INTRODUÇÃO
O pênis é uma importante estrutura do corpo masculino, e danos a sua anatomia são
sempre dramáticos, não apenas funcionalmente, mas também psicologicamente para o paciente.
Dentre as lesões que podem acometer o pênis e sua cobertura, estão as deformidades
congênitas, as doenças inflamatórias, infecções, linfedema, lesões traumáticas e iatrogenicamente
devido a tumores benignos, malignos e, como neste caso, radiodermatites. Os casos
em que se faz necessário realizar a excisão ampla da cobertura peniana são um grande
desafio quanto à reconstrução da região afetada, muitas vezes necessitando do uso
de enxertos de pele e retalhos. Por isso, para tais procedimentos são necessários
conhecimentos anatômicos, fisiológicos e cirúrgicos específicos para um tratamento
adequado1,2.
RELATO DE CASO
Paciente masculino, 78 anos, teve diagnóstico de câncer de pênis há 40 anos, tendo
como tratamento à época a radioterapia. Relata que, há cerca de 1 ano, iniciaram lesões
ulceradas circundando toda a pele peniana. Como hipóteses diagnósticas, foram levantadas
recidiva de tumor prévio, CEC e radiodermatite, cuja biópsia realizada foi inconclusiva.
Por se tratar de uma lesão extensa e sequela de radioterapia, foi feita a opção do
retalho miocutâneo do músculo cremaster para a reconstrução.
No momento intraoperatório (31 de novembro de 2019), foi ressecada toda a cobertura
peniana (Figura 1) e a lesão (Figura 2), a qual foi encaminhada para a biópsia de congelação. Em seguida, a fim de reconstruir
a cobertura peniana (Figura 3), foi realizada uma incisão de 4cm na raiz ventral do pênis, seguida da confecção
de um túnel na bolsa escrotal. Para este, descolou-se, por baixo do músculo cremaster,
uma região de aproximadamente 5cm, cuja irrigação se fez pelos pedículos laterais
direito e esquerdo. Foi realizada a inserção do pênis por dentro do túnel, com saída
da glande através de uma incisão de 3cm na bolsa escrotal, 5cm após a entrada (Figura 4), resultando assim em uma nova estruturação para o corpo peniano, sendo o retalho
modelado na forma cilíndrica.
Figura 1 - Lesão ulcerada em pênis.
Figura 1 - Lesão ulcerada em pênis.
Figura 2 - Ressecção da lesão.
Figura 2 - Ressecção da lesão.
Figura 3 - Pênis desenluvado.
Figura 3 - Pênis desenluvado.
Figura 4 - Inserção peniana no túnel.
Figura 4 - Inserção peniana no túnel.
O pós-operatório seguiu sem complicações, evoluiu com boa permeabilidade do canal
uretral, retalhos bem irrigados, ausência de fibrose ou retração cicatricial A biópsia
não evidenciou malignidade em nenhum local da lesão (Figura 5).
Figura 5 - Aspecto final.
Figura 5 - Aspecto final.
DISCUSSÃO
Diversas técnicas estão descritas para reconstruir a cobertura cutânea do pênis, sendo
o mais comum o uso de enxertos de pele total para reconstrução parcial3,4, com bons resultados estéticos e funcionais. Para lesões grandes, são utilizadas
técnicas com retalhos fasciocutâneos da região medial das coxas, descrita por Hirschowitz
em 19824, retalho escrotal (retalho de dartos) descrito por Goodwin e Thelen, em 19505, usado para perdas cutâneas parciais da genitália, retalho prepucial6, e retalhos miocutâneos do músculo reto abdominal, fáscia lata e o grácilis7.
Foi realizada uma revisão bibliográfica sobre o tema, com buscas nas bases de dados
SciELO, PubMed e na Revista Brasileira de Cirurgia Plástica, com o uso dos seguintes
descritores: Pênis; Escroto; Procedimentos cirúrgicos urogenitais; Procedimentos Cirúrgicos
Reconstrutivos; Retalhos cirúrgicos. Não foi encontrado nenhum relato na literatura
da técnica realizada. Porém, uma técnica foi descrita com implantação do pênis desenluvado
em um túnel subcutâneo entre a derme e a fáscia de dartos feito por meio de retalhos
cutâneos escrotais8, em um segundo tempo é realizada a liberação dos pedículos do retalho utilizado;
a cobertura do penis é realizada apenas com a pele do saco escrotal9,10. A técnica utilizada neste trabalho usou um retalho miocutâneo bipediculado do músculo
cremaster com a pele da bolsa escrotal para realizar o túnel, por ser mais irrigado
e provocar menos retração cicatricial para cobrir uma área com sequela de radioterapia.
Pelo fato do paciente ter 78 anos e outras comorbidades, optou-se por não realizar
o segundo tempo cirúrgico, que seria a liberação dos pedículos laterais, com a liberação
de região ventral do pênis.
CONCLUSÃO
Apesar das diversas técnicas já descritas na literatura, a reconstrução de pênis e
de sua cobertura continua sendo um desafio funcional, anatômico e estético, devido
ao fato de ser uma área com características únicas do corpo, tal como elasticidade,
sensibilidade e textura.
O retalho miocutâneo de pele e cremaster mostrou-se uma boa opção para reconstrução
total da cobertura cutânea peniana, conseguindo prover uma boa vascularização e mantendo
a permeabilidade uretral.
REFERÊNCIAS
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2011;13(3):391-4. PMID: 21540867 DOI: https://doi.org/10.1038/aja.2011.29
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PMID: 23905942 DOI: https://doi.org/10.1016/j.ucl.2013.04.004
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5. Goodwin WE, Thelen HM. Plastic reconstruction of penile skin; implantation of the
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skin loss: A simple flap with an immense potential. Surg Sci. 2014;5(1):6-9. DOI:
https://doi.org/10.4236/ss.2014.51002
7. Bergamo JMO, Silva LD, Correa JHS, Dinali AC, Gallardo CMH, Gomes JRP. Reconstrução
de pênis após desenluvamento traumático com retalho prepucial em espiral: uma nova
abordagem. Rev Bras Cir Plást. 2018;33(Suppl.2):58-60. DOI: https://doi.org/10.5935/2177-1235.2018RBCP0124
8. Barreira MA, Lima LO, Alves Júnior JJ, Silva LFG, Lima MVA. Experiência do Hospital
Haroldo Juaçaba com Reconstrução Utilizando Retalhos Miocutâneos em Cirurgia para
Tratamento do Câncer de Pênis locorregionalmente Avançado. Rev Bras Cancerol. 2014;60(1):43-50.
DOI: https://doi.org/10.32635/21769745.RBC.2014v60n1.494
9. Guo L, Zhang M, Zeng J, Liang P, Zhang P, Huang X. Utilities of scrotal flap for reconstruction
of penile skin defects after severe burn injury. Int Urol Nephrol. 2017;49(9):1593-603.
PMID: 28589215 DOI: https://doi.org/10.1007/s11255-017-1635-6
10. Ziylan O, Acar Ö, Özden BC, Tefik T, Dönmez Mİ, Oktar T. A practical approach for
the correction of iatrogenic penile skin loss in children: Scrotal embedding technique.
Turk J Urol. 2015;41(4):235-8. PMID: 26623155 DOI: https://doi.org/10.5152/tud.2015.17048
1. Hospital Esperança, Recife, PE, Brasil
2. Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil
3. Universidade de Pernambuco, Recife, PE, Brasil
Autor correspondente: Pedro Celso de Castro Pita Praça Miguel de Cervantes, n°60, Sala 301, Ilha do leite Recife, PE, Brasil, CEP:
50070-520, E-mail: pedro.pitta@hotmail.com
Artigo submetido: 12/02/2021.
Artigo aceito: 19/04/2021.
Conflitos de interesse: não há.