ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175
Semiologia da Parede Abdominal: Seu Valor no Planejamento das Abdominoplastias
Semiology of the Abdominal Wall: its Value in Planning Abdominoplasty
Articles -
Year1999 -
Volume14 -
Issue
3
Carlos Alberto JaimovichI, Francesco MazzaroneII, Jairo Fernando Navarro ParraIII, Ivo PitanguyIV
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo principal determinar a integridade ou as alterações da parede abdominal através da semiologia metodizada e sistematizada, para estabelecer relação direta e objetiva com as técnicas e táticas cirúrgicas para cada caso individualmente. Ressalta a importância de se avaliar de modo padronizado e constante a região abdominal dentro de todo o contexto corporal, possibilitando ao cirurgião um raciocínio lógico e claro, levando-o à escolha segura da melhor conduta cirúrgica a seguir.
Palavras-chave:
ABSTRACT
The main purpose of this paper is to determine the integrity and alterations of the abdominal wall through methodized, systematized semiology, in order to establish a direct, objective relationship with the technical and surgical tactics for each individual case. It stresses the importance of assessing the abdominal region in a regular, standardized manner within a whole-body context, offering the surgeon a clear; logical line of thinking that aims at choosing the best surgical conduct to be followed.
Keywords:
INTRODUÇÃO
O abdome ocupa uma posição central na imagem anatômica do corpo humano, destacando-se assim sua importância na definição do contorno corporal e do padrão estético do indivíduo.
A forma da parede abdominal é dada pela estrutura esquelética, pela quantidade e distribuição da gordura, aspecto e situação da pele, integridade do sistema músculo aponeurótico e o conteúdo intracavitário. Cada um desses componentes é uma variável independente dentro do diagnóstico da deformidade da parede abdominal que determinará o tipo de tratamento a ser indicado para o paciente.
Sheldon(1) classifica a forma humana em termos de somatotipos: mesomórfico, ectomórfico e endomórfico, os quais representam um hábito corporal diferente. Os indivíduos mesomórficos são aqueles que têm uma aparência quadrada, com predomínio de músculos, osso e tecido conectivo. O ectomórfico se caracteriza pela longitude e fragilidade, com mínimo de desenvolvimento dos componentes muscular e gorduroso. Os endomórficos apresentam excesso de gordura, abdome proeminente e extremidades curtas. Naturalmente existe alto grau de variabilidade dentro dos três tipos, e a grande maioria da população representa um termo médio, sendo os extremos endomórficos e ectomórficos pouco comuns.
Lewis(2,3,4,5) descreve a parede abdominal de três formas diferentes: pendular, globosa, e flácida. O abdome pendular apresenta acúmulo de gordura no abdome inferior e ao redor do umbigo, podendo a pele dobrar-se sobre o púbis devido ao excesso de peso (Figs. 1a - 1c). O abdome globoso é arredondado, com distensão generalizada, havendo uma quantidade variável de gordura, com ou sem flacidez do sistema músculo-aponeurótico (Figs. 2a - 2c). O abdome flácido apresenta pele redundante, lassa e frouxa, encontrando-se estrias com freqüência (Figs. 3a - 3c).
Figs. 1a-1c - Abdome Pendular.
Figs. 2a-2c - Abdome Globoso.
Figs. 3a-3c - Abdome Flácido.
Pitanguy(6) divide as deformidades abdominais em duas categorias: alterações estéticas e funcionais. Os defeitos estéticos são aqueles que modificam o contorno corporal e devem-se principalmente à flacidez da parede abdominal, acúmulo de gordura e enfraquecimento músculo-aponeurótico. Os defeitos como as hérnias comprometem o aspecto funcional da parede abdominal, que já não é mais capaz de conter as vísceras em sua cavidade. Podem ocorrer deiscências de suturas, durante as primeiras fases do processo cicatricial (do 1º ao 21º dia pós-operatório), devidas a hematomas, infecções, falhas na produção do tecido colágeno e aumento da pressão intracavitária, provocando ruptura da linha incisional e determinando uma solução de continuidade, o que leva à instalação de uma hérnia incisional. Essas deiscências são também passíveis de se instalar mais tardiamente, mesmo após o 1º mês do pós-operatório, pelas mesmas razões, sendo mais comuns as ligadas à perda da resistência cicatricial frente a um súbito e agudo aumento da pressão intracavitária (esforços indevidos no pós-operatório). Outras seqüelas, como as cicatrizes inestéticas decorrentes de posicionamento inadequado de incisões ou caso elas infeccionem, conferem um aspecto desagradável e deformante ao abdome. Eventuais lesões de nervos periféricos podem causar atrofia de grupos musculares, resultando em áreas de enfraquecimento da parede abdominal(6).
A cirurgia plástica abdominal tem por finalidade a correção das alterações da parede abdominal, desde as que afetam a cobertura tegumentar (pele e tecido celular frouxo subcutâneo) até as que afetam a estrutura músculo-aponeurótica, procurando atingir os padrões compatíveis com o que se considera "normal" para o contorno corporal(7-11).
Essas alterações podem ser resumidas em: cutâneas (redundâncias, estrias, cicatrizes, flacidez e retrações), tecido celular frouxo subcutâneo (lipodistrofias) e sistema músculo-aponeurótico (diástases, hérnias, eventrações e abaulamento).
O exame físico, baseado numa avaliação semiológica criteriosa, é fundamental para que se possam colher todos os dados importantes que possibilitarão estabelecer uma classificação didática e de fácil compreensão(5,6,12-14). Essa classificação permite estabelecer com grande margem de acerto o procedimento cirúrgico mais adequado a ser adotado para cada caso, proporcionando um tratamento com melhor resultado estético e funcional. Este é o escopo do presente trabalho: estabelecer uma relação segura entre uma semiologia metodizada, sistematizada e padronizada, ajustando os dados encontrados à classificação proposta pelo Prof. Ivo Pitanguy, para finalmente indicar as melhores condutas cirúrgicas destinadas à correção das alterações do abdome de modo específico e global.
ANATOMIA
Considerações Gerais
A parede abdominal anterior é composta de pele, tecido conjuntivo frouxo subcutâneo (tecido celular subcutâneo) e um sistema músculo-fáscio-aponeurótico. Mediante a remoção e/ou a reposição dessas estruturas, o cirurgião plástico tenta esculpir o tronco. Por conseguinte, o conhecimento da anatomia da parede abdominal anterior se reveste de crucial importância.
A parede abdominal anterior é uma área poligonal em forma de diamante, limitada acima pelo apêndice xifóide e as margens costais, lateralmente pelos músculos oblíquos e a crista ilíaca e abaixo pelos ligamentos inguinais externos(5).
À ectoscopia, apresenta diversas "saliências e depressões", que representam áreas de sombra e de reflexo de luz que, em seu conjunto, propiciam um aspecto harmonioso do relevo abdominal e conferem a aparência de beleza a esta unidade estética corporal(6).
As saliências naturais são produzidas pelas bordas costais, os músculos retos abdominais, as cristas ilíacas, o púbis e parte da região suprapúbica. As depressões são representadas pela linha média supra-umbilical, o umbigo, a pequena área infra-umbilical média, as fossas ilíacas, as arcadas semilunares (áreas de inserção dos músculos retos e oblíquos) e as inserções transversas supra-umbilicais dos músculos retos(5,12,15,16).
A faixa circunferencial compreendida entre a base do tórax e o ápice da região pélvica (cristas ilíacas) é conhecida na terminologia corrente como "cintura", sendo de fundamental importância para a configuração da silhueta do corpo humano, sobretudo entre as mulheres. Sua altura é variável de acordo com o biótipo (normolíneo, brevilíneo, longilíneo). Desse modo, é o esqueleto quem determina o contorno corporal com mais ou menos "cintura", de acordo com o biótipo. Assim, um biótipo longilíneo favorece uma cintura com maior definição, pois permite uma linha suave e alongada com concavidade bilateral, possibilitando um contorno mais adelgaçado. O grau de amplitude da pélvis contribui também para a harmonia da forma dessa região, sendo mais ampla a pélvis feminina em relação ao tórax.
Na vida intra-uterina, é através do umbigo que se faz a conexão entre o feto e mãe . Depois do nascimento, representa a cicatriz secundária à secção e queda do cordão. Nos últimos anos, o umbigo tem adquirido cada vez mais importância sob o ponto de vista estético, social e sexual. A moda tem dado a ele maior destaque, expondo-o com grande naturalidade. Antigas incisões sobre a parede abdominal chegaram a permitir sua extirpação. As técnicas atuais continuam conservando-o e respeitando-o, tentando inclusive aprimorar o seu aspecto(17-21).
Pode-se dizer que a cicatriz umbilical é a única cicatriz do corpo que o indivíduo faz questão de possuir e reclama quando não está presente ou é eliminada. A sua ausência produz uma severa dismorfia, levando ao comprometimento da própria imagem corporal, com reflexos psicológicos que não podem ser desconsiderados.
O estudo histológico da zona da implantação do umbigo na parede abdominal comprovou a ausência de vasos permeáveis pelos quais pudessem nutrir-se a área umbilical ou zonas vizinhas da parede abdominal, além do tecido correspondente ao anel fibroso(16). Essa nutrição é garantida por mínimos vasos e/ou por embebição através das estruturas peritoneais, o que possibilita a preservação da cicatriz umbilical mesmo nos casos em que ela é "esqueletizada" como, por exemplo, na cirurgia do retalho miocutâneo do músculo reto abdominal, situação em que o pedículo umbilical fica literalmente desnudado, preso apenas por sua base à aponeurose posterior e revestido internamente pelos folhetos peritoneais.
A cicatriz umbilical tem uma forma arredondada, deprimida e mais profunda na parte superior. A sua parte externa e superior está limitada pelo rodete cutâneo. Por esse motivo, as bordas são elevadas, sendo a borda inferior mais plana, formando suave transição para a pele da parede abdominal. No fundo da cavidade, em sua zona média, se aprecia uma elevação (mamilo) cujo centro corresponde à cicatriz do cordão umbilical. Ao redor do mamilo existe uma depressão circular denominada sulco umbilical que separa o mamilo do rodete cutâneo(5,20,22,23)(Fig. 4).
Fig. 4 - Forma da Cicatriz Umbilical.
A fixação da cicatriz umbilical na parede abdominal permite a delimitação clara do abdome em dois segmentos: um abdome superior e outro, inferior. Tanto um como outro se acentuam pela depressão ocasionada pela zona umbilical e, na maioria das mulheres jovens, o abdome inferior é levemente mais proeminente e elevado.
Segundo Goss(22), a cicatriz umbilical está ao nível das vértebras L3 e L4. Dubuo(5,24) estudou a situação do umbigo em 100 pessoas não obesas, escolhidas aleatoriamente, em decúbito supino e concluiu que, em 96% dos casos, ela coincide com a linha horizontal imaginária que une as cristas ilíacas.
A região pubiana representa o vértice inferior do polígono abdominal compreendido entre as regiões inguinocrurais e a linha de Dumm. Conhecida como Monte de Vênus, tem importância na harmonia do conjunto abdominal, sendo imprescindível que se leve em conta seu formato, volume, implantação pilosa e sua altura, determinada pela distância entre a fúrcula vulvar e seu limite com o abdome inferior (linha de Dumm). Essa distância, segundo os parâmetros vigentes, corresponde em média a cerca de 6 cm, que é a distância ideal mínima que deve existir após uma abdominoplastia clássica evitando sua distorção.
Pele
A pele da região abdominal tem cerca de 2-4 mm de espessura, contém os anexos habituais de outras regiões do corpo (pêlos, glândulas sudoríparas e glândulas sebáceas), sendo uma das áreas em que sua grande elasticidade permite significativas alterações do volume do abdome (gravidez, obesidade, etc.).
Sua inserção na fáscia é frágil, exceto na área da cicatriz umbilical, onde guarda conexão mais forte com as estruturas subjacentes, indo ao encontro da aponeurose dos músculos retos e da própria linha alba.
Observa-se que os pêlos têm distribuição oblíqua e convergente de cima para baixo em direção à linha média, onde tendem a se distribuir longitudinalmente desde o apêndice xifóide até a região pubiana.
Na região pubiana, a distribuição pilosa tende a ser mais baixa e mais triangular nas mulheres. Nos homens, ela continua com a própria região abdominal, tendo aí distribuição mais difusa e menos poligonal.
O correto posicionamento do retalho durante as abdominoplastias evita que o eixo central seja deslocado lateralmente, o que poderia provocar des-vios da implantação pilosa, provocando aspecto desgracioso ao abdome.
A linha média deve corresponder exatamente à projeção da linha alba, que divide a parede abdominal em duas metades laterais rigorosamente simétricas.
Tecido Conjuntivo Frouxo Subcutâneo (Tecido Celular Subcutâneo)
Markman e Barton(25) descreveram o tecido subcutâneo do tronco e da parte proximal das extremidades inferiores e confirmaram os dados de Gray e cols.(23), com relação à existência de uma camada de tecido adiposo superficial e outra, profunda. A capa superficial está dividia em compartimentos formados por septos fibrosos, ao contrário da camada profunda que está distribuída ao acaso e contém pouca septação. O padrão característico dos depósitos de gordura no ser humano varia com o sexo, a idade e a raça. Os dois padrões principais são o ginecóide (feminino) e o andróide (masculino). As mulheres tendem a ter um percentual maior de tecido gorduroso do que os homens, tipicamente aquelas que possuem acúmulo de gordura na parte inferior do tronco, quadris, coxas e região glútea. As áreas de acúmulo de gordura no homem se traduzem em aumento da circunferência abdominal e do tórax, assim como da região sub-mentoniana. As mudanças que ocorrem com a idade são basicamente produzidas por aumento do volume do tecido adiposo do tronco. O tecido adiposo das extremidades diminui com a idade, sendo transferido aos espaços intramuscular e intermuscular(26,27).
Os indivíduos de raça negra tendem a mostrar um maior depósito de gordura na região glútea, em comparação com os da raça oriental e caucásica. Esse fator é magnificado pela pronunciada lordose lombar, também observada em muitos desses pacientes(21,27).
Fáscia Superficial (Fáscia de Camper-Scarpa)
A fáscia superficial tem um papel importante na manutenção da estética abdominal. Sua porção inferior (infra-umbilical) é mais nítida, principalmente na região das fossas ilíacas onde pode manifestar-se como uma verdadeira fáscia, mais fina que a muscular. Também está presente nas linhas semilunares onde, entretanto, é pouco visível, bem como na sua projeção púbica. Apesar de ser menos nítida do que nas áreas restantes, essa fáscia pode ser sempre diferenciada. Pode-se concluir que, nas áreas onde se observa maior deslizamento da pele e do tecido subcutâneo em relação à aponeurose dos músculos, a fáscia superficial torna-se mais densa e fica mais bem evidenciada. Nas pacientes que se submetem a uma laparotomia com incisão de Pffannestiel, por exemplo, se a fáscia não for reestruturada, pode-se produzir uma retração da mesma em sentido cefálico, causando uma depressão suprapúbica transversal que pode representar um efeito antiestético indesejável(12). Este dado torna evidente a necessidade de se proceder à sutura por planos, de modo adequado, reforçando a continuidade da própria fáscia, principalmente nas abdominoplastias em que se deseja o melhor efeito estético possível.
Vascularização
Dois plexos arteriais primários são responsáveis pela irrigação sanguínea da parede abdominal: um sistema superficial subdérmico e um sistema profundo músculo-aponeurótico. Numerosos vasos formam conexões anastomóticas entre os dois planos, especialmente na região periumbilical.
No plano profundo músculo-aponeurótico, os vasos epigástricos superiores e inferiores correm longitudinalmente dentro do músculo reto anterior e formam uma rede capilar no abdome médio. No abdome superior também estão os ramos xifóideos que correm paralelos aos vasos epigástricos superiores. O plexo superficial subdérmico se origina fundamentalmente nos vasos perfurantes localizados na região periumbilical. Também existem ramos provenientes das artérias epigástricas inferiores superficiais, circunflexa ilíaca e o ramo ascendente da pudenda externa que contribui na formação desse sistema(5,16,23).
Hunger(28) descreve três zonas vasculares da parede abdominal (Fig. 5). A zona I, que ocupa a parte média do abdome, é vascularizada pelo sistema epigástrico profundo. A zona II, no hipogástrio, é perfundida pela artéria ilíaca externa. A zona III, no hipocôndrio, flanco e fossa ilíaca, é irrigada pelas artérias diafragmáticas, intercostais e lombares, formando uma rede vascular primária, principal encarregada da nutrição e do retorno venoso do retalho após uma abdominoplastia.
Fig. 5 - Vascularização da parede anterior do abdome descrita por Hunger.
O retorno venoso depende do sistema toracoepisgástrico, que se situa no plano subcutâneo e faz a drenagem para os vasos axilares e femorais e para as veias do sistema epigástrico profundo.
A Drenagem Linfática é constituída por duas redes: uma superficial e outra profunda, cada uma das quais vai fazer a drenagem para o sistema coletor ganglionar linfático axilar e inguinal (Fig. 6). Os gânglios linfáticos inguinais constituem o centro coletor de todas as vias linfáticas da perna, genitais externos, região perineal e glútea e zonas do abdome e do tronco situadas abaixo do umbigo. Dividem-se em gânglios linfáticos subinguinais superficiais (situados sobre a fáscia) e profundos (localizados abaixo da fáscia). Os gânglios linfáticos axilares constituem o centro de numerosas vias linfáticas que procedem do braço, ombro, parede torácica e abdominal alta e glândulas mamárias. Dividem-se em superficiais, braquiais, peitorais e subescapulares e profundos ou infraclaviculares(16,23).
Fig. 6 - Inervação e drenagem linfática da parede abdominal.
A drenagem linfática necessariamente se dirige aos gânglios axilares no pós-operatório imediato de abdominoplastia devido à secção dos canais linfáticos que drenam os gânglios inguinais. Os sistemas tendem a se refazer com o passar do tempo.
Inervação
A inervação da parede abdominal procede dos nervos intercostais D5 a D12 e dos nervos abdominocrural maior e menor procedentes de L1(16,23)(Fig. 6).
A distribuição dos nervos da parede abdominal muda após a abdominoplastia(16,23,29). Os dermatomas D5-D12 são deslocados para baixo, em sentido caudal. A maioria dos dermatomas inferiores (D10-D11-D12) são ressecados com a pele na abdominoplastia convencional. Os dermatomas superiores são ampliados após a cirurgia de maneira que D9 situe-se imediatamente acima da incisão.
Sistema Músculo-Aponeurótico(16,23)
A parede abdominal é formada por três músculos largos de cada lado: oblíquo externo, oblíquo interno e transverso, reforçados na linha média pelos músculos retos e pelo músculo piramidal. Esses músculos são indispensáveis para manter a postura, a locomoção e a função intestinal e constituem o elemento primário para estabelecer a tonicidade da parede abdominal.
Fisiopatologia das Alterações da Parede Abdominal
Os múltiplos fatores que causam enfermidades e processos que alteram o balanço fisiológico do organismo podem também alterar a forma do abdome até o ponto em que este se torna desagradável para o paciente e causa, inclusive, dificuldades para a higiene corporal normal. A melhor forma de estudar esses múltiplos fatores é considerar cada componente da parede abdominal em separado.
Pele
A pele da parede abdominal pode se alterar por traumatismo, gravidez, obesidade, perda de peso ou processo normal de envelhecimento. Esses fatores podem produzir mudanças temporárias ou permanentes na pele. A natureza elástica da pele abdominal é importante desde o ponto de vista funcional, como na gravidez, e este fator é uma vantagem que se deve ter em conta durante a abdominoplastia. No entanto, a elasticidade da pele não é ilimitada. Se tracionada em excesso, pode dar como resultado a formação de estrias (ruptura e separação do colágeno dérmico que é substituído por tecido cicatricial). Esse fenômeno pode ocorrer em toda a extensão do abdome, sendo mais freqüente no hipogástrio, abaixo do umbigo. A flacidez e a redundância, freqüentes após a gravidez, podem ser reversíveis até certo ponto; se não reverterem no transcurso dos seis meses seguintes ao parto, pode-se considerar que serão uma seqüela permanente(5,6,9,12-14,30-32).
A flacidez, a redundância e a formação de estrias podem também originar-se de mudanças drásticas de peso, como ocorre nos pacientes com obesidade mórbida. A parede abdominal pode ter recebido feridas de origem traumática ou cirúrgica, com cicatrizes visíveis secundárias, que podem ser tratadas ou retiradas durante a abdominoplastia(5,6,12,30-33).
A maceração, o intertrigo e as dermatites, presentes em alguns pacientes e secundárias à umidade e ao atrito entre as dobras cutâneas por redundância dermoadiposa, identificam-se sobretudo em pacientes com abdome em avental.
Tecido Conjuntivo Frouxo Subcutâneo (Tecido celular subcutâneo)
A Sociedade Brasileira de Endocrinologia e a Sociedade Internacional de Endocrinologia e Diabetes definem a obesidade como o aumento do peso corporal de 15-20% acima do peso ideal para os homens e de 25-30% acima do peso ideal para as mulheres, à custa do tecido adiposo.
Na obesidade hipertrófica existe um incremento nato na capacidade de armazenamento de gordura nos adipócitos, para uma mesma população celular (as células aumentam de volume), em comparação com a obesidade hiperplásica em que existe uma reprodução de adipócitos novos que se multiplicam para reacomodar o excesso de armazenamento de lipídeos. Isso ocorre quando a gordura total corporal é maior do que 40 kg(5,6,25,27,34).
A obesidade pode causar hiperlordose, com o conseqüente estiramento dos músculos retos anteriores e diástase, ao qual se soma o acúmulo de gordura no abdome. Depois de perdas de peso, é freqüente encontrar nesses pacientes mudanças atróficas, como flacidez e redundâncias da pele e diástase dos músculos previamente estirados(33,34).
Vale lembrar que a obesidade é, em princípio, contra-indicação para cirurgias plásticas. Somente em condições especialíssimas são feitas as cirurgias plásticas chamadas "higiênicas" em pacientes com esse tipo de alterações metabólica e corporal. Nesses casos, as cirurgias visam a remoção dos grandes excessos dermoadiposos, sem qualquer descolamento, a fim de reduzir os volumes de tecidos redundantes, procurando oferecer mais conforto aos pacientes.
Músculos e Aponeuroses
A estrutura músculo-fáscio-aponeurótica da parede abdominal forma uma espécie de cinturão constritivo que mantém os órgãos intra-abdominais em seu lugar e ajuda a estabelecer uma função intestinal normal. Esses músculos também intervêm nos movimentos de flexão do tronco e nos processos fisiológicos que requerem o aumento da pressão intra-abdominal(6,12,13,14,31,32,35,36).
Existem certas área de debilidade normal da parede abdominal: linha alba, linha semilunar, anel umbilical e região inguinal. Devido a traumatismos (cirúrgicos ou não) e ao "estresse" (situação de tensão tecidual como na gravidez ou distensão intracavitária) podem produzir-se diástases músculo-aponeuróticas (quando são afetados os músculos retos abdominais, produz-se o aumento da globosidade; quando é afetado o músculo oblíquo externo, resulta em aumento do perímetro da circunferência conhecida como "cintura") e/ou herniações do conteúdo abdominal(5,15,16,23,37).
PACIENTES E MÉTODOS
Para se obter uma avaliação semiológica padronizada, com o objetivo de determinar a integridade ou as alterações da parede abdominal, realizou-se um estudo seqüencial em um grupo de 30 pacientes, não selecionados, em série, por um período de 8 meses (março a novembro de 1996), na 38a Enfermaria da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro, Serviço do Prof. Ivo Pitanguy.
Elaborou-se um protocolo básico que foi adotado em todo o grupo em estudo (Fig. 7).
Fig. 7 - Esquema do protocolo
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RESULTADOS
Idade
A faixa etária variou de 34 a 63 anos; 43,3% (13 pacientes) corresponderam à quinta década da vida; 26,7% (8 pacientes) corresponderam à quarta década; 20,0% (6 pacientes) corresponderam à sexta década; 10,0% (3 pacientes) corresponderam à sétima década. A quinta década apresentou o maior número de pacientes, o que corresponde às referências na literatura sobre o assunto (Tabela I).
Sexo
Todos os pacientes foram do sexo feminino.
Tipo Constitucional
Foram identificados três grupos de pacientes: brevilíneo, normolíneo e longilíneo. Determinamos como brevilíneo o tipo morfológico caracterizado pelos membros curtos e tronco largo; longilíneo, o tipo morfológico caracterizado pela prevalência dos membros sobre o tronco; e normolíneo, aquele com forma intermediária.
O tipo constitucional predominante foi o brevilíneo com 20 pacientes (66,7%), seguido do normolíneo com 9 pacientes (30%) e do longilíneo com 1 paciente (3,3%)(Tabela II) .
Causa Determinante da Alteração da Parede Abdominal
Foi perguntado a cada paciente qual tinha sido a causa determinante das alterações estruturais em sua parede abdominal: 13 pacientes (43,3%) relataram ser uma condição secundária à gravidez, resultando como alteração a lipodistrofia do hipogástrio, estrias hipogástricas e periumbilicais e flacidez da parede abdominal; 10 pacientes (33,3%) manifestaram como causa a obesidade que começou na adolescência; 5 pacientes (16,7%) relataram o emagrecimento como causador da flacidez deformante da parede abdominal e 2 pacientes (6,7%) eram portadoras de hérnia incisional secundária a laparotomias. Não foram relatadas outras formas de alteração da parede abdominal (Tabela III).
AVALIAÇÃO POSTURAL
Posição Ortostática
Estando a paciente sem suas vestes e com sua autorização prévia, realizamos uma visão de frente e outra de perfil que nos permitisse avaliar: forma da parede abdominal, posição da cicatriz umbilical em relação à linha intercristas ilíacas, medição comparativa da circunferência corporal, avaliação cutânea e a visão em conjunto da região mamária, abdominal e trocantérica (Figs. 8a e 8b).
Figs. 8a e 8b - Posição ortostática: visão frontal(a) e visão de perfil(b).
Formas da Parede Abdominal
Com base na classificação de Lewis(3, 4), descreve-se a forma da parede abdominal classificando-a em três tipos: pendular, globosa e flácida. Predominou a forma globosa, caracterizada por ser um abdome redondo, protruso com distensão generalizada, lipodistrofia supra e infra-umbilical e lassidão do sistema músculo-aponeurótico (ou sem este), correspondendo a 22 pacientes (73,3%), seguido do abdome pendular, com 6 pacientes (20,0%), e do abdome flácido, com 2 pacientes (6,7%) (Tabela IV).
Posição da Cicatriz Umbilical em Relação à Linha Intercristas Ilíacas
Tomando-se como referência as cristas ilíacas, a avaliação foi feita na posição ortostática traçando uma linha horizontal imaginária que unia as cristas ilíacas. Em 24 pacientes (80%) a cicatriz umbilical era visualmente bem posicionada, coincidindo com a linha traçada entre as cristas ilíacas; em 6 pacientes (20%) a cicatriz umbilical era visualmente posicionada no abdome superior (em 2 casos essa linha passava pela metade inferior do umbigo, e em 4 casos ela passava por baixo da cicatriz umbilical).
Não se encontrou no grupo estudado nenhum caso em que a cicatriz umbilical estivesse abaixo da linha interilíaca, mesmo nos casos mais severos de abdome em avental ou pendular, em que acreditávamos que a parte externa da cicatriz umbilical estivesse deslocada para baixo, devido ao peso do retalho abdominal (Tabela V).
Medição Comparativa da Circunferência Corporal: (Dorsoabdominal)
Foram feitas medidas padronizadas, no pré-operatório e no 3º mês de pós-operatório (intervalo mínimo mas suficiente para a acomodação do retalho, regressão do edema, ajuste postural das pacientes, etc.). Evidenciou-se uma diminuição da circunferência ao nível do apêndice xifóide e na região umbilical variável de 4 a 8%, relacionada especialmente com a abdominoplastia clássica e a lipoaspiração dos flancos. A medição ao nível suprapúbico se manteve estável, não se observando modificações na circunferência sacropúbica. Vale lembrar que, mesmo nos abdomes em avental, o volume causado pelo retalho redundante sobre o púbis não foi incluído na medição por não fazer parte da estrutura pubiana (Figs. 9a - 9c).
Fig. 9 - Medição padronizada da circunferência corporal (dorsoabdominal), na área abdominal, com fita métrica. Nível do apêndice xifóide (a), nível do umbigo (b) e nível pubiano (c).
Avaliação Cutânea
A avaliação do estado da pele na região abdominal mostrou estrias localizadas na região periumbilical e hipogástrica na maioria das pacientes (29), cicatrizes inestéticas secundárias a procedimentos cirúrgicos, como laparotomia, colecistectomia e apen-dicectomia, em 6 pacientes. Em 4 pacientes com abdome pendular evidenciou-se lesão eritematosa, úmida, secundária à maceração pelo atrito da pele (intertrigo), que respondeu bem ao tratamento tópico com cremes antiinflamatórios e bactericidas no pré-operatório.
Visão em conjunto da região mamária abdominal e trocantérica
Essa avaliação se destinou a verificar a integração entre o abdome, as mamas e a região trocantérica, permitindo-nos estabelecer a necessidade ou não de procedimentos cirúrgicos associados, visando à melhor harmonização do conjunto corporal, como, por exemplo, lipoaspiração de quadris ou de flancos, mamoplastia, etc. Embora não estejam previstas cirurgias associadas simultâneas na rotina do Serviço, essa análise permite ao cirurgião uma visão prospectiva dos resultados e a previsão de eventuais cirurgias a serem realizadas em outros tempos cirúrgicos.
Posição Sentada
O abdome foi dividido em dois segmentos:
Mesoepigástrico - estende-se do apêndice xifóide e rebordo costal até uma linha horizontal que passa ao nível da cicatriz umbilical. Meso-hipogástrico - estende-se do rebordo do púbis até a linha horizontal que passa ao nível da cicatriz umbilical.
Observamos, nessa posição, principalmente o grau de lipodistrofia e flacidez da parede abdominal manifestado por uma ou mais dobras cutâneas na visão de frente e perfil (Figs. 10a e 10b). Realizamos a seguir a manobra de pinçamento manual do retalho, que é feita no nível do segmento mesoepigástrico, verificando o grau de distensibilidade da área. É a região mesoepigástrica quem vai proporcionar a cobertura da área cruenta meso-hipogástrica após a ressecção dos tecidos redundantes. Nessa manobra estuda-se o seu comprimento, sua elasticidade e suas aderências a estruturas subjacentes (Figs. 11a e 11b).
Figs. 10a e 10b - Avaliação de frente (a) e perfil (b) na posição sentada, notando-se a dobra cutânea mesogástrica, as redundâncias e a linha de Dumm.
Figs. 11a e 11b - Manobra de pinçamento manual para avaliação da região mesoepigástrica, em duas pacientes distintas.
A visão da região meso-hipogástrica na posição sentada nos dá apenas uma idéia da quantidade de tecidos redundantes, não sendo essa uma avaliação precisa para o cálculo do volume e extensão dos tecidos a serem ressecados no baixo-ventre.
É também nessa posição que se pode determinar a linha de Dumm, fundamental para a previsão do posicionamento ideal da cicatriz hipogástrica final pós-abdominoplastia (Figs. 10a e 10b).
Posição em Decúbito Dorsal
Visa à avaliação do sistema músculo-aponeurótico, localizando as áreas de fraqueza ou fragilidade que poderão ser encontradas ao nível da linha alba, região umbilical, linha semilunar, regiões inguinais e áreas cicatriciais. Com a participação ativa da paciente foram realizadas manobras de Valsalva (que tendem a aumentar a pressão intra-abdominal), tais como: flexão forçada do tórax e flexão forçada dos membros inferiores em extensão (Figs. 12 e 13).
Fig. 12 - Manobra de flexão forçada do tronco, com resistência na região frontal.
Fig. 13 - Manobra de flexão forçada dos membros inferiores, com resistência na região dos joelhos.
Sistema Músculo-Aponeurótico
A diástase dos músculos retos abdominais anteriores foi evidenciada em 22 pacientes, correspondendo a 73,3%. Sua localização durante o exame físico foi supra-umbilical, também evidenciada na manobra de extensão forçada do tórax em posição ortostática (Figs. 14a e 14b). Em 1 paciente (3,3%) se evidenciou hérnia umbilical, 2 pacientes (6,7%) apresentaram hérnia incisional na linha média supra e infra-umbilical secundária a laparotomias e foram facilmente evidenciadas no exame físico. Em 5 pacientes (16,7%) não se evidenciou alteração do sistema músculo-aponeurótico abdominal durante o exame físico (Tabela VI).
Figs. 14a e 14b - Manobra de extensão forçada do tórax em posição ortostática, procurando evidenciar o abaulamento na linha média decorrente de diástase dos músculos retos abdominais anteriores. Duas
pacientes diferentes.
No ato operatório entretanto foi feita a correção da diástase dos músculos retos abdominais, tanto no nível supra como infra-umbilical, em todas as pacientes. Depreende-se daí que, durante o exame físico, a diástase meso-hipogástrica já estava presente mas não pôde ser detectada, pois o volume meso-hipogástrico de tecidos redundantes foi de tal monta que mascarou a evidenciação dos sinais típicos de uma diástase muscular, principalmente o abaulamento vertical na linha média durante as manobras de Valsalva.
Complementação do Estudo do Retalho Abdominal
Estando a paciente em decúbito dorsal, solicita-se que ela realize a flexão dos joelhos apoiando os pés no leito, em relaxamento muscular abdominal total. Nesse momento realizamos o pinçamento do retalho ao nível do segmento meso-hipogástrico, tracionando-o longitudinalmente em direção ao púbis. Dessa forma conheceremos o comprimento do retalho mesoepigástrico, sua elasticidade e distensibilidade, a altura estimada de sua secção, o melhor tratamento a ser adotado para a cicatriz umbilical, o tipo de cicatriz resultante. Do mesmo modo, tem-se uma idéia mais precisa da extensão e do volume de tecido meso-hipogástrico a ser ressecado (Fig. 15).
Fig. 15 - Paciente em decúbito dorsal, membros inferiores fletidos, musculatura abdominal relaxada. Procede-se a manobra de pinçamento dos tecidos do mesoepigástrico e sua tração longitudinal no sentido caudal.
Classificação de Pitanguy(6)
Tipo I: Lipodistrofia abdominal sem flacidez de pele; ausência de diástase ou hérnia; cicatriz umbilical em posição anatômica normal.
Tipo II: Lipodistrofia abdominal infra-umbilical com flacidez cutânea discreta, presença ou ausência de diástase; cicatriz umbilical em posição anatômica normal.
Tipo III: Lipodistrofia abdominal generalizada, com flacidez cutânea moderada; presença ou ausência de diástase.
Tipo IIIA: Cicatriz umbilical em posição anatômica normal.
Tipo IIIB: Cicatriz umbilical em posição anatômica excessivamente elevada.
Tipo IV: Lipodistrofia abdominal acompanhada de acentuada flacidez cutânea. Presença de diástase muscular ou eventrações, com ou sem cicatriz associada; cicatriz umbilical em posição anatômica normal.
Tipo V: Acentuada flacidez cutânea abdominal, com ou sem lipodistrofia; presença de cicatriz na linha média do abdome. Cicatriz umbilical em posição anatômica normal ou alterada.
Tipo 0: Acentuada lipodistrofia e flacidez abdominais, não havendo condições de correção cirúrgica por problemas clínicos. Os pacientes deste grupo devem submeter-se a uma rigorosa terapia clínica para perda de peso, muitas vezes necessitando de um tratamento multidisciplinar (endocrinologista, fisioterapeuta, nutricionista, psicólogo, etc.).
Estudo dos Dados Prevalentes na Metodização Semiológica
Neste grupo de 30 pacientes, os dados prevalentes, ou seja, que tiveram maior incidência percentual, foram: Pacientes na quinta década da vida (43,3%), do sexo feminino (100%), com tipo constitucional brevilíneo (66,7%), que relataram a gravidez como principal causa determinante da alteração da parede abdominal (43,3%), com forma globosa (73,3%), com cicatriz umbilical ao nível da linha intercristas ilíacas (80%), com retalho mesoepigástrico suficiente para cobrir a área cruenta meso-hipogástrica após sua ressecção (66,7%), com diástase dos músculos retos abdominais anteriores como principal alteração da parede abdominal (73,3%).
TÉCNICAS CIRÚRGICAS
Todos os pacientes foram classificados semiologicamente, tendo sido realizado o seu programa cirúrgico pré-operatório pelo Professor e o Residente responsáveis. Os procedimentos cirúrgicos foram realizados por médicos residentes no terceiro ano de formação do Curso de Pós-Graduação em Cirurgia Plástica do Serviço do Prof. Ivo Pitanguy, exceto em um caso de hérnia incisional devido ao volume e conteúdo do saco herniário, no qual o instrutor responsável comandou a cirurgia.
As técnicas cirúrgicas empregadas foram:
Lipoaspiração Isolada(6,29,38,39)
A lipoaspiração simples da região abdominal é indicada para pacientes portadores de deformidades do tipo I da Classificação de Pitanguy. Na grande maioria são pacientes jovens e com lipodistrofia localizada ou generalizada no abdome, com pele de boa elasticidade e turgor, sem flacidez músculo-aponeurótica. Uma paciente de nosso estudo foi submetida a este procedimento (3,3%)
Miniabdominoplastias(3,6,40-42)
Procedimento indicado para pacientes que possuem enfraquecimento músculo-aponeurótico na linha média do abdome, lipodistrofia infra-umbilical e moderada flacidez cutânea (tipos II e III da Classificação de Pitanguy).
Três pacientes (10%) foram submetidas a este procedimento. Nas outras seis pacientes (20%), para as quais estaria teoricamente indicada a miniabdominoplastia, foi realizada a abdomino-plastia clássica segundo a Técnica de Pitanguy, tendo em vista ser um procedimento mais seguro e com menos complicações potenciais como as que são relatadas e observadas nas chamadas miniabdominoplastias (alto índice de seromas, sofrimento e necroses do retalho abdominal, retração cicatricial e redundâncias cutâneas). Nesses casos, a cicatriz final resultante foi um "T" invertido, com o componente vertical mediano de mínimas proporções.
Abdominoplastia pela Técnica de Pitanguy(6,7,11,13,30,31,43,44)
Indica-se esta técnica para os pacientes com moderada ou acentuada flacidez cutânea associada a lipodistrofia localizada ou generalizada, com ou sem eventrações ou hérnias da parede abdominal, enquadrando-se para este procedimento os tipos IV, V e alguns casos do tipo III, sendo que, nestes últimos, a cicatriz resultante poderá apresentar um componente vertical em forma de "T" invertido. Dezoito pacientes (60%) de nosso estudo foram submetidas a este procedimento.
Abdominoplastia Associada a Lipoaspiração(6-8,10,28,30,33,38,45,46)
A associação desta técnica à lipoaspiração torna-se cada vez mais comum, sendo indicada sobretudo para tratar a região dos flancos e quadris, áreas antes localizadas fora do alcance do cirurgião durante uma cirurgia plástica abdominal. Seis pacientes (20%) foram submetidas à associação desses procedimentos.
Em nenhum caso foi realizada lipoaspiração na área descolada do retalho abdominal, devido ao aumento da morbidade que este procedimento pode trazer, como lipolise ou necrose secundária ao comprometimento da vascularização na área tratada.
Abdominoplastia Atípica(6,19,30,32,36,44,47)
Foi indicada em pacientes que apresentavam cicatriz mediana supra e infra-umbilical, lipodistrofia acentuada, flacidez cutânea e hérnia incisional. Duas pacientes (6,7%) foram submetidas a este procedimento, tendo sido utilizado material aloplástico (tela de Marlex® - polipropileno) para reforço músculo-aponeurótico, resultando em cicatriz mediana vertical xifopubiana transumbilical, combinada com cicatriz horizontal arqueada localizada ao nível da linha de Dumm e de concavidade superior.
Não fosse a imprevisibilidade do resultado estético da cicatriz mediana vertical, esta seria talvez a melhor maneira de se obter um adelgaçamento eficaz da "cintura", com aprimoramento da visão ântero-posterior da silhueta (a plicatura dos músculos retos abdominais é eficaz, sobretudo para o aprimoramento da visão de perfil, corrigindo a protrusão da parede abdominal).
CONCLUSÕES
Com o presente trabalho, procurou-se atingir alguns propósitos:
Determinou-se o perfil de nossos pacientes baseados nos dados prevalentes de metodização semiológica, e encontramos: sexo feminino na 5a década da vida, brevilínea, que acusou a gravidez como principal causa da alteração da parede abdominal, apresentando esta a forma globosa, com diástase do músculo reto e retalho mesoepigástrico suficiente. Estabeleceu-se a importância da sistematização da semiologia da parede abdominal, na identificação de sua integridade ou alterações. Procurou-se adotar uma conduta padronizada e sistematizada, tornando fácil, rápida e eficaz a avaliação semiológica da parede abdominal. Definiu-se a valorização dos achados semiológicos na interpretação da Classificação de Pitanguy para os tipos de abdome e das abdominoplastias. Verificou-se que a abdominoplastia pela Técnica de Pitanguy foi o procedimento mais utilizado em nossos pacientes, tendo um amplo espectro de indicações com alto índice de bons resultados cirúrgicos. Notou-se a redução na incidência de miniabdominoplastias devido à inversão da relação risco-benefício, com nítida preferência às abdominoplastias pela Técnica de Pitanguy. Observou-se o aumento da indicação da lipoaspiração durante a abdominoplastia clássica, indicada sobretudo para tratar a região dos flancos e quadris, aprimorando o resultado. Procurou-se diminuir a morbidade, tempo cirúrgico e complicações, graças a uma programação cirúrgica mais objetiva e segura. Reforçou-se o conceito de que é imprescindível um exame clínico completo, rigoroso e meticuloso, para que o cirurgião possa chegar a conclusões diagnósticas que permitam estabelecer tratamentos cirúrgicos corretos, com redução significativa de erros e equívocos. Procurou-se, enfim, possibilitar ao cirurgião uma visão prospectiva, antecipando os seus resultados cirúrgicos com base numa análise precisa e direta, buscando a harmonia entre o abdome, tórax, quadris e púbis, evitando de todas as maneiras possíveis os resultados desgraciosos e antinaturais.
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I. Professor Assistente do Curso de Pós-Graduação em Cirurgia Plástica da PUC-RJ e do Instituto de Pós-Graduação Médica Carlos Chagas. Membro Titular da SBCP, da FILACAP, da Academia Brasileira de Medicina Militar, do Colégio Brasileiro de Cirurgiões. FISPRS, FICS.
II. Professor Assistente do Curso de Pós-Graduação em Cirurgia Plástica da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e do Instituto de Pós-Graduação Médica Carlos Chagas. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e da Federação Ibero-Latino-Americana de Cirurgia Plástica.
III. Médico Residente Graduado pelo Curso de Pós-Graduação em Cirurgia Plástica do Instituto de Pós-Graduação Médica Carlos Chagas.
IV. Professor Titular do Curso de Pós-Graduação em Cirurgia Plástica da PUC-RJ e do Instituto de Pós-Graduação Médica Carlos Chagas. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, da Academia Nacional de Medicina, Academia Brasileira de Letras. FICS, FACS.
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