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Original Article - Year2017 - Volume32 - Issue 4

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2017RBCP0088

RESUMO

INTRODUÇÃO: Agravo de grande importância biopsicossocial, queimadura é um tema crucial na formação médica, uma vez que recém-formados se deparam com pacientes que sofreram queimaduras nos mais variados cenários profissionais.
MÉTODOS: Este estudo avaliou o ensino e a aprendizagem do tema queimaduras em alunos do curso de Medicina de uma faculdade pública do Estado de São Paulo; foi aplicado um questionário específico para avaliar o conhecimento sobre o atendimento inicial ao paciente queimado na primeira série (grupo 1 - 54 estudantes), e na sexta série (grupo 2 - 60 estudantes).
RESULTADOS: Observou-se, no grupo 1, grande desconhecimento sobre o tema, com média geral de desconhecimento ("erros") de 70,98% e de acertos de 29,02%; no grupo 2, essas taxas foram de 36,66 % e 63,34 %, respectivamente. Somente 63,34% dos alunos do sexto ano conseguiriam conduzir adequadamente o tratamento de um paciente queimado e, consequentemente, oferecer a este paciente um melhor prognóstico.
CONCLUSÕES: Os dados são preocupantes, uma vez que não se verificou conhecimento nem preparo adequados dos formandos para atendimento de pacientes queimados, e que queimaduras são situações de emergência que exigem intervenção médica rápida, adequada e eficiente, a fim de reduzir a morbimortalidade das vítimas.

Palavras-chave: Curva de aprendizado; Educação médica; Queimaduras; Serviços Médicos de emergência; Testes de aptidão.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Burns, an injury of high biopsychosocial importance, are a crucial issue in medical training, and newly graduated students face burn patients in a variety of professional settings.
METHODS: This study assessed the teaching and learning of burns among medical students at a public facility in the State of São Paulo; a specific questionnaire was applied to evaluate first year (Group 1: 54 students) and sixth year (Group 2: 60 students) medical students' knowledge about the initial care of burn patients.
RESULTS: In Group 1, there was a substantial lack of knowledge about the subject, with a general average incorrect answer rate ("errors") of 70.98% and a correct answer rate of 29.02%; in Group 2, these rates were 36.66% and 63.34%, respectively. Only 63.34% of the sixth-year students would be able to adequately conduct the treatment of a burn patient, gauged by their ability to offer a patient a better prognosis.
CONCLUSIONS: The data are disturbing, since adequate knowledge and preparation of the trainees for the care of burn patients has not been verified, and burns are emergency situations that require prompt, adequate, and efficient medical intervention to reduce patients' morbidity and mortality.

Keywords: Learning curve; Medical education; Burns; Emergency medical services; Aptitude tests.


INTRODUÇÃO

Devido à importância social e ao impacto na saúde pública, queimadura é um tema de suma importância para a formação médica. Segundo Shahrokhi et al.1, a educação médica em queimaduras pode ser dividida em três componentes principais: a educação cirúrgica, a educação multiprofissional e a orientação.

Historicamente, o método tradicional de educação na prática da cirurgia foi centrado no modelo hospitalocêntrico, inicialmente descrito por William Halsted há mais de 100 anos1. A aquisição de competências é dependente de observação, auxílio e, posteriormente, de execução de tarefas, classicamente conhecido como "veja um, faça um e ensine um". Porém, com o avanço da tecnologia, a preocupação com a segurança do paciente e os "erros médicos", criou-se uma demanda por inovação na educação cirúrgica1.

Médicos recém-formados se deparam com pacientes que sofreram queimaduras nos mais variados cenários profissionais: medicina de emergência, trauma, atendimento pré-hospitalar, cirurgia plástica, dermatologia e clínica geral, sendo dessa forma essencial que tenham conhecimentos significativos sobre o manejo de queimaduras2.

Estudo realizado por Egro e Estela2, em 2014, aponta que o desconhecimento sobre como diagnosticar e executar os cuidados iniciais em queimaduras poderia potencialmente levar à má gestão de queimaduras por médicos.


OBJETIVO

Este trabalho foi elaborado com o intuito de avaliar, de forma indireta, como a formação médica está preparando os estudantes de Medicina para o atendimento primário em queimaduras.

Para tanto, foi proposto verificar se há diferença significativa entre o desempenho dos acadêmicos do primeiro ano (1ª série) com os do último ano (6ª série) do curso de Medicina da Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA), a descrever a distribuição de idade e sexo entre esses estudantes, averiguar se há diferença significativa no número de erros e acertos perante os casos-problema, se ocorre maior número de acertos em estudantes que previamente fizeram algum curso extracurricular sobre o tema ou que cursaram outra faculdade na área da saúde e, ainda, a checar se nos casos de menor complexidade envolvendo queimaduras há uma maior convergência entre as respostas dadas pelos estudantes ou um maior número de acertos.


MÉTODOS

Este é um estudo quantitativo que se propôs a quantificar e qualificar o conhecimento dos estudantes dos primeiro e último anos do curso médico em relação às condutas e ao prognóstico em casos envolvendo queimaduras. Foi aplicado um questionário que consiste em perguntas sobre a identificação do aluno, seu conhecimento sobre o atendimento inicial em queimados e se ele recorre a outras fontes de conhecimento sobre o tema, além do conteúdo ministrado na faculdade (FAMEMA).

O questionário aplicado (Anexo 1) foi construído e validado através da pesquisa "Construção de um questionário para análise do conhecimento sobre o atendimento inicial do queimado", e data do ano de 20083.

População do estudo

Foram entrevistados estudantes dos primeiro e último anos do curso de Medicina da FAMEMA, no ano de 2015. Os estudantes do primeiro ano foram entrevistados nos dois primeiros meses do curso de Medicina. Os estudantes do último (sexto) ano foram entrevistados nos dois últimos meses do curso de Medicina. O tamanho idealizado da população do estudo foi de 160 sujeitos, divididos em 80 alunos do primeiro ano e 80 alunos do sexto ano do curso de Medicina da FAMEMA.

Critérios de inclusão

Foi considerado critério de inclusão unicamente o fato de o estudante estar cursando o primeiro ou o último ano do curso de Medicina da FAMEMA no ano de 2015.

Critérios de exclusão

Foi considerado como único critério de exclusão o fato do estudante se recusar a participar do estudo.

Aspectos éticos

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA) - CAAE: 37178914.0.0000.5413. Todos os participantes foram esclarecidos a respeito do propósito da investigação e assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido após concordarem em participar.

Análise dos dados

Os dados foram transcritos para meio (planilhas) eletrônico e para a análise quantitativa foi utilizada apenas análise comparativa (porcentagens). Os dados obtidos foram comparados com a literatura prévia.


RESULTADOS

Para avaliação do conhecimento geral sobre queimaduras, os seguintes domínios foram selecionados: conceito de queimaduras, classificação da gravidade, cálculo da área de superfície corporal queimada (SCQ) no paciente adulto e na criança, fisiopatologia, exame básico, cuidados imediato e inicial, lesões por inalação, cuidado local, posicionamento da vítima, reposição volêmica, triagem de queimaduras, analgesia, antibioticoterapia, sinais vitais e suporte nutricional (Tabela 1).




O questionário foi fornecido para 160 estudantes das primeira e sexta séries do curso de Medicina da FAMEMA. Destes, 46 negaram-se a participar do estudo (26 estudantes do primeiro e 20 do sexto ano). Com isto, a amostra da primeira série (grupo 1) foi constituída por 54 estudantes (47,37% do total) e da sexta série (grupo 2) por 60 estudantes (52,63% do total). A prevalência do sexo feminino foi de 68 alunos (59,65%) e masculino de 46 alunos (40,35%). Dentre os alunos, apenas cinco (4,39%) possuíam curso superior prévio. A média geral de idade foi de 23,93 anos.

Nas questões que abordavam exame básico e os cuidados imediato e inicial no primeiro atendimento à queimadura (questões 1, 2 e 3 do questionário) houve como índices de acerto, respectivamente, 48%, 55% e 68% no grupo 1, e 95%, 78,33% e 93,33% no grupo 2, e de desconhecimento, 51,85%, 44,44% e 31,48% no grupo 1 e 5%, 21,67% e 6,67% no grupo 2.

A taxa de desconhecimento na questão 4, que aborda o conhecimento do cálculo da superfície corporal queimada no adulto e na criança, foi de 94,44% e de acerto foi de 5% no primeiro ano (grupo 1); no sexto ano (grupo 2), estes índices foram, respectivamente, de 31,67% e 68,33%.

As questões 5, 6 e 7 visavam avaliar o conhecimento acerca dos cuidados locais no primeiro atendimento a queimados, e obtiveram taxas de acertos de 37%, 26% e 9%, e de desconhecimento de 62,96%, 74,07% e 90,74% no grupo 1; no grupo 2 os índices foram de 60%,43,33% e 60% de acertos e de 40,0%, 56,67% e 40,0%, respectivamente, para as questões 5, 6 e 7.

Nas questões 8 e 9 foram abordados o posicionamento e controles do paciente no atendimento médico, e foram obtidas taxas de acertos de, respectivamente, 16% e 37% no grupo 1 e de 48,33% e 96,67% no grupo 2, e de desconhecimento de 83,33% e 62,96% no grupo 1 e de 51,67% e 3,33% no grupo 2.

A décima pergunta do questionário foi sobre a fisiopatologia das queimaduras. A porcentagem de acertos foi de 37% e a de desconhecimento foi de 62,96% no grupo 1. No segundo grupo, o índice de acertos foi de 73,33 e de desconhecimento de 26,67%.

As questões 11, 12 e 13 eram sobre a triagem das queimaduras e as taxas de acertos foram de 16%, 46% e 29%, e as de desconhecimento sobre o tema foram de 83,33%, 53,70% e 70,37% no grupo 1. No segundo grupo, as taxas de acerto foram de 86,67%, 85% e 80%, e as taxas de desconhecimento foram de 13,33%, 15% e 20%.

Nas perguntas 14 e 15, o assunto abordado foi suporte nutricional do paciente e as razões de acerto foram de 13% e 37% e de desconhecimento de 87,04% e 62,96% para o primeiro grupo, com 31,67% e 83,33% de acerto, e 68,33% e 16,67% de desconhecimento para o segundo grupo.

A questão 16 versava sobre volume inicial administrado no paciente queimado, e obteve taxas de acertos de 5% e de desconhecimento sobre o tema de 94,44% no grupo 1, e de 10% de acerto e 90% de desconhecimento no grupo 2.

A taxa de desconhecimento na questão 17, que abordava antibioticoterapia no paciente queimado foi de 98,15%, e a de acertos foi de 1% no grupo 1, e de 20% de acertos e 80% de desconhecimento no grupo 2.

Na pergunta 18, que era sobre os controles vitais em paciente queimado, a porcentagem de acertos foi de 31% e a de desconhecimento foi de 68,52% no primeiro grupo, e de 63,33% de acertos e de 36,67% de desconhecimento no segundo grupo (para ver detalhamento dos resultados, vide Tabelas 2 e 3).






DISCUSSÃO

Queimaduras são lesões traumáticas geradas pelo contato com calor, frio, substância química, eletricidade ou radioatividade, que determina destruição parcial ou total da pele e de seus anexos, deixando sequelas físicas e/ou psicológicas em suas vítimas4,5.

As queimaduras são tidas como um problema de saúde pública pela Organização Mundial da Saúde (OMS)6. Somente no ano de 2004, o número de queimados graves que passaram por algum procedimento médico no mundo foi de aproximadamente 11 milhões de pessoas, superando a incidência de doenças altamente prevalentes como tuberculose e HIV4.

Mais de 300.000 mortes por ano são causadas por queimaduras por fogo, e este número se torna muito maior ao se considerar queimaduras de outras etiologias. A mortalidade por queimaduras é maior em países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos, correspondendo a 95% do total de mortes causadas por queimaduras em todo o mundo6.

Em países desenvolvidos, a mortalidade por queimaduras no sexo masculino é maior que no feminino (proporção de 2:1) na faixa etária de 15-59 anos, enquanto em países subdesenvolvidos a morte em mulheres ocorre 2 a 3 vezes mais, considerando o mesmo grupo etário4. No Egito, 9% das mortes de mulheres em idade fértil é causada por queimaduras. Na Índia, aproximadamente 65% da mortalidade por queimaduras se refere às mulheres, geralmente relacionadas a acidentes domésticos, automutilação e violência doméstica4.

Um estudo prospectivo, realizado no período de abril de 2000 a março de 2005, em Hong Kong7, evidenciou 264 crianças admitidas na Unidade de Queimados do hospital "Prince of Wales", com predomínio do sexo masculino em todas as faixas etárias, sendo a escaldadura a etiologia mais comum7. Em outro estudo8, publicado em 2008, e realizado no Centro Nacional de Queimados CHU IbnRochd de Casablanca, Marrocos, observaram-se 543 admissões de crianças queimadas no serviço (45,7% do total), sendo 96,5% das queimaduras de origem térmica, com predomínio na faixa etária de 1 a 5 anos e a maior parte sendo do sexo masculino (63,5%).

Em 2009, foram realizados 80.607 internamentos no Sistema único de Saúde (SUS) por lesões decorrentes de queimaduras. Houve um predomínio de homens em relação às mulheres (58,6%), e as faixas etárias mais acometidas foram adultos jovens (23,1%) e crianças (22%), havendo predomínio entre menores de 4 anos (16%)5.

No Brasil, os agentes externos, como queimaduras, são os principais responsáveis por mortes na faixa etária de 1 a 14 anos, contribuindo para altas taxas de mortalidade infantil. Em se tratando de queimaduras, as sequelas também são fatores de grande impacto social: para cada morte, tem-se quatro crianças com sequelas físicas e 100% das sobreviventes com sequelas psicológicas9. Nos dados do SUS referentes ao ano de 2015, disponíveis pelo DATASUS (http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sih/cnv/fiuf.def), foram realizadas 7.147 internações em caráter de urgência e foram gastos R$ 9.795.595,31 (aproximadamente US$ 3.000.000,00) com serviços hospitalares devido a acidentes por contato com fonte de calor e substâncias quentes.

Peets et al.10 atentaram-se ao fato de que o conteúdo curricular atualmente é baseado em opiniões de alguns médicos e diretores de instituições de ensino, e não em protocolos. Com isso, os currículos, no que tange ao atendimento de pacientes graves, como queimados, podem não atender às necessidades de ensino dos alunos. As patologias selecionadas no estudo foram: parada respiratória, arritmias cardíacas, choque hemorrágico, distúrbios eletrolíticos e equilíbrio ácido-base, convulsão, parada cardíaca, overdose e abstinência medicamentosa, além de politrauma e sepse. Com base nisto, observa-se que o tema "queimaduras" não é frequentemente abordado no currículo médico. Contudo, é de fundamental importância o preparo adequado dos profissionais para o atendimento emergencial de pacientes queimados.

Estudo realizado no Kilimanjaro Christian Medical Centre constatou que a maioria dos pacientes queimados não recebiam conduta emergencial adequada, o que culminou em internação prolongada e aumento da mortalidade11. Em observação prospectiva12 realizada no Royal Perth Hospital, na Austrália, de 227 atendimentos a queimados, apenas 88 (39%) receberam o manejo inicial de maneira adequada e 50% dos pacientes receberam condutas completamente inadequadas.

Na avaliação realizada no presente trabalho, no grupo 1 (alunos do primeiro ano do curso de Medicina), observou-se grande índice de desconhecimento geral sobre o tema "queimaduras", com média geral de desconhecimento ("erros") de 70,98% e de acertos de 29,02%; no grupo 2 (alunos do sexto ano do curso de Medicina), essas taxas foram de 36,66 % e 63,34 %, respectivamente. Constatou-se, portanto, que o aprendizado no atendimento primário de queimaduras teve relativa alta porcentagem de acertos entre os estudantes do último ano do curso de Medicina na amostra estudada.

Contudo, somente 63,34% dos alunos do sexto ano conseguiriam conduzir naturalmente o tratamento de um paciente queimado e, consequentemente, obter maior sucesso teórico. Os dados são preocupantes, uma vez que o índice de desconhecimento dos alunos do último ano do curso de Medicina ocorreu particularmente em relação aos cuidados locais, suporte nutricional, hidratação e administração de antibióticos, temas de fundamental importância na condução desses casos; o bom uso do tempo nestes casos (queimaduras) é primordial e determinante do prognóstico13.

As maiores taxas de acertos no grupo 1 foram justamente no exame básico e cuidados imediatos e inicial no primeiro atendimento à queimadura, demonstrando maior conhecimento em temas básicos (gerais). Contudo, devido à grande importância da abordagem inicial do paciente queimado para a sobrevida do mesmo, e o fato de o conhecimento geral sobre tais temas ser esperado para alunos da primeira série do curso de Medicina, uma porcentagem de acertos média de 57% é considerada inadequada, podendo, assim, considerarmos que o aprendizado já se inicia de forma ineficaz. Não era esperada a contemplação dos temas sobre cuidado local, conduta médica e fisiopatologia na grade curricular da primeira série de Medicina, e a taxa média de desconhecimento encontrada na amostra foi realmente alta, de 64%.

Como o grupo 1 foi composto por alunos recém egressantes do ensino médio, também podemos inferir quão deficitária está a educação em saúde nas escolas primárias e secundárias. Como em nosso estudo, aquele realizado por Rea et al.12 apontou que educação em primeiros socorros não é fornecida adequadamente na Austrália após estudantes da área de saúde apresentarem desempenho ruim em um questionário sobre abordagem inicial em queimaduras. Contudo, escolas têm um papel importante e crescente na promoção de saúde, prevenção de doenças e de acidentes entre crianças e adolescentes14.

Em nosso estudo, os alunos concluintes (grupo 2) do curso de Medicina obtiveram bom desempenho nos temas exame básico e cuidados imediatos no atendimento à queimadura, da mesma forma que Lemon et al.15 obtiveram resultados satisfatórios em primeiros socorros em queimaduras. Contudo, nos temas cuidados locais no primeiro atendimento à queimadura, obtivemos baixas porcentagens de acertos, assim como no estudo realizado por Rea et al.12, que teve como objetivo verificar o conhecimento da abordagem inicial em queimaduras entre profissionais da saúde e obteve acerto máximo em apenas 18,8% dos entrevistados.

Vale enfatizar que situações de emergência exigem intervenção imediata, conduzida de forma rápida e eficiente, a fim de reduzir a morbimortalidade das vítimas, sendo este ponto de sumária importância na formação médica13. Skinner e Peat16, ainda em 2002, enfatizaram que injúrias causadas por queimaduras, quando conduzidas com primeiros cuidados adequados, estão associadas a resultados mais favoráveis, restringindo o dano aos tecidos, a necessidade de cirurgias e a morbidade subsequente.

Na análise do conhecimento da fisiopatologia das queimaduras, o presente estudo teve 73,33% de acertos no grupo 2. Lemon et al.15 analisaram o mesmo tema (conhecimento da fisiopatologia das queimaduras) com quatro questionamentos, obtendo taxas de acertos de 88%, 83%, 36% e 92%, podendo ser o desempenho considerado nos dois estudos (este e o de Lemon et al.15) aceitável. De maneira geral, nos dois grupos analisados neste trabalho, o conhecimento teórico em queimaduras se mostrou superior ao prático. Estudo anterior publicado por Chakravarthy et al.17 apontaram o fato de que o ensino em Medicina de emergência demanda treinamentos práticos com simulações para atingir a eficácia desejada.

Infelizmente, neste trabalho, destacou-se no grupo 2 o desconhecimento sobre os cálculos da superfície corporal queimada no adulto e na criança (68,33%) e do volume inicial de reposição volêmica a ser administrado (90%). Tais cálculos são fundamentais no primeiro atendimento ao paciente queimado em sala de emergência, uma vez que a hidratação adequada nas primeiras horas após o trauma tem relação direta com as taxas de sobrevida18.

Somente no Reino Unido são realizados cerca de 175 mil atendimentos de pacientes queimados em salas de emergência por ano, e cerca de 13 mil na Holanda19. No Brasil não há um levantamento específico sobre tais atendimentos, mas, sendo um país de terceiro mundo, espera-se números muito elevados. Mais uma vez nos preocupa a dimensão do quão deficitário está o preparo de nossos estudantes para atendimentos em emergências, particularmente em se tratando de queimaduras.

Em estudo realizado por Lemon et al.15 no Reino Unido, apenas 45% dos alunos tiveram ensino formal na área de queimaduras, 20% tiveram ensino não relacionado à grade curricular da faculdade e 35% não tiveram nenhum ensino relacionado ao tema. Em estudos prévios, demonstra-se que apenas 13% das escolas inglesas ensinam sobre queimaduras de forma estruturada, e das 29 faculdades entrevistadas, o tempo máximo que se dispensa ao tema é de 4 horas durante todo o curso de graduação, não muito diferente daquilo que observamos no dia-a-dia da nossa Instituição (FAMEMA).

Na Instituição onde foi realizado este estudo (FAMEMA), existe apenas uma atividade de ensino formal para queimaduras, de tempo limitado e insuficiente, de apenas 2 horas. Comparando-se com o estudo realizado por Lemon et al.15, podemos dizer que os nossos estudantes têm apenas metade do tempo de "ensino formal" em queimaduras quando comparados aos estudantes do Reino Unido, já considerado inadequado e bastante ineficiente.

O reduzido espaço da especialidade de Cirurgia Plástica no currículo médico, e consequentemente do tema "queimaduras", em muito é ligado ao fato desta especialidade ser erroneamente considerada, muitas vezes, somente por seu componente estético. Uma pesquisa relativamente recente20, do ano de 2006, mostrou que 93% dos alunos de Medicina classificaram a "cirurgia estética" como o núcleo da especialidade de Cirurgia Plástica, durante avaliação do currículo médico.


CONCLUSÃO

Embora os índices de acerto no sexto ano de graduação em Medicina sejam maiores que no primeiro ano, não há conhecimento nem preparo adequado dos formandos para atendimento de pacientes queimados. Isto é preocupante, pois queimaduras implicam em situações de emergência que exigem intervenção médica rápida, adequada e eficiente, a fim de reduzir a morbimortalidade das vítimas.


COLABORAÇÕES

GM
Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito; concepção e desenho do estudo; realização das operações e/ou experimentos; redação do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.

AFM Aprovação final do manuscrito; realização das operações e/ou experimentos; redação do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.

LRMS Análise e/ou interpretação dos dados; aprovação final do manuscrito; concepção e desenho do estudo; realização das operações e/ou experimentos; redação do manuscrito ou revisão crítica de seu conteúdo.


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1. Faculdade de Medicina, Universidade de Marília, Marília, SP, Brasil
2. Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil
3. Faculdade de Medicina de Marília, Marília, SP, Brasil
4. Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, São Paulo, SP, Brasil

Instituição: Faculdade de Medicina de Marília, Marília, SP, Brasil.

Autor correspondente:
Luís Ricardo Martinhão Souto
Avenida Santo Antonio, 60, Apto. 130
Marília, SP, Brasil - CEP 17501-470
E-mail: lrmsouto@yahoo.com.br

Artigo submetido: 5/6/2017.
Artigo aceito: 23/9/2017.

Conflitos de interesse: não há.

 

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