ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175
The kite flap on surgical reconstruction of traumatic defects of the thumb: two cases report
O Retalho
Case Reports -
Year2006 -
Volume21 -
Issue
2
Roberto MeloneI, Naila AlvesI, Ricardo Pianta DucattiI, Ricardo Hashimoto MenezesI, Guilherme de Queiróz MoysésI, Marcelo PradoI, Rosa Maria CarrazzoniII, Walfredo Cherubini FogaçaII, Antonio Roberto BozolaIII
ABSTRACT
The kite flap is a fasciocutaneous and neurovascular flap harvest from the dorsal portion of the second finger. Its irrigation originates from the first space dorsal metacarpic artery that is a radial artery branch and its innervation come from the superficial branches of the radial nerve. It is a very useful flap to cover soft tissues defects in the hand. The flap was described, in 1954, by the first time by Gaul and after by Lie and Posch, in 1971. In the present paper, the authors used the kite flap to treat patients and could verify the possibility to cover soft tissue defects in the thumb, very important component of hand function. This flap deliver to the soft tissue defect an innerved island of skin being a good option for reconstructive surgery.
Keywords:
Surgical flaps. Thumb. Hand Injuries, surgery
RESUMO
O retalho "kite" é neurovascular fasciocutâneo da porção dorsal do segundo quirodáctilo, cuja irrigação é proveniente da artéria metacárpica dorsal do primeiro espaço, que é ramo da artéria radial, e se presta a cobrir defeitos de partes moles da mão. Sua inervação é proveniente de ramos superficiais oriundos do nervo radial. Foi descrito pela primeira vez por Gaul (1954) e, mais tarde, por Lie e Posch (1971). Os autores utilizaram o retalho "kite" em dois pacientes e verificaram a possibilidade de cobertura das áreas cruentas no polegar, segmento importante na função da mão. Este retalho leva à área receptora uma ilha de pele inervada e constitui mais uma boa técnica disponível na cirurgia reparadora desse segmento corporal.
Palavras-chave:
Retalhos cirúrgicos. Polegar. Traumatismos da mão, cirurgia
INTRODUÇÃO
A cobertura de defeitos de partes moles em mão, sem prejuízo funcional e sensitivo, continua sendo um desafio para os cirurgiões plásticos da atualidade.
O retalho "kite" é neurovascular fasciocutâneo da porção dorsal do segundo quirodáctilo, cuja irrigação é proveniente da artéria metacárpica dorsal do primeiro espaço, que é ramo da artéria radial. Sua inervação é proveniente de ramos superficiais oriundos do nervo radial. Foi descrito pela primeira vez por Gaul (1954)1, sendo melhor divulgado mais tarde por Lie e Posch (1971)2, e por Foucher (1979)3, que inclusive deu-lhe o nome de 'kite", que em inglês significa pipa, devido à sua forma parecida com esse brinquedo.
É versátil em virtude do seu grande arco de rotação, quando realizada a esqueletização do pedículo neurovascular, proporcionando cobertura de áreas cruentas em polegar, dorso da mão e porção radial da face palmar. É vantajoso em comparação a outros retalhos descritos, como cross-finger4, flag flap5, retalho V-Y6, retalhos de rotação local7, retalhos da eminência tenar8,9, retalho ilhado neurovascular de dedo médio10 e retalhos livres que necessitam boa experiência microcirúrgica.
O objetivo do trabalho é mostrar possibilidades de reparação da mão dentro do arco de rotação do retalho e relatar duas reconstruções de polegar com o retalho "kite", que apresentavam área cruenta e exposição tendínea.
Anatomia
O retalho da artéria metacárpica dorsal é baseado num verdadeiro feixe neurovascular. A sua irrigação é realizada pela artéria metacárpica dorsal do primeiro espaço, ramo profundo da artéria radial, com um calibre de 1,0-1,5 mm (Figura 1). A artéria metacárpica dorsal tem muitas variações anatômicas, mas que não alteram o procedimento cirúrgico. Na maioria dos casos, a artéria acompanha o eixo do segundo osso metacárpico, podendo estar localizada superficialmente ou profundamente no sentido da aponeurose do primeiro músculo interósseo dorsal. Seja qual for a situação, haverá sempre uma importante rede vascular anastomótica, ao nível do colo do segundo osso metacárpico, com a artéria colateral radial palmar do dedo indicador e a artéria metacárpica palmar. A artéria metacárpica dorsal divide-se entre três ramos terminais: ramo radial, ramo ulnar e ramo intermédio11,12. O ramo radial corre acima do primeiro osso metacárpico e se anastomosa com a artéria digital do polegar. O ramo ulnar corre acima do segundo osso metacárpico e da articulação metacárpico falangiana do dedo indicador e termina com ramos pequenos que irrigam o periósteo e o tendão extensor do mesmo dedo. O ramo intermédio corre entre o ramo radial e ulnar, com os quais se anastomosa. Algumas vezes, as duas artérias, superficial e profunda, estão presentes, do ponto de vista cirúrgico é importante incluir-se a aponeurose no pedículo. É acompanhada por uma ou duas veias correspondentes (Figura 1). O nervo é ramificação do nervo radial. Fica localizado no tecido subcutâneo e inerva a porção dorsal da articulação metacárpica e os dois terços proximais do dorso da primeira falange (Figura 1).
Figura 1 - A e B - Artéria metacárpica dorsal, veias e ramo terminal do nervo radial; C - O retalho levantado.
MÉTODO
Realizou-se dissecção do retalho em cadáver fresco com finalidade de observar o seu arco de rotação e as possibilidades de cobertura de áreas cruentas (Figura 2). Está delineado no dorso da articulação metacárpica e primeira falange do dedo indicador. As margens distal e proximal estão ao nível das articulações interfalangeana proximal e metacarpofalangeana, respectivamente e as margens laterais ao nível da linha média do lado radial e ulnar do dedo. A incisão para expor o pedículo é um S reverso. A porção distal da incisão é curvada sobre o lado radial do segundo osso metacárpico, atingindo o lado radial do retalho. As duas bordas cutâneas são delicadamente rebatidas por meio de uma dissecção subcutânea, deixando exposto o tecido subcutâneo que contém o ramo do nervo do retalho. O feixe neurovascular não deverá ser dissecado, devendo permanecer incluso no tecido subcutâneo. Eleva-se o retalho a partir do tendão extensor subjacente. O fino tecido areolar vascularizado que cobre os tendões deverá ser poupado e as veias que cruzam o retalho deverão ser ligadas.
Figura 2 - Obtenção e arco de rotação do retalho descrito em cadáver. A - Marcação; B - Retalho; C - Porção ventral do retalho; D, E, F - Arco de rotação.
O ponto chave do procedimento é incluir-se a fáscia do primeiro músculo interósseo13. O arco de rotação permite a cobertura de todo o dorso do polegar, da primeira membrana e da porção palmar da primeira falange. O sítio doador é coberto com um enxerto de pele.
RELATO DOS CASOS
Paciente 1: G.S, 45 anos, vítima de mordedura de cão, admitido com ferimento corto-contuso circunferencial, em falange proximal do polegar direito, com laceração do pedículo neurovascular da face ulnar, associado a lesão total do flexor longo do polegar, fratura de falange média desalinhada e laceração complexa de partes moles na face volar do polegar (Figura 3). Foi submetido à fixação da fratura, tenorrafia primária do flexor longo, desbridamento e reposicionamento de partes moles. Evoluiu com necrose de pele associada à exposição tendínea do flexor longo do polegar direito na falange proximal-média (2x2 cm), submetido a desbridamento de tecidos desvitalizados (Figura 3). Utilizou-se o retalho da artéria metacárpica dorsal do primeiro espaço com cobertura total da área cruenta, associado a enxerto de pele total no dorso do indicador direito (Figura 3).
Figura 3 - Paciente 1 - A: Área cruenta e fratura fixada; B: Retalho transposto e suturado; C: Área doadora no dorso do indicador; D: Pós-operatório tardio.
Paciente 2: J.L.B, 46 anos, vítima de mordedura de cão, apresentando perda de substância na transição da falange médio-distal do polegar esquerdo, medindo 3x2 cm na face extensora, com área cruenta e exposição do extensor longo do polegar (Figura 4). Confeccionou-se o retalho "kite" para cobertura da área cruenta, associado a enxerto de pele total na área doadora proveniente do braço (Figura 4).
Figura 4 - Paciente 2 - A: Retalho marcado; B e C: Retalho obtido; D: Pós-operatório tardio.
RESULTADOS
O paciente nº 1 evoluiu sem intercorrências, tendo alta no dia seguinte ao procedimento para acompanhamento ambulatorial, apresentando início do retorno da sensibilidade do retalho no 29º dia pós-operatório, quando houve regressão do edema. A atividade flexora estava mantida e limitada pela fixação óssea, que foi retirada após três semanas. Realizou tratamento fisioterápico, readquirindo sensibilidade na área do retalho e função flexora.
O paciente nº 2 evoluiu sem intercorrências, alta no 1º dia de pós-operatório. Apresentou, no 7º dia pós-operatório, necrose de pequena porção distal, cobertura tendínea adequada, sendo tratada conservadoramente. Evoluiu sem déficit motor, com recuperação parcial da sensibilidade do retalho.
DISCUSSÃO
Em virtude do seu grande arco de rotação, o retalho "kite" se presta à cobertura de áreas cruentas nas mais diversas localizações da mão, após esqueletização do seu pedículo neurovascular, que pode se apresentar com até 7 cm de comprimento11. Além disso, traz à região um retalho de pele com sensibilidade, primordial para reconstruções, sobretudo do polegar, sendo esta uma vantagem em relação a outras opções de retalhos. Apresenta facilidade de execução e menor complexidade em relação aos retalhos livres microcirúrgicos, mínima morbidade no sítio doador e possibilita mobilização precoce com resultado estético satisfatório, em virtude da proximidade da área doadora e receptora. Além disso, é realizado em apenas um tempo cirúrgico, o que o torna mais versátil que o flag flap e o cross-finger. A perda do retalho é praticamente inexistente, uma vez que a lesão do pedículo é muito difícil em virtude do seu plano de dissecção bem delimitado (abaixo da fáscia)13,14. Nos dois casos apresentados, houve evolução funcional e estética bastante satisfatórias, sem intercorrências no pós-operatório.
CONCLUSÃO
O retalho "kite" é seguro, oferece grande possibilidade para cobertura de áreas cruentas, sobretudo em polegar e dorso da mão, traz para a área receptora uma ilha de pele inervada e constitui técnica importante e disponível na realização de cirurgia reparadora desse segmento corporal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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I. Médico Residente do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital de Base de São José do Rio Preto, SP.
II. Médico Assistente do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital de Base de São José do Rio Preto, SP.
III. Regente do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital de Base de São José do Rio Preto,SP; Membro Titular da SBCP.
Correspondência para:
Antonio Roberto Bozola
Clínica Imagem de Cirurgia Plástica.
Av. José Munia, 6777
São José do Rio Preto, SP - CEP 15085-350
Telefax: 0xx17 3227-9200
E-mail: bozola@bozola.com.br / bozola.imagem@riopreto.com.br
Trabalho realizado no Hospital de Base de São José do Rio Preto, SP.
Artigo recebido: 01/03/2006
Artigo aprovado: 20/04/2006
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