ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175
Distracção osteogênica mandibular: experiência do INTO-RJ
Mandibular distraction osteogenesis: experience of the INTO-RJ
Original Article -
Year2014 -
Volume29 -
Issue
4
Pablo Maricevich1; Ricardo Lopes da Cruz2; Nivaldo Alonso3; Renato da Silva Freitas4; Gabriel Duarte Basílio5; André Braune6; Edmar Soares Lessa7; Mayra Joan Marins da Costa8; Leizi Regina Barreto Silva9
http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2014RBCP0085
RESUMO
INTRODUÇÃO: O desenvolvimento das técnicas de distracção do esqueleto craniofacial representou um grande avanço na prática da cirurgia cranio-facial. A distracção é uma técnica menos invasiva, mais rápida e com uma morbidade aparentemente menor comparada com as técnicas tradicionais de reconstrução craniofacial. No ano de 2013, o serviço de Cirurgia Crânio Maxilo Facial do INTO realizou uma série de casos de distracção mandibular. Este trabalho objetiva apresentar nossa experiência.
MÉTODOS: De janeiro a março de 2013, sete pacientes realizaram cirurgia de distracção mandibular. Todos os pacientes operados apresentavam hipoplasia mandibular uni ou bilateral em decorrência de anquilose de ATM ou microssomia craniofacial. Em alguns pacientes com anquilose de ATM foi realizada também a ressecção do bloco anquilótico no mesmo tempo da distracção.
RESULTADOS: No pós-operatório houve melhora de todas as funções estomatognáticas, ganho de peso, decanulação da paciente traqueostomizada e melhora na qualidade do sono. Houve melhora nos perfis faciais, as laterognatias foram amenizadas e a abertura oral aumentou na maioria dos pacientes. A abertura oral aumentou de maneira mais significativa naqueles pacientes onde a cirurgia de anquilose foi realizada em conjunto com a distracção. A complicação mais comum foi dor à ativação, relato de cinco pacientes (71%).
CONCLUSÃO: A distracção osteogênica da mandíbula é uma boa alternativa para o tratamento das hipoplasias mandibulares, muitas vezes sendo a primeira indicação em algumas situações clínicas. Aparentemente tem morbidade menor do que as reconstruções clássicas de mandíbula e possui o bônus de alongar também os tecidos moles.
Palavras-chave:
Distracção osteogênica; Distracção; Hipoplasia mandibular; Mandíbula; Anquilose; Anquilose de ATM.
ABSTRACT
INTRODUCTION: The introduction of distraction of the craniofacial skeleton represented a great advancement in the practice of craniofacial surgery. Distraction is a less invasive technique that is faster and with an apparently lower morbidity than the traditional craniofacial reconstruction techniques. In 2013, the craniomaxillofacial surgery service of the Institute of Traumatology and Orthopaedics performed a series of mandibular distraction surgeries. In this article, we aim to present our experience.
METHODS: From January to March 2013, seven patients underwent mandibular distraction surgery. All patients exhibited unilateral or bilateral mandibular hypoplasia due to ankylosis of the temporomandibular joint (TMJ), or craniofacial microsomia. In some patients with ankylosis of the TMJ, resection of the anlylotic block was also performed concomitantly with the distraction.
RESULTS: Postoperative improvement was noted in all the stomatognathic functions: weight gain, decannulation of a tracheostomized patient, and improved quality of sleep. There was an improvement in facial profiles: the laterognathism was eased and the mouth opening increased in most patients. The mouth opening increased more significantly in patients in whom ankylosis surgery was done in conjunction with the distraction. The most common complication was pain upon distraction, reported by five patients (71%).
CONCLUSION: Mandibular distraction osteogenesis is a good alternative for the treatment of mandibular hypoplasia, often being the first indication in some clinical situations. It apparently has a lower morbidity than the classic mandible reconstructions and has the added benefit of also lengthening the soft tissues.
Keywords:
Distraction osteogenesis; Distraction; Mandibular hypoplasia; Mandible; Ankylosis; TMJ ankylosis.
INTRODUÇÃO
O desenvolvimento das técnicas de distracção do esqueleto craniofacial representou um grande avanço na prática da cirurgia craniofacial. A distracção é uma técnica menos invasiva, mais rápida e com uma morbidade aparentemente menor comparada com as técnicas tradicionais de reconstrução craniofacial. Permite ao cirurgião provocar a formação de tecido ósseo ao invés de ter que adicionar enxertos ou retalhos livres captados de outras áreas do corpo1, 2.
A distracção osteogênica da mandíbula tornou-se uma técnica amplamente aceita para a reconstrução de mandíbulas hipoplásicas desde a publicação de McCarthy et al1., em 1992, e Molina et al.3, em 1995. A distracção tem sido considerada como técnica de eleição em muitas situações clínicas devido à relativa segurança do procedimento, período de internação hospitalar reduzido, baixa incidência de transfusões sanguíneas, eliminação de necessidade de captação de enxertos ósseos, além da desejada expansão dos tecidos moles que ocorre concomitantemente à formação de osso local4. Finalmente, a distracção mandibular não apenas pode melhorar o aspecto estético da face, mas também pode trazer benefícios às vias aéreas destes pacientes5.
Uma série de deformidades faciais pode ter, na distracção mandibular, uma opção para tratamento: microssomia hemifacial, síndrome de Goldenhar, sequência de Pierre Robin, anquilose de ATM, síndrome de Treacher Collins, síndrome de Nager, deficiências pós-trauma, apnéia obstrutiva do sono, hipoplasia mandibular na classe II entre outras1,5.
No ano de 2013, o serviço de Cirurgia Crânio Maxilo Facial do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (INTO) realizou uma série de casos de distracção mandibular.
OBJETIVO
Este trabalho objetiva apresentar e avaliar nossos resultados, comparando com os resultados de outros serviços.
MÉTODO
De janeiro a março de 2013, sete pacientes realizaram cirurgia de distracção mandibular no INTO. Todos os pacientes operados apresentavam hipoplasia mandibular uni ou bilateral em decorrência de anquilose de ATM ou microssomia craniofacial. Em alguns pacientes com anquilose de ATM foi realizada também a ressecção do bloco anquilótico no mesmo tempo da distracção.
Todos estes pacientes tiveram, desde o pré-operatório até o momento, um acompanhamento feito de perto por uma equipe multidisciplinar, incluindo cirurgiões crânio maxilo faciais, cirurgiões buco maxilo faciais, fonoaudiólogas, enfermeiras, psicóloga, nutricionistas e assistente social. Exames radiológicos (panorâmica dos maxilares, cefalometria AP e cefalometria perfil) foram realizados no pré e pós-operatório.
Técnica operatória1
Com o paciente anestesiado e intubado (intubação oro ou nasotraqueal), a linha da basilar da mandíbula e o vetor da distracção são marcados. De acordo com as características do paciente, o distractor a ser usado será um externo ou um interno6-12. Nos pacientes que necessitavam de um alongamento unidirecional e tinham uma boa quantidade de tecido ósseo mandibular usamos distractores internos. Nos pacientes que necessitavam de um alongamento em mais de um vetor e/ou tinham pouca quantidade de osso mandibular usamos distractores externos. O acesso cirúrgico pode ser tanto por uma incisão extra-oral submandibular (Risdon) ou por uma incisão intra-oral ao longo da linha oblíqua do ramo1,3-6. A preferência do cirurgião é um fator importante na decisão do acesso cirúrgico. De qualquer forma, no caso do distractor externo haverá a exteriorização pela pele de quatro pinos de fixação que irão "cortar" a pele durante a fase de ativação e, no caso do distractor interno, haverá uma incisão puntiforme na pele para passagem do trocarter durante a fixação do distractor e a exteriorização pela pele de um único pino pelo qual será realizada a ativação do mecanismo interno. A exposição do ramo mandibular (local das osteotomias) é realizada através do descolamento subperiosteal de toda esta área. Obviamente, se a intenção é uma distracção de corpo, o corpo será exposto da mesma forma. Após a exposição, uma serra reciprocante é utilizada para realizar corticotomias lateral, anterior e posterior do ramo mandibular. A direção destas corticotomias é definida pelo vetor desejado de distracção, levando em conta a deficiência mandibular do paciente e a presença de possíveis germes dentários pelo caminho. A escolha do vetor de distracção é uma decisão crítica. Antes de converter as corticotomias em uma osteotomia de fato realizando a corticotomia medial, o mecanismo do distractor é instalado no ramo mandibular. No caso do distractor externo, quatro pinos percutâneos fixados ao osso que se acoplarão ao distractor que ficará fora do corpo e, no caso dos distractores internos, duas espécies de placas de fixação que são atravessadas por dois pinos, um dos quais se exterioriza pela pele e é o responsável pela ativação do sistema. Uma vez com os distractores instalados, a osteotomia é completada com um osteótomo fazendo a corticotomia medial, liberando o segmento mandibular para distracção. Antes do fechamento, o mecanismo de distracção é testada para confirmar seu bom funcionamento.
RESULTADOS
De janeiro a março de 2013 sete pacientes foram operados de distracção mandibular no INTO. A faixa etária variou entre 7 e 46 anos. A idade média foi de 16 anos. Seis pacientes (86%) eram mulheres e apenas um (14%) era homem. A etiologia mais comum para a hipoplasia mandibular e, consequente, assimetria facial foi anquilose de ATM bilateral (4 pacientes), seguida da anquilose de ATM unilateral (2 pacientes) e da microssomia craniofacial (1 paciente). Dos seis pacientes de anquilose de ATM, quatro deles (66%) realizaram ressecção unilateral do bloco anquilótico no mesmo tempo da distracção e cinco deles (83%) já haviam sido submetidos tratamento cirúrgico da anquilose previamente, inclusive um deles com uma tentativa mal sucedida de distracção bilateral.
Todos os distractores colocados foram bilaterais e aplicados em osso nativo. Isto é, não houve nenhum caso de distracção de um segmento ósseo enxertado previamente. A osteotomia utilizada em todos os casos foi a oblíqua de ramo/ângulo. Quatro pacientes (57%) receberam distractores externos (Figura 1) e três (43%) distractores internos (Figura 2) (Tabela 1)
Figura 1. Paciente 5 portadora de anquilose de ATM bilateral submetida a distracção bilateral com distractores externos no pré-operatório e já na fase de consolidação. Observa-se uma ligeira hipercorreção.
Figura 2. Paciente 1 portadora de anquilose de ATM D submetida cirurgia da anquilose + distracção bilateral com distractores internos no pré-operatório e já na fase de consolidação.
Fase de Latência
A fase de latência, intervalo entre a cirurgia e o início do movimento de distracção, foi entre 5 e 6 dias em todos os pacientes.
Fase de Ativação
A fase de ativação, onde o distractor é de fato acionado diariamente de forma gradual, foi realizada pelos próprios pacientes ou responsáveis sob orientação da equipe multidisciplinar. A fase de ativação durou de 4 a 10 semanas. A média do tempo de ativação foi de 6 semanas. A taxa de ativação foi de 1 a 2mm por dia em todos os pacientes.
Fase de Consolidação
Na fase de consolidação, tempo entre o fim da ativação e a retirada dos distractores, o próprio aparato de distracção funciona como um sistema de fixação para que haja uma consolidação do osso formado na posição alcançada. A fase de consolidação durou de 5 a 16 semanas. A média do tempo de consolidação foi de 8 semanas (Tabela 2).
Todos os pacientes com anquilose de ATM apresentavam dificuldades nas funções estomatognáticas (mastigação, deglutição e fonação) por conta da limitação na abertura oral. Em relação às vias aéreas, uma paciente com anquilose de ATM bilateral (14%) era traqueostomizada e quatro (66%) apresentavam roncos significativos durante o sono. No caso da paciente com microssomia craniofacial, a abertura bucal estava normal, não havia ronco e a mastigação apresentava-se com um padrão unilateral contralateral ao lado afetado.
No pós-operatório houve melhora de todas as funções estomatognáticas e ganho de peso em todos os pacientes, decanulação da paciente traqueostomizada e melhora significativa na qualidade do sono naqueles pacientes que roncavam. A melhora dos roncos foi relatada pelos pacientes e familiares, não realizamos exame de polissonografia pré e pós-operatório.
Do ponto de vista dento-esquelético e estético, todos os pacientes apresentavam-se com perfil convexo da face (Classe II de Angle e overjet negativo) e com algum grau de laterognatia e mordida cruzada. O paciente com microssomia craniofacial apresentava hipoplasia mandibular Pruzansky IIB e abertura oral normal. Todos os pacientes com anquilose de ATM, uni ou bilaterais, apresentavam abertura oral diminuída, variando de 0 a 31mm. A média da abertura deste grupo de pacientes foi de 19mm, destacando que nesta mensuração foi levado em conta a distância inter-incisivos, exceto a paciente 7 cujos dentes praticamente não possuíam coroa exposta. Ou seja, o over jet negativo destes pacientes estava contribuindo para o cálculo da abertura final pré-operatória.
Houve melhora em todos os pacientes do ponto de vista dento-esquelético e da estética facial: os perfis faciais foram melhorados e até hipercorrigidos, as laterognatias foram amenizadas, e a abertura oral aumentou na maioria (86%) dos pacientes (Figura 3). A abertura oral aumentou de maneira mais significativa naqueles pacientes onde a cirurgia de anquilose foi realizada em conjunto com a distracção mandibular (Tabela 3) (Figura 4). Três pacientes permaneceram com mordida cruzada e três evoluíram com mordida aberta anterior.
Figura 3. Paciente 3 portador de anquilose de ATM D submetido a cirurgia de anquilose + distracção bilateral interna. Houve melhora da simetria facial, parada dos roncos durante o sono e apenas uma pequena cicatriz onde saia o pino de ativação.
Figura 4. Paciente 7 portadora de anquilose de ATM bilateral submetida a cirurgia de anquilose + distracção bilateral externa. Houve melhora significativa nas funções estomatognáticas e na abertura oral, além do beneficio estético. A abertura oral foi de zero para 52mm.
Radiologicamente, ficou evidente o ganho ósseo obtido no ramo mandibular, o avanço mandibular e o aumento da coluna de ar retromandibular na via aérea destes pacientes. Clinicamente, as partes moles acompanharam este ganho ósseo (Figura 5).
Figura 5. Paciente 4 portadora de anquilose de ATM bilateral submetida a distracção bilateral externa. Houve alongamento significativo da mandíbula e das partes moles, proporcionando uma mudança completa do perfil estético e a decanulação da traqueostomia. Na cefalometria de perfil observa-se o aumento evidente da coluna de ar retromandibular.
A complicação mais comum foi dor à ativação, que foi um relato de cinco pacientes (71%), um deles chegando a fazer ópioide em uma oportunidade. Dois dos quatro (50%) dos pacientes com distractores externos referiram problemas sociais devido à aparência do sistema, sendo que um deles faltou o colégio durante todo o período de tratamento e quase perdeu o ano letivo. Apenas um dos três pacientes (33%) com distractores internos relatou problemas sociais. Duas das quatro pacientes (50%) com distractores externos apresentaram cicatrizes hipertróficas, uma delas com indicação de revisão cirúrgica (Figura 6).
Figura 6. Paciente 6 portadora de anquilose de ATM bilateral submetida a cirurgia de anquilose + distracção bilateral externa. Apesar do resultado, ficaram cicatrizes hipertróficas na face.
Três pacientes (43%) cursaram com neuropraxia do nervo alveolar inferior, duas cursaram com perda da tonicidade do lábio superior (29%) e também duas (29%) cursaram com paresia dos ramos mandibular e/ou bucal do nervo facial. Todas estas alterações de sensibilidade e motricidade foram transitórias e tratadas com sucesso pela Fonoaudiologia. Em uma paciente (14%) o comprimento do distractor pareceu ser inadequado, ou seja, poderíamos ter alongado a mandíbula um pouco mais se tivéssemos colocado um maior (Figura 7).
Figura 7. Paciente 2 portadora de microssomia hemifacial submetida a distracção bilateral interna. A distracção foi feita até o limite do aparelho e talvez um distractor maior tivesse melhorado mais a inclinação da comissura oral.
Todos os pacientes e seus responsáveis acharam que o tratamento com distracção mandibular valeu a pena. São unânimes em reconhecer a melhora funcional e a mudança significativa da estética facial após o procedimento. Percebemos também que a autoestima destes pacientes aumentou de forma evidente.
DISCUSSÃO
Apesar da distracção mandibular ter sido apresentada como uma alternativa terapêutica para as hipoplasia mandibulares em 1992 com as publicações de McCarthy e cols. 1 e Molina e cols. em 19953, esta cirurgia não costuma ser rotineira até hoje em muitos grandes centros do Brasil. É comum receber pacientes, principalmente com deformidades congênitas (microssomia craniofacial por exemplo), na pré-adolescência e adolescência que nunca receberam tratamento cirúrgico. Perderam o tempo da distracção, talvez tenham sofrido com problemas de adaptação social e agora estão no meio de uma decisão: fazer distracção ou esperar o desenvolvimento completo e realizar uma cirurgia ortognática. Além da falta de desenvolvimento ósseo, muitos destes pacientes apresentam-se com uma hipoplasia de partes moles, significativa, associada, o que pode ser um fator determinante para o insucesso de um possível movimento ósseo cirúrgico (cirurgia ortognática).
Via de regra, a indicação de distracção leva em conta principalmente a questão do comprometimento da via aérea e a dismorfia facial. No caso de comprometimento de via aérea, deve-se iniciar a distracção o mais cedo possível, a fim de evitar uma traqueostomia ou possibilitar uma decanulação5. Em relação à dismorfia facial existe uma recomendação de realizar a distracção antes do paciente atingir a idade escolar6. McCarthy et al.1 estipularam alguns critérios para estas indicações de acordo com a faixa etária do paciente e a gravidade do caso (Tabela 4).
Nossa casuística ainda limitada no INTO não nos deixa traçar um perfil característico dos nossos pacientes de distracção (Tabela 1 e 2). Ow et al. 5 em uma grande metanálise com 1.185 pacientes, selecionados em 2012, traçaram este perfil (Tabela 5, 6, e 7).
Em relação ao tipo de distractor a ser utilizado no paciente, existem alguns aspectos que devem ser levados em conta. O distractor externo é preferível no caso de mandíbulas muito hipoplásicas, mandíbulas enxertadas previamente e mandíbulas com pouco espaço ósseo para a fixação das placas do distractor interno. Tem a vantagem de possibilitar uma distracção em vários vetores, o que é desejado para a correção de mordida aberta anterior e para guiar um neocôndilo para a fossa glenóide16. As desvantagens são as cicatrizes, o maior impacto social da aparelhagem externa e a maior vulnerabilidade aos acidentes, principalmente deslocamento do distractor em pequenos traumas com crianças5.
Já o distractor interno tem a grande vantagem de causar menos cicatrizes. Mecanicamente também parece ser mais vantajoso visto que o aparelho de distracção está colado no osso, ao contrário do externo que fica de 30 a 40mm longe do mesmo. A distracção nestes casos é realizada apenas em um vetor e é particularmente adequada para vetores verticais (de 45 a 90º do plano oclusal maxilar). Felizmente, este vetor de distracção é muito frequente e é o melhor para o alongamento do ramo mandibular, o segmento mais acometido nas hipoplasias mandibulares. As desvantagens são a exigência de uma mandíbula com no mínimo 12mm de largura e a necessidade de uma 2ª cirurgia para a retirada do distractor6. Apesar das diferentes características de cada distractor, por trabalharmos em um hospital público, muitas vezes o critério maior da escolha do distractor é a disponibilidade.
A maioria dos pacientes operados no INTO eram portadores de anquilose de ATM. Neste quesito, a distracção mandibular exerce um efeito interessante na ATM e pode ser usada no tratamento da anquilose desta articulação. McCormick et al.14,15 evidenciaram que as forças compressivas da distracção causam um benefício para a estrutura e posição da ATM, com os côndilos apresentando aumento do tamanho, melhora na geometria e aumento da altura vertical após distracção mandibular. No caso de uma anquilose de ATM estabelecida, a ressecção do bloco anquilótico pode vir associada à distracção mandibular na mesma oportunidade cirúrgica. Esta técnica é denominada transport distraction16 e é uma soma das técnicas de transporte com distracção óssea. Uma osteotomia em L ou vertical do ramo é feita criando um segmento ósseo que será transportado por distracção. Durante a fase de ativação, este neocôndilo, pressionado à fossa glenóide, será remodelado, criando uma superfície articular arredondada e lisa. A distracção continua-se até a o ramo atingir uma altura adequada e o neocôndilo alcançar a fossa glenóide. Nestes casos, o período de consolidação é respeitado, mas exercícios vigorosos para a ATM devem ser iniciados já uma semana após o término da fase de ativação.
A decisão de quando parar a distracção pode gerar dúvidas e geralmente é clínica17. Observamos resultados de hipo e hipercorreção no plano anteroposterior da mandíbula e uma extrema dificuldade em posicionar o mento na linha média nos pacientes laterognatas. Em relação deficiência anteroposterior nos pacientes ainda em desenvolvimento, é preferível a hipercorreção. E ainda, mesmo atingindo a hipercorreção desejada, possivelmente, quase todos estes pacientes terão indicação de uma nova distracção ou cirurgia ortognática quando atingirem a maturidade do desenvolvimento esquelético18.
A melhora das características dento-esqueléticas dos pacientes foi evidente nos pacientes operados no INTO. No entanto, apesar do ganho na função e na estética facial ter sido significativo, a questão ortodôntica não foi contemplada por falta desta especialidade na nossa equipe multidisciplinar. O ideal seria um acompanhamento pré e pós-operatório destes pacientes, a exemplo do que se preconiza na cirurgia ortognática19. Atualmente, todos os nossos pacientes encontram-se em tratamento ortodôntico devido a uma parceria com outro hospital.
Nossa complicação mais frequente foi a dor à ativação. Provavelmente, isto pode ter relação com a taxa de ativação utilizada (2 mm/dia). As complicações características do distractores externos foram valorizadas pelos nossos pacientes. Os problemas sociais e as cicatrizes, felizmente, foram compensados com uma melhora geral, também muito valorizada pelos mesmos. O apoio da Fonoaudiologia, mais uma vez, foi muito importante para o tratamento de todas as complicações, especialmente das paresias nervosas, disestesias e hipotonias musculares transitórias. Comparamos nossas complicações com as complicações de outro serviço 18 (Tabela 8).
Finalmente, entendemos que contar com uma equipe multidisciplinar qualificada faz muita diferença no tratamento destes pacientes. O bom resultado depende muito do compromisso do paciente neste longo seguimento onde a cirurgia é apenas uma das várias etapas a serem percorridas.
CONCLUSÃO
Consideramos a distracção osteogência da mandíbula é uma boa alternativa para o tratamento das hipoplasias mandibulares, muitas vezes sendo a primeira indicação em algumas situações clínicas. É um procedimento que aparentemente tem menor morbidade do que as reconstruções clássicas de mandíbula e possui o bônus de alongar também os tecidos moles. Além do mais, existe um provável benefício para a via aérea. Uma equipe multidisciplinar qualificada e completa aumenta muito as chances de sucesso neste tipo de tratamento.
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1. Membro Efetivo da SBCP - Membro Efetivo da ABCCMF
2. Membro Titular da SBCP - Chefe do Centro de Atenção Especializada em Cirurgia Crânio-Maxilo-Facial do INTO-RJ
3. Livre-docente em Cirurgia Plástica pela FMUSP - Chefe do Serviço de Cirurgia Craniomaxilofacial da Divisão de Cirurgia Plástica e Queimaduras do HC-FMUSP
4. Livre-docência pela Universidade de São Paulo - Chefe da Disciplina e do Serviço de Cirurgia Plástica da UFPR
5. Membro Titular da SBCP - Membro Efetivo da ABCCMF
6. Membro Titular da SBCP - Cirurgião Plástico e Crânio-Maxilo-Facial do INTO-RJ
7. Membro Titular da SBCP - Membro Efetivo da ABCCMF
8. Membro Efetivo da SBCP - Membra Efetivo da ABCCMF
9. Membro Efetivo da SBCP - Ex-estagiária em Cirurgia Crânio-Maxilo-Facial do INTO-RJ
Instituição: Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (INTO - RJ).
Autor correspondente:
Pablo Maricevich
Avenida Antônio de Góes, 275 - Sala 407 - Pina
Recife, PE, Brasil CEP: 51110-000
E-mail: jpmaricevich@hotmail.com
Artigo submetido: 15/1/2014.
Artigo aceito: 13/12/2014.
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