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Case Report - Year2023 - Volume38 - Issue 3

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2023RBCP0786-PT

RESUMO

Introdução: A síndrome de Binder também pode ser conhecida como displasia maxilonasal e é uma malformação congênita caracterizada por hipoplasia nasomaxilar devido a um subdesenvolvimento do esqueleto facial médio. A atual incidência ou prevalência ainda é desconhecida, mas afeta aproximadamente um recém-nascido vivo em cada 10.000 nascimentos. O diagnóstico pode ser clínico ou associado a ultrassonografia pré-natal, caracterizada por nariz achatado e convexidade anormal da maxila. O tratamento é cirúrgico para correção das anormalidades estéticas e funcionais.
Relato de Caso: Paciente que recebeu diagnóstico de síndrome de Binder aos 14 anos, sem outras malformações associadas, com queixa estética e funcional nasal. A correção cirúrgica foi iniciada pela extração de um bloco da sexta cartilagem costal à esquerda, com abertura nasal na margem columelar, no padrão de uma rinoplastia aberta, e dissecados os tecidos no plano subSMAS. Após preparo da área receptora nasal, foram esculpidos bloco de cartilagem para reconstrução do dorso nasal, enxertos alares e enxerto de cartilagem septal. Houve melhora de projeção da ponta nasal e alongamento nasal.
Conclusão: A rinoplastia pode ser uma cirurgia desafiadora nesses pacientes, sendo a reconstrução autóloga com o uso de cartilagem costal indicada pela literatura como a melhor opção. É necessário individualizar cada caso para programação de enxertos e reestruturação nasal, sendo fundamental também a melhora funcional desses casos.

Palavras-chave: Disostose craniofacial; Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos; Nariz; Cartilagem; Cartilagem costal

ABSTRACT

Introduction: Binder's syndrome can also be known as maxillonasal dysplasia and it is a congenital malformation characterized by nasomaxillary hypoplasia resulting from an underdevelopment of the middle facial skeleton. The current incidence or prevalence is still unknown, but it affects approximately one child in every 10,000 births. The diagnosis can be clinical or associated with prenatal ultrasonography, characterized by a flattened nose and abnormal maxillary convexity. The treatment is surgical to correct aesthetic and functional abnormalities.
Case Report: Patient diagnosed with Binder's syndrome at the age of 14, without other associated malformations, with aesthetic and functional nasal complaints. Surgical correction began with the extraction of a block of the sixth costal cartilage on the left, with a nasal opening on the columellar margin, in the pattern of an open rhinoplasty, and tissue dissection in the sub-SMAS plane. After preparing the nasal receptor area, a block of cartilage was sculpted for reconstruction of the nasal dorsum, alar grafts and septal cartilage grafts. There was an improvement in the projection of the nasal tip and nasal dorsum.
Conclusion: Rhinoplasty can be a challenging surgery in these patients, and the literature indicates that the best option is autologous reconstruction with costal cartilage. It is necessary to individualize each case to schedule nasal grafts and restructuring, and functional improvement in these cases is also essential.

Keywords: Craniofacial dysostosis; Reconstructive surgical procedures; Nose; Cartilage; Costal cartilage.


INTRODUÇÃO

A síndrome de Binder também pode ser conhecida como displasia maxilonasal e é uma malformação congênita caracterizada por hipoplasia nasomaxilar devido a um subdesenvolvimento do esqueleto facial médio1. Em 1962, Binder relatou três casos e seis características: (1) face arrinoide; (2) posição anormal dos ossos nasais; (3) hipoplasia intermaxilar com má oclusão consecutiva; (4) espinha nasal anterior reduzida ou ausente; (5) atrofia da mucosa nasal e (6) ausência do seio frontal (não obrigatório)1,2. A aparência fenotípica é característica, com o perfil do meio da face hipoplásico, o nariz achatado, o lábio superior convexo com filtro largo, as narinas tipicamente crescentes ou semilunares dando uma aparência de meia-lua1.

A etiologia ainda não foi completamente definida, porém sabe-se que pode estar associada a múltiplas etiologias, como ingestão materna de anticoagulantes à base de cumarina durante a gravidez, lúpus eritematoso sistêmico e algumas outras condições monogênicas, como síndrome de Keutel ou condrodisplasia punctata3.

O diagnóstico pode ser realizado na ultrassonografia pré-natal, caracterizada por nariz achatado e convexidade anormal da maxila, e, além disso, pode haver centros de ossificação epifisária anormais, membros curtos e braquitelefalangia3. O presente artigo relata o caso de uma paciente com síndrome de Binder que foi submetida a tratamento cirúrgico para melhora nasal estética e funcional.

RELATO DO CASO

Paciente feminina, 16 anos, procura o ambulatório de Cirurgia Plástica do Hospital Universitário, Faculdade de Medicina de Botucatu, em Botucatu-SP, por desejo de melhora de projeção da ponta nasal, alongamento do dorso nasal e de funcionalidade respiratória. Refere que desde a infância apresenta as queixas, porém procurou outros médicos previamente, que optaram por não realizar intervenção cirúrgica. A paciente não apresentava comorbidades ou utilização de medicações de uso contínuo, porém refere diagnóstico de síndrome de Binder aos 14 anos de idade. Nunca havia realizado nenhuma cirurgia prévia. Também não apresentava história familiar de quaisquer anomalias genéticas. O trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição.

Ao exame físico nasal, é possível observar encurtamento do dorso nasal, desvio para a esquerda, narinas de pequeno diâmetro, ponta inadequadamente projetada e alta, além do terço médio da face hipoplásico, conforme pode ser visualizado nas Figuras 1 e 2. Ao exame físico, ausência de estruturas cartilaginosas firmes em dorso e asas nasais, com colabamento completo à palpação, ausência de espinha nasal anterior à palpação e ausência de qualquer estrutura de suporte nasal. A paciente não apresentava anomalias vertebrais, em membros ou quaisquer outras alterações. Também não apresentava alterações ortodônticas significativas.

Figura 1 - Foto anterior - pré-operatório.

Figura 2 - Foto perfil - pré-operatório.

Foi realizada tomografia computadorizada dos ossos da face, que demonstrou desvio sinuoso do septo nasal, anterior para a esquerda e posterior para a direita, associado a esporão ósseo para a direita e conteúdo mucoso arredondado no seio esfenoidal à esquerda, com ausência da espinha nasal anterior, conforme evidenciado na Figura 3. Notou-se também hipoplasia maxilar e espessamento mucoso arredondado nos seios maxilares, como indica a Figura 4.

Figura 3 - Tomografia computadorizada dos ossos da face.

Figura 4 - Hipoplasia maxilar e espessamento mucoso arredondado nos seios maxilares.

Foi proposta realização de reconstrução nasal com uso de enxertos de cartilagem costal, e explicado sobre as limitações do procedimento, porém, mesmo após esclarecimento das dúvidas, a paciente optou pela realização da cirurgia, pois apresentava incômodo estético e funcional importantes de longa data. A proposta cirúrgica foi reconstrução do dorso nasal, asas nasais e septo nasal.

A correção cirúrgica foi iniciada pela extração de um bloco da sexta cartilagem costal à esquerda medindo 5x1,5cm de extensão, respeitando-se a manipulação gentil dos tecidos para evitar complicações e, após a retirada do material, realizada manobra de borracheiro para excluir presença de pneumotórax. Foi realizada abertura nasal na margem columelar, no padrão de uma rinoplastia aberta, e dissecados os tecidos no plano subSMAS.

Após preparo da área receptora nasal, foram esculpidos bloco de cartilagem para reconstrução do dorso nasal, enxertos alares e enxerto de cartilagem septal. O enxerto foi fixado no cranialmente no radix com um parafuso de titânio e caudalmente na porção mais anterior da maxila, tendo em vista a presença de espinha nasal anterior atrófica, conforme observado na Figura 5. Foi alocado um enxerto tipo strut e criação de novo domus com pontos de Prolene 5-0, com o objetivo de melhorar a projeção da ponta nasal. A sustentação nasal pode ser visualizada na foto intraoperatória na Figura 6.

Figura 5 - Reconstrução do dorso nasal, enxertos alares e enxerto de cartilagem septal.

Figura 6 - Sustentação nasal.

A paciente recebeu alta no primeiro dia pós-operatório, não apresentando intercorrências durante a internação e compareceu ao primeiro retorno ambulatorial no sexto dia pós-operatório. Foi realizada retirada dos splints e do aquaplast e o nariz apresentava ainda edema importante. Na consulta após uma semana, apresentou melhora importante do edema e da obstrução nasal. A paciente foi seguida até o momento no pós-operatório por três meses e não apresentou intercorrências nesse período, referindo melhora tanto da estética quanto da funcionalidade nasal. Foi possível observar alongamento nasal e melhor projeção da ponta, conforme pode ser visto nas Figuras 7 e 8, que indicam o pós-operatório de três meses.

Figura 7 - Foto perfil - pós-operatório.

Figura 8 - Foto anterior - pós-operatório.

DISCUSSÃO

A síndrome de Binder foi inicialmente descrita em 1962 e pode ser definida como uma malformação congênita caracterizada por hipoplasia nasomaxilar3. As características dessa síndrome incluem nariz achatado e vertical; mau posicionamento do osso nasal; hipoplasia intermaxilar com má oclusão; hipoplasia ou ausência de espinha nasal anterior; atrofia da mucosa nasal; e ausência de seios frontais2. De forma semelhante, a paciente deste relato apresentava nariz curto, com achatamento importante em sua porção dorsal, osso nasal desalinhado e desvio do septo nasal, além de hipoplasia da espinha nasal anterior.

A atual incidência ou prevalência ainda é desconhecida, mas afeta aproximadamente um recém-nascido vivo em cada 10.000 nascimentos4. Atualmente, além do exame físico, pode ser realizado o diagnóstico por meio de ultrassonografia pré-natal, a qual demonstra detecção do fenótipo Binder associado a centros de ossificação epifisária anormais e hipoplasia das falanges distais das mãos5. O diagnóstico pré-natal do fenótipo Binder por ultrassom baseia-se na observação de um perfil plano em um corte sagital mediano da face com osso nasal verticalizado, geralmente de comprimento normal, e um ângulo nasofrontal aumentado anormal6. O diagnóstico pós-natal pode ser feito com base nos resultados clínicos e radiológicos habituais7.

Pode ser isolada ou associada a múltiplas etiologias, como ingestão materna de anticoagulantes à base de cumarina durante a gravidez, lúpus eritematoso sistêmico e algumas outras condições monogênicas, como síndrome de Keutel ou condrodisplasia punctata3. No caso da paciente do presente relato de caso, não havia ingestão de medicamentos durante a gestação ou de outras condições já relatadas. Outra questão importante é que a síndrome de Binder pode estar associada a outras malformações, dentre as quais destacam-se as anomalias vertebrais1. Foi sugerido que existe um processo de indução concomitante comum tanto para a área prosencefálica quanto para as vértebras, o que justificaria a associação dessas características.

A displasia maxilonasal também pode ser combinada com outras malformações. Nos casos mais graves, a síndrome está associada ao prognatismo mandibular verdadeiro, exigindo tratamento ortodôntico e cirúrgico combinados. Pode haver prognatismo pseudomandibular ou mandibular verdadeiro com maxila hipoplásica1. No presente caso, a paciente apresentava hipoplasia maxilar com discreto prognatismo mandibular, mas não foi realizada cirurgia ortognática por desejo da paciente e sua família. Ela usou aparelho ortodôntico durante a adolescência por dois anos, mas ao buscar atendimento pela Cirurgia Plástica não estava mais em tratamento ortodôntico.

A cirurgia corretiva visa corrigir a maxila curta com má oclusão, melhorar o achatamento perialar e aumentar o nariz hipoplásico8. O tratamento ortodôntico planejado é um componente integral do protocolo9. Pacientes com características leves que se apresentam após a conclusão do crescimento facial requerem enxerto ósseo, particularmente ao redor da abertura piriforme, enquanto aqueles com deformidades graves podem precisar de cirurgia ortognática10.

A combinação de procedimentos é adaptada para cada paciente. Muitas vezes, os pacientes também precisam passar por cirurgias secundárias como procedimentos de refinamento, que podem incluir rinoplastia secundária, mentoplastia e remoção de parafusos11. O cronograma de tratamento na síndrome de Binder depende do progresso dos sintomas da oclusão facial. O tratamento cirúrgico pode ser limitado apenas para reconstrução do dorso e ápice nasal ou, adicionalmente, avanço maxilar. Enxerto para o arcabouço osteocondral do nariz pode ser realizado a partir dos 14 anos, e a osteotomia do nariz ou maxila deve ser planejada após os 18 anos12.

Na rinosseptoplastia realiza-se uma septoplastia, mantendo-se um L-strut, e coloca-se um spreader graft. As osteotomias laterais são iniciadas com fratura. Um enxerto de extensão do septo caudal é usado para permitir a projeção e rotação da ponta13. Suturas domais e um enxerto de ponta infralobular criam projeção de ponta adicional. Finalmente, as excisões da base alar e da soleira são realizadas para controlar a largura basilar e a aparência da narina13.

Em relação ao tratamento cirúrgico, diferentes materiais têm sido propostos para reconstruir a estrutura nasal, mas menos evidências dizem respeito a qual enxerto pode ser mais estável e apreciado no contorno nasal14. O uso de osso e cartilagem tem sido mencionado na literatura de acordo com a necessidade do cirurgião. Entre os enxertos - osso passível de remodelação, mas com risco de reabsorção15. A cartilagem apresenta uma taxa baixa de infecção, é fácil de moldar e tem um toque natural in-situ. No entanto, a cartilagem da costela tem uma tendência a deformar que altera a configuração do enxerto de cartilagem ao longo do tempo e as irregularidades do enxerto também podem ser visíveis através da pele15,16.

Foi observado que a cartilagem costal autóloga é mais favorável para reconstruir a estrutura nasal e recuperar a estética nasal da síndrome de Binder14. Esse foi o tratamento preconizado no presente caso, realizando ressecção da sexta cartilagem costal e o preparo dos enxertos antes do adequado posicionamento dos mesmos na estruturação nasal. Apesar do uso de enxertos de cartilagem envolvidos por fáscia ser uma opção descrita na literatura7, ainda não é um método consagrado e no presente caso optou-se por realizar uma abordagem tradicional com uso de bloco de cartilagem costal para estruturação do dorso nasal.

CONCLUSÃO

Apesar de rara, a síndrome de Binder resulta em alterações importantes na estrutura nasal, gerando queixas estéticas e funcionais dos pacientes. A rinoplastia pode ser uma cirurgia desafiadora nesses pacientes, sendo a reconstrução autóloga com o uso de cartilagem costal indicada pela literatura como a melhor opção. É necessário individualizar cada caso para programação de enxertos e reestruturação nasal, sendo fundamental também a melhora funcional desses casos.

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1. Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil

Instituição: Hospital Universitário, Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista (UNESP), Botucatu, SP, Brasil.

Autor correspondente: Oona Tomiê Daronch Rua Prof. Dr. Mauro Rodrigues de Oliveira S/N, Botucatu, SP, Brasil, CEP: 18618-688, E-mail: oona.daronch@yahoo.com.br

Artigo submetido: 01/02/2023.
Artigo aceito: 20/08/2023.

Conflitos de interesse: não há.

 

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