INTRODUÇÃO
O nariz sempre foi foco de estudos e experimentos para correções de deformidades,
devido a sua importância na estética e harmonização facial. Têm-se relatos de
reconstrução nasal cirúrgica desde a Idade Média, mas foi no início do século XX que
Broeckaert, inicialmente, descreveu o uso de parafina líquida para preenchimento e
correção de pequenas deformidades nasais1.
Desde então, o uso de preenchedores usando diversos materiais, sendo o mais comum
ácido hialurônico, surgiu como alternativa para correção de pequenos defeitos no
nariz, em vez da rinoplastia, ou como complementação cirúrgica.
Apesar de ser considerada minimamente invasiva e com menores riscos, se comparada
com
a rinoplastia cirúrgica, o uso de preenchedores nasais não é isento de complicações
como infecção, deformidade, necrose de pele, dentre outros, além de não possuir
resultado duradouro.
OBJETIVO
Descrever um caso de um adulto jovem submetido à rinomodelação com silicone,
complicando com deformidade nasal, e seu tratamento com rinoplastia aberta
reparadora.
RELATO DE CASO
Paciente D.F.S, sexo feminino, 21 anos, foi submetida há 3 anos a rinoplastia e
rinomodelação com silicone. Um ano após o procedimento evoluiu com calor, rubor e
edema local, com drenagem ocasional de secreção seropurulenta. Tratada com
antibióticos e cuidados locais, com resolução parcial. Desde então, evoluiu com
episódios recorrentes semelhantes, resultando em deformidade e enduração progressiva
em ponta nasal. Foi submetida a tratamento com corticoide injetável (triancinolona)
durante exacerbações, também com resolução parcial e recidiva. Negou outros
procedimentos estéticos, comorbidades ou uso regular de medicação.
Realizou tomografia computadorizada de face que evidenciou imagem sugestiva de corpo
estranho em ponta nasal (Figuras 1, 2, 3 e 4).
Figura 1 - Imagem de tomografia computadorizada e reconstrução, evidenciando
corpo estranho em ponta nasal (setas).
Figura 1 - Imagem de tomografia computadorizada e reconstrução, evidenciando
corpo estranho em ponta nasal (setas).
Figura 2 - Imagem de tomografia computadorizada e reconstrução, evidenciando
corpo estranho em ponta nasal (setas).
Figura 2 - Imagem de tomografia computadorizada e reconstrução, evidenciando
corpo estranho em ponta nasal (setas).
Figura 3 - Imagem de tomografia computadorizada e reconstrução, evidenciando
corpo estranho em ponta nasal (setas).
Figura 3 - Imagem de tomografia computadorizada e reconstrução, evidenciando
corpo estranho em ponta nasal (setas).
Figura 4 - Imagem de tomografia computadorizada e reconstrução, evidenciando
corpo estranho em ponta nasal (setas).
Figura 4 - Imagem de tomografia computadorizada e reconstrução, evidenciando
corpo estranho em ponta nasal (setas).
O exame físico mostrou ponta nasal globosa, endurada, com presença de pontos de
eritema e descamação local, e consistência fibrosa, resultantes de um possível
processo inflamatório crônico, além de dorso sem sustentação e côncavo (Figuras 5 e 6).
Figura 5 - Ponta nasal com deformidade.
Figura 5 - Ponta nasal com deformidade.
Figura 6 - Ponta nasal com deformidade.
Figura 6 - Ponta nasal com deformidade.
Foi submetida a tratamento com rinoplastia aberta para retirada de corpo estranho
e
correção de deformidade.
No intraoperatório, evidenciamos distorção importante das cartilagens nasais, além
de
massa fibrótica em ponta nasal, encapsulada, firmemente aderida aos planos
adjacentes, com drenagem de secreção purulenta em pequena quantidade. Também foram
identificadas lâminas de material transparente e maleável (Figura 7).
Figura 7 - Intraoperatório evidenciando massa fibrótica em ponta nasal (seta),
com deformidade parcial de cartilagens alares.
Figura 7 - Intraoperatório evidenciando massa fibrótica em ponta nasal (seta),
com deformidade parcial de cartilagens alares.
O tratamento incluiu a ressecção da massa e de corpo estranho, reestruturação da
ponta nasal com strut columelar e enxerto picado de cartilagem
autóloga, retirada do septo nasal e concha auricular direita, que também foi usado
para estruturação do dorso nasal (Figuras 8 e
9).
Figura 8 - Resultado final pós-rinoplastia.
Figura 8 - Resultado final pós-rinoplastia.
Figura 9 - Resultado final pós-rinoplastia.
Figura 9 - Resultado final pós-rinoplastia.
O anatomopatológico de peça cirúrgica diagnosticou processo inflamatório em
atividade, com corpo estranho com características de silicone (Figuras 10 e 11).
Figura 10 - Peça cirúrgica íntegra (esquerda) e aberta (direita), com fragmentos
de silicone.
Figura 10 - Peça cirúrgica íntegra (esquerda) e aberta (direita), com fragmentos
de silicone.
Figura 11 - Peça cirúrgica íntegra (esquerda) e aberta (direita), com fragmentos
de silicone.
Figura 11 - Peça cirúrgica íntegra (esquerda) e aberta (direita), com fragmentos
de silicone.
RESULTADOS
A paciente D.F.S. evoluiu sem intercorrências, com resultado estético e funcional
satisfatórios, mostrando-se muito satisfeita com o resultado final (Figuras 12, 13 e 14).
Figura 12 - Resultado pós-operatório, 1 mês e meio pós-cirurgia.
Figura 12 - Resultado pós-operatório, 1 mês e meio pós-cirurgia.
Figura 13 - Resultado pós-operatório, 1 mês e meio pós-cirurgia.
Figura 13 - Resultado pós-operatório, 1 mês e meio pós-cirurgia.
Figura 14 - Resultado pós-operatório, 1 mês e meio pós-cirurgia.
Figura 14 - Resultado pós-operatório, 1 mês e meio pós-cirurgia.
DISCUSSÃO
O uso de preenchedores nasais tem ganhado cada vez mais espaço no tratamento estético
do nariz, por proporcionar resultados imediatos e mais rápida recuperação
pós-operatória, se comparado com a rinoplastia cirúrgica.
Vários materiais já foram descritos para preenchimento nasal, sendo o primeiro relato
no início do século XX, com parafina líquida1.
Ainda nesse período, surgiu o silicone injetável como alternativa para contorno
corporal, tendo seu apogeu na década de 1950, no Japão, principalmente em mulheres
e
transexuais que desejavam aumentar seios e glúteos2.
O silicone está presente sob três formas: líquida, gel e elastômero. A forma líquida
é barata e de fácil manipulação, sendo amplamente difundida naquela época. Com isso,
veio seu uso indiscriminado, com uso de silicone industrial e por pessoas sem
qualificação, levando a complicações catastróficas e seu eventual abandono2.
O silicone líquido em sua forma injetável é formado por polímeros longos de
dimetilsiloxane. Ao ser injetado no organismo, ele sofre uma reação de corpo
estranho, com atração inicialmente de neutrófilos para o local injetado, que são
substituídos gradualmente por linfócitos e células gigantes. Esse infiltrado
inflamatório vai provocar uma reação fibrótica, com formação de cápsula e deposição
de colágeno entre os polímeros de silicone, com formação de pseudocistos. Essa
fibrose pode se tornar calcificada, adquirindo consistência pétrea, endurecida, com
irregularidades na superfície cutânea.
As complicações do uso de silicone incluem edema, equimose, eritema e discromia. Além
disso, o silicone, ao ser injetado, sofre migração para tecidos adjacentes, além de
ser fagocitado, cair na corrente linfática e atingir órgãos a distância. Outros
efeitos em longo prazo incluem granulomona e supercorreção que, por ser material
aloplástico permanente, dificulta muito seu tratamento.
Em uma revisão da literatura sobre rinomodelação com silicone, a maior amostragem
encontrada foi do trabalho de Richard Webster et al.
2, em que eles acompanharam, por 20 anos, 347
submetidos à complementação de rinoplastia cirúrgica com rinomodelação usando
silicone injetável em baixas doses, com várias sessões espaçadas, totalizando 1.937
aplicações. Eles mostraram que, quando usado em pequena quantidade e por
profissionais experientes (foi utilizado menos de 100 mL de silicone, quantidade
menor que normalmente era injetado em únicas sessões de aumento mamário e contorno
corporal), o silicone tem poucas complicações em longo prazo. Em seu trabalho, a
principal complicação foi eritema da área injetada, que permaneceu por longo tempo,
encontrado em 10% dos pacientes. Não houveram complicações como necrose de pele ou
amaurose. Nem formação de granulomas de corpo estranho.
Atualmente, o material mais utilizado para rinomodelação é o ácido hialurônico, com
resultados durando de 6 a 24 meses2.
O ácido hialurônico é um polissacarídeo com propriedades hidrofílicas que provocam
aumento do tecido injetado. Apesar de considerado um procedimento minimamente
invasivo, não é isento de riscos e complicações, sendo as mais frequentes hematomas,
edema, dor, infecção e oclusão vascular com consequente necrose de pele, sendo esta
a complicação mais catastrófica, resultado da oclusão da artéria do dorso nasal ou
nasal lateral. No caso da artéria do dorso nasal, ramo da artéria oftálmica, pode
ocorrer amaurose pelo refluxo retrógrado.
Uma série de 280 pacientes submetidos à rinomodelação com ácido hialurônico1, pelo mesmo método de aplicação e
acompanhamento, mostrou apenas complicações mínimas como edema, dor local e pequenos
hematomas de rápida resolução, mostrando que o uso de preenchedores, quando feito
por médicos especializados com conhecimento amplo na anatomia facial, é procedimento
seguro, com riscos pequenos.
No entanto, o uso de preenchedores não tem efeito duradouro em longo prazo, além do
resultado ser puramente estético, não tratando a parte funcional e problemas
respiratórios, que levam às deformidades nasais definitivas. Sendo assim, a
rinoplastia cirúrgica ainda é considerada o padrão-ouro para correções do nariz1,3,4.
CONCLUSÃO
Apesar da promessa de resultados imediatos, rápidos e com menores efeitos colaterais,
a rinomodelação com preenchedores não é isenta de riscos e complicações, além de não
fornecer resultado duradouro e não tratar funcionalmente defeitos respiratórios.
Assim, a rinoplastia cirúrgica ainda é considerada padrão-ouro para correção de
deformidades nasais.
REFERÊNCIAS
1. Coimbra DD, Oliveira BS, Uribe NC. Preenchimento nasal com novo
ácido hialurônico: série de 280 casos. J Comet Dermatology;
2015.
2. Webster RC, Hamdan US, Gaunt JM, Fuleihan NS, Smith RC. Rhinoplastic
revisions with injectable silicone. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 1986;
112(3):269-76.
3. Radaelli A. Medical rhinoplasty with hyaluronic acid and botulinum
toxin A: A very simple and quite effective technique. J Cosmet Dermatol. 2008;
7(3):210-20.
4. Maio M. The minimal approach: an innovation in facial cosmetic
procedures. Aesth Plast Surg. 2004; 28(5):295-300.
1. Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG,
Brasil.
Endereço Autor: Marcus Vinícius Capanema
Gonçalves Alameda Oscar Niemeyer 1100/1501C, Vila da Serra - Nova
Lima, MG, Brasil CEP 34000-000 E-mail:
marcusvic1@hotmail.com