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Utilização do retalho miocutâneo de grande dorsal, com extensão adiposa, nas reconstruções mamárias: uma opção para preenchimento do polo superior
Use of the myocutaneous latissimus dorsi flap with fat extension in breast reconstruction: an option for filling the upper pole
RESUMO
INTRODUÇÃO: As sequelas de mastectomia se apresentam de formas variadas exigindo, do cirurgião, experiência e criatividade para obter o melhor resultado na reconstrução de uma nova mama. Dentre as dificuldades para que este objetivo seja alcançado, está o desafio de um melhor preenchimento do polo superior da mama. O objetivo deste trabalho é apresentar uma opção terapêutica alternativa para correção do polo superior dentre as técnicas já existentes com este propósito.
MÉTODO: A técnica cirúrgica utilizou o retalho de músculo grande dorsal com extensão gordurosa para preenchimento do polo superior da neomama durante sua reconstrução. A técnica descrita foi utilizada em 8 pacientes durante a reconstrução mamária tardia, com idades variando entre 39 e 70 anos. O tamanho desta extensão gordurosa variou entre 4,0 × 10,0 e 7,0 × 13,0 cm. O componente gorduroso do retalho foi avaliado após 3 meses através de ressonância magnética.
RESULTADOS: Foram usados implantes mamários que variavam entre 270 e 435 ml. O acompanhamento pós operatório variou entre 3 meses a 1 ano. Ocorreram 2 casos de epidermólise (28%) na junção do retalho cutâneo com a área receptora. Não houve perda ou sofrimento do retalho. Os resultados demonstram clinicamente ou visualmente que a correção da depressão do polo superior da neomama foi alcançada adequadamente, bem como a viabilidade do retalho gorduroso, observada nos exames de imagem (ressonância magnética).
CONCLUSÃO: A técnica proposta é uma alternativa adequada para o tratamento da maioria dos casos de reconstrução mamária em que se busca o preenchimento da depressão existente no polo superior da mama.
Palavras-chave:
Reconstrução da mama; Retalho miocutâneo; Mastectomia; Músculos superficiais do dorso.
ABSTRACT
INTRODUCTION: The sequelae of mastectomy presents in numerous ways, requiring the experience and creativity of the surgeon to achieve the best result in the reconstruction of a new breast. One of the difficulties in achieving this objective is the challenge of adequately filling the upper pole of the breast. The objective of this work was to present an alternative therapeutic option for correction of the upper pole of the neobreast.
METHODS: In our surgical technique, a latissimus dorsi muscle flap with fat extension is used for filling the upper pole of the neobreast during its reconstruction. The described technique was used in 8 patients during late breast reconstruction. The patients' ages ranged from 39 and 70 years. The size of the fat extension ranged from 4.0 × 10.0 cm to 7.0 × 13.0 cm. The fat component of the flap was evaluated after 3 months by using magnetic resonance imaging (MRI).
RESULTS: Breast implants that varied in volume between 270 and 435 mL were used. The follow-up period after surgery ranged from 3 months to 1 year. Two patients had epidermolysis (28%) at the junction of the cutaneous flap and the receiver area. No graft loss or other complications occurred. Our results demonstrate clinically or visually that correction of the depression in the upper pole of the neobreast was satisfactorily achieved. The viability of the fat flap, as observed on MRI, was adequate.
CONCLUSION: The proposed technique is a suitable alternative method for filling the depression in the upper pole of the neobreast in most cases of breast reconstruction.
Keywords:
Breast reconstruction; Myocutaneous flap; Mastectomy; Superficial muscles of the back.
INTRODUÇÃO
As sequelas de mastectomia se apresentam de formas variadas, exigindo, do cirurgião, experiência e criatividade para obter o melhor resultado na reconstrução de uma nova mama. É preciso considerar o método empregado para o tratamento do câncer, a diversidade da anatomia, além do desejo e da expectativa das pacientes.
Dentre estes detalhes, a depressão no polo superior da mama tem sido alvo de muitas opções de tratamento como lipoenxertia1,2, implantes de material aloplástico como aloderm3,4 e implantes de silicone5. Durante a reconstrução mamária com músculo grande dorsal e implante, adotamos o preenchimento desta região com a inclusão de segmento de tecido adiposo localizado abaixo da ilha cutânea. Chamamos de retalho miocutâneo com extensão adiposa por englobar os três segmentos com funções diferentes. O segmento muscular para a cobertura do implante, o adiposo para preencher o polo superior da mama e o cutâneo para restaurar a falta de pele na região mamária.
Hokin & Silfverskiold6, em 1983, propuseram a reconstrução da mama com retalho do grande dorsal sem utilização de prótese. Para isto, incluíam o tecido adiposo disposto sobre o músculo grande dorsal acima e abaixo do segmento cutâneo, chamando de Extended Latissimus Dorsi Flap.
Utilizamos apenas o compartimento de tecido adiposo na porção inferior ao segmento cutâneo, denominado de "lumbarfold" (prega lombar), descrito por Bailey et al.7, em 2010, para preencher a depressão no polo superior da neomama, que frequentemente não é preenchida pela prótese ou pelo volume muscular do grande dorsal.
OBJETIVO
Demonstrar que a utilização do compartimento de gordura da área lombar, abaixo da ilha cutânea do grande dorsal, pode auxiliar no preenchimento da depressão do polo superior da neomama nas reconstruções mamárias após mastectomia.
MÉTODOS
Utilizamos o retalho miocutâneo com extensão adiposa do músculo grande dorsal em 8 pacientes durante a reconstrução mamária tardia. As pacientes faziam parte da clínica privada do autor principal e foram avaliadas no período de 2012 a 2013.
A idade variou entre 39 e 70 anos, sendo 3 reconstruções à direita e 5 à esquerda. Seis pacientes tinham sido submetidas à radioterapia.
Demarcamos a área a ser excisada, ou incisada, na região mamária para a colocação do segmento cutâneo, além de medir a área de depressão no polo superior da neomama (Figura 1).
Figura 1. Marcação da área a ser incisada para a colocação do retalho, área a ser descolada para a colocação do implante e área superior para o posicionamento da extensão adiposa do retalho.
Delimitamos a ilha cutânea do retalho do músculo grande dorsal e, abaixo deste, marcamos a extensão gordurosa na região da prega lombar a ser utilizada para o preenchimento do polo superior da neomama (Figura 2). O tamanho desta extensão gordurosa variou entre 4,0 x 10,0 e 7,0 x 13,0 cm.
Figura 2. Demarcação do retalho miocutâneo do musculo grande dorsal e abaixo deste (G), a extensão adiposa na projeção do compartimento lombar, com medidas correspondentes ao segmento a ser preenchido no polo superior da neomama.
Após infiltração com solução de soro fisiológico e adrenalina (concentração de 1.1000.000) nas linhas de incisão, incisamos até a fáscia de Scarpa, quando iniciamos o descolamento inferiormente à ilha de pele, confeccionando uma península de tecido adiposo (Figura 3).
Figura 3. Retalho com os três segmentos: cutâneo (C), adiposo (A) e muscular (M).
O isolamento do músculo grande dorsal é iniciado por sua borda inferior. A liberação do retalho é feita no sentido cranial, para uma migração para a região mamária sem tensão.
No fechamento da área doadora, aplicamos pontos de adesão aos planos profundos, como preconizado por Baroudi & Ferreira8, e drenagem fechada com aspiração. A ferida é fechada por planos, com cuidado para compensar a diferença de altura dos retalhos superior e inferior.
Na confecção da neomama, posicionamos a parte inferior do retalho dorsal no polo superior da região mamária, com fixação do músculo na fáscia peitoral e posicionamento da área adiposa sob a área do polo superior da neomama (Figura 4).
Figura 4. Retalho posicionado na região mamária, demonstrando o segmento adiposo para preencher o polo superior da neomama.
A partir do terceiro mês, avaliamos o segmento adiposo por meio de ressonância magnética.
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética responsável (CEP 172/2011) e seguiu os princípios da Declaração de Helsinki.
RESULTADOS
O acompanhamento pós-operatório variou entre 3 meses e 12 meses (Figura 5A).
Figura 5. A: Pós-operatório com 1 ano e 4 meses de reconstrução mamária utilizando retalho miocutâneo com extensão adiposa e implante mamário. B: Pós-operatório com 1 ano e 4 meses, demonstrando a projeção do polo superior da neomama devido ao segmento adiposo do retalho posicionado no polo superior (seta).
Não houve sofrimento ou perda dos retalhos, tendo a projeção do polo superior das neomamas se mantido (Figura 5B).
Os volumes dos implantes variaram entre 270 e 435cc.
A avaliação da manutenção do segmento adiposo por ressonância magnética foi observada em todos os casos analisados após 3 meses (Figura 6).
Figura 6. Ressonância magnética, realizada no pós-operatório, identificando extensão adiposa preservada (círculo).
Ocorreram 2 casos (28%) de epidermólise na junção do retalho cutâneo com a área receptora. Em um dos casos, havia cicatriz de mamoplastia prévia e no outro caso a paciente havia sido submetida à radioterapia local. Ambas evoluíram bem com tratamento tópico.
Observamos no dorso a diferença de espessura entre os retalhos superior e inferior resultante da retirada de gordura da porção inferior.
No primeiro caso, devido ao afinamento em demasia do retalho cutâneo, houve sofrimento da borda inferior da cicatriz na região dorsal. Não houve comprometimento do resultado final e foi solucionado com terapia tópica.
Ocorreu seroma na área doadora de duas pacientes (28%), sendo resolvido apenas com punção aspirativa.
DISCUSSÃO
A mastectomia causa perda também de tecido adiposo, com consequente depressão e aderência da pele à musculatura peitoral, principalmente no polo superior.
A reconstrução com retalho miocutâneo do músculo grande dorsal e implante proporciona a projeção da mama, porém não determina projeção suficiente no polo superior que evite a depressão desta área.
A importância de lançarmos mão desta manobra cirúrgica se deve a algumas considerações como:
- A utilização de enxerto de gordura não é possível neste momento e geralmente necessita de mais de um tempo cirúrgico;
- O uso de matriz dérmica tem custo elevado, além de não estar disponível globalmente;
- Os implantes complementares de silicone têm efeito imediato, porém podem ficar palpáveis e perceptíveis.
A inclusão de segmento de tecido adiposo no corpo do retalho miocutâneo de grande dorsal preenche esta depressão, ou pelo menos diminui a necessidade do volume nos enxertos de gordura feitos posteriormente.
É importante salientar que é necessário que a paciente tenha estes depósitos ou compartimentos de gordura lombar em volume suficiente para preencher o polo superior da neomama.
Observamos algumas publicações relatando a experiência com o uso de retalho de grande dorsal estendido, ou seja, utilizando somente a gordura do dorso (sem incluir prótese de silicone) para dar volume à neomama. Nenhuma se refere a associação de parte desta gordura com a inclusão de prótese nem seu uso na depressão do polo superior. Alguns destes trabalhos relataram diferentes tipos de complicações6,9.
Bailey et al.7 descreveram um estudo anatômico dos compartimentos gordurosos na região dorsal, dividindo-os em segmentos paraescapular, toracolombar e lombar, em pacientes com índice de massa corporal (IMC) variando entre 30,6 e 51,2. Eles usaram retalhos envolvendo as áreas torácica e lombar, de comprimentos variando entre 24 x 12 a 28 x 17cm para reconstrução de mama sem implantes. Deiscências parciais associadas a pequenas infecções na ferida da área doadora ocorreram sem repercussões no resultado final.
Nossa proposta é utilizar o retalho miocutâneo com extensão adiposa com objetivo de preencher a depressão no polo superior da mama, e a prótese de silicone para dar volume à mesma.
Como desvantagem, observamos a diferença de espessura entre os retalhos dorsais superior e inferior da área doadora, resultando num desnível na região da cicatriz. As pacientes foram orientadas quanto a esta diferença e esclarecidas da possibilidade de resolução com a lipoaspiração do retalho superior.
A necrose parcial da borda inferior da cicatriz na região dorsal ocorreu somente no primeiro caso. Explicamos pela inexperiência no procedimento e pelo afinamento em demasia do retalho inferior, o que foi modificado posteriormente com a incisão até a fáscia de Scarpa.
Acreditamos não ser necessário a paciente ser obesa, ou ter índice de massa corporal alto, apenas ter o compartimento lombar presente, já que o volume mamário é dado pelo implante.
CONCLUSÃO
A utilização do compartimento de gordura da área lombar, abaixo da ilha cutânea do grande dorsal, é uma tática eficiente e imediata para o preenchimento da depressão do polo superior da neomama nas reconstruções mamárias após mastectomia.
REFERÊNCIAS
1. Spear SL, Wilson HB, Lockwood MD. Fat injection to correct contour deformities in the reconstructed breast. Plast Reconstr Surg. 2005;116(5):1300-5. PMID: 16217471 DOI: http://dx.doi.org/10.1097/01.prs.0000181509.67319.cf
2. Rigotti G, Marchi A, Stringhini P, Baroni G, Galiè M, Molino AM, et al. Determining the oncological risk of autologous lipoaspirate grafting for post-mastectomy breast reconstruction. Aesthetic Plast Surg. 2010;34(4):475-80. PMID: 20333521 DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s00266-010-9481-2
3. Newman MI, Samson MC, Berho M. AlloDerm in breast reconstruction: 2 years later. Plast Reconstr Surg. 2009;123(6):205e-6e. PMID: 19483545
4. Uflacker AB, Janis JE. The use of acellular dermal matrix in the correction of visible parasternal deformities after breast reconstruction. Plast Reconstr Surg. 2010;126(1):34e-36e.
5. Tavares Filho JM, Bererique M, Franco D, Arbex G, Arnaut Junior M, Franco T. Implantes complementares na reconstrução mamária. Rev Bras Cir Plást. 2012;27(2):290-3. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1983-51752012000200020
6. Hokin JA, Silfverskiold KL. Breast reconstruction without an implant: results and complications using an extended latissimus dorsi flap. Plast Reconstr Surg. 1987;79(1):58-66. PMID: 3797518 DOI: http://dx.doi.org/10.1097/00006534-198701000-00010
7. Bailey SH, Saint-Cyr M, Oni G, Wong C, Maia M, Nguyen V, et al. The low transverse extended latissimus dorsi flap based on fat compartments of the back for breast reconstruction: anatomical study and clinical results. Plast Reconstr Surg. 2011;128(5):382e-94e.
8. Baroudi R, Ferreira CA. Seroma: how to avoid it and how to treat it. Aesthet Surg J. 1998;18(6):439-41. PMID: 19328174 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/S1090-820X(98)70073-1
9. Germann G, Steinau HU. Breast reconstruction with the extended latissimus dorsi flap. Plast Reconstr Surg. 1996;97(3):519-26. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/00006534-199603000-00004
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Instituição: HUCFF - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Autor correspondente:
João Medeiros Tavares-Filho
Rua Buenos Aires, 255
Petrópolis, Rio de Janeiro, Brasil CEP 25610-141
E-mail: clinicajoaomedeiros@gmail.com
Artigo submetido: 22/04/2015.
Artigo aceito: 07/06/2015.
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