INTRODUÇÃO
O Sistema Único de Saúde (SUS) está organizado basicamente em unidades básicas de
saúde e estabelecimentos de média e alta complexidade. A porta de entrada ao sistema
são as unidades básicas de saúde, que devem resolver os principais problemas de saúde
com medidas simples e baratas e atuar na prevenção de doenças. Já os hospitais de
média e alta complexidade contam com profissionais especializados e recursos tecnológicos
especiais1.
A divisão entre média e alta complexidade representa bastante dificuldade aos gestores
do SUS1 e, infelizmente, sua visão desta área é ainda fragmentária, com conjuntos de procedimentos
relacionados nas tradicionais “Tabelas de procedimentos do sistema”, ambulatorial
ou hospitalar, que são muitas vezes limitantes, penalizando principalmente as instituições
de médio porte, que realizam muitos dos procedimentos e que conforme essas Tabelas
seriam de exclusividade da alta complexidade.
Os profissionais especialistas que trabalham nestes hospitais de média complexidade
vivem esta realidade todos os dias, uma vez que estes locais contam cada vez mais
com recursos e especialistas de múltiplas áreas, com grande potencial resolutivo,
evitando a maioria das transferências às já superlotadas instituições de alta complexidade.
E isto ocorre não só porque os hospitais de médio porte têm estrutura e qualificação
para atender muitos dos procedimentos ditos de alta complexidade, mas também porque
a alta complexidade não consegue absorver todos esses casos por falta de vagas.
No contexto dos tumores cutâneos, atendidos nos hospitais de média complexidade, o
referido acima se repete proeminentemente no caso dos tumores malignos. São hospitais
que têm recursos para operar a maioria dos tumores, incluindo tumores malignos maiores,
desde que conte com um profissional especializado em cirurgia plástica ou áreas afins.
Essas instituições contam com centro cirúrgico, anestesista e até mesmo Unidade de
Tratamento Intensivo (UTI), viabilizando inúmeros procedimentos. No entanto, os códigos
cirúrgicos em oncologia são restritos à alta complexidade.
Os tumores de pele não melanoma são o câncer mais prevalente na população2,3, e a inclusão dos hospitais de médio porte no atendimento destas lesões poderia contribuir
para reduzir o tempo de espera de encaminhamento às instituições de alta complexidade.
Infelizmente, além de não receberem repasse para tratamento conforme códigos em oncologia,
nem sempre estas instituições contam com profissionais capazes de tratar estes tumores
em casos mais avançados. Diante disso, faz-se necessária a avaliação de custo e dos
benefícios do tratamento destas lesões, bem como discutir possíveis soluções para
um melhor funcionamento do sistema.
OBJETIVO
O objetivo do presente estudo é descrever a experiência de 9 meses de um cirurgião
plástico no tratamento de pacientes com tumores cutâneos, em uma instituição de médio
porte, não só descrevendo a epidemiologia e resultados do tratamento destas lesões,
como também discutir como otimizar o atendimento destes pacientes e estimar os custos
no âmbito do SUS.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo de coorte prospectiva realizada de janeiro de 2017 a setembro
de 2017, no Hospital Getúlio Vargas em Sapucaia do Sul, Rio Grande do Sul. A coleta
de dados foi realizada em banco de dados em Excel®, com dados demográficos como sexo, idade, dados sobre a cirurgia, área operada, técnica
realizada, resultado de anatomopatológico, número de cirurgias, entre outros. Repasses
financeiros, conforme Tabelas do SUS, foi estimado para cirurgias maiores realizadas
no bloco cirúrgico e apenas para os tumores malignos de pele. O grau de satisfação
foi medido e, conforme escala Glascow Benefit Inventory (GBI), aplicado em parte da
amostra em pacientes chamados em torno de 2 anos após a cirurgia. Este questionário
é composto de 18 perguntas cujas respostas são graduadas de 1 a 5, medindo um escore
global e subescores global, social e de saúde variando de -100 (impacto negativo máximo)
a +100 (impacto positivo máximo)4,5. Os custos com cada paciente foram estimados conforme códigos usados para cada paciente
e com base no site do SUS com as Tabelas disponibilizadas on-line6. Esse último dado foi usado para comparar com os códigos exclusivos da alta complexidade
que seriam mais adequados para o caso de cada paciente.
Critérios de inclusão na coorte geral foram todos os pacientes com tumores cutâneos
e de subcutâneo benignos e malignos que consultaram no período do estudo. Apesar deste
ambulatório ser voltado aos tumores de partes moles, consultaram e foram tratados
também pacientes por outras patologias como dermatocalaze palpebral, ectrópio, hipertrofia
de mama, placas ortopédicas expostas e feridas complexas, mas estes foram excluídos
do presente estudo. Os dados foram analisados em SPSS, versão 20, IBM®.
Este trabalho foi submetido à Plataforma Brasil e aprovado por Comitê de Ética em
Pesquisa (CEP) número 5329, Hospital Materno Infantil Presidente Vargas (HMIPV-RS),
designado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), sob o número de Certificado
de Apresentação e Apreciação Ética (CAAE) 16036719.2.0000.5329. Os pacientes com fotos
publicadas neste trabalho aprovaram sua divulgação através de Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE). Pacientes cujos dados são aqui expostos em conjunto, sem
chances de identificação, foram dispensados do TCLE.
Quatro tipos regimes de cirurgia foram utilizados conforme o caso em tratamento: em
sala ambulatorial com anestesia local, em bloco cirúrgico com anestesia local, em
sala cirúrgica com sedação ou em sala cirúrgica com anestesia geral. O manejo dos
pacientes foi realizado conforme “guidelines” para remoção de tumores cutâneos7,8 e as reconstruções foram realizadas conforme o caso e baseadas na literatura vigente9-11, respeitando os recursos disponíveis na Instituição.
RESULTADOS
No período do estudo foram atendidos 166 pacientes, dos quais 63 foram excluídos da
análise por serem pacientes com outras patologias que não tumores cutâneos e de subcutâneo,
ou pacientes que não foram operados. Restaram 103 pacientes que foram operados que
tiveram dados completos para análise.
A média de idade dos pacientes operados foi de 60,1 anos. Presença de comodidades
associadas foi encontrada em 50,5% da amostra. As comorbidades mais frequentes encontradas
foram: hipertensão arterial sistêmica, diabete, hipotireoidismo e depressão; sendo
que a maioria apresentava mais de uma comorbidade ao mesmo tempo. A média de consultas
foi de 3 consultas por paciente. Tabela 1 demonstra os dados demográficos da coorte.
Tabela 1 - Dados demográficos dos 103 pacientes da coorte de pacientes atendidos em hospital
de média complexidade.
Variável |
N (%) ou Média e desvio padrão
|
Sexo |
|
Masculino |
45 (43,7) |
Feminino |
58 (56,3) |
Idade |
60,12 (16,0)* |
Presença de Comorbidades |
52 (50,5) |
Múltiplas |
25 (24,3) |
Hipertensão |
9 (8,7) |
Outras |
18 (17,5) |
Número de Consultas por Paciente |
|
Uma |
16 (15,5) |
Duas |
32 (31,1) |
Três |
25 (24,3) |
Quatro |
15 (14,6) |
Cinco ou mais |
15 (14,6) |
Local da Cirurgia |
|
Ambulatório |
53 (51,5) |
Centro Cirúrgico |
50 (48,5) |
Área Operada |
|
Face |
72 (69,9) |
Múltiplas áreas |
18 (17,3) |
Membros |
8 (7,8) |
Tronco |
5 (4,9) |
Técnica de reconstrução |
|
Exérese e sutura |
74 (71,8) |
Exérese e retalho |
21 (20,4) |
Exérese e enxertia |
8 (7,4) |
Reconstrução (enxerto/retalhos) |
29 (28,1) |
Reconstrução tardia (pós-AP) |
9 (8,7) |
Diagnóstico Anatomopatológico |
|
Carcinoma Basocelular |
46 (44,7) |
Carcinoma Epidermóide |
9 (8,7) |
Melanoma |
3 (2,9) |
Cistos Epidérmicos |
13 (12,6) |
Outros |
27 (26,2) |
Margens (tumores malignos não melanoma) |
55 (53,4) |
Livres |
46 (83,6) |
Comprometida |
9 (16,4) |
Número de cirurgias por paciente |
|
Uma |
87 (84,5) |
Duas |
11 (10,7) |
Três |
3 (2,9) |
Quatro |
2 (1,9) |
Complicações |
2 (1,9) |
Tabela 1 - Dados demográficos dos 103 pacientes da coorte de pacientes atendidos em hospital
de média complexidade.
As principais áreas do corpo acometidas pelos tumores foram a face, seguido de áreas
múltiplas, membros e tronco (Figura 1). O carcinoma basocelular foi o tumor mais comum encontrado (44,7%), seguido de tumores
benignos de pele e de subcutâneos incluindo nevos, cistos epidérmicos e lipomas. Os
tumores epidermóides foram encontrados em 8,7% dos casos e foram operados 3 pacientes
com melanomas. Estes últimos todos em estágio inicial (inferior a 0,75mm de espessura
e sem ulcerações), precisando somente de ampliação de margem, sem necessidade de outras
intervenções12,13. Considerando a classificação de risco para os tumores de pele não melanoma do NCCN
(National Comprehensive Cancer Network) cujos critérios são expostos na Tabela 2
14, 38,7% foram de baixo risco, 55,5% de alto risco e 5,8% já localmente avançados.
Figura 1 - Distribuição dos tumores conforme áreas acometidas.
Figura 1 - Distribuição dos tumores conforme áreas acometidas.
Tabela 2 - Características de alto risco para os tumores malignos de pele não-melanoma.
|
Baixo Risco |
Alto Risco |
Localização/Tamanho |
<20mm na área L |
>20mm na área L |
<10mm na área M |
>10mm na área M |
<0,6mm na área H |
>0,6mm na área H |
Bordas |
Bem definidas |
Mal definidas |
História |
Primárias |
Recorrentes |
Imunossupressão |
Não |
Sim |
Radiação prévia |
Não |
Sim |
Diagnóstico anatomopatológico |
CBC nodular/superficial |
CBC: moreaforme, basoescamoso, esclerodermiforme, micronodular CEC: acantolítico,
adenoescamoso, desmoplásico, metaplástico
|
Tabela 2 - Características de alto risco para os tumores malignos de pele não-melanoma.
Nove pacientes com tumores basocelulares e epidermóides tiveram margens descritas
como comprometidas ou exíguas. Destes, todos realizaram ampliação, exceto um que se
negou a ampliar as margens e outra que decidiu observar não retornando para ampliação.
Dos sete pacientes operados, dois vieram com carcinoma residual na peça cirúrgica,
sendo que apenas um manteve-se com margem comprometida até a reconstrução perdendo
o enxerto. Este último foi o único paciente que teve que ser encaminhado à alta complexidade
por se tratar de um paciente com carcinoma epidermóide pouco diferenciado de região
temporal, já com invasão da glândula parótida, localmente avançado e de mau prognóstico.
O mesmo foi operado posteriormente em conjunto com o cirurgião de cabeça e pescoço
que realizou parotidectomia parcial e esvaziamento cervical. O paciente foi encaminhado
à radioterapia após a ressecção.
Reconstruções mais complexas com enxertos ou retalhos foram necessárias em apenas
28% do total de pacientes operados, sendo que em 31% destes pacientes se optou por
reconstrução tardia, deixando os pacientes com curativo local até o diagnóstico anatomopatológico
(AP) definitivo, seguido de reconstrução em torno de 2 semanas depois da primeira
cirurgia no caso de margens livres.
Foram feitos 21 retalhos que incluíram técnica de Limberg, bilobado, bandeira, retalho
glabelar (Rieger), nasogeniano e retalho triplo em catavento de couro cabeludo. As
Figuras 2 a 4 mostram resultados de alguns desses casos de reconstrução mais complexos.
Figura 2 - Paciente com carcinoma basocelular, reconstrução com retalho nasogeniano. Deformidade
em alçapão (trapdoor) com resolução espontaneamente.
Figura 2 - Paciente com carcinoma basocelular, reconstrução com retalho nasogeniano. Deformidade
em alçapão (trapdoor) com resolução espontaneamente.
Figura 3 - Paciente com carcinoma basocelular de asa nasal reconstruído com enxerto de cartilagem
auricular e retalho nasogeniano. Reconstrução tardia após anatomopatológico definitivo.
Fotos de pré-operatório, pós-operatório sem reconstrução com retração de asa nasal,
após a reconstrução e fotos finais após refinamento do pedículo do retalho com reconstrução
do sulco nasogeniano.
Figura 3 - Paciente com carcinoma basocelular de asa nasal reconstruído com enxerto de cartilagem
auricular e retalho nasogeniano. Reconstrução tardia após anatomopatológico definitivo.
Fotos de pré-operatório, pós-operatório sem reconstrução com retração de asa nasal,
após a reconstrução e fotos finais após refinamento do pedículo do retalho com reconstrução
do sulco nasogeniano.
Figura 4 - Tumor de dorso nasal reconstruído com retalho glabelar ou de Rieger.
Figura 4 - Tumor de dorso nasal reconstruído com retalho glabelar ou de Rieger.
Ocorreram complicações em 16,5% dos pacientes que incluíram 5 casos de infecção de
ferida operatória, 1 hematoma, 1 paciente com dor persistente que cedeu após 3 meses,
1 deiscência de sutura com necrose gordurosa, 2 necroses parciais de retalhos, 2 hipertrofias
de cicatriz, 1 perda parcial de enxerto, 3 deformidades em alçapão (trapdoor) que melhoraram em 6 meses, 1 paralisia temporária do ramo temporal do facial pelo
anestésico local e uma paralisia definitiva do ramo temporal e zigomático do facial
que estava comprometido por tumor (paciente que realizou a parotidectomia acima descrito).
A Figura 5 mostra caso de paciente com necrose parcial de retalho com boa resolução final com
curativos, demonstrando o bom resultado mesmo no caso de complicações.
Figura 5 - Paciente com tumor basocelular submetido à reconstrução com retalho em catavento que
evoluiu com necrose parcial dos retalhos, mas com bom resultado final após cuidados
e curativos.
Figura 5 - Paciente com tumor basocelular submetido à reconstrução com retalho em catavento que
evoluiu com necrose parcial dos retalhos, mas com bom resultado final após cuidados
e curativos.
Entrou-se em contato com 20 pacientes para responder questionário para cálculo da
escala GBI, sendo que 3 haviam falecido e os 9 não atenderam ou não compareceram no
dia da entrevista, restando apenas 8 para a aplicação do questionário. Nestes, mostrou-se
melhora nos quatro subdomínios da escala, com média de 53,8 pontos na escala geral,
75 pontos na subescala geral, 4,1 na subescala social e 18,75 na subescala de saúde.
Considerando os repasses conforme a Tabela SUS por cirurgia e apenas os pacientes
operados no bloco cirúrgico por tumores malignos, resultou-se em 37 pacientes para
estimativa. Nestes pacientes, o custo estimado ao SUS foi de 349,25 reais por paciente,
sendo 253,38 reais por cirurgia. Se fosse possível usar os códigos oncológicos que
são apenas autorizados à alta complexidade, mas que seriam mais adequados às cirurgias
realizadas, o repasse poderia ser em média de 470,94 por paciente e 341,66 por cirurgia,
ou seja, em torno de 25% maior. Além disso, procedimentos comuns realizados nesta
coorte de paciente como exérese de múltiplos tumores malignos de pele, exérese de
tumores de lábio e de pavilhão auricular não encontram códigos equivalentes na Tabela
de média complexidade, sendo que o código usado nestes casos foi muito inferior em
termos de repasse se comparado aos disponíveis na alta complexidade. Felizmente, no
caso de códigos de enxertos e retalhos o repasse é menor, mas menos impactante, 10%
menores do que os códigos de enxertos e retalhos pós-exérese oncológica das Tabelas
da alta complexidade.
DISCUSSÃO
Os tumores de pele não melanoma são a neoplastia mais prevalente, sendo que nos EUA
seu diagnóstico é maior do que o diagnóstico de todos os cânceres somados2. Na coorte apresentada neste trabalho, o carcinoma basocelular foi a lesão mais comumente
encaminhada, superando até mesmo os tumores benignos de pele e subcutâneo. O local
mais acometido foi a face seguida dos membros. Autores que estudaram tumores de face15 e tumores basocelulares (CBCs)5 encontraram resultados semelhantes aos aqui demonstrados16,17. Em revisão recente sobre os cânceres de pele queratinocíticos (não-melanoma), destaca-se
que sua incidência e, portanto, custos com esta doença vêm em elevação no mundo inteiro,
com risco estimado entre 20-30% de desenvolvimento ao longo da vida em pacientes brancos,
segundo estimativas norte-americanas7,8,18.
Esses tumores podem ser divididos e em alto e baixo risco, conforme critérios propostos
pelo NCCN19, constam na Tabela 2 traduzida de Hughley et al., em 201814. Chama a atenção que nesta coorte, conforme tais especificações, a maioria dos pacientes
(61,3%) já se apresentavam com carcinomas basocelulares e epidermóides de alto risco
ou localmente avançados.
Os retalhos nestes casos de tumores de face são preferidos aos enxertos por terem
melhores resultados estéticos16. Como em nossa casuística a área mais acometida foi a face, no caso de reconstruções
os retalhos foram os preferidos, com 21 retalhos versus 8 enxertos realizados, sendo que apenas 2 destes casos de enxerto foram utilizados
na face. Em 9 casos, nos quais as reconstruções com retalhos foram propostas, foi
optado por reconstrução tardia apenas após anatomopatológico comprovando margens livres
de doenças, conforme recomendado na literatura7,8,14,19, para diminuir o risco de perda da reconstrução. Segundo guidelines de tratamento dos tumores de pele, a melhor indicação para muitos dos casos desta
coorte seria a cirurgia micrográfica de Mohs, por se tratarem de lesões com vários
critérios de alto risco conforme NCCN14. Porém, esta técnica não é disponível na instituição, sendo optado por ressecção
padrão e reconstrução tardia no caso de necessidade de grande mobilização de tecidos
para reconstrução.
Quanto às análises de custos, resultados e grau de satisfação dos pacientes, é importante
esclarecer sob qual perspectiva a análise é feita20. No caso da presente coorte, sob a perspectiva hospitalar há de certa forma prejuízo
financeiro à instituição quanto ao atendimento desses paciente; contudo, ao SUS, há
um ganho de se tratar essas lesões no nível médio, pois o repasse é menor do que o
feito à alta complexidade e pelo acesso ser mais rápido. Este trabalho compara o repasse
do SUS entre a média e alta complexidade, mas não estima se este repasse cobre os
verdadeiros custos hospitalares com o tratamento destas lesões. Neste contexto, Bócoli
et al., em 201321, fez essa comparação, demonstrando que o gasto interno com os tratamentos destas
lesões é superior ao que é repassado pelo SUS. Neste estudo, contudo, o autor não
especifica se a estimativa foi feita em hospital de média ou alta complexidade, contudo,
cita que era em um Hospital Universitário, provavelmente se tratando de alta complexidade.
Portanto, considerando os achados de Bócoli et al., em 201321, o prejuízo da instituição de média complexidade é provavelmente ainda maior do que
o demonstrado neste estudo em hospitais de alta complexidade.
Quanto aos resultados, houve baixa taxa de complicações, especialmente se considerarmos
tratar-se de uma coorte com vários tumores de alto risco de recidiva e por se tratar
de uma população com média de idade elevada e presença de comorbidades em 50,5% da
amostra. Também, conforme questionário de grau de satisfação que foi aplicado em parte
dos pacientes, nota-se melhora em todos os domínios do questionário, principalmente
nos escores geral e subescore geral. Além disso, quanto à resolubilidade, destacamos
que apenas um paciente não pôde ser tratado na média complexidade, sendo encaminhado
à hospital de alta complexidade. Desse modo, sob a perspectiva populacional os ganhos
são muitos.
CONCLUSÃO
Diante do acima exposto e considerando que o câncer de pele não melanoma é uma doença
em ascensão mundial e no Brasil, conclui-se que esta doença causa e continuará causando
de forma crescente enorme impacto ao Sistema Único de Saúde, que deve procurar alternativas
para viabilizar o acesso destes pacientes ao tratamento de forma eficaz. Neste contexto,
a inclusão dos hospitais de médio porte no atendimento destes pacientes parece uma
ótima estratégia para otimizar o funcionamento do sistema. Contudo, a viabilização
desta atuação rotineira neste nível de atenção à saúde deveria passar por uma revisão
nas Tabelas de procedimentos do SUS, que deveriam ser atualizadas, uma vez que na
prática vários procedimentos de exclusividade da alta complexidade já são realizados
na média complexidade, através de códigos de substituição que em sua maioria não contemplam
a verdadeira complexidade dos procedimentos realizados, com valores recebidos 25%
inferiores.
A presença de profissionais habilitados a tratar este problema adequadamente, como
o cirurgião plástico no nível médio de complexidade, pode contribuir sobremaneira
para que esta doença de alta incidência seja resolvida sem encaminhamento à alta complexidade.
Conforme a coorte aqui apresentada, o grau de resolubilidade dos casos na média complexidade
foi grande, sendo que a inclusão rotineira de instituições de médio porte no tratamento
dos cânceres de pele colaboraria com o melhor atendimento dos pacientes e com o melhor
funcionamento do SUS.
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1. Hospital Ernesto Dornelles, Porto Alegre, RS, Brasil.
2. Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre, Porto Alegre, RS, Brasil.
3. Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Porto Alegre, RS, Brasil.
Autor correspondente: Daniele Walter Duarte, Rua General Caldwell 969, Bairro Menino Deus, Porto Alegre, RS. Brasil. CEP: 90130-051.
E-mail: daniwalterduarte@gmail.com
Artigo submetido: 21/12/2019.
Artigo aceito: 22/02/2020.
Conflitos de interesse: não há.