação inflamatória e exocitose em direção às áreas ulcerativas. Isto não foi visto na área medial do retalho, onde a vascularização era remota e a quantidade de vasos aumentada no grupo controle reduziu a atrofia epidérmica e fez as áreas ulcerativas diminuírem.


DISCUSSÃO

A grande diferença entre a pele de coelho e a humana é que a primeira pode produzir vitamina C, por meio do metabolismo natural da glicose. A vitamina C tem como função ser co-fator em muitas reações de hidroxilização, além de ser um importante antioxidante hidrossolúvel de fluidos extracelulares6. É também essencial para o colágeno, proteoglicanos e outros componentes orgânicos da síntese de matriz intracelular. Devido a este fato, escolheu-se usar coelhos ao invés de ratos nesta pesquisa.

Ácido retinóico é um análogo sintético à vitamina A, que tem ações específicas em receptores, tendo vários efeitos colaterais7. Aumento da mitose, edema, resposta inflamatória inespecífica, espongiose discreta, aumento da camada córnea e condensação granulosa, decréscimo do pigmento, hipertrofia de queratina e neoangiogênese são algumas importantes alterações histológicas7-10. Pacientes com a pele desgastada devido à ação da luz solar melhoram as condições de sua pele com o uso de ácido retinóico (rugas, hiperpigmentações, textura e flacidez)11. Os efeitos colaterais mais comuns deste tratamento foram eritema, queimadura e descamação. Quanto maior a concentração do ácido retinóico, pior é a irritação da pele, assim como os efeitos colaterais12. Foi questionado se a concentração do ácido retinóico era abusiva, causando a resposta inflamatória.

Ácido glicólico é largamente utilizado na prática médica, especialmente para tratamento clínico da pele (acne e regeneração da pele)3,5. Em pacientes com a pele desgastada devido à ação da luz solar, tratamento com ácido glicólico melhora textura, reduz rugas, ceratose solar, como também a espessura do estrato córneo e aumento da síntese de colágeno3,13,14. Testes com ácido glicólico mostraram aumento da necrose e formação de crosta, em alta concentração e/ou pH inferior a 2. Eles não foram encontrados em baixas concentrações ou pH alcalino15. A ação da catalase destrói o peróxido de hidrogênio. A glutationa é um tripeptídeo formada pelos resíduos de glicina, cisteína e ácido glutâmico, tendo a função de capturar radicais hidroxil e de oxigênio singleto, além de ser um co-fator de várias enzimas em diferentes caminhos metabólicos e de fazer parte de muitos processos de eliminação de radicais livres6.

Esses dois agentes podem ser usados na mesma formulação em diferentes concentrações. Nesta pesquisa, usou-se ácido retinóico e ácido glicólico em alta concentração, percebendo-se a presença de muitas reações inflamatórias e grandes exocitoses no grupo teste, quando comparado ao grupo controle. Todavia, observou-se uma excelente neovascularização e redução da taxa de atrofia epidérmica no grupo teste, o que não ocorreu no grupo controle. Alguns autores consideram que o aumento da vascularização pode causar uma grande congestão das veias e um enorme edema no retalho7. Porém, a análise histopatológica não identificou estase venosa em nenhum dos animais estudados. Comparando-se o vértice do retalho com a parte medial, notase que no primeiro a grande vascularização leva a um aumento significante da reação inflamatória, que foi menor na parte medial, mais desvitalizada. Isso pode ser uma das razões para o aconselhável uso das substâncias em áreas excessivamente desvitalizadas e com grande solução de continuidade, em outras palavras, em locais que necessitam de grandes retalhos de pele.


CONCLUSÕES

O tratamento dos animais com a solução antinecrose foi capaz de aumentar a neoangiogênese e reduzir a atrofia epidérmica, porém elevou os níveis da reação inflamatória, principalmente, onde já existia um certo grau de vascularização, corrompendo o processo de cicatrização.

Portanto, o uso da solução pode ser indicado para retalhos cutâneos que irão cobrir grandes áreas desvitalizadas com grande solução de continuidade, áreas estas que necessitam de uma boa neovascularização e uma reduzida taxa de atrofia epidérmica para tornar viável a sobrevida do retalho.

Agradecimentos: À Dra. Kátia Virgínia Machado Aguiar, dermatologista e cirurgiã estética, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia, por sua contribuição como consultora e pela revisão crítica do nosso trabalho. À farmácia de manipulação Arte Galênica, por nos ter fornecido as soluções de ácido retinóico e glicólico.


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I. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.
II. Membro Titular da SBCAV.
III. Membro Titular da SBP, Professor da Universidade Federal de Sergipe (UFS) e Universidade Tiradentes (UNIT).
IV. Membro Titular da SBC, Professora da UFS e UNIT.
V. Estudante de medicina da UFS.
VI. Estudante de veterinária da UFRPE.
VII. Estudante de medicina da UFS.

Correspondência para:
Márcio Barreto
Centro de Saúde Prof. José Augusto Barreto.
Av. Gonçalo Prado Rollemberg,211, sala 911, Bairro São José
Aracaju, SE, Brasil, CEP: 49010-410
Tel: 0xx79 213-7438/213-8060
E-mail: marcio.barretto@terra.com.br

Trabalho realizado no na Sempre Viva Unidade Cirúrgica (SVUC) - Serviço de Cirurgia Plástica / Universidade Federal de Sergipe (UFS) - Serviços de Cirurgia Experimental e Patologia/ Universidade Tiradentes (UNIT)/ Universidade Pio X (UNIPIO X) - Serviço de Cirurgia Animal.

Artigo recebido: 05/12/2004
Artigo aprovado: 23/01/2005

 

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