ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

Previous Article Next Article

Case Report - Year2022 - Volume37 - Issue 3

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2022RBCP.539-pt

RESUMO

Introdução: A paralisia facial é um quadro que pode gerar algumas sequelas, e às vezes apenas as estéticas podem ser melhoradas. Com base nisso, objetivou-se relatar um caso em que foi utilizada uma tela de polipropileno e poliglecaprone com finalidade de elevar as estruturas da hemiface direita.
Relato de Caso: A paciente apresentava paralisia em hemiface direita, com selamento palpebral incompetente, desvio de comissura labial e sem movimento da musculatura temporal. Foi realizada uma incisão abaixo da costeleta, pré e retroauricular, com descolamento do retalho cutâneo em toda a hemiface direita. Após levantar o sistema musculoaponeurótico superficial e fixá-lo com fios de mononylon, foi colocada a tela de polipropileno e poliglecaprone na região do terço médio e fixada com monocryl. Foi realizada cantotomia e cantopexia lateral da pálpebra direita. No pós-operatório imediato a paciente evoluiu sem edemas, retrações ou abaulamentos, e após um ano e sete meses apresenta total integração da tela, sem retração, fibrose ou recidiva.
Discussão: A escolha do tratamento estético de paralisia facial depende da causa e duração da lesão, mas existem diversas formas de fazê-lo. Entre as ideias mais novas, estão o uso de células tronco e materiais aloplásticos e, seguindo essa segunda linha, a tela de polipropileno e poliglecaprone pode ser pensada como uma técnica viável, como foi neste caso relatado.

Palavras-chave: Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos; Paralisia facial; Estética; Face; Assimetria facial

ABSTRACT

Introduction: Facial paralysis is a condition that can cause some sequelae, and sometimes only aesthetics can be improved. Based on this, the objective was to report a case in which a polypropylene and poliglecaprone mesh was used in order to raise the structures of the right hemiface.
Case Report: The patient had paralysis in the right hemiface, with incompetent eyelid sealing, deviation of the labial commissure and no movement of the temporal musculature. An incision was made below the cutlet, pre and retroauricular, with detachment of the skin flap across the right hemiface. After lifting the superficial musculoaponeurotic system and fixing it with mononylon threads, the polypropylene and poliglecaprone mesh was placed in the middle third region and fixed with monocryl. Canthotomy and lateral canthopexy of the right eyelid were performed. In the immediate postoperative period, the patient evolved without edema, retraction or bulging, and after one year and seven months, she had complete integration of the mesh, with no retraction, fibrosis or recurrence.
Discussion: The choice of aesthetic treatment for facial paralysis depends on the cause and duration of the injury, but there are several ways to do it. Among the newer ideas are the use of stem cells and alloplastic materials, and following this second line, the polypropylene and poliglecaprone canvas can be thought of as a viable technique, as was reported in this case.

Keywords: Reconstructive surgical procedures; Facial paralysis; Esthetics; Face; Facial asymmetry.


INTRODUÇÃO

A paralisia facial apresenta uma vasta gama de etiologias e pode decorrer de lesões no nervo facial e, dependendo do nível dessa lesão, ocorrem alterações nos músculos da mímica facial. Geralmente, é um fenômeno reversível, seja de forma espontânea, ou por meio de tratamento clínico ou cirúrgico. Mesmo assim, cerca de 20% dos casos evoluem com algum tipo de sequela, variando do grau leve até paralisia completa dos movimentos dos músculos faciais1,2.

O tratamento vai depender de algumas variantes, principalmente o tempo, local e mecanismo de lesão. Para as lesões precoces, pode-se tentar reanimar a musculatura mímica através de neuroanastomoses ou reparos do nervo, por exemplo, enquanto, nas paralisias tardias, pode-se tentar suspensão dinâmica com retalho muscular, ou estática quando a função mímica não é recuperada, apenas a estética3.

Dentro do campo da cirurgia, a tela de polipropileno e poliglecaprone, comercialmente chamada de ULTRAPRO® (Figura 1), que é parcialmente absorvível, tem um espaço interessante, e é requisitada principalmente diante de situações de correção de hérnia abdominal. Ela gera fibrose do tecido, dando sustentação, mas ao mesmo tempo estimula uma cicatriz flexível e promove elasticidade multidirecional, oferecendo à parede abdominal dinâmica e fisiologia normais4.

Figura 1 - Tela de ULTRAPRO® (composta de polipropileno e poliglecaprone).

OBJETIVO

Assim, esse trabalho tem como objetivo trazer um relato de caso, no Hospital das Clínicas de Recife-PE, no qual a tela de polipropileno e poliglecaprone foi usada para tratamento de sequela estética de uma paciente com paralisia facial, tendo como função a elevação das estruturas da hemiface direita.

RELATO DO CASO

S.R.S., feminino, 55 anos, apresenta paralisia facial de etiologia desconhecida há aproximadamente 27 anos, já tendo realizado outra cirurgia na tentativa de correção da paralisia em outro centro, mas não obteve resultados satisfatórios. Ao exame físico inicial - junho de 2016 - (Figura 2), apresentava selamento palpebral incompetente, com esclero show, desvio de comissura labial, e não tinha movimentos da musculatura temporal direita. Após avaliação do serviço de neurologia, optouse por corrigir a assimetria por meio de lifting facial com a elevação da musculatura e fixação de toda estrutura de hemiface com a tela de ULTRAPRO®, devido a sua característica de sustentação associada a flexibilidade e elasticidade.

Figura 2 - Paciente no exame físico inicial, com esclero show, desvio de comissura labial, e sem movimentos da musculatura temporal direita.

Durante a cirurgia - maio de 2017, com a paciente em decúbito dorsal e sob anestesia geral, foi realizada a marcação com o verde brilhante utilizando um compasso, e em seguida iniciou-se com uma incisão abaixo da costeleta, pré e retroauricular com descolamento de retalho cutâneo em toda hemiface direita. Após o levantamento do sistema músculo aponeurótico superficial (SMAS) e sua fixação com fios de mononylon (Figura 3), foi colocada a tela ULTRAPRO® em região de terço médio da hemiface direita (Figura 4). A tela foi fixada com monocryl sobre o SMAS.

Figura 3 - SMAS levantados e fixados com fios de mononylon.

Figura 4 - Tela ULTRAPRO® colocada em região de terço médio da hemiface direita e fixada com monocryl sobre o SMAS.

Como complemento, foram realizadas cantotomia e cantopexia lateral da pálpebra direita. Na hemiface esquerda foi realizada a mesma incisão abaixo da costeleta pré e retroauricular, sobre marcação prévia com descolamento de retalho cutâneo e tratamento do SMAS. Realizada a suspensão da cauda do supercílio esquerdo conforme a técnica de Castanares. Após a revisão da hemostasia, foi realizada sutura por planos. Foram introduzidos drenos tubulares em ambas as hemifaces.

No pós-operatório imediato a paciente evoluiu sem edema, retrações ou abaulamentos. Após um ano e oito meses do ato cirúrgico, apresenta total integração da tela, permanecendo com a fixação da musculatura na sua nova localização, não apresentando fibrose nem recidiva da flacidez (Figura 5).

Figura 5 - A: Paciente em consulta inicial, antes do procedimento; B: Paciente em 1 ano e 8 meses de pós-operatório.

DISCUSSÃO

A paralisia facial é um distúrbio que envolve os nervos da região da face, a etiologia é bastante ampla, com mais de 75 causas descritas, como congênita, idiopática, traumática e tumoral. Porém, o diagnóstico etiológico muitas vezes é difícil de ser dado, aumentando, assim, a casuística idiopática, que é conhecida como paralisia de Bell5.

Para o tratamento cirúrgico, deve-se informar as vantagens e desvantagens de cada proposta, informando que não é possível restabelecer os movimentos voluntários suficientes para restaurar a mímica facial6.

A escolha do tratamento vai depender ainda da causa e da duração da lesão7. Numerosas técnicas já foram descritas para melhorar a função e aparência consequente às lesões do nervo facial, como a reconstrução imediata por sutura direta, indireta ou pela interposição de enxertos nervosos8. Nesses casos, tentase recuperar a função nervosa por meio da neurorrafia, como relatado por Viterbo et al.9 em diversos casos.

Outra forma, mais recente, de tentativa de recuperação nervosa é com o uso das células tronco, como já vem sendo estudado há algum tempo. Essas células devem agir na regeneração nervosa10.

Nas paralisias de longa duração, a suspensão estática é o tratamento cirúrgico mais simples. Em 1934, foi descrito por Gillies11 o uso da transposição do músculo temporal para a reanimação facial, que apresenta bons resultados, mas impraticável com a paciente em questão.

Algumas novas técnicas estáticas para a correção da paralisia de longa duração continuam sendo propostas, muitas com materiais aloplásticos, como apresentado por Alam12, em que foi usado “Gore-tex strip”, com boa resposta estética, principalmente ao analisar o sulco nasolabial.

Seguindo o uso de novos materiais, a utilização de tela de ULTRAPRO® pode ser pensada como uma técnica viável, como foi para este caso. A característica principal de gerar fibrose do tecido, dando sustentação e ao mesmo tempo com uma cicatriz flexível elástica, motivou a escolha para esse produto, que fez com que o resultado da suspensão, pela tração do SMAS, se mantivesse mesmo após a absorção da tela4.

Pode-se concluir, portanto, que a utilização da tela de polipropileno e poliglecaprone é capaz de corrigir a flacidez muscular consequente à paralisia facial e manter o seu resultado cirúrgico, sem apresentar deformidades na pele, mesmo com a tela colocada no subcutâneo, não causando retração.

REFERÊNCIAS

1. Vlastou C. Facial paralysis. Microsurgery. 2006;26(4):278-87. PMID: 16628742 DOI: https://doi.org/10.1002/micr.20240

2. Lazarini PR, Fouquet ML. Paralisia facial: avaliação, tratamento e reabilitação. São Paulo: Lovise; 2006.

3. Brown S, Isaacson B, Kutz W, Barnett S, Rozen SM. Facial Nerve Trauma: Clinical Evaluation and Management Strategies. Plast Reconstr Surg. 2019;143(5):1498-512. DOI: 10.1097/ PRS.0000000000005572 PMID: 30807496 DOI: https://doi.org/10.1097/PRS.0000000000005572

4. Utrabo CAL, Czeczko NG, Busato CR, Montemór-Netto MR, Lipinski L, Malafaia O. Estudo tensiométrico de telas utilizadas na correção de defeito na parede abdominal ventral de ratos. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2017;30(3):165-8. DOI: 10.1590/0102- 6720201700030001

5. Balogh B, Frühwald F, Millesi W, Millesi H, Firbas W. Sonoanatomy of the muscles of facial expression. Surg Radiol Anat. 1988;10(2):101-6. PMID: 3135614 DOI: https://doi.org/10.1007/BF02307817

6. Medina HS, Ramalho R, Biscotto R, Chveid M. Tela de Prolene - Utilização em Reconstruções de Cabeça e Pescoço. Rev Bras Cir Plást.1997;12(1):7-16.

7. Gur E, Kedar DJ, Zaretski A, Arad E, Meilik B, Yanko R, et al. Facial nerve paralysis - therapeutic approach, facial reanimation and adjunctive treatment. Harefuah. 2020;159(8):612-7. PMID: 32852164

8. Batista KT, Cauhi AF. Reabilitação Cirúrgica da Face Paralisada. Rev Bras Cir Plást. 2007;22(4):253-60.

9. Viterbo F, Romão A, Brock RS, Joethy J. Facial reanimation utilizing combined orthodromic temporalis muscle flap and end-to-side cross-face nerve grafts. Aesthetic Plast Surg. 2014;38(4):788-95. PMID: 24943646 DOI: https://doi.org/10.1007/s00266-014-0357-8

10. Wang TV, Delaney S, Pepper JP. Current state of stem cellmediated therapies for facial nerve injury. Curr Opin Otolaryngol Head Neck Surg. 2016;24(4):285-93. PMID: 27379549 DOI: https://doi.org/10.1097/MOO.0000000000000292

11. Baker DC. Facial paralysis. In: McCarthy JG, ed. Plastic Surgery. Philadelphia: W. B. Saunders; 1990. p. 2237-319.

12. Alam D. Rehabilitation of long-standing facial nerve paralysis with percutaneous suture-based slings. Arch Facial Plast Surg. 2007;9(3):205-9. PMID: 17515497 DOI: https://doi.org/10.1001/archfaci.9.3.205











1. Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil.
2. Universidade de Pernambuco, Faculdade de Ciências Médicas, Recife, PE, Brasil.
3. Universidade Federal de Pernambuco, Faculdade de Medicina, Recife, PE, Brasil.

COLABORAÇÕES

PCCP Análise e/ou interpretação dos dados, Análise estatística, Aprovação final do manuscrito, Aquisição de financiamento, Coleta de Dados, Conceitualização, Concepção e desenho do estudo, Gerenciamento de Recursos, Gerenciamento do Projeto, Investigação, Metodologia, Realização das operações e/ou experimentos, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição, Software, Supervisão, Validação, Visualização.

RXBM Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Concepção e desenho do estudo, Gerenciamento do Projeto, Investigação, Metodologia, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição, Validação, Visualização.

MFB Análise e/ou interpretação dos dados, Análise estatística, Aprovação final do manuscrito, Aquisição de financiamento, Coleta de Dados, Conceitualização, Concepção e desenho do estudo, Investigação, Metodologia, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição.

EALC Análise e/ou interpretação dos dados, Análise estatística, Aprovação final do manuscrito, Coleta de Dados, Conceitualização, Gerenciamento de Recursos, Gerenciamento do Projeto, Investigação, Realização das operações e/ ou experimentos, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição, Software, Visualização.

CSCA Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Coleta de Dados, Conceitualização, Gerenciamento de Recursos, Investigação, Metodologia, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição, Validação, Visualização.

KWMC Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Conceitualização, Redação - Revisão e Edição, Visualização.

VLLS Análise e/ou interpretação dos dados, Aprovação final do manuscrito, Conceitualização, Redação - Revisão e Edição, Supervisão, Visualização.

Autor correspondente: Pedro Celso de Castro Pita Praça Miguel de Cervantes, nº 60, sala 301, Ilha do Leite, Recife, PE, Brasil CEP: 50070-520 E-mail: pedro.pitta@hotmail.com

Artigo submetido: 10/03/2021.
Artigo aceito: 14/07/2021.

Conflitos de interesse: não há.

Instituição: Universidade Federal de Pernambuco, Hospital das Clínicas, Recife, PE, Brasil.

 

Previous Article Back to Top Next Article

Indexers

Licença Creative Commons All scientific articles published at www.rbcp.org.br are licensed under a Creative Commons license