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Case Report - Year2024 - Volume39 - Issue 1

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2024RBCP0887-PT

RESUMO

O tumor filoide é uma neoplasia fibroepitelial rara que representa 0,3 a 1% de todas as neoplasias mamárias. De acordo com a classificação histopatológica, 12 a 26% são do tipo borderline e aproximadamente 15% desses tumores recorrem após excisão cirúrgica. O tratamento recomendado para todos os tipos de tumor filoide é a excisão cirúrgica, e no caso de tumores gigantes o tratamento deve ser multidisciplinar. Apresentamos o caso de uma mulher de 46 anos com tumor filoide na mama esquerda que recorreu 4 anos após a excisão cirúrgica. O estudo anatomopatológico qualificou-o como tumor gigante e o estudo histopatológico relatou tumor filoide borderline. Foi submetida a excisão cirúrgica com mastectomia esquerda e reconstrução mamária com retalho de grande dorsal mais enxerto de gordura. A paciente apresentou evolução favorável sem recidiva. Concluindo, o tumor filoide gigante borderline recorrente é raro e seu manejo cirúrgico representa um desafio tanto na excisão quanto na reconstrução mamária.

Palavras-chave: Tumor filoide; Mamoplastia; Retalhos cirúrgicos; Procedimentos de cirurgia plástica; Mastectomia

ABSTRACT

Phyllodes Tumor is a rare fibroepithelial neoplasm that represents 0.3 to 1% of all breast neoplasms. According to histopathologic classification, 12 to 26% are borderline type and approximately 15% of these tumors recur after surgical excision. The recommended treatment for all types of Phyllodes Tumor is surgical excision, and in the case of giant tumors, the treatment should be multidisciplinary. We present the case of a 46-year-old woman with a Phyllodes Tumor in the left breast that recurred 4 years after surgical excision. The anatomopathological study qualified it as a giant tumor and the histopathological study reported a Borderline Phyllodes Tumor. She underwent surgical excision with a left mastectomy and breast reconstruction employing a latissimus dorsi flap plus fat graft. The patient presented a favorable evolution without recurrence. In conclusion, the Recurrent Giant Borderline Phyllodes tumor is rare and its surgical management represents a challenge both in breast excision and reconstruction.

Keywords: Phyllodes Tumor. Mammaplasty. Surgical Flaps. Plastic Surgery Procedures. Mastectomy


INTRODUÇÃO

O tumor filoide (TF) de mama é uma neoplasia fibroepitelial rara e representa menos de 1% de todos os tumores primários de mama1. Sua incidência é de aproximadamente 2,1 por milhão de habitantes e ocorre principalmente em mulheres de 45 a 49 anos2,3. O TF geralmente apresenta rápido crescimento e mede entre 4 e 7cm, mas quando atinge tamanho superior a 10cm é considerado gigante2.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os TF são classificados histopatologicamente como benignos, malignos e limítrofes3. O TF borderline apresenta frequência de 12% a 26%1,3, taxa de recorrência de 15% a 25% e baixo potencial de metástase4. As características histopatológicas incluem um limite circunscrito ou focalmente invasivo, mitoses frequentes e celularidade estromal moderada e/ou atípica1.

O tratamento recomendado para todos os tipos de TF é a excisão cirúrgica5. Para evitar recorrência local, recomenda-se obter margem livre de pelo menos 1cm. Em geral, tumores maiores que 5cm são tratados por mastectomia5,6. Porém, o tratamento final dependerá da classificação histopatológica do tumor, tamanho, extensão e localização. Ao decidir pela ressecção cirúrgica ampla de um TF gigante borderline, é necessário considerar diferentes técnicas reconstrutivas, seja a reconstrução baseada em implantes (RBI) ou a reconstrução autóloga (RA) baseada em retalhos7. Qualidade de vida, a autoestima e o bem-estar psicossocial tendem a melhorar em mulheres que foram submetidas a cirurgia reconstrutiva após mastectomia8.

Apresentamos o caso de uma mulher de 46 anos com TF gigante borderline recorrente em mama esquerda de aproximadamente 40cm de diâmetro, submetida a ressecção ampla com mastectomia e reconstrução mamária imediata com retalho de grande dorsal (RGD) mais gordura injeção de enxerto e que teve evolução favorável após a cirurgia, sem complicações ou recidivas.

RELATO DE CASO

Paciente do sexo feminino, 46 anos, sem comorbidades, com história de mastectomia por TF em mama esquerda há 4 anos compareceu à Faculdade de Medicina, da Universidad Nacional de San Agustín de Arequipa, em Arequipa, Peru. Anteriormente, ela foi à consulta referindo reaparecimento do tumor na mama esquerda. Ao exame físico, foi observada cicatriz cirúrgica periareolar na mama esquerda, no quadrante superior externo e palpado um tumor duro, pouco móvel, com aproximadamente 8cm de diâmetro. Foi realizada biópsia, que revelou TF recorrente. Devido às restrições impostas pela pandemia de COVID-19 no Peru, perdeu-se o contato com o paciente e não foi realizado o acompanhamento correto.

Nove meses depois, a paciente procurou o prontosocorro devido ao aumento do tamanho do tumor e à presença de dor intensa na mama esquerda. Ao exame físico, a mama esquerda apresentava dor à palpação, tumoração pouco móvel de aproximadamente 40cm de diâmetro e eritema com circulação venosa colateral (Figura 1).

Figura 1 - Tumor filoide gigante da mama esquerda (seta) que ocupa todo o volume da mama esquerda e respeita o sulco mamário. Há evidências (*) de circulação colateral abundante, eritema extenso e áreas circulares difusas de coloração violácea.

Os achados encontrados no estudo ultrassonográfico foram compatíveis com a categoria BI-RADS2, descrevendo tumor vascularizado, predominantemente sólido, com margens bem definidas e focos císticos de aproximadamente 15cm. Não houve evidência de metástases à distância na ressonância magnética e na tomografia computadorizada (TC). Os resultados histopatológicos iniciais da biópsia concluíram a presença de neoplasia fibroepitelial com atipias leves, correspondendo a um TF borderline.

Devido aos achados, optou-se pela realização de mastectomia total esquerda e reconstrução mamária imediata. A mastectomia total esquerda foi realizada pelo Serviço de Oncologia Ginecológica. Inicialmente, foi realizada dissecção axilar baixa e incisão de Steward; em seguida, foi confeccionado um retalho superior tendo como limite a borda clavicular inferior, e um retalho inferior tendo como limites o sulco submamário, a borda anterior do grande dorsal e a borda esternal. Posteriormente, foi excisado o tecido tumoral da mama esquerda, dissecandose até a aponeurose do peitoral maior (Figura 2).

Figura 2 - A: Peça de mastectomia na qual o tumor está incluído. B: Mastectomia esquerda com ressecção radical do tumor filoide, evidenciando aponeurose* do peitoral maior.

Linfadenopatias de aproximadamente 2cm foram encontradas no grupo axilar I e a excisão correspondente foi realizada. As características histopatológicas da peça pós-operatória foram consistentes com um TF borderline. Supercrescimento estromal, atipia moderada, camada cambial, bordas permeativas e contagem mitótica de 5/10 por 10 campos foram evidentes. As bordas cirúrgicas eram maiores que 1mm em relação ao tumor. A pele circundante, o mamilo e os ductos terminais livres não apresentavam sinais de malignidade. Os linfonodos do grupo I não apresentavam sinais de malignidade.

A reconstrução mamária foi realizada pelo Serviço de Cirurgia Plástica. Foi realizado retalho miocutâneo pediculado de grande dorsal mais enxerto de gordura. Para obtenção do retalho miocutâneo, foi feita incisão anterior na pele até o músculo grande dorsal. Posteriormente, o músculo grande dorsal foi separado dos músculos serrátil anterior e oblíquo externo, e feita uma abordagem inferior até as inserções da crista ilíaca e finalizada com uma incisão posterior até a fáscia toracolombar sobre o músculo grande dorsal. O retalho foi elevado da posição distal para proximal para localizar o pedículo do grande dorsal (artéria toracodorsal) (Figura 3A). Foi realizada tunelização subcutânea e mobilização do retalho para a área receptora no hemitórax esquerdo. Ambas as áreas doadora e receptora foram fechadas em planos (Figura 3B).

Figura 3 - A: Na obtenção do retalho miocutâneo, valoriza-se o retalho pediculado* de grande dorsal. B: Resultados pós-operatórios imediatos.

Ao final do procedimento, foi colocado dreno Hemovac para recuperação do volume mamário e colocado enxerto de gordura. Foi infiltrada solução tumescente no abdome e realizada lipoaspiração, obtendose 300cc de enxerto de gordura, que foi colocado por via intramuscular no RGD mobilizado e na região mamária. Por fim, foram aplicadas gazes limpas e bandagens elásticas não compressivas.

Uma semana após a cirurgia, a evolução do retalho foi favorável, sem áreas de desconforto ou complicações locais ou sistêmicas. Os drenos diminuíram progressivamente para menos de 30cc de conteúdo sero-hemático e foram removidos. A alta hospitalar foi decidida e foram indicados controles ambulatoriais semanais durante um mês. Com um ano foi realizada tomografia computadorizada que não mostrou sinais de extensão da doença. Nossa paciente está atualmente em acompanhamento rigoroso, apresentando evolução favorável, sem recidiva local ou metástase à distância (Figura 4).

Figura 4 - Paciente chega à consulta após 18 dias de cirurgia, apresentando evolução adequada. A: Anterior. B: Lateral. C: Oblíqua posterior.

DISCUSSÃO

O diagnóstico precoce e o estadiamento da TF são importantes para o tratamento oportuno2. A TF está crescendo rapidamente e o atraso no tratamento pode aumentar a morbimortalidade3. Em função das restrições de confiança social devido à pandemia de COVID-19 e à mudança do atendimento exclusivo de pacientes com COVID-19 para hospitais de maior resolução, o acompanhamento e o contato dos pacientes foram perdidos, levando ao crescimento excessivo do tumor.

A base do tratamento da TF é a excisão cirúrgica5,9. Ao realizar a excisão cirúrgica, além de considerar alguns fatores como tamanho, extensão do tumor, linfonodos palpáveis e margens livres, é necessário considerar a estética para posterior reconstrução da mama afetada. A reconstrução mamária é classificada de acordo com o tipo de procedimento como RBI ou RA7. Embora o uso do RBI seja muito mais frequente, constatou-se que a RA foi associada a um melhor grau de satisfação e bem-estar sexual em comparação ao RBI, e também foi constatado que o RBI apresenta maior risco de falha reconstrutiva a longo prazo7. Portanto, em conjunto com o paciente, decidimos realizar RA em vez de RBI.

Em geral, a RA depende da anatomia da região de origem do retalho. Entre os mais utilizados estão o retalho perfurante da artéria epigástrica inferior profunda (DIEP), o RGD ou o transverso miocutâneo do reto abdominal (TRAM)7. O RGD fornece uma grande quantidade de tecido mole flexível; anatomicamente, o músculo grande dorsal está entre os maiores e mais fortes do corpo, as complicações isquêmicas do retalho são raras devido ao suprimento vascular fornecido pela artéria toracodorsal, pelas artérias intercostais perfurantes posteriores, e a artéria lombar10.

A escolha da área a ser utilizada é determinada pela constituição corporal do paciente, cirurgias anteriores e comorbidades associadas. O uso do RGD é preferido em pacientes não candidatos ao uso do TRAM, por abdominoplastia prévia, TRAM prévio ou insuficiência de pele e gordura abdominal10. No nosso caso, devido à gordura e constituição abdominal do paciente, optou-se pelo uso do RGD.

Concomitante à RA, a lipoenxertia também pode ser realizada na área11. Entre os benefícios encontrados com o uso da lipoenxertia, estão aumento de volume com resultados mais naturais e maior grau de satisfação sem necessidade de uso de próteses11,12. No contexto da reconstrução autóloga, a colocação do enxerto de gordura pode ser realizada tardiamente ou imediatamente após a transposição do retalho pediculado. Anteriormente, foi encontrado um bom ganho de volume na área após injeção imediata de enxerto de gordura durante o procedimento reconstrutivo11. No nosso caso, optou-se por realizar injeção de enxerto de gordura após mobilização do RGD.

Atualmente, poucos estudos relataram a reconstrução do TF gigante borderline usando RA e enxerto de gordura. Wang et al.13 relataram mastectomia total e ressecção de TF borderline de 30cm de diâmetro, porém não relataram reconstrução mamária. Liu et al.14 e Zhao et al.15 relataram a possível associação entre hipoglicemia e TF gigante borderline, em ambos os casos foram realizadas mastectomias radicais, porém também não relataram nenhuma reconstrução mamária. Tsuruta et al.16 informaram o uso de retalho DIEP para reconstrução mamária após mastectomia total para TF gigante, porém não relataram o uso de lipoenxertia.

A terapia adjuvante, como quimioterapia e radioterapia, não demonstrou diminuir a recorrência no TF9. A taxa de recorrência local é de 10,9%, 14,4% e 29,6% em tumores benignos, limítrofes e malignos, respectivamente9. Portanto, é razoável monitorar por pelo menos 3 anos, principalmente em pacientes com TF com margens positivas, por exame físico, ultrassonografia ou mamografia17. Em nossa paciente, foram realizados controles mensais em ambulatório e, em um ano, foi realizado controle com TC. Não houve evidência de novas massas ou tumores na área operada e foi observada evolução clínica adequada.

CONCLUSÃO

Concluindo, o TF gigante borderline recorrente é uma afecção rara. Devido às restrições impostas pela pandemia de COVID-19, o acompanhamento foi perdido e o tratamento oportuno não foi realizado. O manejo cirúrgico desses tumores é um desafio e o tratamento deve ser multidisciplinar. A reconstrução mamária utilizando RGD mais enxerto de gordura parece ser uma opção atraente para obter resultados estéticos positivos.

DECLARAÇÕES DE ÉTICA

Aprovação ética: Todos os procedimentos realizados seguiram os padrões éticos dos Princípios Éticos para Pesquisas Médicas Envolvendo Seres Humanos, contidos na Declaração de Helsinque. No presente estudo, o consentimento informado por escrito foi obtido do paciente.

Consentimento do paciente: A paciente forneceu consentimento informado por escrito para a publicação e uso de suas imagens.

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1. Universidad Nacional de San Agustín de Arequipa, Arequipa, Peru

Autor correspondente: Elizbet Susan Montes-Madariaga Urb. José Luis Bustamante y Rivero, Cerro Colorado, Arequipa, Peru. E-mail: emontesma@unsa.edu.pe

Artigo submetido: 18/10/2023.
Artigo aceito: 04/02/2024.

Conflitos de interesse: não há.

 

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