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Review Article - Year2023 - Volume38 - Issue 4

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2023RBCP0749-PT

RESUMO

Queloides e cicatrizes hipertróficas são lesões formadas a partir da resposta fibroproliferativa anormal ao processo de cicatrização de feridas, gerando uma proliferação excessiva do colágeno nas lesões. Geralmente, predominam em pacientes do sexo feminino e em indivíduos com tons de pele mais escuros. A abordagem terapêutica dessas cicatrizes pode ser indicada de acordo com alguns critérios, como déficit funcional, tamanho e tempo de cicatrização da ferida. Nesse sentido, o presente estudo objetivou realizar uma revisão descritiva da literatura, buscando as evidências de tratamento dos últimos cinco anos neste tema. A revisão foi realizada com base no guideline PRISMA, utilizando as bases de dados PubMed, LILACS, Cochrane Library, SCOPUS, Web of Science e Grey Literature, entre os anos de 2018 e 2022. Foram encontrados 740 artigos, dos quais 16 ensaios clínicos randomizados foram selecionados. Foi evidenciado que manejo do queloide apresenta abordagem multimodal, não havendo um padrão-ouro de tratamento, com taxa de recorrência baixa. Além disso, a terapia combinada de diferentes agentes pareceu ser superior ao uso isolado de métodos terapêuticos no tratamento dessas lesões.

Palavras-chave: Queloide; Cicatriz hipertrófica; Terapêutica; Procedimentos de cirurgia plástica; Revisão

ABSTRACT

Keloids and hypertrophic scars are lesions formed from the abnormal fibroproliferative response to the wound healing process, generating excessive collagen proliferation in the lesions. They generally predominate in female patients and individuals with darker skin tones. The therapeutic approach to these scars can be indicated according to criteria such as functional deficit, size, and wound healing time. In this sense, the present study aimed to conduct a descriptive review of the literature, seeking evidence of treatment over the last five years. The review was carried out based on the PRISMA guideline, using the databases PubMed, LILACS, Cochrane Library, SCOPUS, Web of Science, and Grey Literature between 2018 and 2022. Seven hundred forty articles were found, of which 16 randomized clinical trials were selected. It was demonstrated that keloid management presents a multimodal approach, with no gold standard of treatment with a low recurrence rate. Furthermore, combined therapy with different agents appeared superior to the isolated therapeutic methods in treating these injuries.

Keywords: Keloid; Cicatrix, hypertrophic; Therapeutics; Plastic surgery procedures; Review.


INTRODUÇÃO

Queloides e cicatrizes hipertróficas são formados a partir da proliferação excessiva do colágeno nas lesões, as quais podem ser causadas por acidentes, picada de insetos, queimaduras, vacinações, uso de adornos perfurantes, acne e infecções, com um recrutamento exagerado de fibroblastos e deposição excessiva de matriz extracelular1. Tais lesões predominam no sexo feminino, já que o estrogênio está associado a quadros mais graves, e tendem a se localizar em articulações e dobras corporais, por conta da constante distensão desses locais durante os movimentos corporais diários2.

Quanto à sua epidemiologia, pode-se afirmar que a essas lesões são mais frequentes em tons de pele mais escuros. Hochman et al.3 indicaram o fototipo III de Fitzpatrick como o mais frequente entre os pacientes com cicatrizes fibroproliferativas. Além disso, em pessoas de idade maior ou igual a 25 anos, sendo que a maioria das lesões apresentam origem traumática4. Sabe-se, também, que caucasianos são menos suscetíveis a desenvolverem queloides e cicatrizes hipertróficas, quando comparados a afro-americanos, sugerindo que mecanismos genéticos possam estar envolvidos na patogênese dessas lesões5,6.

Embora saiba-se que ambas constituem resposta fibroproliferativa anormal ao processo de cicatrização, é possível destacar algumas diferenças entre elas. O queloide invade além das bordas originais da ferida e não regride após sua formação. A cicatriz hipertrófica, por sua vez, respeita os limites prévios da lesão, forma-se e regride em um tempo mais curto e está associada à posterior contratura da ferida7,8.

O processo de formação das cicatrizes patológicas não é totalmente compreendido, sendo que alguns estudos sugerem a participação de células como fibroblastos, miofibroblastos, mastócitos e outras citocinas como o fator de necrose tumoral α e o TGF-β29,10. O crescimento anormal dessas cicatrizes é potencializado pela inflamação crônica na derme reticular, sendo que, geralmente, a cicatriz hipertrófica apresenta perda dessa inflamação dérmica, e o queloide cursa com inflamação duradoura11. Tal inflamação se comporta como um fator desencadeante de uma cascata de interleucinas que estão profundamente envolvidas no mecanismo de desenvolvimento dessas feridas, as quais podem ser alvo de tratamentos específicos12.

Dessa forma, as bases do tratamento estão apoiadas na patogênese da cicatriz hipertrófica e do queloide, podendo ser utilizadas diversas formas de abordagem, como por exemplo cirurgia, crioterapia, radioterapia, injeção intralesional (podendo ser feita com corticoide, 5-fluorouracil e verapamil) e laserterapia13. Há, ainda, uma subdivisão em terapias não invasivas, como a utilização de roupas de pressão, fisioterapia, uso de placa de silicone e extrato de cebola14.

As diferentes abordagens podem ser indicadas de acordo com alguns critérios, como o tempo de cicatrização da ferida, déficit funcional, tamanho, presença e quantidade de tecido adjacente e presença de músculo ou fáscia vascularizada abaixo do tecido15. O tratamento dessas lesões, além da questão estética, pode gerar melhora da qualidade de vida do paciente, visto que tais cicatrizes estão associadas a dor, hiperestesia e prurido, sobretudo quando se trata de queloides16.

OBJETIVO

Nesse cenário, objetivou-se realizar uma revisão descritiva da literatura buscando as evidências dos últimos cinco anos no tratamento de queloides e cicatrizes hipertróficas analisando de forma criteriosa os dados encontrados nas diferentes bases de dados acerca da abordagem destas patologias.

MÉTODO

Trata-se de uma revisão de literatura, descritiva, a partir da busca de estudos acessíveis, fazendo uso do guideline PRISMA17, adotando-se a seguinte estratégia:

1) Elaboração de uma questão de pesquisa orientadora da estratégia de busca; 2) Variedade de fontes para a localização dos estudos; 3) Definição de critérios de inclusão e exclusão e 4) Avaliação da qualidade metodológica dos artigos incluídos.

O levantamento dos artigos foi realizado em fevereiro de 2022, utilizando as bases de dados: PubMed (US National Library of Medicine/ National Institute of Health), LILACS (Centro Latino-Americano e do Caribe de informações em Ciências da Saúde), Cochrane Library, SCOPUS, Web of Science e Grey Literature, publicados entre os anos de 2018 e 2022. Utilizou-se da estratégica PICO, que representa um acrônimo para Paciente, Intervenção, Comparação e “Outcomes” (desfecho), e foi elaborada a seguinte questão orientadora: “Quais as evidências de tratamento para queloides e cicatrizes hipertróficas?”.

Procedeu-se o cruzamento dos descritores relacionados aos temas investigados após pesquisa de sinônimos utilizando as ferramentas MeSH (Medical Subject Headings) e DeCS (Descritores em Ciências da Saúde), logo, os descritores foram definidos: (“Cicatrix, Hypertrophic” OR “Cicatrices, Hypertrophic” OR “Hypertrophic Cicatrices” OR “Hypertrophic Cicatrix” OR “Scars, Hypertrophic” OR “Hypertrophic Scar” OR “Hypertrophic Scars” OR “Scar, Hypertrophic” OR “Keloid” OR “Keloids”) AND (“Therapeutics” OR “Therapeutic” OR “Therapy” OR “Therapies” OR “Treatment” OR “Treatments”).

Neste momento da busca foram empregados de forma intencional termos mais amplos, com vista a identificar uma maior quantidade de produções, evitando que algum estudo importante fosse excluído no levantamento. Após isso, foram analisados título e o resumo, respectivamente, para selecionar estudos que avaliaram a população e a intervenção de interesse. Foram removidos relatos de caso, série de casos, estudos transversais e coortes por apresentarem baixo nível de evidência. Além destes, artigos duplicados também foram excluídos, bem como os estudos que não foram redigidos em inglês, espanhol ou português.

Por conseguinte, em relação à elegibilidade, realizou-se leitura na íntegra dos artigos e foram excluídos estudo com alto risco de vieses metodológicos, utilizando-se a ferramenta Risk Of Bias 2 (RoB 2), uma ferramenta revisada para avaliar o risco de viés em estudos randomizados (Tabela 1); artigos classificados como revisões de literatura não entraram nos resultados, porém, foram utilizados na discussão. Os desfechos definidos para esta pesquisa foram: eficácia dos tipos de tratamentos isolados e combinados para queloide e cicatriz hipertrófica.

Tabela 1 - Risco de viés dos estudos.
Autor/Ano D1 D2 D3 D4 D5 Final
Hietanen et al., 2019 + + + + ! + + Baixo Risco
Hietanen et al., 2020 + + + + + + ! Algum Risco
Khalid et al., 2019 + + + ! + + - Alto Risco
Abedini et al., 2018 + + + + + +
Kim et al., 2020 + ! + + + ! D1 Processo de randomização
Aggarwal et al., 2018 + + + + + + D2 Desvios das intervenções pretendidas
Neinaa et al., 2021 + + + ! + + D3 Dados de resultado ausentes
Hewedy et al., 2022 + + + + + + D4 Mensuração dos resultados
Rasaii et al., 2019 + + + + + + D5 Seleção dos resultados
Khalid et al., 2018 + + + ! + +
Tawfic et al., 2020 + + + + + +
Ismail et al., 2021 + + + + + +
Hedayatyanfard et al., 2018 + ! + + + !
Babu et al., 2019 + + + + + +
Güngör et al., 2020 + + + ! + !
Tabela 1 - Risco de viés dos estudos.

As ferramentas que mostraram os níveis de eficácia dos tratamentos foram a Vancouver Scar Scale (VSS); Escala Analógica Visual (EAV); Escala de Avaliação Verbal (VRS) e Patient and Observer Scar Assessment Scale (POSAS) com avaliação do paciente e do profissional responsável; em alguns estudos foram feitas análises histopatológicas acerca das alterações microestruturais pré e pós-tratamento.

RESULTADOS

Tipos de estudo

Foram encontrados 740 artigos nas bases de dados pesquisadas, dos quais 15 foram selecionados, com interpretação e sintetização destes. Todos os 15 estudos eram ensaios clínicos randomizados (Figura 1).

Figura 1 - Fluxograma de seleção dos artigos.

Além disso, com relação às modalidades de tratamento dos estudos incluídos na revisão, encontram-se opções cirúrgicas com adjuvância clínica:

    • Excisão associada à radioterapia;

    • Excisão associada a corticoides.

Modalidades injetáveis intralesionais:

    • Triancinolona Acetonida (TAC);

    • 5-Fluorouracil (5-FU);

    • Verapamil;

    • Hialuronidase;

    • Toxina Botulínica Tipo A (BTX-A);

    • Plasma Rico em Plaquetas (PRP).

Opções de cobertura da cicatriz:

    • Gel de extrato de cebola;

    • Placa de silicone;

    • Pomada de Losartana;

    • Terapias com laser ou ondas de choque:

    • Laser Co2 fracionado;

    • Laser Nd-Yag;

    Extracorporeal ShockWave Therapy (ESWT).

TAC vs. 5-FU

O estudo de Hietanen et al.18 em 50 queloides, tratados em 2 grupos iguais, randomicamente divididos, com injeções intralesionais em intervalos de 3 semanas, indicou que eficácia do tratamento não diferiu significativamente entre os grupos tratados com TAC e 5-FU. A remissão do queloide foi definida clinicamente por um cirurgião plástico experiente como achatamento da lesão até o ponto em que não há mais tratamento ou injeções indicadas, e a taxa de remissão foi de 46% no grupo 5-FU e 60% no grupo TAC em 6 meses de seguimento. Além desta análise, em relação ao índice POSAS houve desfechos positivos em ambas as terapias na avaliação do paciente e do cirurgião.

Em outra oportunidade, o mesmo grupo de pesquisadores analisou a resposta histopatológica deste tratamento19. A diferença biologicamente mais relevante foi nos valores basais de miofibroblastos: o grupo de resposta apresentou mais miofibroblastos na linha de base comparado aos não respondedores, mas a diferença não foi estatisticamente significante. Porém, indicou-se que a perda de miofibroblastos ocorre no grupo de queloides que responde às terapias de injeção, mas não nos queloides que não respondem, denotando que a resposta a terapia está de fato associada com a redução de miofibroblastos nessas lesões.

Além deste, o estudo de Khalid et al.20 comparou os grupos TAC (grupo A=51) com TAC + 5-FU (grupo B=75) em queloides e cicatrizes hipertróficas, com uma injeção semanalmente por 8 semanas. Os desfechos foram avaliados em 4, 8 e 12 semanas, quanto à redução média na altura da cicatriz e recorrência da lesão, tendo como referência de sucesso a diminuição de 50% da altura da lesão.

Dos 108 pacientes que finalizaram o estudo, ambas as modalidades de tratamento apresentaram eficácia, porém, a redução média na altura da cicatriz no grupo B (5-FU + TAC) foi marcadamente melhor do que a do grupo A (TAC), com menor taxa de recorrência no acompanhamento de 22 meses. Além disso, individualizando a análise, em relação a queloides o grupo B apresentou 78% de eficácia no tratamento, resultado este estatisticamente significante superior ao grupo A; já os resultados relacionados à cicatriz hipertrófica não demonstraram diferença estatisticamente significante entre os dois grupos20.

TAC vs. verapamil

Em 50 pacientes conduzidos pelo estudo de Abedini et al.21, sendo 21 com duas ou mais lesões (queloides e/ou cicatrizes hipertróficas), tratados com injeções intralesionais de TAC ou verapamil, com aplicações a cada 3 semanas em até 6 oportunidades, objetivou-se comparar a terapêutica por meio da VSS (Vancouver Scar Scale), uma análise clínica em relação à vascularização, pigmentação e recorrência das lesões por até 1 ano. Houve diferença significativa entre as terapêuticas, os achados revelaram que o verapamil não foi eficaz na redução dos parâmetros da VSS (altura, pigmentação, flexibilidade e vascularização). Em lesões tratadas com TAC, a eficácia da terapia foi observada em todos os parâmetros da VSS a partir da semana 3, e o tempo médio de diminuição da altura e parâmetros de flexibilidade foi de 15 semanas, indicando que o verapamil não pode ser considerado alternativa adequada e eficaz em detrimento da TAC, que tem resposta terapêutica mais rápida com menos efeitos colaterais.

TAC vs. ESWT

O estudo de Kim et al.22 comparou injeções intralesionais de TAC com Extracorporeal ShockWave Therapy (ESWT) em 40 pacientes com queloides, os quais foram alocados em dois grupos. Um grupo recebeu a injeção intralesional isolada de TAC, e o outro, TAC+ESWT. Após 12 semanas do início do tratamento, foi evidenciado que os dois grupos apresentaram melhorias aceitáveis na maioria das dimensões avaliadas. No entanto, tais melhorias foram estatisticamente mais significativas no segundo grupo, apresentando redução percentual média maior no comprimento, largura e altura da lesão, bem como uma melhor pontuação na VSS, quando comparado ao primeiro (p<0,05). Ademais, na Avaliação Global do Paciente e do Investigador, foi evidenciado mais escores ≥4, indicando notas boas ou excelentes, no grupo TAC+ESWT, sem que ocorressem eventos adversos graves, sugerindo que a ESWT pode ser uma nova forma de tratamento adjuvante em queloides.

TAC vs. TAC + hialuronidase vs. verapamil vs. radiofrequência vs. TAC + radiofrequência

Neste estudo realizado por Aggarwal et al.23, 80 pacientes com queloides finalizaram o estudo e foram alocados em cinco grupos terapêuticos, tratados com: 1-TAC isolada; 2-Hialuronidase associada à TAC; 3-Verapamil; 4- Radiofrequência e 5-TAC combinada à radiofrequência. O resultado do tratamento foi avaliado mediante a escala VSS. Nesse cenário, foi evidenciado que o primeiro, o segundo e o quinto grupo obtiveram resultados similares quanto à remoção das cicatrizes, em que a taxa de depuração foi de 75%, 69% e 75%, respectivamente, sendo tratamentos eficazes para queloides. Logo, o estudo sugere que TAC, TAC com hialuronidase e radiofrequência com TAC são igualmente eficazes e que verapamil e radiofrequência isolados não são bons métodos terapêuticos para queloides.

TAC vs. BTX-A vs. PRP

Outrossim, a pesquisa elaborada por Neinaa et al.24, envolvendo 60 pacientes com queloide, comparou 3 terapêuticas isoladas de injeção intralesionais: Grupo I: Toxina Botulínica Tipo A (BTX-A); Grupo II: Plasma Rico em Plaquetas (PRP) e Grupo III: TAC. Este ensaio clínico randomizado avaliou tanto as cicatrizes quanto o VSS e a VRS antes e após o tratamento, não especificando um período exato. Foi visualizada uma melhora significativa, bem como menor expressão do gene pró-fibrótico CTGF por imuno-histoquímica nos grupos I e II, quando comparados ao III. Não houve diferença significativa entre os grupos I e II. Dessa forma, o estudo concluiu que a injeção intralesional de BTX-A e de PRP gerou melhores desfechos em tratamentos de queloides, quando comparada à injeção com TAC.

TAC vs. TAC + PRP

Em outro estudo25, as modalidades terapêuticas comparadas foram: TAC isolada ou combinada ao PRP. Foi realizado um ensaio clínico randomizado com 40 pacientes, que foram aleatoriamente distribuídos em dois grupos iguais (A e B). Ambos receberam TAC intralesional 20mg/ml por 4 sessões, com 3 semanas de intervalo. Os pacientes do grupo A receberam PRP intralesional adicional, 1 semana após as injeções de TAC. Após 3 meses de acompanhamento, ambos os grupos apresentaram melhora significativa nos parâmetros das escalas VSS e VRS. Ainda, o grupo A manifestou melhora significativa na altura, pigmentação, flexibilidade e do VSS geral, enquanto o grupo B evoluiu com incidência significativa de atrofia pós-TAC e hipopigmentação.

TAC vs. TAC + BTX-A

Por sua vez, Rasaii et al.26 compararam injeção intralesional de TAC com a BTX-A, sendo um ensaio clínico duplo cego randomizado. 23 pacientes com pelo menos 2 queloides foram alocados em 2 grupos, sendo que os participantes do grupo A receberam somente TAC, e os do grupo B, TAC associada à BTX-A. Cada queloide foi submetido à terapêutica designada, a cada quatro semanas, para um total de três sessões, avaliando os sintomas de dor e prurido, por meio da escala analógica visual, a altura das cicatrizes mediante paquímetros e pontuando-as na VSS. Ambas as modalidades geraram diminuição nos escores de altura, vascularização e flexibilidade, sem diferença significativa entre elas. No entanto, o grupo B obteve reduções significativas na dor e prurido quando comparado ao A. Dessa forma, a terapia bimodal indicou maior eficácia no cenário adjuvante.

Excisão cirúrgica + TAC + 5-FU vs. excisão cirúrgica + radiação

Khalid et al.27 realizaram um ensaio clínico randomizado com 60 pacientes portadores de queloides de orelha, os quais foram alocados em 2 grupos aleatoriamente. O grupo A recebeu tratamento com excisão cirúrgica e injeção intralesional de TAC + 5-FU. O grupo B, por sua vez, foi tratado com excisão cirúrgica e radioterapia. A eficácia no grupo A foi de 73,33%, e de 43,33% no grupo B (p=0,01), mostrando uma diferença estatística significativa entre as modalidades terapêuticas no seguimento de 6 meses. Dessa maneira, pôde-se concluir que a excisão associada a injeção de TAC + 5-FU é uma modalidade eficaz de tratamento de queloides.

Laser CO2 fracionado vs. laser ND-YAG vs. ambos

Um estudo28 comparou os lasers Nd-YAG e de CO2 fracionado entre si, bem como com a terapia combinada 2 modalidades, com bases clínicas, histopatológicas e bioquímicas. Trinta pacientes com ao menos 3 cicatrizes patológicas (queloides ou cicatrizes hipertróficas) fizeram parte do estudo, sendo que cada cicatriz de um mesmo paciente foi designada para diferentes modalidades de tratamento. Os participantes foram submetidos a 4 sessões, com intervalos entre 4-6 semanas entre elas, e a avaliação foi realizada mediante a VSS e a Observer Scar Assessment Scale (POSAS). A histopatologia avaliou quantitativamente a presença de fibras colágenas e elásticas, e a bioquímica, os níveis de fator de transformação de crescimento β I (TGF-β I) e TGF-β III por meio de estudos de ensaio imunoenzimático. Como desfecho, as cicatrizes hipertróficas obtiveram melhora mais evidente com CO2 fracionado, sendo que os queloides não apresentaram diferença significativa entre as terapêuticas. As fibras de colágeno obtiveram melhora substancial quanto à aparência e padrão, e os níveis de TGF-β I reduziram consideravelmente, enquanto os níveis de TGF-β III apresentaram elevação insignificante em todas as modalidades de tratamento. A combinação terapêutica na mesma sessão não mostrou benefício adicional substancial, e apresentou perfil maior de efeitos colaterais.

Toxina botulínica A intralesional (IL BTX-A) vs. 5-FU

Neste estudo29 foi proposta uma comparação clínica entre toxina botulínica A intralesional (IL BTX-A) e IL 5-fluorouracil (IL 5-FU) no tratamento de queloides em 50 pacientes. 22 pacientes (com 26 queloides) foram tratados com IL BTX-A mensalmente por até 6 meses e outros 22 pacientes (com 27 queloides) foram tratados com IL 5-FU semanalmente por até 6 semanas; os 6 pacientes restantes, cada um com múltiplos queloides, foram tratados com IL BTX-A para algumas lesões (8 queloides) e IL 5-FU para suas lesões restantes (8 queloides), o desfecho principal para melhora clínica foi o achatamento das lesões. Uma resposta terapêutica significativamente melhor de queloides foi detectada após IL BTX-A do que IL 5-FU (p=0,041). IL BTX-A obteve excelente e bom achatamento das lesões (58,8% e 20,6%) em comparação com (31,4% e 17,1%) após IL 5-FU. Logo, IL BTX-A mostrou ser mais eficaz, especialmente para queloides de tamanho grande, com menos efeitos colaterais do que IL 5-FU, menos dor, coceira e sem hiperpigmentação.

Losartana pomada

Hedayatyanfard et al.30 realizaram um estudo cujo objetivo foi examinar os efeitos clínicos da losartana pomada na redução da cicatriz hipertrófica e de queloides. Foi realizado um ensaio clínico randomizado, simples-cego, com 37 pacientes, os quais receberam losartana a 5% ou placebo, para o tratamento de queloides e cicatrizes hipertróficas. Desses, 30 pacientes completaram o estudo, sendo que 20 receberam losartana e 10 placebo, sendo avaliados por 6 meses de acordo com a VSS quanto aos critérios vascularidade, flexibilidade, pigmentação e altura; bem como dor e prurido nos tecidos cicatriciais. Tanto na cicatriz hipertrófica quanto no queloide, os escores VSS foram significativamente reduzidos no tratamento estipulado (p<0,01), assim como foi observado alívio da dor e prurido. Não foi observada recidiva das cicatrizes em 6 meses após o uso da losartana.

Luz intensa pulsátil (LIP) vs. folha de gel de silicone

Num ensaio clínico31 participaram 28 pacientes com 65 cicatrizes hipertróficas. Cada cicatriz foi dividida em 2 partes iguais. Metade da cicatriz foi tratada com 4 sessões de 29J/cm2 de LIP em 3 intervalos semanais. Uma folha de gel de silicone (SGS) foi aplicada sobre a outra metade e trocada em intervalos de 3 semanas. A escala de cicatrizes de Vancouver foi usada para graduar ambas as metades da cicatriz antes do tratamento, em cada visita e 3 semanas após o término do tratamento. Os resultados mostraram que cicatrizes tratadas com LIP apresentaram redução significativa na flexibilidade (p=0,002) e hiperpigmentação (p=0,0001) em relação às cicatrizes tratadas com SGS. Embora a redução percentual na altura da cicatriz tenha sido maior no grupo IPL (15,4% em comparação a 4,6% no grupo SGS), o resultado não foi estatisticamente significativo (p<0,065).

Extrato de cebola

Um estudo de 202032 buscou avaliar a eficácia do extrato de cebola Allium cepa L, alantoína e heparina associados em um gel tópico, na redução de cicatrizes após a segunda cesariana em 120 mulheres que apresentaram cicatriz hipertrófica depois da primeira cesariana. Os grupos utilizando gel e o grupo controle foram divididos em números iguais, com aplicação de gel cicatrizante tópico no pós-operatório por um período de 6 meses, e o desfecho foi avaliado de acordo com a VSS. Deste modo, reduções significativas foram observadas nos subgrupos de vascularização, pigmentação e altura do VSS para aqueles no grupo que continuou o tratamento por 24 semanas.

DISCUSSÃO

O processo de desenvolvimento da cicatriz é complexo e requer compreensão dos mecanismos moleculares que causam seu desenvolvimento e recorrências. As terapias multimodais apresentaram melhores resultados estéticos e funcionais quando corretamente indicadas.

Pode-se afirmar que a decisão pelas terapêuticas empregadas na tentativa de melhorar estética e funcionalmente as cicatrizes patológicas deve ser individualizada, considerando as peculiaridades de cada caso. Para facilitar a tomada de decisão, há a tentativa de criar algoritmos, como o APAS, que sistematizam as escolhas pelos diferentes métodos terapêuticos, combinando-os quando for necessário. Este divide o tratamento em primeira avaliação; suavização das cicatrizes; abordagem com tecnologias e injeções; e tratar a pigmentação e qualidade da pele33,34.

No presente estudo, a terapêutica clínica mais abordada foi a injeção intralesional, sendo realizada com TAC ou 5-FU de maneira isolada ou combinada com outras medidas. No geral, as terapêuticas combinadas obtiveram resultados mais significativos em relação aos aspectos estéticos e sintomáticos, quando comparadas a medidas isoladas, o que está em consonância com o estudo de uma grande revisão de literatura de 202135.

Em relação às terapias cirúrgicas de excisão da cicatriz patológica, há vários estudos prévios que indicam que a excisão isolada não gera bons resultados, com uma taxa de recorrência superior a 50%36. Por este motivo, nesta revisão os estudos que combinaram a excisão cirúrgica com terapias clínicas de injeção intralesional demonstraram resultados positivos, que reiteram as metanálises sobre o tema. Em outra metanálise que examinou o uso de TAC após a excisão de queloides da orelha, a taxa de recorrência foi de 15,4% (IC 95%, 9,4 a 24,1%; p<0,001), provando ter eficácia semelhante à radioterapia após a excisão37,38.

Em se tratando da terapêutica mediada pelo laser de CO2 fracionado, pode-se evidenciar nesse estudo que esta foi superior a outras modalidades de lasers. Correlacionando com a literatura, sabe-se que este laser está associado à melhora dos sinais e sintomas clínicos das cicatrizes patológicas, como cor, espessura e prurido das lesões. Também atua na fisiopatogenia dessas lesões, interferindo na orientação das fibras colágenas, promovendo resultados na flexibilidade e altura das cicatrizes39. Ainda, a terapia utilizando laser foi associada a menores efeitos colaterais e a melhores desfechos estéticos, caso associada à triancinolona intralesional40.

Algumas limitações devem ser consideradas. Podemos observar diferentes escalas de avaliação do desfecho: análises clínicas; topográficas; opinião do paciente e do médico responsável, entre outras. Logo, os estudos avaliam os resultados de forma heterogênea. Por conseguinte, de acordo com as metodologias analisadas, há diferentes métodos de follow-up nos estudos, considerando a contagem do desfecho com temporalidade distinta. Além disso, a metanálise não pôde ser conduzida devido à heterogeneidade entre os estudos para atender a todos os critérios de interesse. É válido ressaltar que mais pesquisas são necessárias para identificar mecanismos bioquímicos, histológicos e genéticos adicionais que impulsionam o desenvolvimento e recorrência do queloide e da cicatriz hipertrófica.

CONCLUSÃO

O manejo do queloide e da cicatriz hipertrófica continua sendo abordado de forma multimodal, sem que haja um padrão-ouro de tratamento que forneça diminuição sintomática, estética, e com taxas de recorrência consistentemente baixas. No entanto, hoje, os tratamentos combinados, tanto clínicos quanto cirúrgicos, como injeções intralesionais de 5-fluorouracil ou triancinolona, radioterapia e excisão da lesão, apresentam uma maior eficácia em detrimento das terapias isoladas. Portanto, são necessários maiores estudos neste campo, de forma a padronizar o tratamento dessas lesões, visando melhores desfechos para os pacientes.

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1. Universidade do Estado do Pará, Cirurgia Plástica, Belém, Pará, Brasil

Autor correspondente: Vinicius Fialho Teixeira Tv. Perebebuí, 2623, Marco, Belém, PA, Brasil., CEP: 66087-662, E-mail: viniciusfialhoteixeira@gmail.com

Artigo submetido: 06/08/2022.
Artigo aceito: 16/11/2022.

Conflitos de interesse: não há.

 

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