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Face I - Year2018 - Volume33 - (Suppl.1)

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2018RBCP0054

RESUMO

O câncer de pele é a neoplasia maligna mais frequente no Brasil, sendo o carcinoma basocelular o mais prevalente. A área afetada por esta afecção é frequentemente local sensível à preservação tecidual. Durante o desenvolvimento do tratamento cirúrgico destas lesões, foram propostas abordagens que contemplavam esta característica, dentre elas, a cirurgia com margens cutâneas mínimas - cirurgia de Mohs - destaca-se pela efetividade de cura. Esta revisão visa abordar a factibilidade desta abordagem no Brasil. A cirurgia de Mohs apresenta efetividade de cura compatível com outras técnicas, tendo a superioridade da preservação de tecidos e tratamento definitivo imediato, ao passo que apresenta custo e complexidade de realização superiores.

Palavras-chave: Cirurgia de Mohs; Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos; Carcinoma basocelular; Neoplasias cutâneas; Estética; Face.


INTRODUÇÃO

O câncer de pele é a neoplasia epitelial maligna mais frequente no Brasil. Em 2016, foram contabilizados aproximadamente 175 mil novos casos de câncer de pele não melanoma no país. Dentre as lesões malignas, os carcinomas basocelulares (CBC) são os mais prevalentes e sua incidência está aumentando drasticamente1.

Há diversos tratamentos para tais cânceres: radioterapia, quimioterapia, terapia fotodinâmica e excisão ou remoção cirúrgica. A excisão cirúrgica convencional (ECC) delimita margens de segurança laterais e profunda, além da borda visível do tumor. A margem de segurança é determinada pelo tipo de tumor e por fatores como dimensões da lesão, localização anatômica e agressividade biológica. Para o carcinoma basocelular (CBC), utilizam-se usualmente margens de 3 a 5mm, enquanto que para o carcinoma espinocelular ou epidermoide (CEC), as margens são de 4mm para os bem diferenciados e de 6mm para os indiferenciados.

A presença do patologista para exame de congelação transoperatória, no bloco cirúrgico, permite também a realização da cirurgia com margens cutâneas mínimas, a cirurgia micrográfica de Mohs (CMM). Normalmente, costuma-se indicar esse tipo de procedimento para regiões que necessitam maior preservação de tecido, como nas pálpebras e orelhas.

Essa técnica também pode ser empregada quando há suspeita de que o tumor pode estar presente microscopicamente além das margens-padrão pré-estabelecidas2. Na técnica de Mohs, a lesão é removida e dividida em pequenos fragmentos que são codificados e planificados para expor toda a margem, em seguida o material é congelado e são montadas inúmeras lâminas com cortes dessas margens. O processo tende a ser lento e repetitivo nas zonas comprometidas, até que se obtenha a negativação das margens e, assim, o fechamento do defeito pode ser realizado no mesmo dia da excisão.


OBJETIVO

O objetivo do presente estudo é demonstrar a utilização da cirurgia com margens cutâneas mínimas - cirurgia de Mohs - no tratamento das lesões malignas não melanocíticas da pele.


MÉTODOS

Estudo de casos no período de janeiro 2017 a janeiro 2018, com pacientes que apresentavam lesões carcinomatosas em regiões da face em áreas que não permitiam confecção de margens cirúrgicas convencionais para a excisão tumoral. Todos os pacientes apresentavam carcinomas basocelulares e as lesões não eram recidivadas.

As indicações de cirurgia micrográfica de Mohs foram revistas segundo dados de uma revisão sistemática da literatura pertinente utilizando o período de 2003 a 2017, na base de dados PubMed e com os termos: "Mohs micrographic Surgery Treatment" OR "Mohs Micrographic Surgery" OR "Mohs/ carcionoma" [Mesh] OR "Therapeutic use of Mohs/Mohs" [Mesh] OR "Mohs/sarcoma" [Mesh] OR "Therapeuctics/Mohs" [Mesh] OR "Body regions/Mohs" [Mesh] OR "Types of tumors/Mohs".


RESULTADOS

A constatação de margens cirúrgicas livres foi obtida após análise do patologista em todos os casos, o que permitiu a reconstrução da área do defeito residual de forma imediata - no mesmo dia da operação de excisão(Figuras 1 a 4).


Figura 1. Esquema gráfico.


Figura 2. Lesão em pálpebra inferior.


Figura 3. Lesão em região nasal.


Figura 4. Lesão em região da face.



DISCUSSÃO

A CMM foi inicialmente desenvolvida no início da década de 1930 e modificada para a técnica de tecido fresco em 1953 pelo Dr. Frederich Mohs nos Estados Unidos. É uma técnica utilizada para o tratamento de tumores com crescimento contínuo e expansivo, em especial nas neoplasias de pele não melanocíticas e na presença de neoplasias de pele complexas ou com margens mal definidas no exame histológico3,4. Pode permitir taxas de cura próximas de 99% com o mínimo de tecido removido para muitos tumores3.

A técnica de Mohs é considerada mais efetiva em certas regiões do corpo4, sendo mais efetiva nas áreas H e M(Quadro 1).




Além destas regiões, aceita-se que a CMM possa ser o tratamento de escolha para determinadas situações:

1. Carcinomas recidivantes: possuem forte indicação para CMM. Enquanto os tumores primários costumam se localizar em áreas periorbiculares, perioral e nariz (zona H); os recidivantes estão no couro cabelo, pescoço e tronco (zona M). Dentre os subtipos histológicos, o CEC in situ mais frequentemente se apresenta como tumor recorrente5.

Os CBC recorrentes tratados com CMM tiveram uma taxa de cura de aproximadamente 11,3% maior comparados aos tratados convencionalmente. O tratamento do CEC recorrente, com envolvimento perineural, mal diferenciado ou maiores que 2cm, também apresentou taxas de recorrência significativamente menores com CMM6.

2. Carcinomas com comportamento biológico agressivo e em áreas de tendência à invasão profunda na face: CBC esclerodermiformes, infiltrativos e micronodulares possuem indicação de CMM5. Da mesma forma, a melhor terapêutica para carcinoma de células escamosas pouco diferenciadas ou de invasão profunda parece ser a CMM. Há estudos que apontam para a superioridade da CMM comparada à ECC nos pacientes com CCE na região labial. Apesar de não apresentar taxas de recorrências melhores, metástases não foram relatadas em pacientes tratados com CMM, enquanto apareceram em 5,4% dos pacientes após ECC7.

3. Tumores com limites não visíveis ou margens incompletas: possuem indicação de CMM para que excisões incompletas sejam evitadas. O CBC apresenta crescimento da pele em forma de cúpula com vasos sanguíneos visíveis, podendo haver sangramento e se apresentando como cor de rosa, cor da pele, marrom, preto ou ter manchas dessas cores8. O CBC possui taxa de excisão incompleta que varia de 4 a 16,6%9-11.

4. Dermofibrossarcoma protuberans: Tende a ocorrer entre a idade de 20 a 50 anos. Infiltra nos septos conjuntivos, dificultando sua excisão completa. Seu desenvolvimento não é concêntrico comparado a outros tumores8,12.

5. Carcinoma sebáceo: neoplasia rara e agressiva, acomete locais que contenham glândulas sebáceas, como a região periocular e face não periocular, cabeça e pescoço, órgãos genitais, canal auditivo, seios, tórax, costas, abdome e nádegas. A maioria dos CS aparecem inicialmente na pálpebra superior ou inferior por ser um local com maior quantidade de glândulas sebáceas8. Como fatores de risco: idade avançada, raça asiática, sexo feminino, irradiação prévia a cabeça e pescoço e a presença da síndrome Muir-Torre (SMT), considerada uma variante da síndrome de Lynch8,13.

A principal desvantagem da técnica de Mohs reside no seu alto custo. Em muitos casos no Brasil, estas despesas não estarão cobertas pelos planos de saúde. Tempo cirúrgico prolongado, análises patológicas repetidas e necessidade de uma equipe médica completa em ambiente cirúrgico explicam estes custos, que poderiam ser aceitos considerando os benefícios da obtenção de cura comprovada por meios patológicos. Entretanto, as indicações permanecem restritas, visto que em diversas situações clínicas a ECC pode ainda ser utilizada, sem agravamento do tempo cirúrgico e sem detrimento do tratamento. Cabe então à equipe médica avaliar cada caso, indicando a cirurgia de Mohs nas situações de comprovado benefício clínico.


CONCLUSÃO

A CMM se constitui em uma ferramenta útil nos tumores de pele não melanoma em que se necessita maior preservação de tecido circunjacente.


REFERÊNCIAS

1. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA). Pele Não Melanoma. 2016. [acessado 2018 Mar 16]. Disponível em: http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/tiposdecancer/site/home/pele_nao_melanoma

2. Terzian LR, Nogueira VMA, Paschoal FM, Barros JC, Machado Filho CD. Cirurgia Micrográfica de Mohs para preservação tecidual nas cirurgias oncológicas da face Surg Cosmet Dermatol. 2010;2(4):257-63.

3. Mansouri B, Bicknell LM, Hill D, Walker GD, Fiala K, Housewright C. Mohs Micrographic Surgery for the Management of Cutaneous Malignancies. Facial Plast Surg Clin North Am. 2017;25(3):291-301. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.fsc.2017.03.002

4. Ad Hoc Task Force. Connolly SM, Baker DR, Coldiron BM, Fazio MJ, Storrs PA, Vidimos AT, et al. AAD/ACMS/ASDSA/ASMS 2012 appropriate use criteria for Mohs micrographic surgery: a report of the American Academy of Dermatology, American College of Mohs Surgery, American Society for Dermatologic Surgery Association, and the American Society for Mohs Surgery. J Am Acad Dermatol. 2012;67(4):531-50. PMID: 22959232 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.jaad.2012.06.009

5. Higgins HW 2nd, Capobianco S, Lee KC. Recurrent Tumors Referred for Mohs Micrographic Surgery: A 12-Year Experience at a Single Academic Center. Dermatol Surg. 2017. [Epub ahead of print] DOI: http://dx.doi.org/10.1097/DSS.0000000000001220

6. Finley EM. The principles of mohs micrographic surgery for cutaneous neoplasia. Ochsner J. 2003;5(2):22-33.

7. Cernea SS, Gontijo G, Pimentel ER, Tarlé RG, Tassara G, Ferreira JA, et al. Indication guidelines for Mohs micrographic surgery in skin tumors. An Bras Dermatol. 2016;91(5):621-7. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/abd1806-4841.20164808

8. American Academy of Dermatology. Basal Cell Carcinoma [acesso 2018 Abr 5]. Disponível em: https://www.aad.org/public/diseases/skin-cancer/basal-cell-carcinoma

9. Farhi D, Dupin N, Palangié A, Carlotti A, Avril MF. Incomplete excision of basal cell carcinoma: rate and associated factors among 362 consecutive cases. Dermatol Surg. 2007;33(10):1207-14. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/00042728-200710000-00008

10. Su SY, Giorlando F, Ek EW, Dieu T. Incomplete excision of basal cell carcinoma: a prospective trial. Plast Reconstr Surg. 2007;120(5):1240-8. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/01.prs.0000279148.67766.e1

11. Tan PY, Ek E, Su S, Giorlando F, Dieu T. Incomplete excision of squamous cell carcinoma of the skin: a prospective observational study. Plast Reconstr Surg. 2007;120(4):910-6. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/01.prs.0000277655.89728.9f

12. Chaput B, Filleron T, Le Guellec S, Meresse T, Courtade-Saïdi M, Grolleau JL, et al. Dermatofibrosarcoma protuberans: margins reduction using slow-Mohs micrographic surgery. Experience with 35 patients. Ann Chir Plast Esthet. 2014;59(4):219-25. PMID: 24411817 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.anplas.2013.11.001

13. Brady KL, Hurst EA. Sebaceous Carcinoma Treated With Mohs Micrographic Surgery. Dermatol Surg. 2017;43(2):281-6. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/DSS.0000000000000943










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