INTRODUÇÃO
As fissuras labiopalatinas são as malformações congênitas mais comuns entre as que
podem acometer a cabeça e pescoço, e se devem à falha da fusão do lábio e do palato
na vida intrauterina1-3. Elas podem ser divididas em fenda labial
isolada, fenda labial com fenda palatina e fenda palatina isolada3-6.
A prevalência dessa doença é incerta, afeta aproximadamente 1 a cada 700 nascidos
vivos dependendo de fatores como etnia, origem geográfica e grau socioeconômico4. Podem ocorrer de forma isolada ou associada a
síndromes. Estima- se que 50% a 70% das fissuras ocorrem de forma isolada ou não
sindrômica1,4.
A frequência das fissuras labiopalatinas difere entre os sexos. Enquanto as fissuras
labiais com ou sem fenda palatina comprometem mais o sexo masculino, esse quadro se
inverte nas fissuras palatinas isoladas, que acometem o mais o sexo feminino numa
proporção de 2:1. Quanto à lateralidade, nota-se dentre as fissuras labiais
unilaterais o acometimento mais prevalente do lado esquerdo que do direito, também
numa proporção de 2:12,4,7-9.
A etiologia ocorre devido ao erro embriológico com causa diversa e incerta, sofrendo
influência de fatores genéticos, ambientais e socioeconômicos1,4. Estudos
indicam que o fumo, drogas, idade dos pais, classe social, consanguinidade e etnia
estão envolvidos no surgimento dessa malformação, relacionando-se de formas
diferentes para a ocorrência das fissuras1,4,5,10,11. Antecedentes
gestacionais, uso de drogas e história familiar são informações essenciais para
associar possíveis fatores genéticos associados. O ácido fólico apresenta-se como
fator protetor7.
Com base na origem embriológica, Spina propôs uma classificação das fissuras levando
em consideração sua posição em relação ao forame incisivo. No grupo I, encontram-se
as fissuras pré-forâmica incisivo completa, que acomete lábio, alvéolo dentário e
assoalho nasal, e incompleta, que acomete apenas o lábio. No grupo II, têm- se as
fissuras transforâmicas. O grupo III é referente às que acometem apenas palato,
podendo ser completas, ou incompletas. As fendas labiais e labiopalatinas podem ser
unilaterais ou bilaterais5,7.
O diagnóstico das fissuras orais pode ser feito no pré-natal com a ultrassonografia.
As fissuras de palato duro são de difícil visualização e só são possíveis de
diagnosticar a partir da 28ª semana. Assim, geralmente, apenas as fissuras labiais
são diagnosticadas no pré-natal precocemente, durante o primeiro trimestre7,12,13. A correção das
fissuras orais é cirúrgica de acordo com o tipo de fissura apresentada e o
protocolo de tratamento é estabelecido por cada serviço7,14,15.
OBJETIVO
Poucos estudos avaliam o perfil epidemiológico dos pacientes com fissuras orais,
especialmente no território brasileiro. Diante da necessidade da melhor compreensão
desse perfil, o presente estudo visa descrever a frequência dos tipos de fissura e
a
prevalência dos procedimentos cirúrgicos nos pacientes com fissuras labiopalatinas
admitidos e operados no Serviço Multidisciplinar de Atendimento aos Portadores de
Fissuras Labiopalatais do Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), Brasília, Distrito
Federal (DF).
MÉTODOS
Trata-se de um estudo descritivo retrospectivo realizado no Serviço Multidisciplinar
de Atendimento aos Pacientes com Fissuras Labiopalatinas, do Hospital Regional da
Asa Norte, situado na cidade de Brasília, DF. Este hospital é caracterizado como
hospital de médio porte e centro de referência no atendimento aos portadores de
fissuras labiopalatais na região Centro-Oeste. O presente trabalho foi aprovado no
Comitê de Ética e Pesquisa, da Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde
(FEPECS), conforme protocolo 53767715.4.0000.5553, e foi conduzido de acordo com a
Resolução nº196/96, que dispõe sobre a realização de pesquisas envolvendo seres
humanos.
A população do estudo compreendeu todos os pacientes submetidos a procedimentos
cirúrgicos do Serviço Multidisciplinar de Atendimento aos Pacientes com Fissuras
Labiopalatais HRAN, entre os meses de agosto de 2013 e julho de 2017. Foram
excluídos da pesquisa os pacientes nos quais as fichas não continham todas as
informações que seriam analisadas.
Os pesquisadores realizaram uma coleta de dados de prontuários dos pacientes com
diagnóstico de fissura labiopalatina deste serviço em uma tabela de Excel. As
variáveis analisadas foram a data da cirurgia, o sexo do paciente, a idade do
paciente no ato cirúrgico, a cirurgia realizada, o diagnóstico de acordo com a
classificação de Spina, a análise em relação à lateralidade das fissuras e os
antecedentes familiares relacionados às fissuras e anomalias associadas.
Posteriormente, realizou-se uma análise estatística por meio do
software [R] para Windows com os testes de proporção e
Qui-quadrado.
RESULTADOS
Entre agosto de 2013 e junho de 2017, 586 pacientes foram tratados cirurgicamente
neste serviço, porém apenas 322 preencheram os critérios inclusivos da pesquisa. Dos
322 pacientes atendidos no serviço, 169 eram do sexo masculino (52,48%). A idade dos
pacientes variou entre menos de 1 ano até 53 anos, com mediana de 1,87 anos.
A procedência dos pacientes é variável. O serviço de referência assiste o Distrito
Federal e entorno. No entanto, há pacientes que procedem do Norte e Nordeste do
Brasil.
Diagnóstico dos pacientes
Em ambos os sexos, as fissuras transforâmica esquerda e a bilateral são as mais
prevalentes, com 20,50% e 18,94%, respectivamente. Realizado o teste de
proporção, foi obtido um p-valor de 0,6098.
Conforme observado na Tabela 1, no sexo
masculino, as fissuras mais frequentes foram a transforâmica bilateral (21,30%),
transforâmica esquerda (18,93%) e transforâmica direita (15,38%). Após realizar
o teste de proporção, obteve-se um p- valor de 0,2974. No sexo
feminino, as fissuras mais frequentes foram transforâmica esquerda (22,22%),
transforâmica bilateral (16,34%) e pós-forâmica incompleta (16,34%) e o
p-valor foi de 0,2354.
Tabela 1 - Diagnóstico dos pacientes por sexo.
Diagnóstico (Fissura) |
Masculino |
Percentual |
Feminino |
Percentual |
Total |
Percentual |
Pré-forâmica incompleta esquerda |
14 |
8,28% |
11 |
7,19% |
25 |
7,76% |
Pré-forâmica incompleta direita |
6 |
3,55% |
9 |
5,88% |
15 |
4,66% |
Pré-forâmica incompleta bilateral |
3 |
1,78% |
0 |
0,00% |
3 |
0,93% |
Pré-forâmica completa esquerda |
9 |
5,33% |
7 |
4,58% |
16 |
4,97% |
Pré-forâmica completa direita |
14 |
8,28% |
11 |
7,19% |
25 |
7,76% |
Pré-forâmica completa bilateral |
3 |
1,78% |
3 |
1,96% |
6 |
1,86% |
Transforâmica esquerda |
32 |
18,93% |
34 |
22,22% |
66 |
20,50% |
Transforâmica direita |
26 |
15,38% |
16 |
10,46% |
42 |
13,04% |
Transforâmica bilateral |
36 |
21,30% |
25 |
16,34% |
61 |
18,94% |
Pós-forâmica completa |
11 |
6,51% |
12 |
7,84% |
23 |
7,14% |
Pós-forâmica incompleta |
15 |
8,88% |
25 |
16,34% |
40 |
12,42% |
Total |
169 |
100,00% |
153 |
100,00% |
322 |
100,00% |
Tabela 1 - Diagnóstico dos pacientes por sexo.
Lateralidade das Fissuras
Inicialmente, será analisada a frequência da lateralidade (unilateral e
bilateral) das fissuras mais frequentes, pré-forâmicas e transforâmicas, dos
pacientes no geral e por sexo (Tabela 2).
Na população estudada, a fissura unilateral esquerda foi a mais frequente, em
ambos os sexos.
Tabela 2 - Lateralidade das fissuras por sexo.
Lateralidade |
Masculino |
Percentual |
Feminino |
Percentual |
Total |
Percentual |
Unilateral direita |
46 |
32,17% |
36 |
31,03% |
82 |
31,66% |
Unilateral esquerda |
55 |
38,46% |
52 |
44,83% |
107 |
41,31% |
Bilateral |
42 |
29,37% |
28 |
24,14% |
70 |
27,03% |
Total |
143 |
100,00% |
116 |
100,00% |
259 |
100,00% |
Tabela 2 - Lateralidade das fissuras por sexo.
Em seguida, analisou-se a prevalência das fissuras pré-forâmicas e transforâmicas
por sexo e no geral (Tabela 3), sendo
esses tipos de fissuras os mais frequentes em ambos os sexos. Conforme o teste
de proporção mostrou por um p- valor inferior a 0,001, as
fissuras transforâmicas são mais prevalentes.
Tabela 3 - Tipo de fissura por sexo.
Diagnóstico (Fissura) |
Masculino |
Percentual |
Feminino |
Percentual |
Total |
Percentual |
Pré-forâmica |
49 |
34,27% |
41 |
35,34% |
90 |
34,75% |
Transforâmica |
94 |
65,73% |
75 |
64,66% |
169 |
65,25% |
Total |
143 |
100,00% |
116 |
100,00% |
259 |
100,00% |
Tabela 3 - Tipo de fissura por sexo.
Foram realizados testes estatísticos para analisar se o diagnóstico das fissuras
(pré-forâmica e transforâmica) dependem do sexo nos pacientes atendidos neste
serviço. Da mesma maneira, foram realizados testes para identificar se a
lateralidade das fissuras (unilateral ou bilateral) possui predileção a algum
sexo. Pelo resultado do teste de Qui-quadrado (Tabela 4), na população estudada, tanto o diagnóstico da
lateralidade quanto o da fissura são independentes do sexo do paciente.
Tabela 4 - Análise estatística em relação a lateralidade e o sexo, diagnóstico e
sexo.
Test |
Gênero |
N (%) |
Teste Qui-quadrado |
Razão entre gênero (F/M) |
Laterality |
Feminino |
116 (44,8%) |
x2 = 1,301
|
1 : 1,23 |
|
143 (55,2%) |
p = 0,52
|
Pre-foramen x trans-foramen |
Feminino |
116 (44,8%) |
x2 = 0,03
|
1 : 1,23 |
Masculino |
143 (55,2%) |
p = 0,85
|
Tabela 4 - Análise estatística em relação a lateralidade e o sexo, diagnóstico e
sexo.
Parentesco
O estudo analisou de forma subjetiva a hereditariedade das fissuras dos pacientes
por sexo no período de 2015 a 2017. Observou-se que a maior parte dos pacientes
do estudo não possuem parentes com esse diagnóstico. No sexo masculino, 77,78%
dos pacientes desta população não possuem parentes com fissura oral. Já no sexo
feminino, esse valor aumenta para 83,05%.
Malformação associada
Ao analisar a presença de malformações associadas à fissura oral dos pacientes
por sexo, percebe-se que 90,46% dos fissurados não possuem esse diagnóstico. No
sexo masculino, apenas 9,36% dos pacientes apresentam e no sexo feminino,
9,74%.
Dentre os 9,56% dos fissurados sindrômicos do serviço, 5 pacientes possuem
malformações cardíacas; 1 torácica; 1 craniana; 2 retardo mental; e 6 possuem 2
ou mais malformações associadas, sendo as mais prevalentes cardíaca, ocular,
membros e sistema urinário.
Tipo de cirurgia
Confrme apresentado na Figura 1, no centro
de Fissurados do HRAN, a cirurgia realizada com mais frequência é a
queiloplastia. Tem-se a palatoplastia como o segundo procedimento cirúrgico mais
feito pela equipe.
Figura 1 - Tipo de cirurgia no geral e por sexo.
Figura 1 - Tipo de cirurgia no geral e por sexo.
Idade
A Figura 2 mostra a relação da idade do
paciente durante o procedimento cirúrgico com o tipo de cirurgia (palatoplastia,
a queiloplastia e rinoplastia) e sexo. Ao analisar a palatoplastia, nota-se que
a mediana em ambos os sexos é de 3 anos e a faixa etária média no feminino é de
9 anos e no masculino de 6 anos. Na queiloplastia, observa-se faixa etária média
em homens de 4 anos e em mulheres de 8 anos. Sobre a mediana, nota-se antes do
primeiro ano de vida e de 1,42 anos, respectivamente. Na rinoplastia, percebe-se
faixa etária média de 20,54 anos e mediana de 17 anos no sexo masculino, já no
feminino 19,2 anos e 22,71 anos, respectivamente.
Figura 2 - Boxplot das idades por tipo de cirurgia.
Figura 2 - Boxplot das idades por tipo de cirurgia.
DISCUSSÃO
Sabe-se que um centro de referência necessita de diversos profissionais para oferecer
um tratamento completo e de qualidade para o paciente portador de fissura. No
entanto, Paranaíba et al.15 referem que 75%
das unidades de atendimento dos fissurados no Brasil possuem apenas os seguintes
especialistas em seus serviços: cirurgião plástico, cirurgião dentista e
fonoaudiólogo. No Hospital Regional da Asa Norte, preconiza-se o atendimento
interdisciplinar com os seguintes profissionais: cirurgião plástico,
otorrinolaringologista, cirurgião craniofacial, dentista, odontopediatra,
ortodontista, nutricionista, fonoaudiólogo, psicólogo, pediatra, enfermeiro,
assistente social e geneticista.
Não se sabe a prevalência exatas das fissuras labiopalatinas no Brasil. Estudos foram
realizados em outro centros, encontrando prevalência da malformação em 0,49 no Rio
Grande do Norte; 0,88 em Porto Alegre, RS; e 1,54 em Bauru, SP, a cada 1000 nascidos
vivos3,6,16.
Como a fissura labiopalatina tornou-se uma doença de notificação compulsória no DF
a
partir de setembro de 2017 (Lei 5.958/2017), não foi possível encontrar no período
analisado (agosto de 2013 a junho de 2017) na literatura local, e em dados do
governo, a prevalência exata dessa malformação no DF. Possivelmente, ocorreu uma
subnotificação, o que dificultou a determinação de sua prevalência na população
local.
Quanto ao sexo, na literatura há relatos de maior frequência de fissuras orais no
sexo masculino2,8,9,16-22. Apesar de 169 das 322 crianças estudadas
(52,48%) serem meninos, não foi possível afirmar esse dado na população estudada,
pois não houve relevância estatística.
Do total de registros de 322 fissuras orais dos pacientes do HRAN, verificou-se maior
proporção das fissuras labiais e transforâmica (80,4%) quando comparadas às fissuras
palatinas isoladas (19,6%). Esse dado está de acordo com a literatura, em que se
encontram relatos de predomínio de fissuras labiopalatinas variando entre 69,1% e
81%, considerando fissuras pré-forâmica e transforâmica numa entidade conjunta10,19.
Quanto ao diagnóstico pela classificação de Spina, os tipos de fissura mais
prevalentes foram transforâmica esquerda (20,50%) e bilateral (18,94%), seguidas da
transforâmica direita (13,04%) e pós-forâmica incompleta (12,42%). Como o valor de
p foi superior a 0,05 (p-valor de 0,6098), não
é possível afirmar nesse estudo a prevalência de um tipo de fissura. No entanto, a
literatura relata predomínio da fissura transforâmica esquerda seguida da
pós-forâmica incompleta18. Estudos que não
discriminam lateralidade também obtiveram maiores frequências de fissuras
transforâmica (24,89 - 37,1%) e fissuras pós-forâmica (26,9 - 31,7%)17,20.
Quanto à distribuição por sexo do tipo de fenda, no sexo feminino foram mais
frequentes as fissuras transforâmica esquerda (22,22%) e, no sexo masculino, as
fissuras transforâmica bilateral (21,30%). Porém, o valor de p em
ambos os sexos foi superior a 0,05, por isso, não é possível determinar a
prevalência de um tipo de fissura nessa amostra. Apesar de estudos na Eslováquia,
Rio Grande do Sul (BR), Minas Gerais (BR), Pernambuco (BR) relatarem o predomínio
de
fissuras labiais com ou sem envolvimento do palato em meninos, e a maior incidência
das fissuras palatinas isoladas no sexo feminino4,7-9,18-22.Quanto à
lateralidade, houve maior prevalência das fissuras unilaterais esquerdas (41,31%),
que foram 1,3 vezes mais frequentes que as unilaterais direitas (31,66%). Da mesma
forma, na literatura médica as fissuras também são mais comumente descritas à
esquerda2,8,9,13,16-18,20-22.
Apesar da etiologia ser multifatorial, a hereditariedade é relatada no meio
científico como o fator mais importante do acometimento das fissuras orais. Sabe-se
que o risco de uma criança nascer com fissura é aumentado em 40 vezes quando os pais
possuem essa deformidade2,5. Neste estudo, 19,85% dos pacientes possuíam
histórico familiar de fissuras orais, um valor próximo ao observado na literatura
(23%)5.
Segundo a literatura, as fissuras transforâmicas são as mais prevalentes, e
observa-se uma incidência maior no sexo masculino, de 1,5:1,023. Em consonância com a literatura, no presente estudo as
fissuras transforâmicas também foram as mais frequentes (65,25%). Porém, não se
observou estatisticamente influência do sexo no diagnóstico da fissura
transforâmica, na amostra estudada.
No Brasil, há poucas pesquisas que analisam a frequência e o tipo das malformações
congênitas associadas aos pacientes com fissuras labiopalatinas5. Um estudo realizado em 2014 no estado da Paraíba e um em 2005
em São Paulo observaram, respectivamente, que 7% e 9,18% dos fissurados eram
sindrômicos5,24. Dos pacientes atendidos no HRAN, apenas
9,54% apresentam malformações associadas. Isso ressalta a importância de pacientes
com fissuras labiopalatais serem examinados detalhadamente para realizar o
diagnóstico de outras malformações associadas5.
De acordo com a literatura, as malformações de membros inferiores e superiores são
as
mais frequentes (33%) dos defeitos associados; em segundo lugar, aparecem as
malformações do sistema cardiovascular (24%)7.
Já nos pacientes do departamento de Fissurados do HRAN, 25,8% possuem malformações
cardíacas, sendo esta a mais prevalente neste serviço.
Sabe-se que o tratamento das fissuras orais é cirúrgico e cada centro de referência
elege seu protocolo de tratamento. De acordo com o protocolo estabelecido pelo
Serviço de Fissurados do Hospital Regional da Asa Norte, a queiloplastia é o
primeiro procedimento a ser realizado em pacientes que possuem fissura acometendo
o
lábio e palato, ou apenas o lábio e deve ser feito em lactentes com 3 meses de vida
ou quando eles alcançarem as condições orgânicas mínimas necessárias para
submeter-se à anestesia geral7,14.
O fato de 80% dos pacientes atendidos no HRAN possuíam fissuras pré-forames e
transforâmicas justifica a queiloplastia ser o procedimento cirúrgico mais realizado
pelo serviço. Os resultados deste estudo mostram que a faixa etária média do sexo
masculino é de 4 anos e do feminino de 8 anos, já a mediana é antes do primeiro ano
de vida e de 1,42 anos. Com isso, nota-se que existem pacientes que foram submetidos
à queiloplastia tardiamente, alterando, assim, o valor da média.
Esse fato pode ocorrer pelo serviço de fissurados do HRAN ter um atendimento
porta-aberta, atendendo e tratando o paciente independentemente da idade com que ele
procura o serviço; ou pela dificuldade do paciente em ter acesso ao serviço de
saúde; ou por um diagnóstico tardio. Consequentemente, nem sempre o tratamento é
realizado na idade preconizada pelo protocolo. Porém, é interessante ressaltar que,
como os resultados revelam, a maioria dos fissurados atendidos neste serviço recebe
o tratamento cirúrgico no primeiro ano de vida.
De acordo com o protocolo do serviço HRAN em análise, realiza-se a palatoplastia
em pacientes portadores de fissuras labiopalatais com 18 meses de idade e peso
adequado. Neste estudo, 36,08% dos pacientes foram submetidos a esse procedimento
cirúrgico. Observou-se que a mediana em ambos os sexos é de 3 anos e a faixa etária
média no sexo feminino é de 9 anos e no sexo masculino de 6 anos. Logo, assim como
a
queiloplastia, essa cirurgia também é realizada em idades avançadas neste serviço
provavelmente por razões similares.
A rinoplastia também faz parte do protocolo do tratamento em casos de deformidade
nasal. Com isso, ela é menos frequente e é realizada após a correção das fissuras
labiopalatais ou quando o paciente completar 16 anos de idade14. No Hospital Regional da Asa Norte, em concordância com a
literatura, apenas 6,82% dos pacientes foram submetidos a esse procedimento
cirúrgico. Observou-se faixa etária média de 20,54 anos e mediana de 17 anos, em
consonância com o recomendado pela literatura.
De acordo com Paranaíba et al.15, as técnicas
de Veau e Van Langenbeck são as mais utilizadas em palatoplastias em relatórios
internacionais. Nas queiloplastias, uma revisão de protocolos cirúrgicos brasileiros
mostrou a preferência pela técnica de Millard para queiloplastia unilateral e, de
Spina e Millard para casos bilaterais. No departamento de Fissurados do HRAN, a
maioria das cirurgias são realizadas com as técnicas de Fisher ou de Millard para
queiloplastia e de Van Langenbeck e Sommerlad para palatoplastia.
CONCLUSÃO
O perfil epidemiológico do paciente com fissura labiopalatina atendido no Hospital
regional da Asa Norte é de maioria do sexo masculino, não sindrômicos e sem parentes
com esse diagnóstico. Não foi possível determinar uma prevalência entre os sexos.
Concluiu-se que as fissuras transforâmicas foram as mais frequentes, principalmente
a unilateral à esquerda. A cirurgia mais realizada foi a queiloplastia, já que as
fissuras pré-forâmica e transforâmica foram as mais frequentes. Não foi possível
encontrar no período analisado na literatura local, e em dados do governo, a
prevalência exata dessa malformação no DF.
COLABORAÇÕES
EVR
|
Análise e/ou interpretação dos dados, análise estatística, coleta de
dados, redação - preparação do original.
|
TOP
|
Análise e/ou interpretação dos dados, análise estatística.
|
GNM
|
Análise estatística.
|
LRR
|
Concepção e desenho do estudo.
|
LGM
|
Concepção e desenho do estudo, supervisão.
|
MDS
|
Supervisão.
|
DRP
|
Aprovação final do manuscrito, redação - revisão e edição.
|
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1. Hospital Regional da Asa Norte, Brasília, DF,
Brasil.
Autor correspondente: Tayane Oliveira
Pires SMHS - Área Especial, Q. 101, Asa Sul - Brasília, DF, Brasil
CEP 70330-150 E-mail: tayaneoliveirap@gmail.com
Artigo submetido: 18/12/2018.
Artigo aceito: 10/2/2019.
Conflitos de interesse: não há.