ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Articles - Year2001 - Volume16 - Issue 2

RESUMO

O tratamento das fraturas do côndilo mandibular é alvo de muita divergência entre os cirurgiões. Há casos relatados na literatura de reabsorção completa do processo condilar após fratura tratada cirurgicamente com fixação interna.
O presente trabalho tem como objetivo relatar um caso clínico de reabsorção do côndilo mandibular decorrente de fratura condilar com deslocamento que havia sido tratada por redução cruenta e osteossíntese a fio de aço em uma paciente do sexo feminino de 14 anos de idade. Para a reconstrução foi utilizado enxerto costocondral fixado com dois parafusos de 2.0 mm de diâmetro. Esse tratamento possibilitou um bom resultado funcional e estético a longo prazo.

Palavras-chave: Fratura condilar; reconstrução condilar; enxerto costocondral

ABSTRACT

The treatment of mandibular condylar fractures is a controversial issue among surgeons. Complete resorption of the condylar process after a fracture treated surgically using internal fixation has been described in the literature. The present study of a 14 year-old female patient aims to describe a case of resorption of the mandibular condyle due to a condylar fracture with displacement, which had been previously treated by surgical reduction and osteosynthesis with steel sutures. Treatment consisted of a costochondral graft fixed with two 2.0 mm diameter screws that provided adequate long-term functional and aesthetic results.

Keywords: Condylar fracture; condylar reconstruction; costochondral graft


INTRODUÇÃO

As fraturas do côndilo mandibular ainda hoje são objeto de controvérsias entre os autores. Nos casos de fratura com deslocamento, Becker(1) (1952) e Schwipper & Keutken(2)(1985) indicam redução aberta com osteossíntese do côndilo. Outros profissionais não indicam cirurgia e realizam somente o bloqueio maxilomandibular rígido por uma semana, seguido de fisioterapia elástica baseada na oclusão (Melmed(3),1972).

A cirurgia deve ser indicada sob aspectos clínicos e não radiográficos. Má oclusão associada com mordida aberta juntamente com restrição nos movimentos mandibulares são os sinais mais importantes que indicam a cirurgia. Muitas vezes encontramos fraturas de côndilo mandibular sem qualquer alteração oclusal (Markowitz(4) et al.,1989).

Em casos de reabsorção condilar ou em cirurgias para alterações degenerativas internas da articulação temporomandibular é indicada a reconstrução desta última. Este trabalho tem como objetivo apresentar um caso clínico de uma paciente que foi submetida à redução aberta de uma fratura condilar com deslocamento que evoluiu com reabsorção total do côndilo, sendo, então, realizada a reconstrução com enxerto costocondral.


CASO CLÍNICO

Paciente do sexo feminino, 14 anos de idade, vítima de queda da própria altura, tendo batido o mento no chão. Procurou o setor de Cirurgia Oral e Maxilofacial da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo com queixa de dor em região pré-auricular à esquerda e má oclusão havia 6 dias. Radiograficamente foi observada fratura condilar à esquerda com deslocamento medial do coto proximal (Fig. 1). O côndilo estava aderido ao músculo pterigoídeo lateral, com ausência de contato com o resto da mandíbula.


Fig. 1 -Tomada radiográfica de Towne em que se observa fratura de côndilo extra-capsular à esquerda, com deslocamento medial do seguimento proximal (seta).



A paciente foi submetida a uma cirurgia com redução aberta e fixação do côndilo por meio de um acesso pré-auricular. A fixação do côndilo foi realizada com fio de aço duplo (Fig. 2), seguida de bloqueio maxilomandibular rígido durante 3 semanas.


Fig. 2 -Fio de aço duplo fixando o côndilo após a redução.



Após a remoção do bloqueio maxilomandibular, a paciente iniciou um programa de fisioterapia. Quatro meses depois da cirurgia a paciente apresentou um desvio mandibular em direção ao lado afetado e má oclusão, em razão de encurtamento do ramo mandibular à esquerda (Fig. 3). A paciente foi encaminhada ao ortodontista para correção da má oclusão, porém, após 6 meses de tratamento ortodôntico, o restabelecimento da oclusão não foi obtido (Fig. 4). Ao exame radiográfico nessa época, foi observada a reabsorção completa do côndilo (Fig. 5).


Fig. 3 -Fotografia frontal da paciente em que se evidencia o desvio mandibular para à esquerda à custa do encurtamento do ramo mandibular do mesmo lado.


Fig. 4 -Mordida aberta do lado direito após tentativa de resolver a má oclusão com ortodontia.


Fig. 5 -Radiografia panorâmica de mandíbula em que se observa a presença do fio de aço com o côndilo já reabsorvido.



Um ano após a fratura e a primeira cirurgia a paciente foi reoperada, sendo realizada a reconstrução da articulação temporomandibular com enxerto costocondral e fixação deste com dois parafusos de titânio de 2 mm de diâmetro mediante um acesso submandibular (Figs. 6A e 6B), associado com a rotação de um retalho de músculo temporal para interpor-se entre o enxerto e a fossa articular. A paciente foi então submetida a fisioterapia elástica durante 30 dias após a reconstrução para o restabelecimento da oclusão (Fig. 7), tendo sido corrigida simultaneamente a simetria facial no decorrer desse período (Fig. 8).


Fig. 6a -Enxerto costocondral removido para reconstruir a articulação temporomandibular.


Fig. 6b -Tomografia computadorizada mostrando a fixação do enxerto com dois parafusos de titânio de 2.0 mm de diâmetro.


Fig. 7 -Oclusão após 30 dias da reconstrução da articulação temporomandibular do lado esquerdo e fisioterapia elástica.


Fig. 8 -Fotografia frontal da paciente 30 dias após a reconstrução, na qual verificamos o restabelecimento de simetria no terço inferior da face.



DISCUSSÃO

A discussão sobre o tratamento das fraturas de côndilo iniciou-se há 40 anos com Becker(1)(1952), indicando tratamento cirúrgico, e Thoma(5)(1955), preconizando o tratamento conservador. Melmed(3)(1972) enfatizou há 20 anos que o tratamento para estas fraturas é conservador, entretanto, Messer(6)(1972) afirma ser cirúrgico. Shwipper & Keutken(2)(1985) compararam os resultados após tratamento clínico ou cirúrgico em fraturas de côndilo com deslocamento e concluíram que a estabilidade com miniplacas é mais eficiente do que o bloqueio maxilomandibular.

Acreditamos que a cirurgia deva ser indicada nos casos em que existe má oclusão importante com deslocamento condilar. Alguns pacientes apresentam fratura condilar com deslocamento sem má oclusão associada(7).

Casos de reabsorção condilar após osteossíntese têm sido relatados na literatura (Iiza & Lindquist(8),1991). Boyne(9)(1989),publicou uma técnica de enxerto livre de côndilo mandibular, ou seja, para se obter a redução, o côndilo foi removido e posteriormente fixado em 35 pacientes, não tendo tido reabsorção pós-operatória.

Chen(10) et al. (1997) indicam enxerto costocondral em fraturas condilares agudas nas quais o côndilo apresenta-se severamente cominuto.

A reconstrução protética de côndilo mandibular tem sido realizada utilizando uma variedade de materiais (Gottlieb(11),1956; Hartwell & Hall(12),1974). Markowitz(4) et al. (1989) idealizaram uma osteotomia deslizante para reposicionar o côndilo. De acordo com estes autores o enxerto pode sofrer reabsorção ou um crescimento imprevisível. Simpson(13)(1985) reportou o uso de enxerto costocondral para a reconstrução da articulação temporomandibular em uma série de 11 pacientes, com bons resultados.

Os enxertos costocondrais são indicados para reconstruir o côndilo e para corrigir má oclusão por reabsorção nessa área, e o músculo temporal é apropriado para substituir o disco articular. Contudo, preconizamos o enxerto costocondral somente em pacientes que ainda apresentam um potencial de crescimento, pois acredita-se que a zona de cartilagem contribua para o crescimento mandibular. Em pacientes adultos, deve-se dar preferência à cortical externa da calota craniana, já que a mandíbula não vai mais crescer e trata-se de um osso essencialmente cortical, portanto, mais resistente à reabsorção quando comparado com a costela.


BIBLIOGRAFIA

1. BECKER AB. Condylar Fractures. Oral Surg. Oral Med. Oral. Pathol. 1952;5:1282-6.

2. SCHWIPPER V & KEUTKEN K. Conservative or surgical treatment of fractures of the condyle in adults. Proceedings from the 8th International Conference on Oral and Maxillofacial Surgery. Edited by E. Hjorting-Hansen. Quintessence Publ. Co. 1985,179-86.

3. MELMED EP. Fractures of the mandible. Ann. Roy. Coll. Surgeons England. 1972;50:371-81.

4. MARKOWITZ NR, ALLAN PG, DUFFY MT. Reconstruction of the mandibular condyle using ramus osteotomies. J. Oral Maxillofac. Surg. 1989,47:367-77.

5. THOMA KH. Displacement of condyle in fracture-dislocations of the mandible. Oral Surg. Oral Med. Oral Pathol. 1955;8:774-82.

6. MESSER EJ. A simplified method for fixation of the fractured mandibular condyle. J. Oral Maxillofac. Surg.1972;30:442-3.

7. MANGANELLO-SOUZA LC, VITA J, FISCHMAN R, SILVEIRA ME. Estudo de 32 casos de fraturas do côndilo mandibular. Rev. A Folha Médica. 1982;85(1):825-30.

8. IIZA T & LINDQUIST C. Severe bone resorption after miniplate fixation of high condylar fractures. Oral Surg. Oral Med. Oral. Pathol. 1991;72:400-3.

9. BOYNE PJ. Free grafting of traumatically dispaced or resected mandibular condyles. J. Oral Maxillofac. Surg. 1989;47:228-32.

10. CHEN C, LAI J, CHEN Y. Costochondral graft in acute mandibular condylar fracture. Plast. Reconstr. Surg. 1997;100:1234-9.

11. GOTTLIEB O. Temporomandibular arthroplasty. Oral Surg. 1956;9:362-6.

12. HARTWELL SW & HALL MD. Mandibular condylectomy with silicone rubber replacement. Plast. Reconstr. Surg. 1974;53:440-4.

13. SIMPSON W. The costocondral graft. Proceedings from the 8th International Conference on Oral and Maxillofacial Surgery. Edited by E. Hjorting-Hansen. Quintessence Publ. Co. 1985;531-6.










I. Coordenador científico do Setor de Cirurgia Oral e Maxilofacial do Departamento de Cirurgia da Santa Casa de São Paulo.
II. Residente em Cirurgia Oral e Maxilofacial da Santa Casa de São Paulo.

Endereço para correspondência:
Luiz Carlos Manganello-Souza
Rua Itapeva, 500 - 1º andar Cj. 1
São Paulo - SP - 01332 - 000
Fone: (11) 288 - 7168

Trabalho realizado na Faculdade de Medicina da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo

 

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