ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175
Surgical treatment cleft craniofacial of middle line
Tratamento cirúrgico da fissura craniofacial da linha média
Original Article -
Year2010 -
Volume25 -
Issue
2
Rafael Anache Anbar1, Alcides Martins Arruda2, Gilberto de Carvalho Reis1, Lucilene dos Santos1, Rodrigo Anache Anbar1
ABSTRACT
The clefts craniofacial constitute congenital rare anomalies. They are located in determined lines through the eyelids, eyebrows, nostrils, lips and jawbones, reaching soft and bone parts. They are of unknown etiology. The classification most used for the rare clefts of face is it of Tessier. It is based on anatomical relations obtained in clinical observations and post-operative finds. The clefts numbers 0 and 14, positions himself in the middle line of the skull and of the face. Can be present the characteristics is excess of tissue or the lack of the same. The correct diagnose is essential for the surgical approach. The treatment is based on suture of the soft cloths, on three plans: cutaneous, muscular and mucous; Zplasty; treatment toothing; bone grafts, when necessary. The authors describe the case of a 2-year-old patient and 3 months, masculine, 0 and 14 showing cracks of Tessier. The first correction was based on the treatment of soft tissue defect of these cracks, planned in two surgical times.
Keywords:
Craniofacial abnormalities. Face/abnormalities. Congenital abnormalities/classification.
RESUMO
As fissuras craniofaciais constituem anomalias congênitas raras. Localizam-se em determinadas linhas através das pálpebras, sobrancelhas, narinas, lábios e maxilas, atingindo partes moles e ósseas. São de etiologia ainda desconhecida. A classificação mais utilizada para as fissuras raras de face é a de Tessier. É baseada em relações anatômicas obtidas em observações clínicas e achados pós-operatórios. As fissuras números 0 e 14 situam-se na linha média do crânio e da face. Podem-se apresentar como uma fissura com as características de excesso de tecido ou agenesia dos mesmos. O correto diagnóstico é fundamental para abordagem cirúrgica. O tratamento é baseado em sutura dos tecidos moles, em três planos: cutâneo, muscular e mucoso; zetaplastias; tratamento ortodôntico; enxertos ósseos, quando necessário. Os autores descrevem o caso de um paciente de 2 anos e 3 meses, sexo masculino, apresentando fissuras 0 e 14 de Tessier. A primeira abordagem baseou-se no tratamento do defeito das partes moles dessas fissuras, sendo realizada em dois tempos cirúrgicos.
Palavras-chave:
Anormalidades craniofaciais. Face/anormalidades. Anormalidades congênitas/classificação.
INTRODUÇÃO
As fissuras craniofaciais são entidades patológicas enquadradas dentro dos achados médicos invulgares e constituem anomalias congênitas raras.
Em 1837, Walter Dick1 relatou o primeiro caso de fissura facial oblíqua e, a partir desta época, inúmeros casos foram relatados. Como a natureza destas deformidades não era conhecida, havia uma certa individualidade e discordância nasdescrições de vários autores.
Algumas teorias foram propostas para explicar a existência das fissuras. As principais são a de Dursy2 e His3, que responsabilizam a falta de fusão dos processos faciais pelo aparecimento das fissuras e, a de Pohlann4, Veau e Politzer5, que se referem à migração mesodérmica. O entendimento das fissuras faciais ainda não está completo.
As investigações, os estudos e as estatísticas catalogados durante anos agrupam quatro categorias de fatores que, direta ou indiretamente, podem interferir no desenvolvimento anormal do embrião, são eles: radiações, infecções maternas, distúrbios metabólicos maternos e medicamentos ingeridos nos primeiros meses de gestação6.
A incidência não é bem conhecida. Fogh-Andersen7 encontrou incidência de uma fissura rara para 300 fissuras comuns. O sexo masculino e os caucasianos são atingidos mais frequentemente. Em 75% dos pacientes com fissuras raras de face, outras anomalias estão associadas.
Em 1976, Tessier8 propôs uma classificação das fendas craniofaciais, baseado em sua experiência pessoal, que incluía observação clínica, radiológica e cirúrgica de 336 pacientes. Tessier planejou um sistema de numeração ordenado para identificar o percurso anatômico das fendas nos tecidos moles e no esqueleto, com início no número 0 e término no número 30.
Na fenda número 0 de Tessier, a fissura mediana pode ser caracterizada como verdadeira9 ou falsa10. No tipo verdadeiro, a fenda situa-se entre os processos globulares medianos, o lábio geralmente apresenta-se como uma banda alargada, freio labial duplicado, diastema entre os incisivos. Apresentam-se com uma columela larga, cartilagens alares hipoplasiadas e deslocadas lateralmente e ponta nasal bífida8. Os ossos nasais estão afastados lateralmente. Encontra-se um alvéolo maxilar característico em forma de quilha. O hipertelorismo orbital e o encurtamento da altura central da face estão presentes.
Na fissura mediana falsa, pode ocorrer ausência quase total do filtro e da pré-maxila, estendendo-se ao assoalho do nariz, a columela não se forma ou é rudimentar. A fissura do palato pode estar presente, além de anomalias oculares, ausência de tegumento craniano e alterações encefálicas8. A deficiência óssea produz hipotelorismo ou ciclopia. As anomalias do sistema nervoso geralmente limitam a vida dos pacientes.
A fissura pode estender-se para cima, em direção ao crânio, constituindo a fissura número 14, formando uma disrafia craniofacial média. Pode produzir agenesia de um segmento craniano ou excesso de tecido. Quando o hipertelorismo está presente, observamos o deslocamento lateral das órbitas. As alterações cranianas são extremas e podem limitar a vida dos pacientes.
As fissuras medianas do lábio inferior e da mandíbula constituem um prolongamento caudal da fissura número 0, forma denominada de fissura número 30 por Tessier8.
O correto diagnóstico é fundamental para abordagem cirúrgica. A fissura é rara e de apresentação múltipla, tornando seu tratamento um desafio.
O tratamento destas raras fissuras emprega uma variedade extrema de recursos devido às características peculiares a cada caso. Em geral, a idade na qual a primeira cirurgia é realizada varia com a gravidade do caso.
Um desenvolvimento estrutural adequado aumenta o tamanho dos componentes faciais, facilitando as reparações e permitindo maior exatidão nas aproximações. No primeiro tempo, as correções limitam-se aos tecidos moles. As estruturas ósseas deformadas são corrigidas em posteriormente a estas.
RELATO DO CASO
W.S.S., 2 anos e 3 meses, sexo masculino, com fenda verdadeira, número 0 e 14 de Tessier (Figura 1). As características presentes eram de nariz bífido, cartilagens alares hipoplasiadas e deslocadas lateralmente e hiperteleorbitismo. O diagnóstico baseou-se no exame físico e radiográfico. A primeira etapa do tratamento restringiu-se à correção no defeito dos tecidos moles, e se deu em dois tempos cirúrgicos distintos.
Figura 1 - Aspecto pré-operatório.
A primeira cirurgia corrigiu a ponta bífida, por descolamento, mobilização e fixação das cartilagens alares, seguidos de fratura dos ossos nasais (laterais e superiores) e enxerto de fáscia lata no dorso nasal (Figuras 2 e 3); a segunda cirurgia, realizada 17 meses após o primeiro procedimento (Figura 4), incluiu a ressecção das pregas da fissura e uma zetaplastia na dorso nasal (Figura 5).
Figura 2 - Aspecto intra-operatório: correção da ponta bífida, fratura dos ossos nasais e enxertia de aponeurose.
Figura 3 - Aspecto intra-operatório: fixação da aponeurose com pontos externos.
Figura 4 - Aspecto pós-operatório de 1 mês.
Figura 5 - Aspecto pós-operatório de 3 meses da segunda cirurgia.
A correção do defeito ósseo, produzindo hiperteleorbitismo (decorrente da fissura número 14 de Tessier) se dará na próxima etapa cirúrgica.
DISCUSSÃO
A escolha do tratamento cirúrgico depende de cada caso. Sabe-se que o objetivo principal da reparação cirúrgica engloba a sutura dos tecidos moles em três planos, cutâneo, muscular e mucoso; tratamento ortodôntico e enxerto ósseo quando necessário.
Apresentamos a solução que nos pareceu mais adequada do ponto de vista estético e funcional para o tratamento da fissura rara, cuja frequência escassa impede uma padronização resolutiva.
Esta primeira etapa solucionou o defeito decorrente da fenda mediana da face. Aguardamos a segunda etapa de intervenção para corrigir o defeito ósseo do crânio.
CONCLUSÃO
Com a combinação das duas cirurgias, nesta primeira intervenção, no caso relatado, teve-se uma melhora acentuada tanto do ponto de vista estético quanto funcional na fissura mediana de face apresentada.
REFERÊNCIAS
1. Dick W. A case of hyperencephalous monstrouosity. Lond Med Gaz. 1837;19:897.
2. Dursy E. Entwicklungsgeschichte des kopfes des menschen und der hoheren wirbrltheire. Tubingen:Lauppschen; 1869. p.99.
3. His W. Die formentwicklung des ausseren ohkes. Leipzig: F.C.W.Voge; 1885. p.21.
4. Pohlann EH. Die embryonale metamorphose der physiognomie und der mundhohle des katzenkopfes. Morphol. Jahrbuch. 1910;41:617.
5. Veau V, Politzer J. Embriologie du bec-de-lievre. Ann D'Anat Path. 1936;12:275.
6. Carreirão S, Lessa S, Zanini SA. Tratamento das fissuras labiopalatinas. 2ª ed. Rio de Janeiro:Revinter; 1896.
7. Fogh-Andersen P. Rare clefts of the face. Acta Chir Scand. 1965;129:275- 81.
8. Tessier P. Anatomical classification of facial, cranio-facial and laterofacial clefts. J Maxillofac Surg. 1976;4(2):69-92.
9. Galanti S. Rare congenital malformation of the nose. (2 cases of bifid nose). Ann Laringol Otol Rinol Faringol. 1961;60:583-601.
10. Braithwaite F, Watson J. A report on three unusual clefts lip. Br J Plast Surg. 1949;2(1):38-49.
1. Cirurgião Geral; Médico Residente de Cirurgia Plástica no Serviço de Cirurgia Plástica da Santa Casa de Campo Grande-MS.
3. Cirurgião Plástico; Regente do Serviço de Cirurgia Plástica da Santa Casa de Campo Grande-MS e Chefe do Serviço de Cirurgia Plástica no HU da UFMS.
Trabalho realizado no Serviço de Cirurgia Plástica da Santa Casa de Campo Grande - MS, Campo Grande, MS
Artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBCP
Correspondência para:
Alcides Martins Arruda
Rua Euclides da Cunha, 488 - Jd. dos Estados
Campo Grande, MS, Brasil - CEP 79020-230
E-mail: drarruda@terra.com.br
Artigo recebido: 10/2/2009
Artigo aceito: 17/7/2009
All scientific articles published at www.rbcp.org.br are licensed under a Creative Commons license