INTRODUÇÃO
Acidentes que acometem as mãos já são considerados epidemia, principalmente
acidentes de trabalho e os decorrentes da violência urbana, atingindo
diretamente a situação econômica e a qualidade de vida do indivíduo, ocasionando
com frequência o afastamento do trabalho e prejuízo ou até mesmo incapacidade
nas atividades de vida diária e atividades de vida prática. As lesões
relacionadas ao trabalho são inúmeras, provenientes de traumas como queimaduras,
eritemas, fraturas e esmagamentos1.
As mãos são mais vulneráveis a fraturas do que outras partes do corpo. Elas
constituem aproximadamente 5-20% de todas as fraturas e aproximadamente 40% de
fraturas de membros superiores. As causas subjacentes a essas lesões variam
consideravelmente de acordo com as características demográficas2.
OBJETIVO
Destaca-se o acometimento da mão por essa ser uma unidade anatômica importante na
realização de atividades cotidianas. Dessa forma, faz-se necessário um
tratamento direcionado para a recuperação funcional, o que depende da
experiência e habilidade do profissional que realizará tal procedimento para
conseguir um resultado satisfatório3.
MÉTODO
Trata-se de um estudo do tipo transversal, analítico, com abordagem quantitativa,
realizado através de uma análise retrospectiva e descritiva de uma base de dados
do Instituto Doutor José Frota (IJF), hospital terciário, localizado em
Fortaleza-CE, entre setembro de 2021 e junho de 2022, acerca das fraturas de
mão. Os sujeitos envolvidos no estudo foram os pacientes com fratura de mão
admitidos no hospital entre janeiro de 2018 e junho de 2022. O estudo foi
aprovado no Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) da referida instituição, sob o
número do parecer 5.069.371.
Os dados para caracterização epidemiológica dos pacientes foram registrados por
meio de um questionário online no formato Google
Forms, no qual havia variáveis tais como sexo, faixa etária,
procedência, mecanismo do trauma, mão e ossos acometidos.
Os dados quantitativos foram organizados em planilha no programa Microsoft Excel
2019. Foram realizadas análises estatísticas descritivas. As variáveis
categóricas foram expressas em percentual ou frequência, bem como determinação
do valor de p, teste exato de Fisher ou Qui-quadrado de
Pearson, sendo atribuído o p<0,005 como dado de relevância
estatística. Os dados estão apresentados em tabelas e gráficos.
RESULTADOS
Participaram do estudo 290 pacientes, sendo 85,7% do sexo masculino e 14,3% do
sexo feminino. Destes, 138 indivíduos tinham entre 20 e 39 anos, representando
um total de 47,6%. Dos pacientes estudados, 148 eram do interior do estado do
Ceará (51,6%) e 139 (48,4%) da capital, como representado na Tabela 1.
Tabela 1 - Características demográficas dos pacientes com fratura de mão do
Instituto Doutor José Frota.
Variáveis |
Participantes
(n)
|
Valor
(p)
|
Sexo |
|
0,002 |
Masculino |
244
(85,7%)
|
Feminino |
43
(14,3%)
|
Faixa etária |
|
|
0-19 anos |
43 (14,8%) |
20-39 anos |
138 (47,6%) |
40-59 anos |
79 (27,2%) |
Acima de 60 anos |
30 (10,3%) |
Procedência |
|
0,106 |
Fortaleza-CE |
139
(48,4%)
|
Interior do
CE
|
148
(51,6%)
|
Tabela 1 - Características demográficas dos pacientes com fratura de mão do
Instituto Doutor José Frota.
Acresça-se ainda que, de acordo com os dados estudados, o principal mecanismo de
trauma observado foi acidente de trânsito (36,4%), seguido por acidentes de
trabalho (26,9%) e ferimentos por arma de fogo (14%). Além disso, 58,8% dos
pacientes tiveram a mão esquerda acometida, bem como 38,7% a mão direita,
seguidos por 2,7% que tiveram ambas as mãos, como demonstrado na Tabela 2.
Tabela 2 - Características relacionadas ao trauma de mão dos pacientes.
Mecanismo do trauma |
Participantes (n) |
Valor (p)
|
Arma
de fogo
|
37 (14%) |
0,001 |
Arma
branca
|
19 (7,2%) |
Acidente de trânsito |
96 (36,4%) |
Acidente de trabalho |
71 (26,9%) |
Acidente doméstico |
12 (4,5%) |
Queda |
15 (5,7%) |
Outros |
14 (5,4%) |
Mão acometida |
|
|
Direita |
108 (38,7%) |
0,125 |
Esquerda |
164 (58,8%) |
Ambas |
7 (2,7%) |
Tabela 2 - Características relacionadas ao trauma de mão dos pacientes.
No que tange ao mecanismo do trauma relacionado às fraturas de mão, o principal
atribuído foram os acidentes de trânsito na maior parte das faixas etárias.
Entretanto, para a amostra entre 40 e 59 anos houve a predominância das fraturas
advindas por acidente de trabalho (Gráfico 1).
Gráfico 1 - Distribuição dos mecanismos do trauma por faixa etária.
Gráfico 1 - Distribuição dos mecanismos do trauma por faixa etária.
Em relação aos ossos fraturados, houve uma acentuada prevalência do acometimento
das falangeanas, em todas as faixas etárias, representando 210 pacientes
(72,4%). Ressalta-se, sobretudo, nos pacientes com idade entre 20 e 39 anos
(Gráfico 2).
Gráfico 2 - Distribuição dos ossos fraturados por faixa etária.
Gráfico 2 - Distribuição dos ossos fraturados por faixa etária.
Os Gráficos 3 a 6 apresentam a distribuição dos pacientes por osso
fraturado e dedo e mão acometidos.
Gráfico 3 - Distribuição dos pacientes com fratura de metacarpo por dedo e
mão acometida. MD: mão direita; ME: mão esquerda.
Gráfico 3 - Distribuição dos pacientes com fratura de metacarpo por dedo e
mão acometida. MD: mão direita; ME: mão esquerda.
Gráfico 4 - Distribuição dos pacientes com fratura de falange proximal por
dedo e mão acometida. MD: mão direita; ME: mão esquerda.
Gráfico 4 - Distribuição dos pacientes com fratura de falange proximal por
dedo e mão acometida. MD: mão direita; ME: mão esquerda.
Gráfico 5 - Distribuição dos pacientes com fratura de falange média por dedo
e mão acometida. MD: mão direita; ME: mão esquerda.
Gráfico 5 - Distribuição dos pacientes com fratura de falange média por dedo
e mão acometida. MD: mão direita; ME: mão esquerda.
Gráfico 6 - Distribuição dos pacientes com fratura de falange distal por dedo
e mão acometida. MD: mão direita; ME: mão esquerda.
Gráfico 6 - Distribuição dos pacientes com fratura de falange distal por dedo
e mão acometida. MD: mão direita; ME: mão esquerda.
DISCUSSÃO
Em meio aos membros e suas respectivas funções no organismo humano, há um que se
destaca pela grande complexidade e papéis desempenhados, como a propriedade de
transmitir e captar sensações e a realização de movimentos delicados ou que
exijam força. Essas atribuições permitem ao ser humano produzir atividades
necessárias à sua existência, como realizar atividades laborais, perceber
objetos no espaço, se comunicar, utilizar e construir aparelhos e até se
defender. Esse membro em questão é a mão, que tem como composição 27 ossos,
vários músculos, ligamentos, tendões, vasos, nervos e tecidos. Porém, é uma
estrutura comparativamente frágil, além de ser muito exposta e vulnerável a
traumatismos, que podem comprometer a sua capacidade de funcionamento4.
Nessa circunstância, o presente estudo apresentou maior prevalência de indivíduos
do sexo masculino (85,7%) em comparação com o sexo feminino (14,3%), dado que
é
concordante com o estudo Vieira et al.5, o qual apresentou prevalência do sexo masculino em
aproximadamente 92,8%, enquanto o sexo feminino foi de apenas 7,14%. Os dados
também concordam com os de Albuquerque et al.6, que descreveram 65,4% dos casos das fraturas dos dados
coletados em pacientes do sexo masculino, provenientes do interior do Ceará.
Acresça-se que os dados obtidos nesta amostra demonstram que os adultos jovens
apresentaram maior incidência [138 (47,6%)], em comparação às outras faixas
etárias, dado que converge com o estudo de Hill et al.7, que descreveram uma média de idade de 27,2
anos, além da moda de 21 e 25 anos e variação entre 1 e 93 anos de idade. Porém,
ao se comparar com Albuquerque et al.6, que analisaram o perfil epidemiológico das fraturas em
geral no Ceará, a média de idade foi de 40,7 anos, percebe-se uma pequena
diferença no perfil epidemiológico quando se compara aos dados das fraturas
específicas dos ossos da mão.
Em relação ao mecanismo de trauma, os dados colhidos referem que a maior parte
deles foi decorrente de acidentes de trânsito (36,4%), seguido de acidentes de
trabalho (26,9%) e logo após eventos relacionados com arma de fogo (14%) e arma
branca (7,2%), dados que se assemelham com outros já existentes, como os de
Vieira et al.5, que
apresentaram como principal mecanismo de trauma acidentes automobilísticos
(26,2%), seguido por acidentes de trabalho (19%). Acresça-se que os acidentes
de
trânsito também foram mais prevalentes no estudo de Fonseca et al.8, o qual obteve 17,5% de
prevalência.
Para restaurar a anatomia e função após a fratura, é necessário realizar o
tratamento, que é determinado pela apresentação da fratura, pelo grau de desvio
e pela dificuldade em se manter a redução, mas, de forma geral, a maioria das
fraturas na mão são bem manejadas com tratamento conservador9,10.
Porém, nesta pesquisa, o tratamento cirúrgico foi mais observado, em que a
osteossíntese com fios de Kirschner foi majoritariamente a mais prevalente,
realizada em 229 indivíduos (79%), seguida pela fixação interna rígida em 27
pessoas (9,3%) e amputação em 18 (6,2%). Já o tratamento conservador (4,5%),
redução incruenta/cruenta (4,1%) e enxerto ósseo (2,8%) foram menos executados.
O tratamento cirúrgico com fios de Kirschner foi utilizado na maioria dos dados
coletados, seguindo o que também foi descrito em Vieira et al.5, em que esse tratamento foi
realizado em mais de 88% dos casos.
De acordo com o Ministério da Saúde, em 2015, foram realizadas 5,9 milhões de
internações no Sistema Único de Saúde (SUS)11 na faixa de 20 a 59 anos no Brasil. Excluindo as
internações por gravidez, parto e puerpério, o sexo masculino tem maior número
de internações (51%). Esses dados vão de acordo com o obtido no atual estudo,
que demonstrou que os homens foram os indivíduos mais acometidos nos traumas
de
mão e que, a faixa etária mais prevalente estava entre 20-39 anos.
No atual estudo, os ossos mais acometidos foram os falangeanos, seguidos dos
metacarpais e, por último, os ossos do carpo. Esses dados estão de acordo com
o
estudo realizado por Jindal et al.12, no qual 75% das fraturas avaliadas envolviam falangeanos e
metacarpos; destas, os ossos mais acometidos também foram os falangeanos, com
59%.
CONCLUSÃO
O presente estudo corrobora com os dados presentes na literatura. Desse modo, é
evidenciada a repetição de um padrão de prevalência em adultos jovens do sexo
masculino, que tem como principal mecanismo de trauma acidentes de trânsito e
de
trabalho, bem como ossos acometidos nas fraturas de mão.
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4. Köchli S, Scharfenberger T, Dietz V. Coordination of bilateral
synchronous and asynchronous hand movements. Neurosci Lett.
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7. Hill C, Riaz M, Mozzam A, Brennen MD. A regional audit of hand and
wrist injuries. A study of 4873 injuries. J Hand Surg Br.
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retrospectivo. Rev Bras Ortop. 2006;41(5):181-6.
9. Henry MH. Fractures of the proximal phalanx and metacarpals in the
hand: preferred methods of stabilization. J Am Acad Orthop Surg.
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10. Meals C, Meals R. Hand fractures: a review of current treatment
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11. Brasil. Ministério da Saúde. Sistema Único de Saúde. Dados de
Morbimortalidade Masculina no Brasil. Brasília: Ministério da Saúde;
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12. Jindal R, Jindal N, Dass A. Prevalence of hand fractures: a clinical
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1. Instituto Dr. José Frota, Fortaleza, CE,
Brasil
2. Unichristus - Centro Universitário Christus,
Fortaleza, CE, Brasil
Autor correspondente: Joaquim José de Lima Silva
Rua João Adolfo Gurgel, 133, Cocó, Fortaleza, CE, Brasil, CEP: 60025-061,
E-mail: cirurgiaoplastico@joaquimjose.med.br
Artigo submetido: 17/12/2022.
Artigo aceito: 13/06/2023.
Conflitos de interesse: não há.