INTRODUÇÃO
Na literatura, os hematomas ocorridos após a ritidoplastia ou cirurgia do
rejuvenescimento facial são vistos como a complicação mais comum deste procedimento
(1% a 15%)1,2. Ocorrem, geralmente, nas primeiras 24 horas1-3 e podem causar consequências significativas como comprometimento da
vascularização dos retalhos cutâneos, prolongamento da convalescença cirúrgica, até
comprometimento respiratório1. Eventualmente,
podem se apresentar de forma tardia, podendo ocorrer dias após manipulação
cirúrgica2,4. Hematomas expansivos tardios são pouco
descritos na literatura e tendem a ser negligenciados pela maioria dos cirurgiões
plásticos4. Quando ocorrem, necessitam de
abordagem cirúrgica de urgência, pois podem causar danos significativos. Geralmente,
são causados por “destamponamento” de lesões de grandes vasos, como os temporais
superficiais2,4. É importante que o cirurgião esteja atento a
essa complicação, para que o diagnóstico seja realizado em tempo hábil, não
comprometendo a saúde do paciente e o resultado cirúrgico final. O trabalho
apresentado tem como objetivo relatar o caso de uma paciente submetida a
ritidoplastia completa, que evoluiu no décimo dia pós-operatório (DPO) com hematoma
expansivo, choque hipovolêmico e desvio de via aérea.
OBJETIVO
Relatar o caso de uma paciente submetida a ritidoplastia completa, que no décimo dia
pós-operatório evoluiu com hematoma expansivo, choque hipovolêmico e desvio de via
aérea.
MÉTODO
Paciente A.M.R., sexo feminino, 65 anos. À admissão encontrava-se no décimo DPO de
ritidoplastia completa realizada em clínica particular. Apresentava edema e
abaulamento em hemiface esquerda após drenagem linfática (Figura 1). Realizada evacuação imediata de 250 mL de sangue vivo
através de abertura de ponto de sutura, com melhora momentânea. A paciente foi
mantida sob observação, evoluiu com nova coleção cervicofacial e progressão para
choque hipovolêmico, sendo então encaminhada com urgência para o bloco cirúrgico
(Figura 2). No momento da intubação
orotraqueal, foi necessário o uso de fibroscópico devido à compressão e desvio de
via aérea. Durante o ato cirúrgico, foi identificado volumoso hematoma cervicofacial
à esquerda e, após evacuação do mesmo, foi possível identificar sangramento ativo
da
artéria temporal superficial (Figura 3).
Realizada hemostasia através de ligadura da artéria temporal superficial esquerda
e
síntese dos retalhos cutâneos por planos.
Figura 1 - Edema e abaulamento cervicofacial em hemiface esquerda .
Figura 1 - Edema e abaulamento cervicofacial em hemiface esquerda .
Figura 2 - Retalho cutâneo com sinais de sofrimento vascular - epidermólise e
palidez do retalho.
Figura 2 - Retalho cutâneo com sinais de sofrimento vascular - epidermólise e
palidez do retalho.
Figura 3 - A artéria temporal superficial esquerda apresentava sangramento ativo
durante ato cirúrgico.
Figura 3 - A artéria temporal superficial esquerda apresentava sangramento ativo
durante ato cirúrgico.
RESULTADO
A paciente permaneceu 48 horas no centro de tratamento intensivo, em intubação
orotraqueal para manutenção de via aérea. Apresentou boa evolução no pós-operatório,
sem novos sangramentos, sem progressão do sofrimento de pele. Recebeu alta
hospitalar no quinto dia após drenagem, em boas condições clínicas. O seguimento foi
dado em consultório particular, não havendo novas intercorrências (Figura 4).
Figura 4 - Resultado após 1 mês.
Figura 4 - Resultado após 1 mês.
DISCUSSÃO
Descrita no início do século XX, a ritidoplastia, ou cirurgia do rejuvenescimento
facial, tem se tornado uma das cirurgias estéticas mais realizadas em todo o
mundo5, principalmente em pacientes com
mais de 65 anos de idade1. Embora apresente
baixas taxas de complicações graves, quando estas ocorrem, podem levar a aumento
expressivo da morbidade e resultados estéticos devastadores1. Os hematomas permanecem como a complicação mais comum e podem
ser classificados em três categorias, de acordo com sua extensão6. O primeiro grupo corresponde a pequenos
hematomas que podem ser conduzidos de forma expectante ou submetidos à punção por
agulha. O segundo grupo, hematomas médios, geralmente ocorrem nas primeiras 24
horas, sendo possível tratá-los através de expressão manual, sem necessidade de
abordagem cirúrgica. Já os hematomas de grande volume, hematomas expansivos,
necessitam de evacuação cirúrgica imediata, abertura das suturas e ligadura de vasos
sangrantes2,6. A maioria dos hematomas do primeiro e segundo
grupos ocorrem de 1 a 15 horas pós-operatórias, e os do terceiro grupo em até 48
horas. Ress relatou casos ocorridos em 2, 4 e 5 dias após procedimento
cirúrgico7, e Goldwin relatou um hematoma
expansivo ocorrido no décimo dia pós-operatório4. Embora infrequente, o hematoma expansivo tardio é uma importante
complicação que demanda exploração cirúrgica imediata. Ao contrário dos eventos
recentes, são passíveis de identificação durante abordagem, pois usualmente ocorrem
por “destamponamento” de grandes vasos, como os temporais superficiais2,4. Esses vasos devem ser hemostasiados através de ligaduras, e somente a
cauterização elétrica não é recomendada4. A
fisiopatologia dos sangramentos tardios é desconhecida, mas sabe-se que podem
decorrer até por estímulos mínimos4. No caso
apresentado, a paciente foi submetida à drenagem linfática previamente ao
sangramento, sendo creditado por nós como evento desencadeador. Quando trata-se de
hematomas em cirurgia plástica, o melhor tratamento continua sendo a prevenção.
Preconiza-se que grandes vasos sejam ligados durante a dissecção, em detrimento de
apenas coagulação direta. É importante que o cirurgião conheça e esteja atento a
essa complicação, para que o diagnóstico seja realizado em tempo hábil, não
comprometendo a saúde do paciente e o resultado cirúrgico final.
CONCLUSÃO
Hematomas expansivos tardios após ritidoplastia podem ser graves, podendo culminar
em
ameaça à vida. É essencial que o cirurgião tenha em mente essa possível complicação,
realizando hemostasia rigorosa e de forma adequada. Além disso, o acompanhamento
minucioso pós-operatório do paciente continua sendo a melhor conduta para evitar
desdobramentos desfavoráveis.
REFERÊNCIAS
1. Gupta V, Winocour J, She H, Shack RB, Grotting JC, Higdon KK.
Preoperative risk factors and complication rates in facelift: analysis of 11,300
patients. Aesthetic Surg J. 2016 Jan; 36(1):1-13. doi:
10.1093/asj/sjv162.
2. Dermatologic Surgery: Official Publication For American Society For
Dermatologic Surgery, et al. 2005 Sep; 31(9 Pt 1):1134-44. Discussion
1144.
3. Beer GM, Goldscheider E, Weber A, et al. Aesth Plast Surg. 2010;
34:502. doi: 10.1007/s00266-010-9488-8.
4. Goldwyn RM. Late bleeding after rhytidectomy from injury to the
superficial temporal vessels. Plast Reconstr Surg. 1991;
88:443-5.
5. Kleinberger AJ, Spiegel JH. What is the best method for minimizing
the risk of hematoma formation after rhytidectomy? Laryngoscope. 2015;
125:534-6. doi: 10.1002/lary.24685.
6. Sukop A, Duskova M, Tvrdek M, et al. Aesth Plast Surg. 2009; 33:838.
doi: 10.1007/s00266-008-9297-5.
7. Rees TD, Lee YC, Couburn RJ. Expanding hematoma after rhytidectomy:
a retrospective study. Plast Reconstr Surg. 1973; 51:149-53.
1. Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG,
Brasil.
Endereço Autor: Andreia Souto da Motta
Avenida do Contorno, 8000 - sala 1302, Santo Agostinho - Belo Horizonte, MG,
Brasil CEP 30110-017 E-mail: asmotta.med@gmail.com