ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

Previous Article Next Article

Case Report - Year2022 - Volume37 - Issue 3

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2022RBCP.589-pt

RESUMO

A mastopexia é a cirurgia plástica responsável pela correção da ptose mamária, problema caracterizado pela discrepância entre o volume da mama e sua camada cutânea. As complicações mais relatadas no pós-operatório imediato são deiscência de suturas, seroma, edema e infecção, enquanto outras, como a galactorreia, são consideradas raras. O caso em questão consiste em uma paciente de 52 anos, que realizou a mastopexia bilateral com inclusão de prótese e desenvolveu após 30 dias do procedimento galactorreia com hiperprolactinemia. O diagnóstico foi suspeitado devido ao aumento de volume, associado a dor ou desconforto mamário no pós-operatório, seguido de saída secreção leitosa. A galactocele pósmastopexia com prótese pode ou não estar associada à hiperprolactinemia, porém pouco se sabe sobre a real fisiopatologia do desenvolvimento desse quadro. O tratamento foi feito com cabergolina 0,5mg em duas doses, com melhora do quadro.

Palavras-chave: Galactorreia; Mamoplastia; Hiperprolactinemia; Implante mamário; Complicações pós-operatórias

ABSTRACT

Mastopexy is the plastic surgery responsible for correcting breast ptosis, a problem characterized by a discrepancy between the volume of the breast and its skin layer. The complications most commonly reported in the immediate postoperative period are suture dehiscence, seroma, edema and infection, while others such as galactorrhea are considered rare. The case in question consists of a 52-yearold patient who underwent bilateral mastopexy with prosthesis inclusion and developed galactorrhea with hyperprolactinemia 30 days after the procedure. The diagnosis was suspected of increased volume, associated with postoperative breast pain or discomfort, followed by milky discharge. Galactocele after mastopexy with a prosthesis may or may not be associated with hyperprolactinemia, but little is known about the real pathophysiology of the development of this condition. Treatment was done with cabergoline 0.5mg in two doses, improving the condition.

Keywords: Galactorrhea; Mammoplasty; Hyperprolactinemia; Breast implants; Postoperative complications.


INTRODUÇÃO

A ptose mamária caracteriza-se por desproporção entre a pele da mama e seu conteúdo. Esta alteração tem a mastopexia como um procedimento cirúrgico que objetiva correção do problema mamário1. É comum a associação desta à flacidez e à hipomastia, o que dificulta sua abordagem cirúrgica2,3,4. Em 1969, Goulian e Conway sugeriram a colocação de próteses mamárias junto à mastopexia, visando melhor efeito estético nesses casos2. No entanto, o procedimento combinado adiciona a ocorrência de complicações relacionadas à presença da prótese às complicações relacionadas a mamoplastia em si5.

Para um melhor resultado estético, deve-se levar em conta a escolha do pedículo areolopapilar, localização do implante, tipo de ressecção glandular, o tipo de incisão e o formato de implante5,6.

As complicações mais frequentes dessa abordagem cirúrgica são recidiva da ptose, cicatrizes hipertróficas, queloides, achatamento do cone mamário, perda da sensibilidade, posicionamento inadequado ou distorções da aréola, aplainamento mamilar, infecções, hematomas, seromas e deiscências de suturas7. No entanto, alguns desfechos incomuns também podem acontecer, a exemplo da galactocele ou galactorreia8. Pouco se sabe a respeito da fisiopatologia desses resultados atípicos, mas acredita-se que se deva à manipulação do tecido mamário durante o procedimento cirúrgico8,9.

Existem poucos relatos na literatura acerca de galactorreia ou galactocele após mastopexia com colocação de implantes mamários, sendo então uma rara complicação desse procedimento8,9.

OBJETIVO

Nesse sentido, o presente estudo tem como objetivo relatar e discutir um caso de galactorreia pós-mastopexia com prótese.

RELATO DO CASO

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e apresenta CAAE de número: 40146720.7.0000.5549.

Paciente do sexo feminino, 53 anos, G2P2A0 e dois períodos de amamentação prévia, com duração de 2 anos cada. Encontra-se em tratamento de reposição hormonal, com uso de dienogeste e valerato de estradiol. Sem outras comorbidades. Ao exame físico, mamas com ausência de cicatrizes e/ou nodulações, ptosadas classificadas como grau II de Regnault.

No dia 24 de agosto de 2019, na cidade de Patos de Minas (MG), realizou mastopexia bilateral associada à inclusão de próteses 260ml, texturizadas, redondas, alta projeção da marca Motiva, com cicatriz em “T” invertido e posicionadas em plano subfascial. No mesmo procedimento, ainda foi realizada blefaroplastia. O tempo cirúrgico foi de 4h30 e a paciente recebeu alta hospitalar em 24 horas.

No pós-operatório imediato, paciente relatou dor e edema unilateral em mama esquerda. Foram prescritos cefadroxila monoidratada 500mg e celecoxibe 200mg de 12/12 horas por seis dias, dipirona 1g, vitamina C 1g efervescente e colírio de dextrano e hipromelose devido à blefaroplastia. Associada à medicação, iniciou-se também drenagem linfática manual, visando redução do edema.

Nove dias após a cirurgia, devido à manutenção dos sintomas, foi solicitada ultrassonografia das mamas, realizada em 05/09/2019. O laudo confirmou discreta coleção líquida (seroma) peri-implante em mama esquerda. Ultrassonografias de controle foram realizadas 7 e 14 dias após a primeira, confirmando ainda presença de coleção líquida em discreta quantidade, anecoide, homogênea ao redor do implante, sendo melhor identificada em quadrante superolateral da mama esquerda.

No 30º dia de pós-operatório, paciente iniciou quadro de galactorreia. Foi prescrito o medicamento cabergolina 0,5mg, um comprimido, dose única, sem melhora em uma semana. O tratamento foi repetido mais uma vez, em dose única. No entanto, continuou relatando quadro de mastalgia e edema à esquerda.

Foram solicitados exames de dosagem de hormônio folículo estimulante (FSH), TSH ultrassensível, macroprolactina e prolactina. Os resultados foram, respectivamente, 34,66mUI/mL, 3,25microUI/mL, 37,06ng/ml com percentual de recuperação de 75% e 37,1ng/ml. Assim, percebe-se alteração nos resultados da macroprolactina e prolactina, o que levou à confirmação do quadro de galactorreia devido hiperprolactinemia.

Após 15 dias do uso da segunda dose de cabergolina 0,5mg, houve interrupção da galactorreia, evoluindo para um quadro assintomático, com melhora da dor e do edema.

A ultrassonografia de controle corroborou os achados, evidenciando apenas implantes mamários de silicone sem sinais de coleção líquida peri-implante e BIRADS-2. A paciente evoluiu sem quaisquer outros sintomas.

DISCUSSÃO

Como qualquer outra abordagem cirúrgica, as mamoplastias de aumento estão sujeitas a complicações9. Todavia, as mastopexias possuem um grau de dificuldade mais elevado devido às características da pele do paciente, maior flacidez e pouca elasticidade1,10. Dentre as diferentes complicações no pós-cirúrgico de correção mamária, o quadro de galactorreia possui poucos relatos literários9.

No caso clínico apresentado, há ocorrência da secreção leitosa após o procedimento cirúrgico, além dos sintomas de dor, desconforto e aumento do volume mamário unilateral, definindo assimetria. Diferentes estudos indicam que técnicas cirúrgicas que manipulam os ductos lactíferos podem estar relacionadas com o fenômeno da galactorreia11. Para diminuir a perturbação desses ductos, alguns cirurgiões optam por uma incisão inframamária, quando não há necessidade de realizar a mastopexia9.

A galactocele nem sempre está associada à hiperprolactinemia. Quando as concentrações séricas de prolactina estão normais, a galactorreia é considerada fisiológica e transitória devido ao excessivo estímulo do tecido mamário. Pacientes submetidas a mamoplastia de aumento possuem estímulos mamilares por distensão abrupta e compressão, devido à prótese mamária, tornando-se fatores contribuintes para a secreção da prolactina12.

Quando se compreende a fisiologia da lactação, entendemos como a sulpirida e outros inibidores da dopamina que interagem nesse ciclo hormonal podem estimular a produção de leite e estar envolvidos na formação da galactocele. De modo contrário, agonistas da dopamina, como a bromocriptina e a cabergolina, entre outros, atuam inibindo a prolactina e, consequentemente, a lactação, sendo portanto, essenciais no tratamento da galactocele13.

A ocorrência de lactação é uma complicação rara da cirurgia plástica mamária. A fisiopatologia desta complicação pode estar associada a uma secreção inadequada de prolactina no contexto cirúrgico. Os fatores que favorecem essa complicação seriam o número de gestações, uma história de amamentação recente e extensa e a ingestão de certos medicamentos, como uma pílula estroprogestativa. O principal sintoma dessa complicação é a ocorrência de galactorreia unilateral ou bilateral, em média de 6 a 12 dias após a cirurgia. O principal diagnóstico diferencial é uma infecção pós-operatória.

Dependendo do caso, o tratamento pode variar entre simples vigilância à associação de agonista dopaminérgico, antibioticoterapia e revisão cirúrgica. Os agonistas dopaminérgicos são a primeira escolha, pois o acompanhamento de pacientes, a longo prazo, tem comprovado sua eficácia tanto na reversão de alterações gonadais ligadas à hiperprolactinemia como na redução dos adenomas hipofisários14,15.

A cabergolina - medicação utilizada no caso relatado - é um agonista dopaminérgico derivado do Ergot (fungo contaminante comum do centeio e outros cereais, ou pelo uso excessivo ou mal orientado de drogas derivadas da ergolina) com longa ação após administração oral, usado no tratamento da hiperprolactinemia, além de distúrbios idiopáticos, adenomas hipofisários, amenorreia, oligomenorreia, anovulação e galactorreia14.

A dose inicial recomendada de cabergolina é de 0,5mg por semana, administrada em uma ou duas doses por semana. A dose semanal deve ser aumentada gradualmente, preferencialmente adicionando 0,5mg por semana em intervalos mensais, até que a resposta terapêutica ótima seja atingida. A dose terapêutica é normalmente 1mg por semana, mas pode variar de 0,25mg a 2mg por semana. Doses de cabergolina de até 4,5mg por semana têm sido usadas em pacientes hiperprolactêmicos14. No caso relatado, a cabergolina foi utilizada na dose de 0,5mg, em duas tomadas com uma semana entre elas, totalizando 1mg.

Esse esquema terapêutico foi eficaz quanto à inibição da lactação após a mastopexia bilateral associada à inclusão de próteses no presente caso.

CONCLUSÃO

A galactocele pós-mastopexia com prótese é uma complicação rara e pode ou não estar associada à hiperprolactinemia, porém pouco se sabe sobre a real fisiopatologia do desenvolvimento desse quadro.

Ao iniciar-se um quadro de galactorreia em pós-operatório de cirurgia mamária, é mandatória a realização de dosagens hormonais para identificar o aumento da prolactina. Inibidores da lactação são utilizados como tratamento, com bons resultados e protocolos já estabelecidos. Não foi necessária a realização de procedimentos invasivos para controle e resolução do caso, apenas o uso de medicamento oral.

REFERÊNCIAS

1. Soares AB, Franco F F, Rosim ET, Renó BA, Hachmann JOPA, Guidi MC, et al. Mastopexia com uso de implantes associados a retalho de músculo peitoral maior: técnica utilizada na Disciplina de Cirurgia Plástica da Unicamp. Rev Bras Cir Plást. 2011;26(4):659-63. DOI: https://doi.org/10.1590/S1983-51752011000400021

2. Carramaschi FR, Tanaka M P. Mastopexia associada à inclusão de prótese mamária. Rev Bras Cir Plást. 2003;18(1):26-36.

3. Mansur JRB, Bozola AR. Mastopexia e aumento das mamas com proteção e suporte inferior da prótese com retalho de pedículo inferior. Rev Bras Cir Plást. 2009;24(3):304-9.

4. Moreno Gallent I, Ribera Pons M. Mastopexia y prótesis: Revisión a los 5 anos. Cir Plást Iberolatinoam. 2006;32(2):107-16.

5. Sanchéz J, Carvalho AC, Erazo P. Mastopexia com prótese: técnica em “D” espelhado. Rev Bras Cir Plást. 2008;23(3):200-6.

6. Maximiliano J, Oliveira ACP, Lorencetti E, Bombardelli J, Portinho C P, Deggerone D, et al. Mamoplastia de aumento: correlação entre o planejamento cirúrgico e as taxas de complicações pósoperatórias. Rev Bras Cir Plást. 2017;32(3):332-8.

7. Valente DS, Carvalho LA, Zanella RK. Mastopexia crescente com implantes de silicone: um estudo longitudinal prospectivo. Rev Bras Cir Plást. 2012;27(4):584-7. DOI: https://doi.org/10.1590/S1983-51752012000400019

8. Viaro MSS, Viaro PS, Batistti C. Galactocele medicamentosa pósmamoplastia de aumento: relato de caso e revisão da literatura. Rev Bras Cir Plást. 2016;31(2):287-91.

9. Ascenço ASK, Graf R, Maluf Junior I, Balbinot P, Freitas RDS. Galactorreia: como abordar essa complicação incomum após mamoplastia de aumento. Rev Bras Cir Plást. 2016;31(2):143-7.

10. Campos JH, Campos LEV. Tratamento cirúrgico da ptose mamária. Rev Bras Cir Plást. 2019;34(Suppl.3):22-4.

11. Holanda E F, Pessoa SGP, Muniz V V, Pessoa LMGP, Souza MPS, Rebelo AD. Galactorreia associada à mamoplastia pós-bariátrica: relato de caso. Rev Bras Cir Plást. 2019;34(Suppl.3):28-30.

12. Macedo JLS, Rosa SC, Naves LA, Motta LACR. Galactorreia após mastoplastia de aumento. Rev Bras Cir Plást. 2017;32(1):155-6.

13. Gomes RS. Mastopexia com retalho de pedículo superior e implante de silicone. Rev Bras Cir Plást. 2008;23(4):241-7.

14. Musolino NRC, Cunha Neto MB, Bronstein MD. Cabergolina como alternativa no tratamento clínico de prolactinomas. Experiência na intolerância/resistência à bromocriptina. Arq Bras Endocrinol Metab. 2000;44(2):139-43. DOI: https://doi.org/10.1590/S0004-27302000000200006

15. Bouhassira J, Haddad K, Burin des Roziers B, Achouche J, Cartier S. Montée laiteuse après chirurgie plastique du sein: revue de la littérature. Ann Chir Plast Esthet. 2015;60(1):54-60. DOI: https://doi.org/10.1016/j.anplas.2014.07.014











1. Centro Universitário Atenas, Paracatu, MG, Brasil.
2. Hospital Federal de Bonsucesso, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

COLABORAÇÕES

LSA Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Coleta de Dados, Metodologia, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição.

ALMAP Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Coleta de Dados, Metodologia, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição.

BMC Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Metodologia, Redação, Revisão e Edição.

MLPB Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Metodologia, Redação, Revisão e Edição.

JCPA Aprovação final do manuscrito, Redação -Preparação do original, Redação - Revisão e Edição, Supervisão.

TAF Aprovação final do manuscrito, Redação -Revisão e Edição, Supervisão.

Autor correspondente: Ludimilla Santos Araújo Rua Raul Botelho, 251, Alto do Córrego, Paracatu, MG, Brasil CEP: 38606-032 E-mail: ludinhasantos@hotmail.com

Artigo submetido: 21/05/2021.
Artigo aceito: 14/07/2021.

Conflitos de interesse: não há.

Instituição: Centro Universitário Atenas, Paracatu, MG, Brasil.

 

Previous Article Back to Top Next Article

Indexers

Licença Creative Commons All scientific articles published at www.rbcp.org.br are licensed under a Creative Commons license