ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Original Article - Year2010 - Volume25 - Issue 1

ABSTRACT

Introduction: Since 1957, when Millard introduced the concept of rotation-advancement repair, this technique has become the procedure of choice for unilateral cleft lip worldwide. More recently, modifications described by Noordhoof, Mohler, Skoog, and McComb started being jointly performed so that better results could be obtained. In this study, the aesthetic results and the facial growth pattern after primary unilateral cleft lip repair through a modified technique are presented. Methods: Forty-five patients with unilateral cleft lip underwent primary surgical repair through this technique. For results analysis, a scoring system for aesthetic results was established and to evaluate the facial bone growth pattern the Atack' Index was used. Results: By means of the established technique, 17.8% presented good aesthetic results and 82.2% were considered excellent results. Among aspects considered negative, late deformity of the lower lateral cartilage prevailed (37.8%). We observed that 83.4% had Atack' Index 1 and 16.6% had Atack' Index 2. Conclusions: Through the presented primary rhinocheiloplasty approach, regardless of cleft type, it is possible to obtain good aesthetic and functional results. In order to obtain better results along time, technical refinements and the criterial analysis of results must be performed on a routinely basis.

Keywords: Cleft lip/surgery. Lip/surgery. Mouth abnormalities.

RESUMO

Introdução: Desde 1957, quando Millard introduziu o conceito de reparo tipo avanço e rotação, este se tornou o procedimento de escolha para o reparo da fissura labial unilateral em todo o mundo. Mais recentemente, modificações descritas por Noordhoof, Mohler, Skoog e McComb passaram a ser realizadas em associação para que melhores resultados pudessem ser obtidos. Neste trabalho, os resultados estéticos e o padrão de crescimento ósseo facial do reparo primário da fissura labial unilateral através de técnica modificada são sistematicamente apresentados. Método: Quarenta e cinco pacientes portadores de fissura labial unilateral foram submetidos ao reparo cirúrgico primário por meio da técnica proposta. Para a análise dos resultados, foi estabelecido um sistema de pontuação dos resultados estéticos e a avaliação do padrão de crescimento ósseo facial foi realizada com emprego do índice de Atack. Resultados: Verificamos que 17,8% dos pacientes apresentaram bons resultados estéticos e 82,2%, resultados considerados excelentes. Entre os aspectos considerados negativos, houve predomínio da deformidade tardia da cartilagem lateral inferior (37,8%). Quanto ao índice de Atack, 83,4% dos pacientes apresentaram índice 1 e 16,6% índice 2 de Atack. Conclusões: Por meio da abordagem para rinoqueiloplastia primária apresentada, independentemente do tipo de fenda, é possível a obtenção de bons resultados estéticos e funcionais. Para que melhores resultados possam ser obtidos ao longo do tempo, refinamentos técnicos e a análise criteriosa dos resultados devem ser rotineiramente buscados.

Palavras-chave: Fenda labial/cirurgia. Lábio/cirurgia. Anormalidades da boca.


INTRODUÇÃO

Idealmente, o reparo cirúrgico da fissura labial unilateral deve proporcionar a reconstituição de lábio e nariz com forma e função normal, permitindo o crescimento e o desenvolvimento normal dos ossos da face. Para isto, a confecção de arco de cúpido simétrico, com coluna filtral de aparência natural, uma linha branca contínua e bem alinhada, com cicatriz minimamente visível sobre a coluna filtral; a distribuição correta de vermelhão e mucosa, com preservação do tubérculo mediano e, a reconstituição funcional e harmoniosa da musculatura orbicular associada à simetria de narinas e assoalho nasal são parâmetros essenciais que devem estar presentes.

Na literatura, diversas técnicas de reparo da fissura labial unilateral foram descritas, cada qual com diferente posicionamento da cicatriz cutânea. Devido à importante retração cicatricial e ao aparecimento de entalhes no lábio, modificações do reparo em linha reta introduzido por Thompson1, em 1912, atualmente estão restritas aos casos em que a deformidade da fissura labial é mínima. Técnicas baseadas na utilização de retalhos locais, introduzida por Mirault2, como o emprego do retalho quadrilateral de LeMesurier3 ou o retalho triangular de Tennison4, foram bastante populares nas décadas de 1950 e 1960, mas a cicatriz final violando a integridade do filtro demonstrou ser importante desvantagem deste tipo de técnica; o mesmo acontecendo com o alongamento da vertente medial por meio da interposição de retalhos em Z, como preconizado por Spina5, em 1968.

Em 1957, foi introduzido por Millard6,7 o conceito do reparo tipo avanço e rotação e, por meio desta técnica tornou-se possível obter cicatriz resultante sobre a projeção da coluna filtral, ao mesmo tempo em que arco de cupido e concavidade filtral eram preservados, tensão era colocada sobre a base alar e alargamento da narina era reduzido. Em decorrência dessas vantagens e da melhor moldagem do processo alveolar subjacente, essa técnica tornou-se o procedimento mais utilizado para o reparo da fissura labial unilateral em todo o mundo.

No entanto, dificuldades para a sua utilização em fendas amplas, com encurtamento acentuado do segmento medial, deficiência de vermelhão seco e úmido e a necessidade de descolamentos amplos em partes moles levaram ao desenvolvimento de uma série de modificações, entre as quais, destacam-se: o "back-cut" na incisão de rotação, introduzido por Millard8, o retalho de vermelhão da vertente lateral descrito por Noordhoff9, a incisão de rotação estendida para a columela proposta por Mohler10 e, as subunidades anatômicas de Fisher11.

Além disto, com o intuito de obter melhor estabilidade dos resultados em longo prazo, refinamentos no rearranjo das fibras musculares do orbicular12 e a abordagem primária da deformidade nasal foram propostos por Skoog13, McComb14 e Tajima & Maruyama15.

Com o intuito de melhorar os resultados estéticos sem comprometer o crescimento ósseo facial, modificações na abordagem da rinoqueiloplastia primária do paciente com fissura labial unilateral foram introduzidas pelo Grupo de Cirurgia Craniofacial da Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras do HCFMUSP e, nesse estudo, por meio de análise retrospectiva, os efeitos causados por essas modificações no padrão de crescimento ósseo facial, bem como seus resultados estéticos, foram avaliados.


MÉTODO

Durante o período de 2002 a 2008, quarenta e cinco pacientes portadores de fissura labial unilateral foram submetidos à rinoqueiloplastia primária, conforme técnica proposta. Seguindo o protocolo de atendimento multidisciplinar do Grupo de Cirurgia Craniofacial do HCFMUSP, a realização deste procedimento ocorreu a partir dos três meses de idade (Quadro 1). Até este período, nenhum tipo de dispositivo com o intuito de reposicionar a deformidade nasal ou os segmentos alveolares foi aplicado. Logo após a cirurgia, no entanto, modeladores nasais de silicone foram utilizados durante período de dois meses. A partir de então, houve seguimento ambulatorial até cinco anos de idade. Nesse momento, estudo da oclusão dentária, por meio de cefalometria e modelos em gesso, foi realizado. Com emprego do índice de Atack16, o padrão de crescimento ósseo facial foi avaliado (Quadro 2).






Técnica Cirúrgica

Após indução anestésica e colocação de tubo endotraqueal via oral, o paciente foi colocado em posição supina com o pescoço discretamente estendido através de coxim abaixo dos ombros. Antissepsia foi realizada com emprego de povidine tópico.

Marcação: Para marcação dos pontos de reparo utilizou-se verde brilhante. Inicialmente a linha média do nariz, o contorno das asas do nariz, a posição do dômus de ambas as cartilagens laterais inferiores do nariz e a transição entre o vermelhão seco e úmido foram marcados. Em seguida, na vertente medial, sobre a linha branca, os pontos do tubérculo mediano, do arco de cupido do lado não fissurado e do arco de cupido do lado fissurado foram evidenciados. Pontos de referência para o assoalho nasal foram estabelecidos no lado não fissurado e transferindo-se esta dimensão para o lado fissurado outros dois pontos de reparo foram estabelecidos nesse segmento. Base da coluna filtral do lado não fissurado foi demarcada, observando-se a conformação da coluna filtral. A partir do arco de cupido do lado fissurado, marcou-se a incisão de rotação até a base da coluna filtral do lado não fissurado. De acordo com a conformação da coluna filtral do lado não fissurado e da altura vertical da vertente medial, a incisão demarcada foi mais ou menos arqueada; quando o lábio era muito curto, prolongamento em 90o sobre a coluna filtral do lado não fissurado pôde ser feita, delimitando o retalho de rotação. A partir do arco de cupido do lado fissurado, incisão na margem medial da fissura foi estabelecida, delimitando o retalho C. Na vertente lateral, demarcamos sobre a linha branca o arco de cupido do lado fissurado, que foi coincidente com o local em que se inicia o estreitamento do vermelhão. Observando-se a altura do lábio no lado não fissurado, estabelecemos a altura na vertente lateral. Através de pequena incisão a 1mm da rima narinária, o retalho de avanço foi delimitado (Figuras 1 e 2).


Figuras 1 e 2 - Marcação.



Procedimento: Após marcação dos pontos de referência, os mesmos foram tatuados com auxílio de agulha de insulina e verde brilhante. Bloqueio bilateral do nervo infra-orbitário foi realizado e, a seguir, a infiltração das margens da fenda, espinha nasal anterior, base alar do lado fissurado e ponta nasal com solução de lidocaína a 0,4% e epinefrina em concentração 1:100.000 foi realizada. Inicialmente, na vertente medial, uma incisão na margem da fissura, acima da linha cutânea, foi realizada através da pele e do subcutâneo, mas não do músculo. O tecido marginal foi descartado. Dissecção do músculo orbicular da pele suprajacente, vermelhão e mucosa subjacente foi realizada. Na pele, com o intuito de preservar a concavidade filtral, a dissecção muscular foi realizada apenas a 1 mm da borda. Através de pequena incisão liberadora realizada no sulco gengivolabial, o freio labial foi seccionado. O músculo orbicular foi liberado de sua inserção na base da columela e da porção alveolar alta da fissura, o que permitiu a exposição da espinha nasal anterior. Por meio do posicionamento do lábio e do nariz, verificou-se a simetria entre a coluna filtral e a incisão de rotação planejada. Incisão sobre demarcação prévia foi realizada através da pele, com a confecção do retalho de rotação e do retalho C. Em casos em que a rotação para baixo foi insuficiente, prolongamento sobre a coluna filtral pôde ser feita (Figura 3). Na vertente lateral, a incisão na margem da fissura, acima da linha cutânea, foi realizada do mesmo modo que na vertente medial, com a preservação do músculo. Abaixo da linha cutânea, retalho de vermelhão foi confeccionado. O tecido marginal foi descartado. Dissecção do músculo orbicular da pele suprajacente, vermelhão e mucosa subjacente foi feita. Nesta vertente, a dissecção entre pele e músculo foi mais extensa. Abaixo da base alar, ampla dissecção do músculo orbicular foi realizada. Através de incisão no sulco gengivolabial, fez-se a liberação do lábio em relação ao rebordo alveolar e à abertura piriforme. Dissecção supraperiosteal sobre a maxila proporcionou liberação da base alar (Figura 4). Através de incisão intercartilaginosa, a cruz lateral da cartilagem lateral inferior e sua porção vestibular foram liberadas da inserção póstero-lateral na abertura piriforme, o que permitiu avanço ântero-medial da base alar. Descolamento cutâneo das cartilagens laterais inferiores do nariz, bem como da cartilagem lateral superior do lado fissurado, foi realizado através desta mesma incisão (Figuras 5 e 6).


Figura 3 - Abordagem na vertente medial.


Figura 4 - Abordagem na vertente lateral.


Figuras 5 e 6 - Abordagem da deformidade nasal.



Com o posicionamento do dômus do lado fissurado em sentido ântero-medial, dois ou três pontos de Vicryl® 5.0 fechando a incisão intercartilaginosa foram passados com o objetivo de manter o avanço da cruz lateral da cartilagem lateral inferior. Buscando a simetria de ponta, uma sutura transdomal em U foi feita com Monocryl® 5.0. Pontos transfixantes ao redor da asa refixaram a cartilagem lateral inferior, evitando-se a formação de espaço morto.

Com a secção do freio labial, o avanço da mucosa da vertente medial corrigiu a altura do lábio. A síntese entre a mucosa de ambas as vertentes foi feita com pontos separados de Vicryl® 5.0. Com emprego de dois a três pontos deste mesmo fio, a incisão liberadora na vertente lateral foi fechada. Com pontos simples de Nylon® 5.0, realizou-se a síntese do músculo orbicular. A banda nasal foi suturada na espinha nasal anterior e as fibras profundas do vermelhão foram unidas.

Por meio de gancho duplo no nariz e ponto de reparo na linha cutânea, acertou-se o posicionamento do retalho C e calculou-se a extensão da incisão que delimitou o retalho de avanço. Independentemente do tamanho da fenda, esta incisão foi posicionada a 1 mm da base alar, sendo sempre de pequena extensão, nunca ultrapassando a metade lateral da abertura narinária. Três pontos subdérmicos de Monocryl® 5.0 foram realizados e, por fim, a síntese cutânea foi feita com pontos simples de Vicryl rapid® 6.0.

Observando-se a diferença de altura do vermelhão entre as vertentes, posicionou-se o retalho de vermelhão da vertente lateral para que esta diferença fosse corrigida. Respeitando-se a referência anatômica do tubérculo mediano, as dimensões deste retalho foram modeladas e através de pequena incisão na transição entre o vermelhão seco e úmido este retalho foi inserido na vertente medial. Síntese com pontos separados de Vicryl rapid® 6.0 finalizaram o procedimento (Figura 7).


Figura 7 - Aspecto final.



Modelador nasal de silicone foi colocado. Pomada antibiótica foi aplicada na linha de sutura. O paciente foi extubado e encaminhado à recuperação pós-anestésica. Alta hospitalar ocorreu no primeiro dia pós-operatório. Durante a primeira semana, restringiu-se o uso de mamadeira e chupeta. Retorno ambulatorial foi feito com sete, quinze e trinta dias e, a partir daí, os pacientes foram avaliados periodicamente, de maneira multidisciplinar, de acordo com a rotina do serviço.

Avaliação dos resultados estéticos

Por meio de um sistema de pontuação, os aspectos estéticos importantes do lábio (simetria do arco de cupido, da coluna filtral e do vermelhão, alinhamento da linha branca e da transição entre o vermelhão seco e úmido); do nariz (simetria do assoalho nasal, da base alar, do posicionamento do dômus e da cartilagem lateral inferior) e; da cicatriz propriamente dita (hipertrofia, alargamento, pontos marcados) foram analisados após período pós-operatório de 6 meses (Quadro 3).

Avaliação do padrão de crescimento ósseo facial

De acordo com o protocolo estabelecido, os pacientes com cinco anos de idade realizaram estudo da oclusão dentária por meio de cefalometria e modelos em gesso e, a partir destes exames, o padrão de crescimento ósseo facial foi estabelecido por meio do índice de Atack.


RESULTADOS

Quarenta e cinco pacientes portadores de fissura labial unilateral foram consecutivamente submetidos à rinoqueiloplastia primária, conforme técnica proposta. Quatorze pacientes eram portadores de fissura pré-forame e trinta e um pacientes eram portadores de fissura transforame; 55% foram submetidos a tratamento cirúrgico até seis meses de idade, mas 33% apresentaram idade superior a dezoito meses no momento da cirurgia (Tabela 1).




Resultados estéticos

A partir do sistema de pontuação dos resultados estéticos, 17,8% dos casos foram considerados bons e 82,2% foram considerados excelentes (Figuras 8 a 10). Dentre os aspectos considerados negativos, 37,8% foram relacionados a deformidades da cartilagem lateral inferior, 20% a simetria da base alar e 20% a simetria do vermelhão (Tabela 2).


Figura 8 - Pré-operatório e pós-operatório tardio.


Figura 9 - Pré-operatório e pós-operatório tardio.


Figura 10 - Pré-operatório e pós-operatório tardio.




Correlação entre gravidade da fissura e resultado estético insatisfatório da cartilagem lateral inferior pôde ser estabelecida no seguimento a longo prazo. Retração cicatricial esteve presente em 1 paciente e, em 6 casos, observou-se a presença de cicatriz hipertrófica.

Padrão de crescimento ósseo facial

Em longo prazo, 24 (53,5%) pacientes foram submetidos a estudo da oclusão dentária por meio de cefalometria e modelos em gesso. Por meio do índice de Atack, observou-se que 20 (83,4%) pacientes apresentaram índice tipo 1 de oclusão dentária, enquanto quatro (16,6%) pacientes apresentaram índice tipo 2. Padrões desfavoráveis de oclusão dentária não foram observados nesta amostra (Tabela 3).




DISCUSSÃO

O tratamento do paciente com fissura labial unilateral tem como objetivo proporcionar a reconstituição de uma face harmoniosa e balanceada, com dentição completa e oclusão dentária normal, que restabeleça o sorriso e remova o estigma da fissura lábio-palatal.

Para que isto seja possível, a abordagem multidisciplinar, particularmente a integração cirúrgica e ortodôntica; o profundo conhecimento dos mecanismos que causam a deformidade do lábio e do nariz; e meticulosa técnica cirúrgica são fatores fundamentais.

Estudo baseado em questionário envolvendo todos os membros da Associação Americana de Deformidades Craniofaciais e Fissuras Labiopalatinas, bem como da Sociedade Canadense de Cirurgiões Plásticos, demonstrou que 84% dos cirurgiões plásticos realizam queiloplastia baseada no princípio de avanço-rotação17. Destes, 46% realizam o procedimento conforme descrição inicial proposta por Millard, mas 38% realizam modificações desta técnica. Entre as modificações, 25% realizam o procedimento de Noordhoff, 21% o de Mohler e 16% preconizam o uso de técnica original baseada no princípio de avanço-rotação. Para todos, nenhuma mudança técnica é realizada com base no tipo de fissura. Em relação à rinoplastia primária, 52% afirmaram a realização rotineira deste tratamento, mas 22% declararam nunca realizar o tratamento da deformidade nasal concomitantemente à queiloplastia.

Em revisão recente sobre os cinquenta anos da técnica de Millard realizada por Stal et al.18, destaca-se o grande impacto que a ideia inovadora de Millard introduziu na história do reparo cirúrgico da fissura labial unilateral, mas principalmente enfatiza-se a importância da persistência e da análise crítica dos resultados para o desenvolvimento de modificações. De acordo com estes autores, independentemente do tipo de modificação realizada, o questionamento constante, o refinamento e a aplicação de modificações com base na experiência permitem a obtenção de melhores resultados nesta técnica.

Baseado na experiência do autor sênior, este trabalho propõe modificação na abordagem global da rinoqueiloplastia primária do paciente com fissura labial unilateral, dando-se ênfase: 1. na dissecção estendida do músculo orbicular abaixo da asa nasal, com o seu correto reposicionamento; 2. no alongamento da mucosa oral da vertente medial através da liberação do freio labial superior, sem a necessidade de Z-plastia; e 3. no tratamento da deformidade nasal através de acesso direto.

Tendo como ponto-chave a liberação e a total mobilização de todos os elementos do lábio-nariz, incluindo envelope cutâneo, cartilagem nasal, revestimento vestibular do nariz, musculatura e mucosa oral, preconiza-se o correto reposicionamento destas estruturas, sem o comprometimento do crescimento ósseo facial.

Marcando-se a incisão de rotação na base da coluna filtral do lado não fissurado, uma incisão com maior comprimento pode ser obtida, o que diminui a necessidade de prolongamento inferior desta incisão para alongamento da vertente medial. Após a síntese cutânea, a tração deste ponto em direção à linha média traciona concomitantemente a porção desviada do septo caudal, contribuindo desta forma para o seu correto reposicionamento, sem uma abordagem direta deletéria ao crescimento facial.

O rearranjo diferencial do componente muscular que corrige sua inserção e reorienta as fibras musculares é também passo fundamental na correção das deformidades unilaterais. Em ambas as dissecções medial e lateral, a liberação completa do músculo em relação à base esquelética é o ponto-chave para a simetria da base alar. Restringindo-se o descolamento cutâneo em 5 mm lateralmente e 1 mm medialmente, acredita-se que descolamentos mais amplos sejam desnecessários e potencialmente restrinjam o crescimento da face. Inserindo-se a banda nasal na espinha nasal anterior e realizando-se a síntese das fibras profundas do vermelhão, corrige-se a deformidade do assoalho nasal e evita-se o aparecimento de entalhes no lábio. Com o correto posicionamento da base alar, diminui-se a tensão nesta região e torna-se possível reduzir de maneira significativa a incisão do retalho de avanço ao redor da asa nasal, como proposto inicialmente por Millard.

Para manter o alongamento tardio do lábio acredita-se que, por meio da liberação do freio labial e o avanço medial do retalho mucoso, haja a correção do déficit de altura de mucosa sem a necessidade de Z-plastia.

Através da incisão intercartilaginosa, realiza-se a liberação completa da cruz lateral da cartilagem lateral inferior em relação à abertura piriforme e à cartilagem lateral superior, bem como a liberação do seu revestimento vestibular. Por meio do avanço ântero-medial da cruz lateral e do dômus a columela é centralizada, a base alar é reposicionada de maneira simétrica e, a abertura narinária obtém igual circunferência. Através de ponto transdomal e pontos transfixantes na asa obtém-se a simetria da ponta nasal. O uso de retalhos de corneto inferior, L ou M para o fechamento da incisão intercartilaginosa, é desnecessário. Com o intuito de limitar os efeitos da retração cicatricial, modelador nasal de silicone é utilizado durante período de dois meses.

Com esta abordagem precoce, crescimento e desenvolvimento do nariz ocorrem em uma posição anatômica mais favorável, o que proporciona melhor desenvolvimento psicossocial e de auto-estima.

De acordo com estudos realizados pelo Grupo Consultivo de Padrões Clínicos19 e pelo Projeto Eurocleft20, existe ampla correlação entre experiência e resultados e; para que melhores resultados possam ser obtidos ao longo do tempo, o rigoroso seguimento longitudinal e a análise crítica dos resultados devem ser sistematicamente realizados. Assim sendo, foi objetivo deste trabalho estabelecer um sistema de pontuação para avaliar de maneira objetiva e padronizada os resultados estéticos. Com base neste sistema, análises subjetivas puderam ser excluídas e critérios objetivos permitiram a avaliação criteriosa, que demonstraram 82,2% de resultados excelentes. Dentre os aspectos considerados negativos, uma correlação entre gravidade e resultado estético insatisfatório da cartilagem lateral inferior pôde ser estabelecida. Nestes casos, em que uma deterioração dos resultados iniciais ocorreu, a memória da cartilagem e a retração cicatricial foram consideradas os fatores responsáveis.

Finalmente, considerando-se a importância do crescimento ósseo facial no equilíbrio estético da face e a íntima correlação que existe entre as intervenções primárias do lábio e palato sobre este padrão de crescimento, é fundamental que protocolos específicos de avaliação sejam estabelecidos. Neste trabalho, estudo da oclusão dentária e inferência sobre o padrão de crescimento ósseo facial foram realizados aos cinco anos de idade, por meio de exame de cefalometria e modelo em gesso. Apesar da pequena casuística apresentada, verifica-se que alterações oclusais compatíveis com restrição do terço médio da face não ocorreram quando esta técnica foi aplicada. Em longo prazo, a correlação destes dados com o índice de cirurgias ortognáticas será um critério importante para avaliar a eficácia do protocolo proposto.


CONCLUSÕES

Por meio da abordagem para rinoqueiloplastia primária apresentada, independentemente do tamanho da fenda, melhores resultados estéticos e funcionais puderam ser obtidos, sem restrição ao crescimento ósseo facial. Para que melhores resultados possam ser obtidos ao longo do tempo, análise criteriosa e objetiva deve sistematicamente ser realizada.


REFERÊNCIAS

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1. Médico Assistente do Grupo de Cirurgia Craniofacial da Disciplina de Cirurgia Plástica do HCFMUSP.
2. Professor Livre Docente; Chefe do Grupo de Cirurgia Craniofacial da Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras do HCFMUSP.
3. Médico Assistente do Grupo de Cirurgia Craniofacial da Disciplina de Cirurgia Plástica do HCFMUSP.

Trabalho realizado pelo Grupo de Cirurgia Craniofacial da Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP.
Artigo submetido pelo SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBCP.

Artigo recebido: 28/12/2009
Artigo aceito: 18/1/2010

Correspondência para:
Nivaldo Alonso Rua Afonso Brás, 473 - cj. 65 - Vila Nova Conceição
São Paulo, SP - CEP 04511-011
E-mail: nivalonso@gmail.com

 

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