INTRODUÇÃO
O Brasil foi o país que mais realizou cirurgias estéticas no ano de
2018, com um total de 1.498.327 procedimentos. Liderando a tabela, a mastoplastia
de
aumento aparece como responsável por 18,4% deste total, o que corresponde a
275.283 cirurgias1. Fica evidente a
necessidade de aprendizado desta área da cirurgia plástica durante a
residência. O ensino deste tipo de procedimento não se limita apenas
à questão de inserção no mercado de trabalho, mas
há também ao treinamento da relação
médico-paciente, evoluindo a capacidade de comunicação
interpessoal, que é fundamental na prática da especialidade2.
O tratamento reparador ainda deve ser o principal pilar da formação do
residente, especialmente por ser normativa a realização de apenas 15%
de cirurgias estéticas ao longo da formação do
especialista3. O sistema
único de saúde (SUS) oferece diversos tratamentos que envolvem
cirurgia plástica, como oncologia, microcirurgia, traumas, cirurgia
após perdas ponderais massivas, tratamento de lipodistrofia secundária
à terapia antirretroviral, entre outros. Todas essas subespecialidades fazem
parte da formação do cirurgião plástico, conforme
orientações da Comissão Nacional de Residência
Médica de 20194.
As técnicas de mastoplastia de aumento não se limitam exclusivamente ao
uso das próteses mamárias. A lipoenxertia ganhou espaço, com
estudos avançados quanto sua coleta, preparo e aplicação,
além de poder ser realizada de forma isolada ou associada aos implantes de
silicone5,6.
A indicação correta das técnicas e mesmo dos tipos de implantes
disponíveis exige exame físico detalhado, visando adequar as
próteses à estrutura anatômica e perfil das pacientes7. Cabe destacar a importância
da avaliação clínica, especialmente à distância
fúrcula-mamilo entre 17 e 21cm, assim como a prega de envelope cutâneo
maior que 2cm, que pode indicar a necessidade de um plano submuscular8.
A literatura é variável no que concerne ao que se considera um aumento
adequado do tamanho da mama, variando entre as diversas culturas e épocas o
que seria a mama de tamanho ou formato ideal. Encontramos algumas tentativas sobre
o
que seria a descrição da mama com melhor forma e volume, porém
sem uma fórmula concreta7,9. O mesmo pode se dizer sobre a
técnica, visto que diferentes autores apresentam preferências quanto a
vias de acesso - inframamária, periareolar e transaxilar -, planos de
dissecção - subfascial, “dual plane”
(submuscular) e subglandular -, e tipos de silicone - macro e microtexturizados,
entre outros8,10.
Portanto, a correta indicação e o conhecimento dos arsenais
disponíveis são ferramentas valiosas para os residentes.
OBJETIVOS
Neste artigo, objetivamos apresentar um levantamento de mastoplastia de aumento
primária realizadas por alunos do primeiro e segundo ano de cirurgia
plástica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu
nos últimos quatro anos e discutir o ensino deste tipo de cirurgia no
âmbito da residência médica.
MÉTODOS
Foram revisados os prontuários de pacientes submetidas à mastoplastia
de aumento primária por residentes do primeiro e segundo ano de Cirurgia
Plástica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu
da Universidade Estadual Paulista (HC FMB UNESP) nos últimos 4 anos -
período de janeiro de 2017 a março de 2020.
Previamente às cirurgias, todas as pacientes foram submetidas à
assinatura de termo de consentimento livre e esclarecido, incluindo riscos inerentes
ao procedimento anestésico- cirúrgico e específicos da
mastoplastia de aumento. O trabalho está de acordo com as
recomendações do comitê de ética em pesquisa (CEP) do HC
FMB UNESP, sendo aprovado sob o parecer número 4.480.923.
Rotina ambulatorial e programação cirúrgica
Foram selecionadas as pacientes que são acompanhadas no ambulatório
de cirurgia plástica estética, com entrada via Anexo I do Sistema
Único de Saúde com queixa de hipomastia. Todas passam por triagem,
sendo excluídos casos de índice de massa corpórea (IMC)
maior que 28 ou menor que 16, além de tabagistas e doenças do
colágeno ou comorbidades que inviabilizem a realização de
cirurgia sob anestesia geral. Após esta fase, as pacientes passam em uma
consulta chamada de “Caso Novo Estética”, onde passam por
anamnese completa e exame físico detalhado, seguido por planejamento
cirúrgico com escolha de ao menos dois volumes diferentes de implantes a
serem selecionados no dia da cirurgia de acordo com tamanho da loja criada e
decisão conjunta no momento das marcações.
Todas as pacientes são reavaliadas na véspera ou no dia do
procedimento, quando se rediscute o planejamento cirúrgico e se realizam
as marcações dos pontos de referências, limites da mama e
local da incisão com caneta dermográfica.
Após as cirurgias, as pacientes eram orientadas a fazer
utilização de sutiã cirúrgico por pelo menos 30 dias
de forma ininterrupta e ao menos mais 30 dias durante a noite.
Técnica cirúrgica
Neste tópico, houve pouca variação em relação
a materiais, sendo utilizados afastadores iluminados de tamanhos, formatos e
marcas diferentes, bem como os fios de sutura variaram entre mononylon, monocryl
e polidioxanona, assim como os métodos de curativo, com micropore, rayon
e fita adesivas. Durante a implantação, sempre ocorria troca de
luvas e limpeza das mesmas com soro fisiológico 0,9%, antes da
manipulação do implante. Em geral, todas as pacientes eram
posicionadas em mesas com capacidade de dorsiflexão para
avaliação de simetria após a implantação das
próteses.
Critérios de inclusão
Todas as pacientes adultas submetidas à mastoplastia de aumento
primária, de indicação estritamente estética, cujos
procedimentos foram realizados por um residente do primeiro ou segundo ano como
cirurgião principal.
Entre os prontuários selecionados, algumas pacientes foram submetidas a
outros procedimentos no mesmo tempo cirúrgico, como:
lipoaspiração, lipoenxertia glútea, rinoplastia,
abdominoplastia, redução de papila e revisão de outras
cicatrizes.
Critérios de exclusão
Como critério de exclusão de prontuários, não
incluímos pacientes com deformidades torácicas congênitas
ou adquiridas, pós-bariátricas, ou necessidade de pexia ou alguma
forma de ressecção cutânea.
Análise de dados
Realizada análise estatística descritiva, com análise de
variância para cálculo da média e desvio-padrão
referentes ao volume, segundo a posição do implante; teste do
qui-quadrado para avaliação das complicações; e
teste de Goodman para comparação do perfil do implante e sua
posição.
Tabela 1 - Média e desvio-padrão referentes ao volume segundo
posição do implante.
Posição x Volume do implante (ml) |
Subfascial |
“Dual plane”
(submuscular)
|
Subglandular |
p1 |
Média |
333,3 |
308,1 |
325,2 |
0,08 |
DP |
36,1 |
37,9 |
44,2 |
|
Tabela 1 - Média e desvio-padrão referentes ao volume segundo
posição do implante.
RESULTADOS
Pacientes
120 pacientes foram identificadas neste período de 4 anos (janeiro de 2017
a julho de 2020), com idade de 19 a 47 anos - média de 28,6 anos.
O IMC variou de 16,9 a 26,2 - média de 21,73, sendo que em 26 pacientes
não foi possível calcular de forma retrógrada o IMC a
época da cirurgia.
Sete pacientes apresentavam hipotireoidismo, uma paciente era hipertensa e outra
tinha hiperplasia adrenal congênita, porém todas mantinham
adequado controle clínico no ato da cirurgia e tinham seguimento
especializado e regular das respectivas comorbidades.
Implantes
Todas as cirurgias realizadas foram bilaterais e tiveram a base redonda como
implante de eleição, bem como compartilhavam o mesmo fabricante -
Silimed®. Apenas uma paciente recebeu o implante do tipo
poliuretano, sendo todas as demais próteses texturizadas.
O volume dos implantes variou de 270 a 445ml, com média de 327,25ml,
conforme a Tabela 1. A maior
diferença entre os lados direito e esquerdo foi de 85ml, sendo que em 10
casos foram utilizados implantes de tamanhos diferentes.
Houve predomínio de implantes de projeção alta 75% (90/120),
seguidos pelos implantes médios 14% (17/120) e extra-altos 10,8%
(13/120). Nenhuma paciente recebeu implantes de baixa projeção. A
Figura 1 apresenta a
distribuição destes dados e sua relação com a
posição dos implantes com teste de Goodman
(p=0,03).
Técnica cirúrgica
O tempo de cirurgia variou de 45 a 330 minutos, com tempo médio de 116
minutos, porém esses valores foram afetados pela realização
de outros procedimentos no mesmo tempo cirúrgico, não sendo
possível quantificar o tempo gasto com lipoaspiração em
alguns casos, por exemplo.
A via de acesso foi invariavelmente inframamária nos casos selecionados,
apresentando relatos irregulares em relação a qualidade da
cicatriz e necessidade de revisão da mesma no intraoperatório
devido a trauma de bordos causado por manipulação dos tecidos
durante inclusão do implante.
Quanto à posição do implante, 67,5% (81/120) foram alocados
em posição subfascial, sendo que 21,6% (26/120) foram implantados
em posição subglandular, principalmente por dificuldade de
identificação e separação da fáscia do
músculo peitoral maior.
Todas as pacientes que tiveram implantes colocados com técnica de
“dual plane” (submuscular), que correspondeu
a 10,8% (13/120), saíram de cirurgia com dreno portovac,
com tempo médio de 2 a 7 dias até a retirada.
Utilização de dreno foi irregular nas demais pacientes, sendo
relatado o uso em 15% (18/120) dos casos, especialmente quando notado no
intraoperatório sangramento de difícil controle. Nestes casos, o
dreno também permaneceu por 2 a 7 dias, respeitando o mesmo
critério de retirada: aspecto seroso ou serohemático e
débito menor que 30ml em 24 horas.
As comparações entre o perfil e a posição dos
implantes estão apresentadas na Figura 1.
Complicações
Apenas uma paciente no intervalo observado necessitou de reabordagem
cirúrgica devido à assimetria não notada no
intraoperatório, sendo a simetrização realizada em segundo
tempo pelo mesmo cirurgião 9 meses após a primeira cirurgia, sem
abordagem da cápsula ou troca de implantes. Outra paciente apresentou
queixa de ptose mamária e foi submetida à mastopexia periareolar
um ano após a mastoplastia primária. Nenhuma outra paciente
necessitou de reabordagem cirúrgica até o momento da
divulgação destes resultados (janeiro/2021).
Durante uma cirurgia, houve rompimento externo ao se fazer a
implantação, com necessidade de lavagem exaustiva da pele e
cavidade, e troca por implante de mesmo tamanho, sem demais
intercorrências no período intra e
pós-operatório.
Figura 1 - Relação entre a posição e o perfil do
implante.
Figura 1 - Relação entre a posição e o perfil do
implante.
Não identificamos complicações maiores, como casos de
infecção, seroma ou hematoma com necessidade de reabordagem
cirúrgica, bem como tromboembolismo venoso ou morte. O caso único
de infecção apareceu no 8º dia de
pós-operatório e foi tratado de forma conservadora, com
observação e manutenção do uso de cefalexina por 7
dias.
Foram considerados casos de hematoma e seroma, saída de
secreção ativa de sangue ou líquido seroso por mais de 7
dias, sem presença de coleções ou abaulamentos nas mamas.
Todos se resolveram espontaneamente com tratamento conservador.
Os seis casos de deiscência também foram conduzidos clinicamente,
sem reabordagem, pois não passaram de distância maior que 3mm.
O surgimento de estrias na mama nas pacientes que foram submetidas aos implantes
subglandulares foi de 11,5% (3/26), enquanto no plano subfascial foi de 3,7%
(3/81). Isso sugere risco três vezes maior de formação de
estrias quando se opta pelo plano subglandular, em comparação com
plano subfascial (p=0,22). Pacientes submetidas à
técnica de “dual plane” (submuscular)
não apresentaram essa alteração clínica.
Hiperestesia no complexo areolopapilar foi queixa presente em três
pacientes cujos implantes estavam em plano subglandular, mais superficial
(p<0,05).
75% das pacientes operadas não apresentaram nenhuma
alteração clínica, sendo que 5 pacientes não fizeram
seguimento após a primeira consulta
(p<0,001).
As complicações estão agrupadas na Tabela 2, divididas entre as diferentes
posições dos implantes.
Cuidados hospitalares e seguimento ambulatorial
O tempo de internação variou de 2 a 3 dias e nenhuma paciente
necessitou de internação em unidade de terapia intensiva.
Não foi possível estimar o tempo de retorno às atividades
habituais das pacientes, por seguimento irregular no
pós-operatório e dados incompletos neste quesito.
Até o momento, o seguimento das pacientes foi de 4 a 41 meses completos,
sendo que a média é de 23,34 meses.
Todas as pacientes foram questionadas durante os retornos ao ambulatório e
consideraram-se satisfeitas com o resultado estético.
DISCUSSÃO
Avaliação do residente sobre sua formação é um
parâmetro importante para analisar como está seu processo de ensino e
aprendizagem. Conforme relatado por estudo alemão, a maioria dos residentes
egressos dos serviços de cirurgia plástica não se sentem
confiantes para a realização de procedimentos estéticos ao
término de sua formação11. Muitos desejam ter realizados mais cirurgias
estéticas durante o treinamento. A mastoplastia de aumento está entre
as mais citadas pelos residentes, que sugerem a realização de pelo
menos 10 destas cirurgias durante sua formação. Em nosso estudo, a
média de procedimentos por residentes foi de 15, o que torna um treinamento
considerado adequado segundo esta ótica.
Tabela 2 - Taxa de complicações e relação com
posição dos implantes.
Complicações |
Subglandular |
Subfascial |
“Dual
plane” (submuscular)
|
Total |
p1 |
Seroma |
0 |
3 (3,7%) |
0 |
3 (2,5%) |
0,05 |
Infecção |
0 |
1 (1,2%) |
0 |
1 (0,8%) |
0,37 |
Estrias |
3 (11,5%) |
3 (3,7%) |
0 |
6 (5%) |
0,22 |
Hematoma |
0 |
0 |
1 (4,3%) |
1 (0,8%) |
0,37 |
Ptose |
0 |
1 (1,2%) |
0 |
1 (0,8%) |
0,37 |
Cicatriz alargada |
0 |
3 (3,7%) |
0 |
3 (2,5%) |
0,05 |
Assimetria |
0 |
1 (1,2%) |
1 (4,3%) |
2 (1,6%) |
0,61 |
Hiperestesia de CAP |
3 (11,5%) |
0 |
0 |
3 (2,5%) |
0,05 |
Deiscência |
1 (3,8%) |
5 (6,1%) |
0 |
6 (5%) |
0,03 |
Mastalgia |
1 (3,8%) |
1 (1,2%) |
1 (4,3%) |
3 (2,5%) |
1,00 |
Sem
alterações
|
18 (69,2%) |
61 (75,3%) |
10 (43,4%) |
90 (75%) |
<0,001 |
Sem seguimento |
1 (3,8%) |
3 (3,7%) |
1 (4,3%) |
5 (4,1%) |
0,45 |
Tabela 2 - Taxa de complicações e relação com
posição dos implantes.
A importância do ensino estético durante os anos de residência
médica envolve também a preservação do mercado de
trabalho. A invasão de outras especialidades médicas e não-
médicas, além de ações legais no meio jurídico,
tem que ser combatida com conhecimento e formação de cirurgiões
plásticos aptos e capacitados para o ingresso no mercado de
trabalho2.
O número de cirurgias por residente neste artigo está dentro dos 15% de
procedimentos estéticos que a matriz do Conselho Nacional de
Residência Médica recomenda para a formação do
especialista.
Em nossa casuística, 77,5% (93/120) das mastoplastias de aumento ocorreram na
primeira metade do segundo ano de residência e as cirurgias de implante em
“dual plane” (submuscular) acontecem, em geral,
com 4 meses do segundo ano de residência, e após pelo menos 10
mastoplastias de aumento em outros planos. Isso pode ser explicado pela necessidade
de incisão muscular e dissecção mais cuidadosa.
Os cirurgiões do primeiro e segundo ano são acompanhados por pelo menos
mais um residente da equipe como primeiro auxiliar, além da presença
do staff, normalmente professor ou preceptor, que avalia a execução
dos passos e orienta nos principais momentos de decisão. A
instrumentação geralmente foi feita por residente da cirurgia geral ou
técnico(a) de enfermagem contratada para o cargo. Todas as anestesias foram
realizadas por residentes e/ou preceptores do serviço de anestesiologia do HC
FMB UNESP.
Trabalho de Hidalgo e Sinno, em 201612, apontou o perfil das cirurgias de mastoplastia de aumento nos
Estados Unidos realizada por membros da American Society of Plastic
Surgeons (ASPS). Mostrou-se preferência por implantes redondos,
lisos, sendo 42% deles com 300 a 350cc e 42% acima de 350cc. Diferentemente de nossa
análise retrospectiva, eles apontaram o plano subfascial como utilizado em
apenas 2.4%, enquanto a via inframamária também foi a mais aplicada.
Os implantes texturizados, que em nosso estudo foram unanimidade, corresponderam a
apenas 10% das escolhas daquele artigo.
Avaliação semelhante a esta foi apresentada na Revista Brasileira de
Cirurgia Plástica por Charles-de-Sá et al., em 201913. Neste estudo, também houve
preferência por implantes redondos em relação aos
anatômicos, além de predomínio dos microtexturizados, seguidos
por implantes de poliuretano. Incisão da pele em posição
inframamária também foi maioria, e a posição do implante
em ordem decrescente de frequência foi em plano subfascial, seguida pelo
subglandular e, por último, submuscular (“dual
plane”), em proporções de 54, 26 e 14%, que é
próxima da nossa experiência.
Alves et al. (2018)14 em estudo
retrospectivo avaliaram como preferencial o implante do tipo anatômico como
mais “natural”, utilizando também a marca Silimed® como
referência nesta comparação.
As complicações mais frequentes em nosso estudo foram a
deiscência de ferida operatória e estrias cutâneas nas mamas,
ambas encontradas em 5% dos casos. Apesar de complicações
também poderem ser associadas a curva de aprendizagem, algumas são
encontradas também em serviços com profissionais de longa
experiência. Basile et al. (2012)15 relataram 19 casos de estrias em 409 pacientes - 4,9% -
avaliados em pós-operatório de mastoplastia de aumento. Como fator de
risco para esta complicação os autores citaram a idade, já que
pacientes mais jovens estão mais propensas à ruptura de fibras durante
a distensão cutânea. Tijerina et al. (2010)16 e Brown (2020)17 realizaram análises retrospectivas de 1.000 e 783
casos de mastoplastia de aumento primária. A principal
complicação encontrada por ambos foi a contratura capsular, em 0,4% e
6,8%, respectivamente. Em nossa análise, esta complicação
não foi evidenciada, porém deve-se considerar o fato de que o nosso
tempo de observação, que é fator fundamental nesta
complicação, foi inferior.
Quando comparamos as posições dos implantes em relação a
complicações, notamos que pacientes submetidos à técnica
subfascial foram as que apresentaram menos complicações
pós-operatórias. Isso difere de Brown et al. (2012)18 que não reportaram
diferença significativa quando comparada a posição subglandular
e subfascial. No entanto, quando em posição subfascial, apresentamos
maior taxa de seroma, diferindo da metanálise realizada por Li et al.
(2019)19, que não
encontrou diferenças na taxa de seroma entre implantes posicionados em planos
acima ou abaixo do músculo peitoral.
Assim como o descrito em outras grandes séries de casos20, em que há níveis
muito baixos de complicações durante e após a mastoplastia de
aumento, não obtivemos nenhuma complicação maior, como o
tromboembolismo venoso.
Outro tópico a ser comentado é a maior evidência e novas
pesquisas relacionadas ao linfoma anaplásico de grandes células
associado ao implante mamário (BIA-ALCL). Isto também interfere nessa
discussão e pode afetar em um futuro próximo muito do que é
levado em consideração sobre o uso das próteses21,22.
Apesar dos resultados pós-operatórios satisfatórios e um
número substancial de procedimentos, ferramentas mais concretas de
avaliação de ensino necessitam de ser implementadas, para
também criarmos padrões de treinamento replicáveis para os
novos cirurgiões plásticos. Uma dessas ferramentas presente na
literatura atual é a chamada “entrustable professional
activities” (EPA)23,24. Neste
método, tenta-se traduzir as competências de cada procedimento
cirúrgico. Em tese, ao se atingir competências
pré-determinadas, o cirurgião em formação estaria
realmente habilitado para realização não
supervisionada25. Esse
tipo de mecanismo pode potencialmente tornar a formação mais objetiva
e auxiliar na organização de insumos e recursos despendidos na
formação do cirurgião plástico. O EPA referente à
mastoplastia de aumento pode ser futuramente traduzido para o português e
adaptado a realidade de cada serviço.
Dentre as limitações deste estudo, devemos comentar o caráter
retrospectivo e realizado sob análise de prontuários. Isto prejudica
avaliação de dados como a qualidade da cicatrização e
satisfação das pacientes, uma vez que foram descritos em
caráter menos objetivo pelos avaliadores.
A mastoplastia é a cirurgia mais realizada pelo cirurgião
plástico em sua prática clínica, o que a torna fundamental na
formação técnica do médico residente da especialidade.
Manter uma rotina e um padrão em sua realização é
importante para a evolução do especialista, tanto para o refinamento
de uma de suas cirurgias mais procuradas, quanto para o desenvolvimento das
habilidades necessárias para a realização de cirurgias mais
complexas.
Acompanhar a evolução do serviço escola ao longo do tempo e
seguir as pacientes que receberam implante é imprescindível para que
se identifiquem eventuais complicações precocemente e se
ofereça às pacientes resultados satisfatórios e duradouros.
CONCLUSÃO
A mastoplastia de aumento primária é um dos principais procedimentos em
grande parte dos consultórios de cirurgia plástica. Quando realizado
em serviço de residência médica, por cirurgiões
plásticos em formação sob supervisão adequada,
também pode trazer resultados satisfatórios, com baixas taxas de
complicação.
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Medicina de Botucatu, Botucatu, SP, Brasil.
Autor correspondente: Balduino Ferreira de
Menezes Neto, Rua Hortênsia, 291, Apto 802, Jardim Bom Pastor,
Botucatu, SP, Brasil, CEP 18607-650, E-mail:
balduino.neto@unesp.br
Artigo submetido: 18/10/2020.
Artigo aceito: 14/07/2021.
Conflitos de interesse: não há.
Instituição: Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina de Botucatu, Botucatu, SP, Brasil.